Helena narrando
Cheguei em casa depois de um dia tumultuado com as minhas amigas em um clube, eu amava ir naquele clube, pouquíssimas pessoas tinham acesso, então era seguro contra qualquer doença, fora que o atendimento era impecável lá, os meninos tratavam a gente super bem, eu passei o dia lá com direito à spa, piscina, drinks, camarão e tudo que eu mereço... Assim que adentrei a entrada, Zoo, a governanta que me viu crescer já veio ao meu encontro pegando minha bolsa.
- Sua doidinha, com o cabelo todo molhado...-Eu ri...
- Oiii Zoo, não deu tempo de passar no chuveiro, fora que prefiro mil vezes o meu banheiro, você sabe...- Eu disse subindo as escadas, ela riu.
- Sei sim... Querida, eu preciso conversar com você...
- Agora? Eu estou tão cansada Zoo, não pode ser mais tarde?
- Infelizmente não Helena...- Ela disse vindo atrás de mim, parei em frente a porta do meu quarto...
- Então diga...- Entramos no meu quarto.
- O seu avô não anda muito bem, ele vem adoentado por uns dias.
- Doente? Por que ele não me disse?
- Ele não quer te preocupar, mas eu acho que você tem o direito de saber que seu avô não está nada bem...
- E os médicos? Por que não vieram ainda?
- Já vieram... A princípio ele está infartado já e n**a qualquer tratamento...
- O que? Eu quero falar com ele...
- Tome um banho antes...
- Eu disse que quero falar com ele Zoo, agora...- Eu exigi, ela suspirou.
- Ok, vamos...- Fomos até o quarto do meu avô, Zoo acendeu as luzes e meu avô me olhou e sorriu.
- Querida Helena...- Ele disse baixo, bem baixo, que só quem estava muito perto poderia ouvir... Eu sorri de lado sentando na cama...
- Vovô... Como o senhor se sente?
- Na medida do possível minha querida... Se divertiu?
- Sim... Vovô, o senhor precisa ir para um hospital, se cuidar e voltar forte para mim...
- Não Helena, eu estou com noventa anos filha... Eu já vivi tudo o que eu tinha para viver na minha vida, e posso dizer que tive a melhor vida do mundo... Eu quero descansar...- Há essa altura do campeonato eu já chorava...
- Vovô, o que será de mim sem o senhor? Eu não posso ficar sozinha nesse mundo, o senhor é a minha única família...- Ele deu uma risada rouca, com dificuldade segurou a minha mão...
- Helena... Você tem idade suficiente para se cuidar. Lembre-se, construa valores, os mesmos que tentei lhe ensinar... Nunca acreditei que fui bom o suficiente para te criar filha, mas acredito que uma coisa boa eu deva ter feito. A vida não para Helena... Está na hora de amadurecer e caminhar sozinha...
- Caminhar sozinha? Eu não consigo sozinha vovô...
- Consegue querida... Consegue sim... Onde eu estiver, estarei cuidando de você... Lembre-se, não somos o que temos, somos o bem que colocamos no mundo... - Ele disse e senti sua mão soltar a minha...
- Vovô?- O chamei, mas ele fechou os olhos vagarosamente para não abrir nunca mais...
Eu me debrucei sobre ele chorando desesperadamente, eu havia acabado de perder a minha família, a única pessoa no mundo que me amava assim como perdi meus pais... O que será de mim? Zoo tentou me puxar, mas me larguei dela.
- Me deixe Zoo... Me deixe com meu avô...-Eu disse acariciando o rosto dele...
- Por que vô? Por que o senhor? Por que comigo? - Eu fazia várias perguntas, mas nenhuma delas tinha resposta, eu queria meu avô de volta, eu queria minha vida de volta, como vou viver sozinha? Sem ninguém para me amparar? Para me mostrar o caminho que devo seguir?
- O que será de mim Zoo? - Perguntei soluçando...
- Helena, você tem a mim... Eu ainda estarei aqui...
- Meu vôzinho Zoo... Isso não é justo, dizem tanto que Deus é justo e tirou minha única família de mim Zoo...
- Querida, Deus é justo... Seu avô precisava descansar, Deus diz "Vinde a mim, os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei". A lei de Deus é clara...
- Como vou viver? Que caminhos vou seguir?
- Você vai encontrar o seu caminho... Eu sinto muito querida...- Ela disse me abraçando, eu voltei a chorar nos seus braços...
(...)
Lá estava eu, em frente ao caixão do meu avô, vestida inteiramente de preto, embora meu vestido esteja lindo e combinando muito bem com a meia calça e a botinha, eu estava destruída por dentro. Eu tinha a minha mão pousada sobre a mão do meu avô, seu velório estava cheio, muito cheio mesmo, e eu estava de óculos de sol a dim de disfarçar meu olhar inchado e caído... Zoo se aproximou de mim.
- Helena, está na hora de levarem o caixão ao cemitério... Vamos? - Ela disse estendendo a mão para mim com um sorriso acolhedor... Olhei pela última vez para o meu avô, acariciei seu rosto.
- Eu amo você vovô... Meu Eterno Rodolfo...- Eu disse baixo, em meio aos soluços, às lágrimas e a dor incansável no coração...
Quando chegamos em cemitério, eu via seu caixão descendo para debaixo da terra, meu coração parecia querer sair de dentro de mim e ir junto, quando o caixão alcançou o chão eu joguei sobre ele um último botão de rosa branca, assim me despedindo finalmente do meu avô, lhe desejando paz para onde ele tenha ido. Ele sempre me dizia que a vida continuava, eu brincava com ele e dizia não acreditar, então ele disse que ele só teria certeza que a vida tinha continuação para ele passasse para o outro lado...
Eu espero mesmo que ela tenha continuação e que meu avô possa continuar espalhando a sua bondade do outro lado da vida, e cuidando de mim, me protegendo, trilhando o meu caminho, como ele sempre fez em vida...
Ver a terra caindo sobre o seu caixão me fazia criar vários questionamentos dentro da minha cabeça, será que eu vou conseguir seguir daqui para frente sozinha? Como vou voltar para aquela casa? Onde nós fomos felizes por tantos anos e agora, tudo virou pó...
Eu espero conseguir ir atrás da minha felicidade, mas nada e nem ninguém vai curar o vazio que ficou dentro do meu coração, ou será que o universo será capaz de me enviar alguém que despertará a felicidade novamente dentro de mim?