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1594 Words
Juan O silêncio dominou a casa até o início da noite. Flora não gritou ou reclamou; estranhei o silêncio, porém, preferi ficar distante, dando tempo para que ela pensasse em seus atos. Quando uma das empregadas anunciou que o jantar estava pronto, fui até meu quarto buscá-la para jantarmos juntos. Destranco a porta, encontrando o quarto totalmente vazio; em cima da cama, há um bilhete. "Nunca mais me prenda, não sou a p***a de uma criminosa." A desgraçada fugiu pela janela. Ligo para o meu chefe de segurança; não é possível que Flora tenha ido atrás de Ulisses novamente. Essa situação entre os dois precisa parar. Sei bem que pode não estar transando com ele, mas apenas a menção de que esteja com outro me deixa fora do eixo. – Senhor, sua esposa não saiu da fazenda. Os homens estão nos seus postos e não avisaram nada. Ela pode estar perdida nas plantações; já pedi para um grupo de homens procurá-la. – Tudo bem, Expedito, ache minha esposa. Flora não conhece minhas terras e pode realmente estar perdida. É uma propriedade extensa e pode ser perigosa à noite. Respiro fundo, tentando me acalmar. Esse dia está sendo agitado demais para o primeiro de casado. Saio do quarto indo para a cozinha, pedindo às empregadas que guardem o jantar. Não vou conseguir comer nada, preocupado com Flora. Ouço sons de música vindo da direção da colônia dos trabalhadores. Aqueles que trabalham aqui são fixos, famílias que servem à minha família há anos. Meu pai foi o idealizador da colônia São Miguel Arcanjo. São casas onde trabalhadores e suas famílias habitam, além dos meus seguranças, que também moram lá com suas famílias. – Flávia, por que há festa na colônia? – É o início das festividades de São Miguel Arcanjo. Tem a missa, depois a festa. Será assim até o dia do Santo. Tinha me esquecido completamente da festividade. Esse casamento consumiu tanto meus pensamentos que não consegui focar em outro assunto. É uma festa tão antiga, da época em que meu avô ainda era vivo. – Se quiser ir, pode ficar à vontade. Estenda esse aviso para as outras também. Na hora que encontrar minha esposa, vou até lá para prestigiar o evento. Flávia sorriu, se contendo para não comemorar na minha frente. Sei que, para o povo simples da fazenda, essas celebrações são muito importantes. Um pensamento passa pela minha cabeça, mas não, Flora não seria tão louca assim de sair para uma festa de pessoas que ela nem sequer conhece. No entanto, se for para me irritar, minha esposa é capaz de tudo. Flora Não ia ficar presa naquele quarto como se fosse uma prisioneira. Sabia que poderia me machucar pulando a janela, mas depois de tomar um banho e colocar uma roupa confortável, a ideia não pareceu ser tão estúpida, principalmente depois de escrever um lindo bilhete para o meu odioso marido. Fui uma criança um pouco rebelde em alguns sentidos, muito por conta de mamãe, que acobertava minhas travessuras. Subia nas árvores frutíferas das terras do meu avô com a ajuda dela. Aprendi a andar a cavalo, de bicicleta e até a pilotar moto com a ajuda de Emanuel. Foram anos maravilhosos, por isso não tive dificuldade de pular a janela e descer pelo telhado. Os homens de Magalhães nem sequer viram minha descida. Fui na direção das plantações; precisava conhecer o território inimigo para saber como seguir com os meus planos. – Menina, o que faz aqui? O expediente já acabou, estamos todos indo para a missa. Um homem n***o, que com certeza tem o dobro do meu tamanho, se aproximou de mim. Ele está acompanhado de uma moça muito bonita com uma bebezinha em seu colo. – Paixão, ela deve estar perdida. É nova na colheita, não é? Não queria mentir, só que se contar quem realmente sou, vão chamar os homens de Juan, e não quero isso. – Sim. – Quer ir na missa conosco? Começamos a festividade de São Miguel Arcanjo hoje. Iniciamos pelo terço e depois a celebração da missa. Não estou sendo uma boa católica recentemente, mentindo, enganando e sendo uma grande v***a. No entanto, sinto falta de estar na igreja. Cresci cercada de fé, como também ia sempre à missa. Ajudava minha mãe nas festas para a Nossa Senhora da Rosa Mística. Era tão bom estar com as pessoas em comunhão para agradecer. – Quero sim, estava perdida; aqui é uma plantação muito grande. – E vai ficar ainda maior. O patrão casou-se com uma moça da família Acácia e ganhou como dote uma propriedade com muitos hectares. – Fiquei sabendo. Meu casamento com Magalhães foi um negócio vantajoso para ele. Sou um útero