P.V. Princesa Kiara
Termino meu café da manhã e saio em busca de Solomon. Precisava falar com ele. Cinco soldados me acompanham enquanto o procuro. Encontro-o nos estábulos, onde se preparava para ir ao campo de treino.
— Preciso falar com você — ele me olha sério e assente. Selamos outro cavalo e saímos para dar uma volta. Os soldados nos acompanhavam a uma certa distância.
— A rainha já te contou, não é?
— Sim, ela falou hoje.
— Espero que não esteja chateada.
— Não estou. Sei que a situação não era boa naquele momento, e que, se tivesse outra escolha, você não teria dito.
— Que bom que sabe. Jamais trairia a sua confiança.
— Eu sei. Confio a minha vida a você, Solomon — ele me olha com curiosidade.
— Vai contar a ele?
— Depois do casamento. Se ele souber agora, acho que me trancaria até lá.
— Também acho. Ele é muito protetor com você.
— Obrigada pela sua ajuda.
— Não precisa agradecer. Fiquei desesperado quando te vi naquela cama, Kiara. O seu rosto estava pálido, suas mãos frias. Nunca mais me dê um susto desses.
— Não tenho essa intenção, mas você sabe que, se vocês estiverem em risco, eu não vou ficar parada.
— Não se preocupe. Vou garantir que o seu casamento seja o mais seguro do mundo — eu sorrio para ele.
P. V. Solomon
Lembro-me com clareza do dia em que Kiara foi gravemente ferida. Recordo o pânico que senti ao ver a lâmina da espada perfurar a sua barriga, o desespero quando olhei nos seus olhos. Ela me encarava friamente, ainda envolvida pela adrenalina do momento. Depois, vi quando chutou Lien, que tentava ajudá-la. Fiz um gesto de cabeça para ele, indicando que não insistisse. Ela subiu num cavalo e partiu. Logo após, mais duas pessoas passaram por nós a cavalo. Sabia que eram Sofia e Elisa; pelo menos ela não estaria sozinha.
A emboscada foi bem planejada. Não tivemos nem chance de nos defender direito, e isso custou a vida de soldados valorosos. Algum tempo depois, os soldados do rei Alexandre Mandrack chegaram para nos ajudar. Seguimos com eles até o castelo, onde fomos atendidos pelo curandeiro. Assim que os outros se distraíram, corri até o quarto do príncipe, onde havia uma intensa movimentação.
— Preciso vê-la — disse a Dylan.
— Ela está sendo tratada, Solomon. Não podemos fazer nada por enquanto — respondeu, segurando-me.
— Por favor, Dylan. Preciso saber se ela está bem.
— Assim que o curandeiro sair, eu te chamo. Não podemos levantar suspeitas.
Eu sabia que ele estava certo, mas o desespero me dominava.
— É muito grave?
— Não vou mentir, Solomon. Ela perdeu muito sangue, e o corte é profundo. Há risco, mas estamos fazendo tudo ao nosso alcance. — Dylan não estava melhor do que eu; via no seu semblante que também estava esgotado.
— Ela precisa ficar bem, aquela teimosa! — disse, bravo.
— Se não fosse por ela, hoje vocês estariam todos mortos.
— Eu sei, mas não queria que as nossas vidas valessem esse preço. — Ele deu alguns tapinhas no meu ombro.
— Preocupo-me com ela tanto quanto você. Ela estará segura comigo. Não pense muito nisso. Se ela ouvisse você falando assim, provavelmente chutaria o seu traseiro.
Um sorriso triste surgiu nos meus lábios. Ela provavelmente faria isso mesmo.
— Agora vá. Se não, o príncipe vai desconfiar. Assim que o curandeiro sair, mando alguém te chamar para vê-la.
Com essas palavras, saí. Procurei por Lien e os outros, que estavam num quarto sendo tratados. Só me restava esperar. A espera era angustiante. Já era tarde quando um guarda avisou que o príncipe Dylan queria me ver. Dei uma desculpa aos outros e o acompanhei até o quarto. Ao entrar, parei diante da cena.
Lá estava ela, deitada numa cama, o rosto pálido, o corpo imóvel. Senti as lágrimas molharem o meu rosto. Corri até ela e me joguei ao seu lado, chorando. Era muito difícil vê-la daquele jeito.
— Kiara?
— Calma, Solomon. Ela está bem agora — disse Dylan, segurando os meus ombros. — Agora é só esperar que ela reaja. Ela é uma guerreira, lutou até agora. Ela vai ficar bem.
As suas palavras não tinham efeito sobre mim. O meu desespero era visível. Sofia observava do canto do quarto, as mãos tampando a boca enquanto chorava baixinho. Hoje era um dia triste para todos.
Após a minha visita a Kiara, tive que fazer um grande esforço para não demonstrar as minhas emoções aos outros. Depois de dois dias, fomos embora com uma grande escolta até o reino de Lien, onde chegamos em segurança. Conforme os dias passaram, percebi que eles sabiam que eu não estava bem, mas não me pressionaram a falar nada. Até que, um dia, recebi um convite da rainha e do rei para uma conversa.
— Majestade, desejava me ver? — perguntei ao entrar no seu escritório.
— Sim, rapaz. Sente-se — disse, apontando uma cadeira à minha frente.
Sentei-me.
— Do que precisam?
— Preciso que me diga a verdade — disse o rei Damon, olhando-me sério.
— Não compreendo, majestade.
— Sim, você compreende. O que não contou aos outros?
— Não é nada, só um pouco de saudade da minha futura noiva — respondi com um sorriso apagado.
A rainha levantou-se, sentou-se ao meu lado e segurou uma das minhas mãos.
— Sua dor não é de saudade, querido. Vejo preocupação e tristeza em você. Seja o que for, prometemos que nenhuma palavra sairá desta sala.
Ela me olhou intensamente, e eu sabia que a suas intenções eram verdadeiras.
— Tem a nossa palavra, rapaz. Não diremos nada, nem mesmo a Lien.
— Tudo bem, mas nada pode sair daqui. A vida de alguém estará em perigo — eles assentiram, e eu continuei: — Quem salvou as nossas vidas no dia do ataque foi a princesa Kiara.
Vi o choque nos seus rostos. A rainha levou a mão aos lábios, espantada, enquanto o rei me olhava incrédulo.
— Mas como isso é possível?
— Contarei tudo a vocês, porque preciso da sua ajuda.