P. V. Príncipe Lien
Recebo olhares curiosos no corredor e, então, percebo que a minha camisa estava aberta. Bem, eu não poderia fazer nada a respeito.
— Alteza, o que houve? — pergunta Rolf, quando entro no meu quarto.
— Kiara foi o que houve.
— A princesa fez isso? — pergunta, chocado.
— Foi — digo, rindo.
— Como pode estar feliz com isso?
— Prefiro não responder à sua pergunta. — Vejo ele me olhar confuso, então a suas bochechas coram ao compreender.
— Desculpe a indelicadeza.
— Não se preocupe — digo, dando um tapa no seu ombro. — Vou me arrumar. Já desço.
— Certo. Vou esperar lá fora — diz, fazendo uma reverência e saindo.
Olho o arranhão que Kiara fez no meu peito, e um largo sorriso se espalha pelo meu rosto. Tiro as minhas roupas e vou tomar banho. Arrumo-me rapidamente e desço as escadas com Rolf.
— Achei que teríamos que ir buscá-lo lá em cima — diz o meu pai.
— Me desculpe pela demora.
— Imagina! Aqui você está em casa. Não precisa se preocupar com isso — diz o rei, sorrindo.
— Isso é culpa de Kiara — diz a rainha.
— Acho que Vossa Majestade entendeu errado — digo, vendo os outros me olharem.
— Não precisa se desculpar, Lien. Sabemos a filha que temos — diz o rei.
— Não é isso, Majestade — tento novamente.
— Desista — diz Kiara. — Ela não vai mudar de ideia.
— Mas do que estão falando? — pergunta o rei Damon.
— Segundo a minha mãe, eu estava tentando roubar a virtude do príncipe. — Todos ficam em silêncio até que uma risada chama a nossa atenção.
— Com certeza, ela faria isso — diz Solomon, sorrindo. — Qual o problema de esperar pelo casamento, Kiara? — Agora todos riam, e Solomon estava quase rolando no chão de tanto rir.
— Eu imagino a cena. Ela deve ter te ameaçado com uma faca. — Kiara me olha sem graça, e vejo a suas bochechas corarem. — Eu não acredito que estou certo! — diz Solomon, rindo ainda mais.
— Chega, vocês estão deixando a princesa constrangida — diz o rei Damon. — Isso é assunto particular deles.
— Me desculpe, Majestade, mas, como um bom amigo, eu não podia deixar essa história passar.
— Eu entendo, Solomon. Até porque ele não tem mais nenhuma virtude para ser roubada — diz o meu pai.
Olho, chocado, para meu pai. Todos irrompem novamente em risadas, e viramos a piada deles.
— Pai!
— Me desculpe, filho. Eu não resisti.
Quando todos se cansaram de nos importunar, fomos tomar o café da manhã. Foi tranquilo, e então seguimos para as despedidas.
— Façam uma boa viagem e avisem quando chegarem — diz o rei Elrick.
— Avisaremos, meu amigo, e obrigada pela hospitalidade — diz o meu pai, lhe dando um abraço.
— Se mudar alguma coisa da festa, mando mensagem, Esmeralda — diz a rainha Ismênia.
— Confio na sua escolha, Ismênia, e obrigada por me permitir ajudar.
— Imagina. Somos família agora — diz, lhe dando um abraço.
— Se cuida — diz Kiara, me abraçando.
— Você também — digo, lhe dando um beijo na testa. Entro na carruagem, e partimos.
O nosso caminho seria longo, mas eu estava com saudades de casa. Não havia nada melhor do que o nosso lar.
— Vamos passar pelo reino dos Mandrack — diz o meu pai, após um tempo em silêncio.
— Por quê?
— Para agradecer pela ajuda da última vez. Estamos em dívida com eles.
— Verdade, filho. No seu noivado não pudemos discutir isso, mas agora seria sensato demonstrar a nossa gratidão.
— Não me importo. Eles são boas pessoas. Seria benéfico termos um bom relacionamento.
— Sim, também percebi que o príncipe Dylan é amigo da princesa Kiara.
— Eles são bem próximos. Ele a trata como uma irmã mais nova — digo, lembrando-me das brincadeiras deles.
— Isso é bom. No futuro, vocês terão boas cooperações — diz a minha mãe, sorrindo.
O dia passou lentamente. Parecia que a noite nunca iria chegar. Acampamos em um lugar seguro. Além da nossa escolta, o rei Elrick foi generoso o suficiente para nos ceder mais alguns soldados. Aproveito esse momento para falar com Rolf.
— Parece estar tudo tranquilo — digo, sentando-me ao seu lado, próximo à fogueira.
— Sim. Já verificamos e deixamos alguns soldados de vigia na floresta. Ninguém nos pegará de surpresa.
— Isso é bom. Mas queria ver outra coisa com você.
— Se eu puder ajudar...
— Conseguiu deixar alguém de espião para investigar aquele assunto?
— Sim. Você o conhece. Está tudo certo. Assim que ele tiver notícias, nos mandará uma mensagem.
— Não vejo a hora de resolver isso. Não tenho uma sensação boa a esse respeito.
— Vamos ficar de olho. Mudando de assunto, você já pensou no que dar de presente para a princesa?
— Presente?
— Sim, de casamento. É normal você dar algo de muito valor a ela no casamento.
— Não tinha pensado nisso ainda.
— Peça ajuda ao rei. Aposto que ele deve saber de algo.
— Obrigado por me avisar. Não tinha pensado nisso.
Conversamos mais um pouco, e entro na minha barraca para descansar. A minha noite não foi das melhores. Tive alguns pesadelos que me tiraram o sono até amanhecer. Não gostava nem de lembrar.
Depois de mais um dia longo de viagem, finalmente chegamos ao reino do rei Alexandre Mandrack. Fomos recebidos no caminho por alguns dos seus soldados, que nos escoltaram até o castelo. Era uma sensação de déjà-vu estar ali. As lembranças da última viagem ainda estavam frescas na minha memória.
— Bem-vindos — diz o príncipe Dylan. — Meu pai os aguarda.
Somos guiados até uma sala grande, com uma linda decoração em dourado. Em uma das paredes havia um estandarte de um dragão, o brasão dos Mandrack. O rei, vendo a nossa chegada, se levanta e vem na nossa direção.
— Rei Damon, é um prazer recebê-lo no meu humilde castelo — diz, apertando a mão dele.
— Eu que agradeço por nos receber assim, de repente.
— Imagina. Nós quase não recebemos visitas. É bom tê-lo aqui para conversarmos um pouco.
— Fique à vontade, rainha Esmeralda. Como sabe, sou viúvo, então ficarei devendo uma companhia para você.
— Não se preocupe. Estou bem.
— Vou chamar Luna para lhe fazer companhia — diz Dylan, sorrindo.
— Verdade. Tinha me esquecido da minha adorável nora.
— Vou chamá-la. Venha comigo, Lien. Precisa ver o novo cavalo que ganhei. — Fazendo uma reverência, saio da sala acompanhando Dylan.