01- Kayla.
1509 Words
Kayla narrando:
Já pensou em viver uma nova vida? Em um lugar onde ninguém te conheça, ou melhor, não saiba quem é a sua família!
Sempre quando fecho os meus olhos à noite, penso em uma vida diferente, longe de tudo isso, de tanta dor, ignorância, e angústia!
Não tenho um minuto de paz, estou ficando tão cansada, com o peso do meu pai e irmão sobre mim e mamãe.
Me chamo Kayla, tenho vinte e cinco anos, nasci em Porto Rico, meus pais fugiram de lá quando eu só tinha cinco anos, e viemos para o Brasil.
Meu irmão mais novo, Carlos, é uma dor de cabeça, tem 18 anos, está envolvido com coisas erradas, meu pai já está preso, e a pobre da minha mãe já está acabada, se matando para levar as coisas para ele na prisão e pagar suas contas.
Vamos ao meu destino, acordo todos os dias às quatro horas da manhã, pego meus livros e começo a estudar, estou tentando uma bolsa na faculdade, as provas estão chegando, e minha mente está a milhão, se conseguir uma bolsa, vai ser minha esperança para fugir de tudo isso.
Minha mãe trabalha de empregada doméstica na casa de uns ricos aqui em Manaus, eu trabalho durante o dia em uma empresa de logística, faço parte da equipe de limpeza !
O meu salário vai toda para a minha mãe, não tiro nenhum centavo para mim, se preciso de algo, eu peço a ela, não por que ela me obriga, mas sim por respeito, eu sei o tanto que ela luta, e ganho um pouco mais que ela. Temos um carro para pagar, aluguel, contas do cotidiano, comida, e as merdas que meu irmão faz.
Meu pai foi preso a dois anos por contrabando, formação de quadrilha e porte de arma, o juiz não pensou duas vezes, ele pegou um longo tempo no fechado!
Não concordo com o que meu pai faz, mas quando ele estava em liberdade, fazendo suas merdas, ele sustentando a casa, minha mãe estava bem.
Eu nunca esperei por nada do meu pai, eu já estava trabalhando, nunca dependi dele, porque mesmo sendo o meu pai, ele sempre me tratou com indiferença, tudo ia apenas para Carlos, meu irmão caçula.
Minha mãe disse que meu pai queria um menino como primeiro filho, e isso foi um golpe no meu coração. Não tenho culpa de nascer mulher! Mas ignorando isso, quando meu pai estava na rua, tínhamos uma casa maior, um carro f**a, moto, jóias, e tudo do melhor. Mas não sobrou nada, tudo se perdeu com as contas, só o advogado ficou uma fortuna, e para no final, ele perdeu o caso do meu pai, com isso meu pai sempre exige mais de nós....
Nunca fui visitar meu pai em dois anos, ele nunca ligou para mim, e não é agora que isso vai mudar!
Minha mãe toda a semana visita ele, ajudo ela a fazer jumbo ( a comida), arrumar as coisas, e deixo ela de carro na penitenciária , fico o dia todo lá na frente, esperando minha mãe sair, assim economizamos na gasolina e no pedágio!
Assim vamos seguindo...
Entrei no trabalho às 10h da manhã e saiu às 18h da tarde. O trabalho é pesado, quando chego em casa estou morta de cansaço, apenas tomo banho, janto e vou dormir. Acordo sempre às quatro da manhã, para estudar, a casa está em silêncio, não tem barulho na rua, e consigo me concentrar!
Quando o relógio chega às 9:00 horas, fecho os livros, tomo café e sai para pegar o ônibus fretado...
No trabalho sou invisível, com a ignorância do meu pai, eu fiquei muito boa em passar despercebida pelas pessoas. Evito amizades, para não sair do meu foco, meus estudos, e do meu futuro!
Deve estar se perguntando porque não fiz faculdade ainda né, tão velha, 25 anos! Bem, meu pai nunca deixou, disse que era perda de tempo, mas agora que ele foi preso, não pode dizer mais nada.
Não sei ao certo, o porquê tudo isso aconteceu! Mas Deus me deu uma oportunidade, e vou agarrar ela, quando meu pai sair da prisão, eu já vou ter terminado a faculdade e com fé trabalhando muito.
Vou viajar daqui uma semana para o Rio de Janeiro, me escrevi para faculdade de lá, quero muito passar em medicina, sempre foi meu sonho, e amo tudo que envolve cirurgia!
Minha mãe não disse nada a Carlos, que vou viajar, para ele não tentar estragar tudo...
