Capítulo 1

2397 Words
Emily sabia que estava muito encrencada. Desde que descobrira a gravidez, aos dezenove anos, tudo havia dado errado. Não que não sonhasse em ter filho, pois almejava um dia ter sua própria família, e sempre desejou ser mãe, mas não assim, do jeito que seria. Afastou da mente as lembranças, não queria pensar na loucura que havia cometido, no ato impulsivo que a trouxe até lá, para esse momento fatídico. Sentia que as mãos começavam a ficar suadas, o coração estava batendo mais forte contra as suas costelas e o ar faltava. Sabia que tudo isso era o medo, sua forma de recuar e deixar de fazer o que precisava arrumar. Era injusto, afinal ele precisava saber, ela não podia esconder isso para sempre. Sem ter planejado o momento certo, tinha agido por impulso, apenas esperando que aquele fosse o melhor jeito. Puxou o ar com mais força e tentou controlar as emoções. Por experiência própria, sabia que não existia nada de r**m que não pudesse piorar. Estava em frente ao grande arranha céu da International Daime e horas pareciam ter passado enquanto reunia coragem para entrar. Ergueu o rosto para vislumbrar toda a estrutura de vidro e metal, fria e luxuosa. O prédio podia ser visto de vários pontos do centro da cidade, até um pouco mais além. Acima dele, havia somente as nuvens densas, e em algum lugar ali dentro, o seu destino a aguardava de certa forma. Nos primeiros meses de gravidez, pensava em contar apenas para não ficar com a consciência pesada, mas quando entrou no quinto mês da gestação, falar virou mais que uma necessidade de absolvição. Perguntou-se se seria bem recebida, se não se arrependeria de ter seguido sua intuição. - Droga! - Ralhou consigo mesma, tão baixo, que as pessoas que passavam nem ouviram, ou se tivessem, não deram um pingo de atenção. Emily pensou até mesmo em ter ligado, mas tinha quase certeza de que não seria atendida. E como poderia? Em todo caso, continuava a ser uma desconhecida. Percebendo seu nervosismo os pequenos seres em seu ventre começam a se mexer freneticamente, buscando cada um o seu espaço. Mesmo ainda sendo muito pequenos, ambos já conseguiam causar desconforto, dependendo do movimento que faziam. Ela seria mãe de gêmeos bi vitelinos, e apesar de ter descoberto há algum tempo, ainda não podia acreditar. O chute recebido foi de certa forma reconfortante, pois era sinal de que estavam bem e seguros com ela. Quando começou a senti-los, havia chorado tanto, sendo tomada por um misto de sensações desconhecidas. Naquele momento, compreendeu que não estava mais sozinha, e que havia duas crianças dentro dela, prontas para logo virem ao mundo. Acariciou o ventre e enxugou as lágrimas teimosas que corriam pelo rosto, precisava ser forte, se não por ela, por Kevin e Karen. Havia escolhido os nomes em homenagem a sua mãe se fosse menina e ao pai do bebê, se fosse um menino, porém o destino foi travesso e lhe deu os dois juntos. A princípio, ficou desesperada de medo, foi um tremendo choque quando a médica mostrou na tela dois bebês e não um, afinal, duas crianças exigem muito mais cuidados. Ela não era do tipo que tinha uma rede de apoio na cidade em que morava, os poucos parentes que tinha, viviam longe e não eram muito íntimos. Bocejou, percebendo que já estava quase na hora da sua soneca diária. A gravidez a fazia dormir por horas a mais que o normal e diversas vezes ao dia, tendo mudado totalmente seus hábitos, já que antes dormia muito pouco e sempre acordava cedo, para que seu dia rendesse ao máximo. Precisava entrar naquele maldito prédio o quanto antes ou teria que voltar pra casa como uma fracassada. A verdade é que era assim que se sentia. Dando um suspiro final, se forçou a afastar os pensamentos pessimistas. — Você consegue, Emily! — Incentivou a si mesma, na esperança de se convencer. Lentamente se aproximou da entrada, adiantando os passos quando chegou perto da porta, para que assim pudesse entrar logo, antes que sua pouca coragem fosse embora. A porta abriu automaticamente, revelando o grande e luxuoso saguão, com um chão brilhante de porcelanato cinza. Além disso havia espelhos em toda parte, e notando o seu reflexo em um deles, percebeu que não gostava do vislumbre de si mesma. Estava pálida e grande. Na verdade, seu ventre era a única coisa volumosa em seu corpo, pois seus braços estavam finos e suas pernas haviam perdido as coxas grossas que antes odiava. Usava um vestido branco florido e um casaquinho de crochê roxo, confeccionados por ela mesma, assim como uma gargantilha, a única joia que possuía, a qual tinha um pingente em formato de coração na ponta, com uma