Vejo quando o entardecer lentamente cai. Os raios de sol se escondendo por trás de uma cortina verde que era a floresta a nossa volta, tinha chegado o momento.
— Venha, querida! Está na hora.
Asher me conduz até os fundos da sua cabana, onde havia preparado uma fogueira. Ao redor, diversos elementos folclóricos representavam o espírito da floresta.
— Sente-se — disse, apontando para um banco em frente à fogueira.
Sentei-me e observei enquanto ele iniciava a cerimônia. Com um chocalho na mão, Asher dançava em volta da fogueira, jogando ervas e pedras místicas nas chamas. Após algum tempo, a cor do fogo mudou. As chamas agora eram azuladas e mais altas do que antes. Então, Asher se aproximou de mim.
— Preciso de algumas gotas do seu sangue — ele me entregou uma pequena faca. Cortei a minha mão e deixei algumas gotas caírem na fogueira.
Vi quando as chamas explodiram para cima e começaram a se acalmar. Logo, sombras surgiram no fogo e vozes ecoaram, embora eu não conseguisse entender o que diziam.
— Em breve, o seu destino e o do príncipe se cruzarão de forma decisiva. Isso não vai demorar a acontecer — disse Asher, com a voz calma e o semblante sereno. — Existe alguém poderoso que deseja o sangue dele e fará de tudo para consegui-lo.
— Sabe me dizer quem é essa pessoa?
— Não. Posso apenas sentir a sua aura, cheia de ódio. Você terá que fazer uma escolha que poderá custar a sua vida.
— Que escolha?
— Na hora certa, você saberá.
— O que são esses gritos?
— Sua escolha não será fácil, Kiara. Esses gritos são as consequências dela. Mas, se escolher corretamente, o príncipe Lien viverá.
— Já imagino o que seja — o desespero encheu o meu peito, e dúvidas rolavam na minha mente.
— Eu estarei aqui para te ajudar, Kiara. Não se preocupe — disse Asher, segurando os meus ombros. Lentamente, as chamas voltaram ao normal.
— Obrigada pela ajuda, mestre. Já tenho uma ideia do que fazer agora — levantei-me e o abracei.
— Eu lhe devo minha vida, Kiara, e farei o que puder para impedir que você perca a sua. Essa é uma promessa que faço a você.
Despedi-me e montei no meu cavalo. O meu coração estava angustiado, e as memórias do que vi na fogueira ainda me assombravam. As palavras do mestre ecoavam na minha mente. Encontrei os soldados angustiados, aguardando por mim. Imaginei que a minha demora os tivesse preocupado. Pedi desculpas e, cutucando o flanco de Relâmpago, parti em disparada rumo ao castelo.
A minha noite não foi das melhores. Tive pesadelos com a morte de Lien. Não sabia como poderia mudar o seu destino. Por que a vida precisava ser tão difícil? Desejava poder abrir uma porta e resolver magicamente todos os meus problemas. Quando me levantei, olheiras enormes marcavam o meu rosto. Além da sanidade, parecia que eu estava perdendo a beleza também.
— Levanta, Kiara! — Sofia entrou no quarto e começou a puxar as minhas cobertas. — Vamos, Kiara, sai dessa cama.
— Qual é, Sofia! — reclamei. — Minha noite não foi das melhores.
— Hoje é um novo dia. Você pode compensar mais tarde — disse ela, finalmente conseguindo arrancar as cobertas de mim.
— O que pode ser tão urgente para você fazer todo esse escândalo? — levantei-me e lavei o rosto numa bacia com água.
— Hoje haverá um torneio de tiro ao arco — a sua empolgação era admirável, mas eu não estava animada.
— Não vou. Peça ao Sol para ir com você — joguei-me na cama novamente, mas fui acertada por uma almofada. — Ei!
— Você não vai voltar a dormir.
— Com toda certeza não. Você tirou o meu sono.
— Por que está com essa cara de velório? — Não podia contar o motivo, mas também não consegui esconder o meu desânimo.
— Fui vê-lo ontem — ela parou imediatamente, deixando cair o vestido que havia pegado no meu armário. Os seus olhos me encararam com preocupação.
— Como? — gaguejou.
— Fui vê-lo ontem, e as notícias não são boas — fui até ela, peguei o vestido e comecei a me trocar.
— Por que você foi lá?
— Precisava de respostas, e aqui eu não conseguiria — fui até o armário, escolhi um par de botas e peguei o meu arco.
— O que ele disse? — o rosto dela mostrava desconforto com o assunto, e eu não poderia revelar muito.
— Nada que já não saibamos.
— Então foi uma perda de tempo.
— Não. Foi bom vê-lo de novo. Já estava com saudades — ela me olhou como se eu fosse louca.
— Você só pode ter perdido o juízo — Sofia nunca havia conhecido Asher, mas o simples fato de mencioná-lo a deixava desconfortável.
— Esquece isso — disse, indo até a porta. — Vamos antes que eu desista.
O seu rosto se iluminou, e ela correu na minha direção com um sorriso. Descemos e encontramos os meus pais na sala, preparando-se para sair.
— Bem na hora, querida.
— Vai competir hoje? — Não dava para saber se minha mãe estava feliz ou não com isso. Sabia que ela não gostava muito, mas era a única coisa que eu conseguia fazer com a sua permissão.
— Vou. Hoje vou deixar todos no chinelo — disse, piscando para meu pai.
— Isso mesmo, filha. Vamos mostrar que a nossa princesa não é apenas uma linda dama.
— Eu preferia que fosse — fui até a minha mãe e lhe dei um beijo na bochecha.
— As coisas nem sempre são como queremos.
— Você conseguiu, Elrick. Tem um filho de saias — rimos da fala dela. A minha mãe era incorrigível.
— E tenho muito orgulho disso.
Seguimos para o local do torneio, um grande campo gramado onde haveria demonstrações de outros esportes também. Fazia tempo que o meu pai não realizava um torneio. Quando chegamos, o campo estava cheio. Havia várias barracas de comida e bebida, e os competidores já se preparavam. Subimos até o palco reservado para o rei.
— Bem-vindos a mais um campeonato de tiro ao alvo! — disse o meu pai, enquanto aplausos irrompiam. — Desejo boa sorte a todos, e que os jogos comecem!
Um sorriso curvou os meus lábios. Desci do palco e caminhei até o meu lugar.