Ele é cobrinha criada pelo meu pai, mesmo ele me maltratando, amo ele com todas as minhas forças, lembro dele pequeno no meu colo, brincando com ele, e da inocência, do jeitinho de admiração que ele me olhava!
Sei que ainda tenho o meu irmão dentro desse carrasco, um dia ele vai acordar para vida!
Minha mãe comprou as passagens de ida e volta. Tirei uma licença na empresa, minhas férias estão vencidas, então, tenho muitos dias...
Fiquei três dias viajando, cheguei no Rio de Janeiro exausta, fui para a pousada onde já tinha feito a reserva.
Tomei um longo banho, e dormi de verdade...
Acordei com celular despertando, levantei, me arrumei e sai para prova, meu coração estava acelerado, será que vou conseguir? Estudei sozinha esses dois anos, mas com dedicação!
Depois da prova, sai com a mente livre, não estava difícil, pensei que um bicho de sete cabeças , mas não! Avisei a minha mãe, ela ficou feliz, disse que ia dar certo!
Os dias das provas passaram, estava no ônibus voltando para Manaus, com a sensação que algo ia mudar, que vou conseguir, mesmo vendo pessoas lá falando que estava no sexto ano de tentativa para ganhar a bolsa!
Voltei para Manaus, cheguei em casa a noite, fui até a cama da minha mãe, ela estava deitada dormindo...
_ Mãe, cheguei! - beijei sua cabeça devagar para não assustar ela.
_ Oi meu amor, que bom, Deus está contigo! - percebi que minha mãe falou fraco, com a voz falhando!
_ Mãe, a senhora está bem? - perguntei preocupada!
_ Sim, meu amor, só uma dor no peito, acho que é o peso de puxar os sofás do lugar, fiz a faxina pesada hoje! - olhei para minha mãe, ela estava suando frio.
Coloquei a mão sobre seu rosto e estava com febre!
_ Mãe, a senhora está com febre, onde está Carlos? - levantei correndo, fui até o quarto de Carlos, mas estava vazio.
Fui para a cozinha, abri o armário onde ficavam os remédios e o termômetro, voltei para o quarto, e minha mãe estava com os olhos fechados.
_ Mãe? - corri até ela...
_ Mamãe? Acorda! - gritei mas ela não me ouviu...
Peguei minha mãe pelos braços, com muita dificuldade, e levei ele devagar até o carro, estava quase caindo quando cheguei, minhas pernas estavam tremendo pelo peso!
_ Mãe, vai ficar tudo bem!
Sai de casa correndo, indo em direção ao hospital, entrei pela emergência buzinando!
Sai do carro gritando...
_ Socorro, me ajuda, por favor! - a porta da emergência abriu, o segurança viu o meu desespero e foi até o carro...
_ O que aconteceu? - ele perguntou vendo minha mãe desmaiada.
_ Não sei, cheguei de viagem hoje, minha mãe estava deitada suando frio, reclamou de dor no peito e desmaiou quando fui pegar o remédio!
O segurança pegou a cadeira de rodas, e me ajudou a colocar ela, corremos para dentro da sala de emergência, o médico estava sentado na mesa conversando com a enfermeira!
_ O que foi? - perguntou para o segurança.
_ VERMELHO, Senhor! - segurança disse incomodada com a cena entre o médico e a enfermeira.
_ Coloque ela na maca, vamos ver... - médico se levantou sem pressa...
Estava me segurando para não gritar com ele, era como se fosse indiferente com a situação!
Ele estava examinando minha mãe, a enfermeira pegou os documentos comigo e começou a fazer a ficha....
O médico colocou minha mãe no oxigênio, a enfermeira estava ao lado dele, colocou ela na medicação e nos aparelhos...
_ O que sua mãe disse exatamente? - o médico perguntou perturbado, com os aparelhos...
_ Estava viajando, cheguei a pouco mais de uma hora, ela estava na cama deitada, disse que estava com dor no peito, ela é doméstica, disse que carregou peso, mas hoje não trabalho, ela foi visitar meu pai na prisão! Ela estava suando frio, então percebi que estava com febre, corri até a cozinha, quando voltei ela estava desmaiada! - disse começando a chorar...
_ Ok, vamos fazer uns exames preciso que nós acompanhe, aqui não temos o necessário, vou transferir sua mãe para a próxima cidade. - Médico disse pedindo a enfermeira a ambulância urgente!
Minha mãe não acordou, entramos na ambulância, ela chegou em cinco minutos, segurei as suas mãos da minha mãe, estavam frias...
Comecei a orar, pedindo a Deus por clemência, que ele não tirasse minha mãe de mim, ela era a minha força nesse mundo!
- Writer
