A guerra dos s.exos
Quando as portas do elevador se fecharam, Ellie teve a certeza absoluta de que os seus pulmões haviam perdido a capacidade de captar oxigênio. Ao lado dela estava ele, Peter Fernsby, o homem que a odiava desde que ela se entendia por gente. Peter sequer a deu um bom dia, permaneceu estático e sério, sempre ficava assim quando Ellie estava por perto.
A garota contou em seu relógio de pulso os exatos três minutos mais demorados de sua vida até o elevador abrir no quinto andar, onde estava situado o jurídico da fábrica em que ela havia acabado de herdar.
Os dois se sentaram lado a lado, de frente para Thomas MacGyver, o jovem advogado que tomava a frente dos assuntos jurídicos da fábrica. Ao lado dele estava Daisy Bridgestone, chefe do departamento pessoal e braço direito de Antony, pai de Ellie.
— Reforçando que ambos são sócios majoritários da empresa, a partir de hoje trabalharão ocupando o mesmo cargo provisoriamente. — Informou Daisy.
— Provisoriamente? — Peter ergueu uma de suas sobrancelhas loiras.
— Com o falecimento dos antigos presidentes, toda a corporativa de investidores, assim como os outros sócios minoritários, exigem uma eleição para a existência de um único CEO.
— Isso significa que um de nós terá um poder de decisão maior, mas quanto o outro? — Perguntou Ellie.
— O outro ocupará o segundo lugar. Ainda terá mais voz ativa do que os sócios minoritários, mas será subalterno ao que vencer o cargo. — Explicou Daisy.
— E qual o critério para haver um vencedor? — Perguntou Ellie, interessada.
O entusiasmo da moça deixava o Peter ainda mais irritado.
— Vocês precisarão montar equipes de produção e venda. O grupo de quem houver uma maior pontuação ganhará o cargo no final do ano. Boa sorte, concorrentes. Que comecem os jogos.
Peter apenas reagiu com um sorrisinho presunçoso. Para ele, a sua vitória era muito óbvia. Ellie era só uma garota tonta do interior que não tinha experiência com uma fábrica do porte da Dynasty golden thread, não tinha como competir com ele.
Minutos depois, quando ficou a sós com Thomás, Peter finalmente pôde cuspir as cobras e lagartos que tanto queria.
— O Anthony poderia muito bem ter determinado outra pessoa para representá-lo na empresa. Está muito claro que essa garota não tem a menor experiência para dividir comigo a liderança da Dinasty.
— O Anthony sempre garantiu para todo mundo que preparou a filha para assumir o lugar dele algum dia.
— Eu conheço a Eleanor desde que nasceu. Ela é só uma patricinha que quer brincar de executiva. Vai acabar afundando a fábrica se confiarmos trabalhos complexos nas mãos dela. Estou falando, Thomas. Essa garota não tem condições de assumir a liderança de uma equipe. Eu tenho certeza que vai atrasar a produção e cair muito as vendas, já consigo sentir o cheiro do prejuízo.
— Não seja tão pessimista, Peter, eu olhei o currículo dela. A garota estudou administração em Londres, tem especialização em gerenciamento e consultoria. Vamos dá um voto de confiança para ela.
— O que adianta ter estudos e não ter experiência? Eleanor passou a maior parte da vida dela no interior.
— Ninguém nasce com experiência, Peter. Se o Anthony confiou na filha para ocupar o cargo que era dele, deveria ter os seus motivos.
— Você está defendendo a Eleanor porque era puxa-saco do Anthony.
— Ou talvez seja você que tem uma implicância exagerada com a garota. Por que não gosta dela, afinal? Vocês têm dez anos de diferença, não é como se fosse traumatizado por ter sido criado junto com ela.
Peter não soube responder o porquê não gostava de Eleanor, o fato é que nunca gostou dela.
Não é algo unilateral, os sentimentos são totalmente recíprocos. Eleanor sempre fez questão de ser tão desagradável quanto.
— Não vou perder o meu tempo falando da Eleanor. Eu vou montar o meu time e trabalhar no resultado que eu já espero. No final do ano irei assumir o cargo de liderança máxima.
— Eu acho que você está subestimando a moça e que pode se surpreender.
— Eu tenho experiência em vendas e produção desde que me entendo por gente. Também sou administrador e ainda sou economista. Eu duvido muito que a Eleanor entenda mais de números e gerenciamento do que eu.
— Eu acho que você está levando essa competição um pouco a sério demais.— Thomás fez uma careta.
— E não é para levar? Eu me sinto no mínimo insultado por ter que concorrer com uma garota crua como a Eleanor.
— Não vou mais debater com você a respeito disso. Apenas quero dar uma sugestão na hora de montarem as equipes.
— Qual sugestão?— Perguntou Peter, curioso.
— Um time composto apenas por homens, outro, por mulheres.
— Ah, claro, uma guerra dos s.exos. Não acha que isso já está um tanto fora de moda?— Perguntou Peter, com ironia, embora não achasse a ideia de todo m.al.
— Eu acho que pode funcionar.
— Bom... O que realmente me importa é provar para a Eleanor que ela está no lugar errado e mandá-la para bem longe. Com essa intrometida fora da fábrica terei a autonomia que preciso para transformar a Dinasty no que sempre quis.
…
Desde muito pequena Ellie acompanhava o pai nos negócios dele e sempre ficou muito encantada com a forma que ele conduzia as coisas. Ela sabia que um dia precisaria sentar naquela grande poltrona p.reta e assumir a liderança de uma fábrica, por isso, sempre aproveitou ao máximo os ensinamentos de seu pai.
A parte r**m de tudo aquilo é que precisaria dividir a liderança com Peter Fernsby até o final do ano.
P.ior ainda seria se ele ganhasse o cargo no qual os dois estavam disputando.
— Eu sei que o Peter não aceita a minha presença aqui. Ele acha que eu sou apenas uma filhinha de papai brincando de executiva.— Confessou Ellie para Daisy, enquanto as duas caminhavam pelo extenso corredor do andar de produção da fábrica.
— Então mostre para que veio. Monte suas estratégias e sua equipe, cale a boca do arrogante do Fernsby.
Ellie arqueou uma das sobrancelhas com o comentário da mulher.
Daisy deu um sorrisinho sem graça ao enfiar a mão em seus cabelos crespos para coçar a cabeça.
— Eu deveria ser imparcial, mas estou torcendo por você. Essa fábrica nunca teve uma representação feminina na liderança.— Confessou Daisy.
— Eu vou me esforçar ao máximo para ganhar, pode ter certeza. Eu até já sei as estratégias de vendas que podem funcionar para aumentar o nosso lucro.
— E o que você sugere?
— A Dinasty sempre atendeu um público de alto padrão, mas já parou para pensar que os tempos mudaram? A classe B e C, que são maioria, tem um alto poder de compra. Podemos investir em tecidos mais baratos, mas de boa de qualidade, assim atrairemos um novo público e aumentaremos as nossas vendas.
— Eu gostei da ideia e achei ousada, mas temos que pensar de um outro ângulo. E se a ideia não funcionar?
— Vamos apostar no marketing e na divulgação da mídia social. Eu tenho certeza que muita gente já sonhou em ter alguma roupa da Dinasty, o problema é que não cabia no orçamento.
— Então essa vai ser a sua proposta?
— Essa vai ser a minha proposta.— disse Ellie, com segurança.
— Então pode se preparar para enfrentar a terceira guerra mundial, porque o Peter não vai gostar nada disso.
Ellie mordeu os lábios, tensa.
De uma coisa tinha total certeza: Peter não tornaria a sua vida nada fácil.