Capítulo II

1495 Words
O pequeno vilarejo onde Stefan nasceu e cresceu se encontrava em um lugar muito afastado dos outros reinos e povos. Mais especificamente situado no litoral, escondidos pelas montanhas e florestas, próximo a uma pequena ilha bastante farta em natureza e beleza, envolta pelo imenso mar. Por mais que distantes do restante do mundo, eram bastante conhecidos pela pesca e caça, também sendo bastante procurados para serviços especiais ou troca de mercadorias e obra-primas das artesãs do lugar. Todos os preparativos para a grande noite estavam sendo finalizados, as mulheres de todo o vilarejo enfeitavam com flores e tranças de cipó a passagem de bambu em forma de arco que ligava-os a imensa ilha, onde acreditavam abrir passagem para os bons espíritos que traziam prosperidade ao povo naquele novo ciclo. Era uma celebração que costumavam fazer no solstício de verão, o que para eles, era somente a partir disso que o ano finalmente se iniciava e anunciava as boas novas para todos ali. Pois era no verão que o calor agitava os peixes e havia mais águas nos rios e mar fazendo assim a melhor época para se pescar e consequentemente sendo a época mais farta para todos. ── O que tanto olha perdido pro horizonte, meu filho? ── Questionou sua mãe, uma mulher de estatura baixa já no auge dos seus quarenta e cinco anos, olhos esverdeados e claramente desgastados pela idade e o clima tropical da região, longos e encaracolados fios loiros presos a um coque desajeitado no topo da cabeça, que agora se achegava junto do filho caçula. Stefan nada disse por um momento, apenas deixando com que a brisa fresca lhe atingisse a face enquanto que seus olhos ainda permaneciam fixos para o "nada". ── Não sente algo estranho? Este ano me parece bem diferente dos demais. Estou com... um pressentimento r**m, talvez? ── Tão logo o jovem rapaz sentiu-se envolto pelo abraço gentil e caloroso de sua mãe, que também lhe beijava o topo da cabeça. Não era a primeira vez que via seu filho com com esses pensamentos, Stefan sempre foi diferente dos demais meninos da região, sempre tão dócil, gentil e sensível a tudo que ocorria em sua volta. A mulher sorriu por um curto momento ao se lembrar da primeira vez em que ele havia saído com o pai para caçar coelhos pra' um guisado. Seria o jantar na véspera de aniversário do garoto onde completaria seus doze anos, um desastre total quando ele finalmente compreendeu que os pobres coelhos seriam mortos de forma tão c***l, e nada nem ninguém conseguia lhe por na cabeça que era apenas o necessário para se alimentarem e algo especial para aquela noite. No final, acabaram por comer sopa de repolho com algumas outras ervas e legumes, apenas. ── Não pense assim, querido. Talvez seja seu corpo reagindo ao tempo que passou fora. ── a mulher deu uma sútil risada afagando os cabelos cor de cobre ao que segurava o filho pelas laterais da face o fazendo a olhar nos olhos ── Até eu comecei a pensar que não mais voltaria pra sua família. O rapaz gentilmente enlargueceu o sorriso nos lábios retribuindo a doce risada contagiante de sua mãe com a própria. ── Jamais! Não importa quanto tempo eu fique fora, sempre voltarei pra cá. São meu porto seguro, minha rocha firme... não me atrevo a não voltar. ── Venha! Vamos ajudar... ── ela disse com o sorriso radiante e então o segurou pela mão o puxando de volta para os preparativos, ele sem questionar ou se opor, a seguiu. [•••] Já era noite, o vilarejo estava decorado com flores coloridas, bandeiras e lanternas, criando um ambiente festivo, alegre e... único. O ar estava repleto do cheiro de comida típica, como peixe grelhado e frutas frescas. As pessoas dançavam ao som de música folclórica, tocadas por instrumentos tradicionais. As crianças corriam pelo vilarejo, rindo e brincando com lanternas luminosas. No centro, uma grande fogueira ardia, simbolizando a renovação e o início do novo ano. O povo reunido ao redor da fogueira cantava e dançava, agradecendo aos deuses pelo retorno do verão. Stefan estava no meio da multidão, sorrindo e dançando com os amigos. Ele havia passado o dia ajudando a preparar o festival e agora estava desfrutando da celebração como todos a sua volta. De repente, ele ouviu um chamado vindo da beira do vilarejo. Era uma voz baixa e misteriosa, que parecia vir de lugar