fértil e trouxe também mais dinheiro para sua conta, que já era bem grande. Tenho que continuar minha vingança; ele tem que pagar por tudo que fez comigo. Apenas eu saí perdendo nessa relação. – Já tem lugar para ficar ou vai para as outras fazendas da região? – Ainda não sei. E vocês? – Moramos aqui desde sempre. Meu pai e minha mãe foram trabalhadores aqui, assim como os meus sogros. Eu e meu marido crescemos juntos, acabamos nos apaixonando e, por fim, nos casamos. Engravidei um ano depois, e aqui está minha Maria do Rosário, e logo teremos o nosso menino. Percebi que a barriga da moça que foi tão educada comigo está um pouco grande. Eu queria ser mãe assim como ela, apaixonada pelo marido, mas isso nunca vai acontecer. Magalhães não terá filhos se depender de mim; quero que não tenha nenhum descendente. – Parabéns! Sua família é muito bonita. – Obrigado. Estamos quase chegando na capela. Trouxe seu terço? Se tivesse trazido, logo perceberiam que não sou uma simples trabalhadora. Minha mãe me deu o terço que era da minha avó, todo feito com pedras de rubi. Portanto, resolvo responder que esqueci. Ela me entrega um terço simples feito de madeira. – Assim você não se perde nas ladainhas. A capela está praticamente cheia; alguns estão sentados nos bancos de madeira e outros no chão, perto da porta. Por que Magalhães não aumenta a capela? A da nossa fazenda é grande e espaçosa; aqui, as pessoas estão desconfortáveis. – Levanta para Guadalupe sentar, Zacarias, minha mulher está grávida e ainda com Maria do Rosário no colo. Vamos, homem! O homem se levantou, sorrindo para Guadalupe, logo ficando ao lado do seu marido. Fiquei em pé, observando cada detalhe do lugar. Apesar de simples, todos estavam felizes, à espera do início do Rosário. Padre Lucas entrou na igreja, sendo cumprimentado por todos. Eu o amo tanto; é um senhor doce e gentil com todos. Guadalupe me chama para sentar ao seu lado. Um dos rapazes que estavam lá se levantou, cedendo o lugar para mim. Os homens estão todos em pé; apenas as mulheres estão sentadas, mais um gesto gentil por parte deles. – Como é bom ver a capela cheia. Estou feliz pela presença de todos. Serão dias abençoados. Sei que, apesar do dia de trabalho cansativo que cada um teve, fizeram um esforço para estarem aqui para rezar, agradecer e, por que não, pedir a São Miguel Arcanjo uma benção. Vamos começar a refletir sobre os mistérios em cada fim do terço; depois, terminamos com a missa e nossa festividade com um delicioso jantar. Padre Lucas não é um gordinho das bochechas rosadas à toa; ele ama uma boa refeição. Mamãe sempre gostou de recebê-lo com uma mesa farta. Começamos a rezar o terço, e foi impossível não me emocionar. Essas pessoas não têm muito no âmbito financeiro, mas têm uma fé bonita de se ver. Ao final, rezamos a oração de São Miguel Arcanjo e depois tivemos a missa, que foi igualmente linda. Me senti bem depois de tanto tempo tendo sentimentos de tristeza e abandono. Após a missa, todos saíram. Padre Lucas me viu ao longe, pedindo com o olhar para esperá-lo. – Sua bênção, padre. – Deus a abençoe. O que faz aqui, Flora? – Padre, estou aqui porque sou uma mulher temente a Deus e que precisa Dele como todo mundo aqui. Ele sabia que Magalhães jamais me deixaria sair de casa. Não é segredo para ninguém a forma como Juan sempre viu esse casamento. Uma maneira de mostrar para todos que não sou como Mirela e melhorar a reputação da sua família me mantendo sob suas rédeas. – Vou para a festa. Quero ver se o senhor ainda sabe alguns passinhos de dança. – Menina flor, seu marido não sabe que está aqui, não é? – Não, mas ele não é meu dono. Eu pertenço a mim e a Deus. Pego no braço do padre, levando-o para o meio da multidão, logo o perdendo, já que é muito requisitado. Há tanta comida e pessoas que é bem difícil andar no meio de todo esse povo. Acabo esbarrando em um rapaz, é Zacarias, aquele que levantou para Guadalupe se sentar com sua filhinha na capela. – Perdida, menina? – Não, só estava indo dançar. E você? Está perdido? Ele é alto, com os cabelos pretos, ombros largos e um sorriso encantador. Não era permitido conversar com outros homens além dos da minha família; o contato era mínimo ou quase inexistente. No final, isso não adiantou de nada. Fui sempre obediente e respeitava as regras, para ter que me casar com alguém que transformou minha vida em um inferno. – Não. Já que está indo dançar, podemos dançar juntos, o que acha? – Boa ideia, só não pise no meu pé!
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