Camila Narrando.
Eu poderia começar falando sobre os meus sonhos, a minha vida perfeita, os meus dias como uma estudante e dedicada, mas tudo isso foi tirado de mim num piscar de olhos, bastou eu dar uma volta com uma amiga pelas ruas da Cidade do México que tudo começou, ou melhor, que tudo terminou.
— Eu não quero ir com esses homens, papai... — Eu choramingava enquanto as minhas coisas eram trazidas dentro de uma mala velha.
— Não é uma opção. — Ele falou firme, não parecia estar nem um pouco triste com o que estava acontecendo. — Ou você vai, ou morremos...
— Eu não sou uma mercadoria. — Eu olhei nos seus olhos incrédula com o que ele estava fazendo. — Eu não vou com esses nojentos.
— Faça o que o papai está falando, querida! — Um dos homens falou. — Estará muito melhor... — Ele alisou o meu rosto enquanto eu apertava os meus olhos de tanta raiva. — Se ele está te dando em troca de uma dívida milionária, imagina o que mais ele seria capaz.
— Vai logo... — Ele falou com a voz trêmula. — Não olhe para trás.
Eu abaixei a minha cabeça e senti as lágrimas escorrer, eu não podia acreditar que isso realmente estava acontecendo, eu imaginava qualquer coisa, menos que ele seria capaz de me abandonar dessa forma.
Eu fui seguindo os homens, ao entrar no carro, eu ouvi gritos desesperados do meu pai e em seguida um silêncio desesperador. Eu olhei pela janela do carro e vi um dos homens limpar a lâmina da faca na sua roupa e em seguida entrar no carro atrás do que eu estava.
Um nó se formou na minha garganta, o choro que antes era silencioso se tornou um grito desesperado e cheio de dor.
— PAPAI... NÃOOOO! — Eu chorava feito criança.
Antes que eu pudesse fazer mais escândalo ou tentar sair do carro, eles deram partida, acelerando o máximo que conseguiam, já que as ruas estavam vazias por ser feriado.
— Para de chorar. — O homem que estava no banco do passageiro falou. — Se não engolir esse choro, será obrigada a conviver sem a língua, o que acha?
— Eu prefiro morrer! — Eu respondi entre dentes.
— Cuidado, eu posso realizar os seus desejos. — Ele piscou e começaram a rir.
Eu tentei ignorar ao máximo tudo o que eles falavam, todas as brincadeiras maldosas que faziam sobre a morte do meu pai e sobre mim... Tudo o que eu queria era me livrar disso tudo e sofrer o meu luto em paz.
Entre um soluço e outro eu acabei dormindo e só acordei quando ouvi portas batendo, até a minha ser aberta e um dos homens me puxar do carro com força e me levando para uma espécie de galpão abandonado, pelo menos era o que parecia, mas conforme fomos entrando, percebi que era um alojamento de péssima qualidade e eu não era a única dali.
— Pronto gostosinha, esse é o seu novo lar. — Um dos homens falou me jogando entre os colchões e em seguida ele saiu, nos trancando naquele lugar.
Aquilo parecia um pesadelo, eu olhava para todas aquelas meninas e sentia o medo delas no olhar, talvez elas estavam aqui pelo mesmo motivo que eu ou por não terem tido sorte na vida, mas eu precisava saber se tinha alguma forma de escapar dali, ir embora daquele lugar nojento e cheio de más intenções.
Eu me encolhi num canto, abracei os meus joelhos e comecei a chorar, eu estava desesperada e sozinha no mundo, a minha mãe tinha ido embora há anos e agora o meu pai simplesmente me trocou por uma dívida que eu nem sequer tinha conhecimento. Pelo que eu ouvi, ele acabou se envolvendo em algum rolo de tráfico e não entregou a mercadoria, com isso ele tinha que quitar o que sumiu e a forma que ele achou foi me vendendo, uma garota nova, cheia de vida, virgem e bonita.
— Quem é você? — Uma voz doce ecoou ao meu lado.
— Ora, Guadalupe... — Uma pausa. — A garota está m*l, não para de chorar...
— Eu quero ajudar... — A tal Guadalupe falou.
— Eu... Eu... — Eu me ajeitei e limpei o meu rosto. — Eu sou Camila...
— Eu sinto muito, Camila... — A outra garota falou. — Eu sou a Dulce e essa é a Guadalupe, mas eu a chamo de Lupi.
Eu sorri fraco e desviei o olhar, não sabia o que dizer, não tinha ideia se sentia muito por essa situação toda ou se eu ficava feliz por estar conhecendo alguém.
— Os Occhioa te machucaram? — A Lupi perguntou.
— Não... — Eu neguei. — Não a mim, mas eles mataram o meu pai...
— Já era de se esperar, eles não prestam... fazem coisas horríveis com nós... — Dulce falou. — Algumas de nós saímos e nunca mais voltamos.
— O que é aqui? — Eu perguntei agora mais calma.
— A maioria de nós somos traficadas, outras são moedas de troca e uma ou outra está aqui apenas porque não tiveram sorte na vida. — Lupi explicou. — Onde você se enquadra?
— Moeda de troca... — Eu abaixei a minha cabeça.
— Sorte a sua... — Dulce falou.
— Por quê? — Eu perguntei. — Não vejo vantagem nisso.
— Você é a única entre nós que têm a chance de sair daqui... — Ela sorriu fraco. — Eles podem te leiloar para homens ricos e para contratos, depois de algum tempo eles te soltam.
— Isso fica cada vez pior. — Eu rolei os olhos.
Nós ficamos um bom tempo conversando e desabafando sobre as nossas antigas vidas, elas foram as únicas que me abraçaram aqui e tentaram abrir os meus olhos para o que estava por vir.
Eu ia precisar ser forte e aguentar firme tudo o que estava por vir, já que eu não teria muitas chances de fugir daqui, a não ser que algum velho rico me arremate.