A Confiança - Organização - Livro 3

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Flora

Algumas semanas depois

Toda a situação do jantar com Juan serviu para ele não vir atrás de mim. Emanuel só não levou o caso para Hugo porque pede para não fazer nada. Gabrielli é amiga pessoal de Juan e, no final, nada iria acontecer. Pensei que poderia conseguir uma forma dele ter o que tanto parece gostar, que é sexo, mas ele não quis tocar em mim e ainda me bateu.

Celeste está brincando com sua cachorra, está alheia aos meus conflitos. Sei que ela tem os próprios problemas para lidar. Meu irmão Miguel intensificou sua perseguição a ela, estendendo a Rafael também. Papai não fala nada, deixa Miguel mandar e desmandar em todos nós. Depois do que houve comigo, deixou Miguel mandar Emanuel para a Espanha sem nem ao menos se despedir de mim.

Ele sabe bem como sou ligada a Emanuel. Tenho certeza de que fez isso para nos punir pelo que houve. Magalhães deve ter reclamado. Como queria acabar com esse casamento logo. Não me importo mais com honra ou reputação, quero é viver em paz. Esse compromisso só trouxe desunião e brigas na nossa família.

– Flora, eu e Rafael decidimos ir embora. Acredito que eu não sou bem-vinda aqui. Realmente tentei ser o melhor, aceitar as regras do seu irmão. Pensei que estava me adaptando, mas depois do que aconteceu ontem, pela minha saúde e do meu bebê, é melhor ir para outro lugar.

Olhei para ela com mais atenção, a barriga já está evidente. Celeste não contou a ninguém até agora; provavelmente também não vai contar. Miguel a ofendeu muito ontem no jantar, a xingou de selvagem, inclusive criticou a campanha de arrecadação que está promovendo junto com padre Lucas e outras ofensas pesadas.

– Meu Deus, cunhada, parabéns! Por que não contou antes? Mamãe vai ficar tão feliz. Vamos contar para todos, fazer uma linda festa com muitas flores. Não podemos esquecer da missa, o padre Lucas vai ficar animado.

O semblante triste de Celeste foi o sinal de que ela não queria nada disso. Seu olhar carregado com um sentimento de dor me deixou triste.

– Você não quer o bebê?

– Eu quero, amo o meu filho, só não quero festa. Não estamos em clima de comemoração. Quando tudo estiver organizado na nossa casa no território neutro, contamos para todos, fazemos uma festinha. Mas agora não.

Tudo isso é culpa de Miguel e sua liderança injusta e prepotente. Minha amiga era tão feliz; agora parece ter perdido toda sua alegria.

– Território neutro? Celeste, por que não aqui na cidade de Acácia? Vocês estão se afastando de nós, é isso?

– Sim. Rafael e eu decidimos assim. Infelizmente, seu irmão está muito magoado com tudo, inclusive com esse casamento sem sentido entre você e Magalhães. Como diz o ditado: os incomodados que se retirem. Se pudesse, levaria você conosco, só que Jacó não quer causar uma guerra. Juan não vai aceitar desfazer o negócio.

Meu casamento é um negócio. Ele não gosta de mim ou quer ter uma família bonita comigo, e sim conseguir mais terras, dinheiro e herdeiros para cuidar dos seus negócios.

– Se estão indo para o território neutro, é porque vocês não querem mais ser da família.

– Pedi para Rafael reconsiderar, pensar melhor, mas depois de ontem ele não mudou sua decisão. Miguel me ofendeu demais, humilhou sem nenhuma necessidade. Não sei por que me odeia tanto.

Abri meus braços para que ela pudesse me abraçar. Sei que ela precisa desse consolo. Meu irmão é um homem maravilhoso por apoiá-la em tudo, percebendo como Miguel está sendo c***l com Celeste sem que ela tenha feito nada.

Celeste

– Tem certeza de que quer ficar aqui?

– Sim. Preciso ficar sozinha um pouco. Logo entro. Não precisa se preocupar.

Pensei que o meu casamento seria um sonho se tornando realidade. Quando soube do compromisso, fiquei assustada; não queria de início. Rafael era apenas o irmão da minha melhor amiga, alguém bem distante de mim. Ele tentou se aproximar muitas vezes, eu o rejeitava todas as vezes por medo. Iria cumprir com minha obrigação mesmo não me sentindo preparada.

Com o tempo e insistência de Rafael, comecei a vê-lo com outros olhos. Os passeios nos jardins de sua família, como também no campo de girassóis, mudaram totalmente meu jeito de ver o nosso compromisso. Ele me pediu em namoro como se fôssemos mundanos, pois queria que tivéssemos uma experiência diferente das propostas feitas pelas famílias.

