Alívio
Helena, desde que se lembrava, sonhava com a liberdade. Cresceu sob os olhos atentos da mãe, cuja obrigação era manter a menina de grandes olhos azuis e cabelos negros como a noite pura e virgem, para que fizesse um casamento vantajoso para os negócios ilícitos de seu pai.
Na máfia, os casamentos são jurados em sangue e só terminam quando um dos cônjuges morre — quase sempre, é a esposa que encontra um fim misterioso
Quando teve idade para compreender o destino que a aguardava, chegou muitas vezes a sonhar com uma fuga para um lugar distante onde poderia escolher seu próprio destino, mas no fundo Helena sabia que se um dia fugisse, seu pai a caçaria e a faria rastejar de volta para casa. Nos negócios, ele era feito de fantoche pelos seus superiores e aliados, mas em casa era temido por todos, os espancamentos e restrições de comida garantiam que fosse obedecido. Então, quando foi dada em casamento para Otávio Garcia, Helena aceitou como quem aceita que a morte é inevitável, ela não tinha escolha, assim preferiu sonhar com uma vida respeitosa dentro dos moldes sociais da sociedade a que ela e Otávio pertenciam.
Otávio era jovem, bonito e até mesmo lhe mandava flores. Algumas vezes, se pegava sorrindo lembrando dele. Rapidamente fez amizade com sua futura cunhada Ella, pena que a menina vivia a maior parte do tempo confinada em um convento.
Mas a ilusão de felicidade durou pouco, mais precisamente até a noite de núpcias. Os galanteios de Otávio deram lugar a socos, violência extrema, e o jovem galanteador se tornou um masoq.uista. Para uma menina de 16 anos que nunca tinha sequer beijado um homem, a noite de núpcias a transformou em uma sombra do que era. Nem mesmo as su.rras de seu pai tinham sido capazes de subjugá-la de tal maneira, mas o que Otávio fez teve o poder de fazê-la sentir medo de qualquer outro homem.
Depois da lua de mel, teve a ilusão de que o marido a deixaria em paz. Sua virgindade ele já tinha conseguido, mas Otávio a perseguia a qualquer hora do dia. Mesmo morando na casa do sogro, ele arrumava uma maneira de arrastá-la para o quarto. Com o tempo, ela aprendeu a não gritar quando isso acontecia, pelo menos o orgulho ela precisava manter. Vivia de lábios e olhos roxos, o corpo também era cheio de hematomas. Sempre tinha uma desculpa para espancá-la, a cama que não estava bem forrada, o olhar de um dos seguranças que tinha se demorado nela, ou algumas vezes ela tentava impedir que a tocasse, mas era vão, após a subjugar era obrigada a fazer tudo que ele queria. Cada noite no mesmo quarto que ele fazia com que desejasse a morte. Então, quando recebeu a notícia de que Otávio estava morto, sentiu um alívio tão grande que chorou por horas. Desejava que ele tivesse morrido antes, três anos naquele inferno tinham parecido três décadas.
Agora ela poderia ao menos dormir em paz, por sorte, tinha a chave do quarto de Ella, a partir daquele dia dormiria ali, não queria olhar para a cama onde muitas vezes foi estupr.ada e espanca.da até ficar roxa. Mas agora Otávio não podia alcançá-la e ela podia finalmente tentar voltar a ser quem era antes dele.
Seu pai havia prometidp que não iria casá-la novamente, ele era um crápula, mas ao menos cumpria o que prometia.