Jason Rochelle vive entre sombras — sombras que se erguem a cada sucesso vazio, a cada conquista que deveria parecer uma vitória, mas que, no fundo, é apenas mais uma tentativa de preencher o abismo que existe dentro dele. O acidente levou embora muito mais que o seu irmão gêmeo; arrancou dele um pedaço da alma e, com ele, toda a certeza de quem ele realmente era.
Agora, ele carrega o fardo de uma existência que m*l compreende, cercada de fragmentos de um passado que apenas vislumbra em lampejos distantes e assustadores.
Sua ascensão na Tecno Electronics é impecável. Ele trilha o caminho até o topo com uma determinação quase obsessiva, onde o trabalho é o único refúgio de uma paz que ele não conhece. Mas não importa o quão alto ele suba, não importa a fortuna ou o status que conquiste, algo nele continua vazio. Há uma exaustão que os sucessos profissionais não apaziguam; um cansaço que grita mais alto a cada dia, pedindo uma pausa.
Ao voltar a Portsmouth, a cidade onde cresceu, Jason é inundado por uma onda de familiaridade desconfortável. Cada rua, cada esquina, sussurra memórias que ele não consegue acessar, mas que de alguma forma o assombram. A sua irmã o olha com uma expressão que é ao mesmo tempo, amorosa e vigilante, como se soubesse mais do que diz, como se guardasse segredos que ele não está pronto para ouvir. E ali, entre os fantasmas da sua própria história, ele percebe que o vazio que o consome talvez seja uma cicatriz, uma barreira que a sua mente erigiu para protege—lo de algo muito mais sombrio.
Será que ele quer, realmente, saber o que perdeu?
Jéssica
Estou sentada na beirada da cama, os joelhos puxados contra o peito, enquanto Jake se move pelo quarto com aquela calma habitual. Ele ajusta o punho da camisa como se estivesse se preparando para algo simples, algo rotineiro. Mas eu sei o que está por vir. A maneira como ele evitou meu olhar ao entrar no quarto, o tom casual demais na voz... Ele está tentando me preparar para uma notícia.
— Jason quer que eu vá com ele a uma festa amanhã — ele finalmente diz, com a voz baixa, mas cheia de naturalidade. Como se isso não fosse grande coisa.
Meu estômago se contrai.
— Uma festa? — pergunto, tentando esconder a inquietação que se forma em mim. — Achei que você não curtia essas coisas.
—A festa é em Londres. E você sabe que ele não dirige a longas distâncias. Ele tem aquele trauma de infância, o medo da estrada.
—Você precisa ir mesmo?
Jake sorri, aquele sorriso torto que sempre ilumina o quarto inteiro. Ele se vira para mim, os olhos castanhos brilhando com uma mistura de diversão e ternura.
— Não é sobre a festa, Jess. É sobre o Jason. Eu quero me aproximar mais dele. Ele anda com companhias que não me agrada. Acho que precisa de alguém ao lado dele agora. Sabe como é, eu não posso dizer não.
A irritação sobe à superfície, mas logo se dissolve em preocupação. É tão típico do Jake colocar o irmão em primeiro lugar, sem pensar nas consequências. Quero insistir para ele não ir, para deixar Jason lidar com os próprios medos. Mas conheço Jake. Sei que isso não vai acontecer.
— E se vocês voltarem tarde? Ou se a estrada estiver r**m? — Minha voz sai mais alta do que eu pretendia, carregada do medo que estou tentando esconder.
Jake dá uma risada leve, como se eu estivesse sendo dramática. Ele se aproxima e se ajoelha na minha frente, segurando minhas mãos nas dele. Suas mãos são quentes, seguras, como tudo o que ele representa para mim.
— Vai ficar tudo bem, Jess. Eu prometo. É só uma viagem. Eu cuido disso. Sempre cuido.
Quero dizer que ele não precisa cuidar de tudo, que ele pode dizer não, mas as palavras não saem. O medo dentro de mim é irracional, mas ainda assim real, e ele não entenderia. Como explicar algo que nem eu consigo colocar em palavras?
— Jason não pode arrumar outra pessoa para levá-lo? — Tento insistir, mesmo sabendo a resposta.
— Não meu amor — Jake sorri novamente, tentando me tranquilizar, mas vejo a sombra de preocupação em seu olhar. Ele percebe que estou aflita.
Antes que eu diga qualquer outra coisa, ele me puxa para seus braços, envolvendo-me em um abraço firme. A respiração dele é quente contra minha pele, e eu sinto o som do coração dele, forte e constante, como uma promessa de que ele sempre estará ali.
— Confie em mim, Jess. Eu volto antes que perceba. Prometo.
Seus lábios tocam os meus em um beijo lento, cheio de uma doçura que sempre faz o mundo ao meu redor desaparecer. Mas, dessa vez, sinto algo diferente, uma urgência, como se ele também estivesse tentando gravar o momento na memória.
Eu o aperto com mais força, como se pudesse mantê-lo aqui, longe da estrada, longe de tudo. m*l sei que esse será o último abraço, o último beijo. Que a estrada, com seu asfalto frio e seus perigos invisíveis, será a última coisa que irá separá-lo de mim.
E que essa promessa, feita tão casualmente, será a única coisa dele que restará para mim quando a noite acabar.