Sua forma de tratar nossa relação e o seu respeito comigo me fizeram perceber rapidamente que Rafael seria o amor da minha vida. Ficaríamos juntos para o resto de nossas vidas; evitá-lo seria r**m para mim. Foi quando percebi que havia me apaixonado. Não me importei de antecipar nossa união carnal; as convicções ridículas da Organização nunca foram uma regra para mim.

– Queria tanto que tudo tivesse dado certo aqui. A Senhora sabe disso.

Em frente à imagem de Nossa Senhora da Rosa Mística, consigo encontrar conforto. Não posso falar meus anseios e medos com Rafael; ele já está tão sobrecarregado com a mudança e a separação da sua família. Sinto uma dor profunda por ter causado tanto transtorno para o homem que amo.

Minha cachorrinha está quietinha no meu colo. É uma vira-lata pequena que encontrei na porteira da Fazenda Méndez; desde então, ela é minha companhia. A trouxe para ficar comigo, mas até com minha pretinha, Miguel implica. Respiro fundo terminando de rezar; faço o sinal da cruz indo até Nossa Senhora, tocando em sua imagem.

Quando estou saindo, começo a chorar ao perceber que Miguel está na entrada da capela. Não suporto mais essa perseguição; estou cansada de toda essa situação. Não quero brigar ou discutir com ele. Tenho que preservar a mim e ao meu filho. Tento sair de cabeça baixa com pretinha nos meus braços; Miguel me puxa pelo braço, fechando as portas da capela.

– Miguel, por favor, eu só quero ir embora. Me perdoe por ter desafiado você durante esses últimos meses. Prometo que não terá mais problemas comigo.

Sinto o cheiro de bebida vindo da direção dele. Miguel está bebendo muito. Ninguém percebe como isso o transforma em um homem muito mais agressivo e descontrolado.

– Celeste, uma pobre vítima do c***l e injusto Miguel Acácia. Estou incomodando você e essa cachorra de rua? Nunca vou perdoá-la pelo louco que você me transformou. Poderia pelo menos ter sido infeliz como a maioria das garotas que se casam por arranjo. Mas tinha que ser diferente, se apaixonar e sorrir como a p***a de uma mulher realizada com seu casamento.

Tentei me afastar, sendo impedida pelo seu aperto no meu braço. Ele está louco como no dia do casamento de Hugo e Gabrielli quando me atacou.

– Miguel, me deixe sair, não faça algo que vai se arrepender.

– Arrepender? Tenho tantos arrependimentos; um deles é não ter me casado com você. Sempre a amei, Celeste. Seus sorrisos, seu amor, seu corpo e sua alma deveriam pertencer a mim e mais ninguém. Depois de ontem, sei que não posso ficar longe de você. Apenas precisamos ser discretos; Rafael não pode saber jamais do que vamos fazer hoje.

Pretinha começou a rosnar para Miguel, que tirou minha cachorrinha dos meus braços, a chutando. Tentei ir até ela, sendo impedida por ele, que puxou meus cabelos para trás.

– Não faça isso, Miguel! Vai estragar sua vida e a minha. Estou implorando para esquecer isso, me deixe ir embora em nome de Deus.

Ele me jogou no chão, subindo em cima de mim. Comecei a me debater debaixo dele, gritando e usando minhas mãos como defesa. Miguel não vai destruir minha vida; não vou permitir. Fecho meus olhos, pedindo para Nossa Senhora me dar força. Foi quando percebi que estou com o vestido totalmente rasgado. Miguel para, percebendo algo que tentei esconder durante esses últimos meses.

– Está grávida? GRÁVIDA! ISSO NÃO PODE SER, CELESTE. ELE NÃO PODIA TER ENGRAVIDADO VOCÊ.

Nesse momento, a porta é aberta por Rafael, meu marido, que me vê jogada no chão com a roupa rasgada, percebendo rapidamente o que está acontecendo. Rafael já sabia da gravidez e preferiu não contar para ninguém, como eu também não queria. Ele foi na direção do irmão para agredi-lo, mas gritei apavorada com toda situação. Rafael, com certeza, mataria Miguel, estragando nossas vidas para sempre.

– CHEGA! PELO AMOR DE DEUS, RAFAEL, ME TIRA DAQUI!

Ele foi em minha direção, me pegando no colo. Me encolhi em seu peito, como se quisesse me fundir ao meu marido. Estou exausta com tudo isso. Pela segunda vez, Miguel tentou abusar de mim. Será que essa perseguição nunca vai ter fim? Antes de sairmos, Rafael para na frente do seu irmão.

– Vou cumprir com minhas últimas obrigações a pedido do nosso pai. Depois, não quero vínculos com você e nossa família. Só não te mato agora porque não quero minha mãe chorando por um merda feito você. Fique longe da minha mulher, seu desgraçado.