foto antiga de casamento de seus pais por dentro. Era a única coisa que tinha restado, desde o incêndio que a deixou órfã aos dez anos de idade. Os seus cabelos encaracolados e castanhos estavam soltos e chegavam até a cintura, e ao redor de seus olhos castanhos escuros, haviam olheiras, destacadas por sua pele pálida, quase sem vida, o que acentuava mais a imagem de uma menina grávida e frágil. Ela havia dormido m*l na noite anterior, de tão ansiosa que estava, tanto pela consulta, quanto pela visita que decidiu fazer ao pai de seus filhos. Desviou os olhos do espelho grande e suntuoso. Procurou lembrar quantas vezes estivera ali, naquele saguão, se encarando naquele mesmo espelho e não conseguindo seguir adiante no que que devia fazer. Tinha dado para trás e agido como uma covarde, mas agora seria diferente. Não seguiu até o balcão imenso da recepção, pois sabia que aquela era a hora em que os funcionários chegavam, então, sua presença não era notada. Entrou rapidamente no elevador, apertando o número do andar desejado, antes que recuasse mais uma vez. Sua mente gritava para que que recuasse, implorando para ela guardar o segredo, entretanto a necessidade também se fazia presente, não a deixando esquecer de que não havia outro jeito. Quando as portas lentamente estavam se fechando, um par de mãos impediram que o elevador seguisse seu caminho, e o movimento inesperado assustou Emily. Mas o susto deu lugar ao pânico, e ela ficou sem chão ao notar quem havia entrado no elevador. Kevin, assim como ela, parecia surpreso, com a expressão de que tinha visto um fantasma. Ela não esperava que o confronto fosse ocorrer assim, não esperava que o destino se encarregaria de o colocar diante de si tão rápido. Um segundo antes de desmaiar, Emily viu a dureza tomar das feições de Kevin Daime e antes de perder os sentidos ele a amparou com seus braços fortes. [...] Antes de abrir os olhos, Emily tocou o ventre como de costume, sentindo os bebês responderem ao seu pedido silencioso de mostrar que estavam bem. Eles chutavam e se contorciam freneticamente, a fazendo sorrir agradecida. — Que bom que você acordou. — A voz fria de Kevin Daime a despertou por completo. Assustada, levantou rápido demais e tudo começou a girar a sua volta, como se estivesse em um carrossel. As mãos quentes de Kevin a amparam, e só então lembrou de ter desmaiado no elevador, a fazendo se recordar do motivo de estar ali, com ele. — Sente-se, antes que desmaie mais uma vez. — A ordem fora apenas sussurrada, mas ela não pode deixar de acatar, pois o tom deixou todo seu corpo arrepiado. — Mas que droga, Júlia onde está o maldito médico? — gritou, demonstrando impaciência. Emily apenas fechou os olhos e recostou a cabeça no sofá. O lugar em seu braço que Daime havia tocado queimava de forma assustadora, e era incrível perceber como seu corpo reagia a um simples toque dele, como suas terminações nervosas entravam em pânico e seu coração saltava descompassado. Respirando lentamente várias vezes, conseguiu relaxar e ao abrir os olhos, entendeu o que ele gritava com a assistente. — O médico já está a caminho. — Anunciou uma loira exuberante, de olhos fatais como uma cobra. Quando se deu conta que a mulher a encarava, se voltou para ela, notando que em seu semblante não havia nenhuma emoção, sequer empatia pelo seu estado. — Médico? Não preciso de um, eu estou bem. — falou, com a voz fraca. Se deu conta que estava na sala dele, tinha certeza disso, pois aquela perfeição em detalhes só podia pertencer a ele. A mesa no centro da sala era grande e organizada, não havia nada fora do lugar, dois computadores estavam de frente para a poltrona confortável onde ele se sentava, assim como alguns celulares que tocavam quase que silenciosamente. Na parede dos fundos, havia uma varanda enorme, em que uma pequena cachoeira ornamental estava alojada, e de onde formava um tranquilo lago artificial, em que peixes de várias espécies nadavam, cada um mais bonito e colorido que o outro. No meio do lago, havia uma ponte de madeira que levava até a parede de vidro, de onde se podia ver toda a cidade, e mais além o mar azul. A visão em conjunto era de tirar o fôlego, e apesar de ser incrível, ela desviou os olhos, pois tinha medo de altura e não queria pensar o quão no alto estava naquele momento. Kevin encerrou uma chamada que tinha ido atender, e voltou a olhar para ela. — Você precisa de um médico sim, afinal acabou de desmaiar. — Não... Eu estou me sentindo perfeitamente bem, desmaios são comuns no meu estado, principalmente depois de levar um grande susto. — Os olhos verdes dele a fitavam de alto