• 4 • A travessia

1231 Words
O som suave da chuva batendo nas janelas do apartamento de Axel parecia coincidir com a inquietação que tomava conta de seu peito. Depois do encontro no bistrô, ele havia tentado se distrair com a rotina. Mas, de alguma forma, aquele momento com Vincent continuava martelando em sua mente. Cada palavra dita, cada olhar trocado, fazia com que o desejo se confundisse com o medo, a insegurança. E isso o fez "sumir", já não mais estava indo as apresentações e sempre rejeitava os convites do belo homem de negócios. Ele não sabia mais se estava pronto para aquilo, mas também não conseguia afastar a ideia de que talvez fosse a única chance de se entender, de se libertar das próprias amarras. Às 10 da manhã, o celular de Axel vibrou na mesa. Ele hesitou antes de olhar. O número desconhecido fez seu coração acelerar de forma inexplicável. Com um movimento rápido, ele desbloqueou a tela e leu a mensagem. "Axel... Você está em casa?" Vincent, só podiam ser dele. A mensagem simples, sem grandes explicações, mesmo depois de tantos outros números bloqueados ele ainda insistia. Axel sentiu um frio na barriga, uma mistura de excitação e ansiedade. Estaria ele realmente pronto para aquilo? Para seguir em frente, para dar o próximo passo? Ou estaria se entregando a algo que não podia controlar? Ele não respondeu imediatamente, mas ao olhar pela janela e ver as gotas de chuva caindo, algo dentro dele se acendeu. A chuva, o ambiente silencioso e íntimo... Talvez fosse a hora. Axel mesmo confuso, mesmo dividido entre o querer e "não poder" não queria mais se esconder. Não queria mais ter medo do que era, do que poderia ser, do que desejava. "Sim, estou. Por que?" Axel finalmente digitou, sentindo o peso das palavras. Em menos de um minuto, a resposta de Vincent apareceu na tela. "Eu quero te ver. Estou preocupado. Precisamos conversar. Podemos?" O simples fato de saber que Vincent queria encontrá-lo fez com que a ansiedade aumentasse. Axel estava imerso em uma tempestade interna, como se as nuvens dentro de sua mente estivessem mais densas do que a chuva do lado de fora. O que Vincent queria? Uma conversa, ele sabia. Mas ele também já sabia que conversas com Vincent nunca eram simples. Eles estavam sempre atravessando linhas, rompendo limites. Sem mais demora, Axel o respondeu passando o endereço e assim seguiu para o quarto onde vestiu uma camiseta preta e calças escuras, optando por algo simples, como se tentasse se esconder por trás da normalidade. Quando o interfone tocou, seu coração quase parou. ── Sim? ── Ele atendeu, tentando controlar a respiração. ── Axel... ── a voz de Vincent soou no outro lado da linha, suave, mas carregada de uma certeza que fez o estômago de Alexandre revirar. ── Posso subir? ── o bailarino hesitou por um segundo, mas não teve coragem de recusar. ── Claro... Te espero. A porta do apartamento se abriu alguns minutos depois, e o cheiro da chuva ainda estava no ar, misturado ao perfume inconfundível de Vincent. Axel se virou quando ouviu o som dos passos firmes do homem entrando na sala. O CEO estava usando uma jaqueta de couro escura, o cabelo um pouco mais bagunçado do que o normal, como se tivesse passado a mão por ele repetidas vezes, tentando se acalmar. Mas seus olhos... seus olhos estavam mais intensos do que nunca. ── Você não precisa pedir desculpas... Vincent começou, sua voz tranquila. Ele se aproximou devagar, observando Axel, como se estivesse aguardando uma reação. ── Pedir desculpas? ── Axel perguntou, confuso. Ele ainda não entendia exatamente o que Vincent estava fazendo ali, embora, no fundo compreendesse o que de fato ele estava comentando. ── O que você quer de mim, Vincent? ── Não, realmente não há o porquê de desculpas... mas... você sumiu! você não apareceu, de novo... e de novo... está tudo bem? Não... não é isso... está me evitando, Axel, e porquê? Você sabe muito bem o que eu quero. Eu quero você. ── A resposta veio direta, sem rodeios. ── Quero entender quem você é. Sem máscaras. Sem fugas. Quero que pare de me expulsar como se eu fosse um monstro. Axel não conseguiu evitar o choque que tomou conta de seu corpo. Ele queria entender... quem ele era? Essa era uma pergunta que ele ainda não tinha resposta. ── Não é tão simples assim... ── Axel disse, a voz mais fraca do que ele gostaria. Ele deu um passo para trás, sentindo o frio do ambiente se misturar com o calor crescente entre eles. ── Eu não sei quem eu sou. Eu sou só um bailarino. Não sou... eu não sou como você, eu já disse. Eu não tenho o seu mundo, a sua vida, o seu poder. Vincent se aproximou, um movimento preciso e controlado, e parou a apenas um passo do bailarino. Ele olhou para ele com uma intensidade que fez o corpo de Axel tremer, mas, ao mesmo tempo, o atraía. ── Você não é como eu, e isso é exatamente o que me interessa. Eu não quero que você seja como eu, Axel. Eu quero que você seja quem você realmente é. Axel fechou os olhos por um momento, tentando controlar a sensação que estava crescendo dentro dele. Era uma mistura de medo e desejo, perto de Vincent sempre era. Ele não sabia se estava pronto para se entregar a isso, mas também não conseguia resistir ao que Vincent oferecia. A promessa de liberdade, de algo além da sua própria solidão. ── E se eu me perder? ── o bailarino sussurrou, as palavras saindo sem querer. Ele olhou para Vincent com uma vulnerabilidade que raramente mostrava. ── E se me perder nesse desejo, nessa... atração por você? Vincent sorriu suavemente e, com um movimento delicado, tocou a mão de Axel. ── Então se deixe perder. Se permita isso. Às vezes, se perder é a única maneira de encontrar o que realmente importa. Você tem medo de se perder, mas, ao meu ver é o medo que está te segurando. Eu posso ser a sua segurança, Axel. Eu quero ser. Aquelas palavras ficaram pairando no ar como uma promessa, uma promessa que parecia tanto atraente quanto aterradora. Axel olhou nos olhos de Vincent e, por um breve instante, tudo o que ele sentia desapareceu. Ele não tinha mais dúvidas. Ele sabia que estava em um caminho sem volta. Mas queria isso. ── Eu não sei o que vai acontecer... ── Axel disse, sua voz quase inaudível, mas cheia de uma decisão que ele não sabia de onde vinha. ── Mas quero tentar. Mesmo com medo... Quero... tentar entender o que é isso. Mesmo que seja difícil pra mim… no fundo eu realmente quero. Vincent não respondeu imediatamente. Ele apenas se inclinou e, com um movimento suave, tocou os lábios de Axel com os seus. O beijo não foi apressado, mas sim algo profundo, como se ambos estivessem descobrindo algo novo, algo verdadeiro. Quando se separaram, o bailarino sentiu que algo havia mudado dentro dele. O medo ainda estava ali, mas não dominava mais. Ele havia dado o primeiro passo para fora de sua zona de conforto, e, por mais aterrador que fosse, também era libertador. ── Agora, você está pronto. ── Vincent sussurrou contra os lábios de Axel. E, pela primeira vez, o bailarino acreditou que talvez estivesse.

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