algum. "Stefan... Stefan..." Ele se virou, procurando quem estava chamando, mas não viu ninguém. A voz parecia vir de longe, mas era clara e distinta. O ruivo se levantou e quando deu por si já estava se afastando do meio do povo. "Quem é?" perguntou Stefan, aproximando-se da beira do vilarejo. A voz não respondeu, mas pareceu se aproximar. Stefan sentiu um arrepio na espinha e seu coração começou a bater mais rápido. Alguns passos à frente e então... parou. Stefan sacudiu a cabeça, pensando que era apenas sua imaginação. Então decidiu voltar para a festa, achando melhor ignorar o chamado misterioso. A música e as risadas dos amigos logo o envolveram novamente e ele se juntou ao grupo de dançarinos, esquecendo o chamado estranho. A noite estava quente e alegre, e Stefan não queria deixar que nada estragasse a celebração. No entanto, enquanto dançava, ele não conseguia sacudir a sensação de que algo estava observando-o. Ele olhou ao redor, mas não viu nada fora do comum. De repente, uma das mulheres mais idosas do vilarejo, uma anciã, conhecida por sua sabedoria e intuição, aproximou-se dele. ── Stefan, meu querido, você está bem? ── perguntou ela, olhando-o com preocupação. ── Sim, estou bem ── respondeu Stefan. ── Por que pergunta? ── A noite está cheia de energias estranhas, ── disse ela. ── Eu sinto que algo está vindo. Algo que pode mudar tudo. Stefan sentiu aquele arrepio novamente lhe subir pela espinha, e então engoliu em seco. Mas seus olhos a olhavam com mais curiosidade, então se achegou mais perto dela. ── O que você quer dizer com "energias estranhas"? ── perguntou ele. A anciã olhou ao redor, como se verificando se alguém estava ouvindo. ── Eu sinto que há uma presença aqui, ── disse ela baixinho. ── Uma presença que não é do nosso mundo. Ela está observando, esperando. Stefan endireitou a postura, inconscientemente acabou por olhar a sua volta também, como se estivesse procurando pelo que quer que fosse essa presença, mas nada além de um arrepio novamente. ── O que ela quer? ── perguntou ele. A mulher sacudiu a cabeça. ── Não sei, ── respondeu ela. ── Mas eu acho que está relacionado ao chamado que você ouviu. Stefan a olhou com incredulidade, os olhos levemente arregalados ao se lembrar do chamado misterioso de agora a pouco. ── O que eu devo fazer? ── perguntou ele. A mulher olhou para ele sério. ── Você precisa estar preparado ── disse ela. ── Para o que vier. E precisa estar atento às suas próprias sombras. Stefan olhou para a anciã, ainda mais confuso e intrigado. Não entendia o que ela queria dizer com tudo aquilo. ── Minhas sombras? ── repetiu ele. ── O que você quer dizer? A anciã olhou ao redor novamente, e então sua voz pareceu mais baixa aos seus ouvidos: ── Seu coração, Stefan ── sussurrou ela baixinho. ── Seu coração é uma porta para o desconhecido. E você precisa aprender a controlá-lo. Stefan sacudiu a cabeça. ── Não entendi ── disse ele. A anciã sorriu. ── Você entenderá. Quando chegar a hora. ── E com isso, ela se virou e desapareceu na multidão. Stefan se levantou mas hesitou em segui-la e questionar mais sobre tudo aquilo. Então ficou ali, parado e confuso, sem saber o que fazer. O festival continuou, mas ele não conseguiu mais se divertir. Estava distraído, pensando nas palavras da anciã. Horas se passaram e o festival finalmente havia acabado. Stefan voltou para casa, cansado e confuso. Ele se deitou em sua cama, olhando para o teto. "O que ela queria dizer?" pensou ele. "Minhas sombras? Ouvir meu coração?" Ele não conseguia dormir, pensando nas palavras da anciã. De repente, um barulho vindo da janela o fez sentar num sobressalto. Ele olhou para a janela e viu uma figura sombria parada lá fora. Stefan sentiu um arrepio e o coração lhe querer saltar pela boca. ── Quem é? ── perguntou ele. A figura não respondeu. Stefan se levantou da cama e se aproximou da janela para olhar para fora e viu uma figura alada, com olhos vermelhos. Stefan sentiu um choque e se afastou alguns passos, o fôlego preso em sua garganta. "O que é isso?", pensou ele. Engolindo em seco ele se aproximou novamente da janela. A figura alada olhou para ele e Stefan sentiu uma conexão estranha. ── Quem é você? ── perguntou ele novamente. A figura não respondeu, mas Stefan sentiu que ela estava chamando-o. [•••]

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