a baixo, a envergonhando, parecendo que a despiam, ou arrancavam todos seus segredos. A secretaria havia saído sem que ela notasse, e os telefones na mesa já não tocavam mais. Ela estava sozinha com ele, e começava a se sentir temerosa e terrivelmente desconfortável, principalmente porque o homem alto e forte a encarava de maneira fria e um tanto curiosa, mas nada satisfeito. — Mesmo assim, eu insisto que meu médico a examine. — Olhou para uma mesinha de vidro com algumas revistas de investimento e um jornal dobrado, apenas para quebrar o contato visual. — Acabei de vir de uma consulta e não há nada de errado comigo, acredite, estou bem. — Sabia que estava discutindo com ele atoa, afinal Kevin Daime fazia o que queria e quando queria. Como uma pantera ele se aproximou, deixando-a acuada e assustada, e mesmo sabendo que ele não seria capaz de lhe fazer m*l, Emily se afastou um pouco, constatando por fim que ele apenas se sentou na sua frente, a encarando demoradamente. A proximidade era sufocante de certa forma. — Então, já que está em perfeita saúde, posso saber o que faz aqui? — O coração de Emily doeu ao notar o quanto ele desejava que ela não estivesse ali, o quanto ele a desprezava, como seu corpo inteiro emanava isso. Ela nunca teve ilusões em relação a ele, já que eles eram de mundos diferentes e quase estranhos um para o outro. Haviam ficado juntos apenas uma única noite e foi suficiente para marcá-la para sempre. [...] Cinco meses antes Emily andava pela praia, o dia estava quase escurecendo, quando decidiu nadar. Aquela região em que estava era calma e agradável, e só os donos das residências ao redor desfrutavam daquela parte. Tinha ido fazer um trabalho em uma das casas de lá, mas apesar de ter liberdade em poder passear no seu tempo livre, ainda se sentia uma invasora. Quando decidiu entrar na água não esperava ser puxada para o fundo por uma corrente, e em minutos estava se afogando. Mesmo lutando inicialmente, logo se deixou afundar, pois sendo sincera consigo mesma não havia muito pelo que viver e morrer não seria tão r**m, mas o pensamento não durou muito tempo, pois braços fortes a puxaram do fundo rapidamente. Meio inconsciente, ela foi tirada da água, vomitando toda a água salgada que havia ingerido, sentindo seu peito doendo e a garganta ardendo. Além de seu corpo inteiro que tremia, ela tinha a percepção de saber que por pouco não tinha morrido, o que teria sido de sua inteira culpa — Você está louca? Tentando se matar justamente na minha praia! — A arrogância na voz do seu salvador fez seu queixo tremer, e assim que começou a chorar não conseguiu mais parar. Sentiu quando o desconhecido a abraçou forte e carinhosamente, a surpreendendo, já que um segundo antes ele não fora nada gentil. Assim que Emily se sentiu melhor, ela o encarou, vendo como ele era lindo, naquele instante percebendo seu corpo inteiro queimar pelo toque dele. Perdidos em relação ao tempo, ambos ficaram se encarando, então, sem esperar, ele a beijou com ternura no começo, mas logo em seguida com urgência, sugando seu ar, levando-a ao céu com apenas um beijo. Não resistiu, afinal queria sentir mais, queria experimentar mais dele e logo seu biquíni branco foi tirado, sendo substituído pelas mãos dele, que percorriam cada centímetro de seu corpo, deixando-a louca. Enquanto gemia sem reconhecer a própria voz, o estranho salvador sussurrava carinhosamente sobre a beleza de seu corpo e do quanto a estava desejando naquele momento. Depois de terem chegado ao prazer juntos, ele deixou bem claro que tudo o que viveram foi um erro do qual ele se arrependia e que se odiava por ter se deixado levar. O coração dela ficou em frangalhos, e ela o observou ir embora, para só então chorar. Uma semana depois descobriu quem era o desconhecido ao qual entregou sua inocência, e o quanto era rico e poderoso. Viu como ele sempre estava cercado de mulheres lindas, e que era presença constante em revistas de fofocas. Decidiu então não pensar mais nele, não ser mais uma a desejá-lo, mesmo isso sendo quase impossível. Apesar da sua determinação, durante semanas acordava a noite queimando de desejo, lembrando do sexo incrível e enlouquecedor que teve nas areias daquela praia. Quando descobriu que estava grávida, ficou desesperada e sem saber o que fazer, mas logo se decidiu em não contar, ela teria o bebê e ele seria só dela. Lembraria apenas do doce momento em que estivera nos braços dele e apesar de ele a ter magoado, nunca se arrependeria de ter se entregado pela primeira vez a um homem impossível para ela.  
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