Duas semanas, depois do nosso primeiro "Almoço em família", estamos aqui novamente. Ia ser na casa do Gabriel, o namorado da minha mãe, mas de última hora os dois mudaram de ideia e agora é aqui em casa novamente.
Minha mãe disse que hoje o dia está perfeito para um churrasco à beira da piscina. Fiquei duas horas enchendo as bóias e limpando a cobertura, sozinha. Espero que esse almoço valha à pena. Até vesti meu biquíni de arco-íris de tão animada que estou.
Tudo bem, nem tanto, mas o que vale é a intenção.
A campainha toca bem na hora que me deito na bóia de melancia. Estou deitada como se fosse a rainha do universo, então, apenas olho para a Eliza, que está me olhando também, e digo.
- Vai lá. - e ela vai.
Arrumo os óculos de sol em meu rosto, e cruzo os braços atrás da cabeça. Continuo assim até os três subirem, Eliza, Abby e Lucas. Gabriel deve ter ficado com a mamãe na cozinha.
Levanto um pouco minha cabeça e aceno com a mão direita, os cumprimentando.
- Bom dia! - tento parecer animada e simpática.
- Bom dia! - Abby me cumprimenta animada, já tirando a roupa e ficando só de biquíni.
Lucas acena com a cabeça, me olhando de soslaio. Ele se senta em uma das cadeiras da mesa com guarda-sol, saca seu celular e instantaneamente se esquece do mundo. Eliza nos observa silenciosamente enquanto tira a roupa, ficando de biquíni, e entra na piscina.
Por um momento acho que vamos ficar em silêncio, mas acabo me surpreendendo quando Abby começa um assunto sobre piscinas, bóias e sol e nós quatro conversamos como se fosse a coisa mais normal e já feita muitas vezes antes.
A conversa animada continua quando Gabriel e minha mãe chegam. Ficamos conversando durante o almoço e depois também. Só não gosto quando começam a falar sobre estudos, muito menos quando me incluem.
- Abbigail quer seguir a carreira de modelo. - Gabriel comenta, como se a filha não estivesse presente. - Por causa disso mesmo que nos aproximamos, não é meu amor? - agora se dirige à minha mãe.
- Sim. - Ela concorda. - E eu tenho certeza que vai ter uma carreira maravilhosa. Sabiam que Aurora passou em vários vestibulares para moda? Primeiro lugar em todos. Quer ser estilista.
Agora a minha mãe que comenta, como se eu não estivesse por perto.
Suspiro, super entediada, me levanto da espreguiçadeira e entro na piscina já mergulhando. Quando volto à superfície, ouço Gabriel falando.
- Mas eu deixo... Tanto que Lucas passou em medicina, na Inglaterra, e vai para lá na primeira semana de janeiro.
Sinto meu coração parar por um segundo. Me viro e observo os dois, embaixo do guarda-sol. Depois olho para o Lucas, que desgrudou os olhos do celular e agora me olha por trás dos óculos escuros.
- Meu amor, eu acho muito importante os filhos ficarem perto dos pais. Não estou te julgando, só dizendo meu ponto de vista. - Minha mãe continua conversando, mas agora nem presto mais atenção.
Saio da piscina, me enrolo na toalha e desço depressa para meu quarto.
Minha irmã e Abby, que estavam na piscina também, observam silenciosamente. Talvez elas não tenham entendido, mas espero que Lucas entenda.
Como pôde?! Ele sabe que é meu sonho e nem me contou que vai se mudar! Agora ele vai deixar de falar comigo até nos sonhos?!
Entro no meu quarto, batendo porta, e vou direto para o banheiro. Só quando a água gelada molha a minha cabeça é que penso em como saí.
Devo ter feito a maior cena, mas agora nem dá mais para mudar. Só tenho que pensar no que dizer, se alguém me perguntar.
Meu comportamento, últimamente, está sendo de uma garota mimada, mas eu sou uma pessoa legal, juro! Não sei o que está me dando. Deve ser os hormônios, sei lá.
- Aurora?!
Alguém me chama e eu acabo tomando um susto. Me apoio na parede do box e desligo o chuveiro.
- O quê?! - Pergunto, gritando de volta, mesmo sem saber quem é.
- Posso entrar? - A voz fica mais perto do meu banheiro, o que facilita no reconhecimento.
Agora eu realmente não sei se rio ou se choro.
- Espera aí no quarto.
Respiro fundo e me visto com meu roupão rosa da Victoria's Secret.
Talvez eu não deveria estar com tanta vergonha, já que tivemos, algumas vezes, sonhos em que ambos estavam nús. Mas eu estou. Estou morrendo de vergonha e ansiedade. Lucas, finalmente, quer falar comigo na vida real. Mesmo que os dois escondidos dentro do meu quarto.
Saio do banheiro e o vejo olhando para as minhas paredes. Com posters, fotos, desenhos, frases e palavras estranhas. Quando conheço uma palavra nova, principalmente as estranhas, eu as escrevo nas paredes do meu quarto.
- Oi. - Me sento na ponta da cama, que está arrumada, graças à Deus.
Ele se vira, sorri para mim, vem na minha direção e se senta ao meu lado. Acho que tudo passou em câmera lenta, ou meu coração quase parou, por uns segundos.
- Oi. - Lucas finalmente diz, depois de passar alguns segundos me encarando.
- Paguei muito mico? - Pergunto, apontando para o teto, para ele ter uma ideia do que estou falando.
- Mais ou menos. Mas sua irmã amenizou a situação. - Ele da de ombros, como se estivesse se desculpando.
- O que ela disse?
Ele cora com pouco, mas conta: - Ela disse que provavelmente você está de TPM, e não gostou da mãe de vocês fazendo propaganda, e... Sabe...
- Entendi... - Assinto.
Vou relevar, porque ele me salvou de um grande sermão sobre boas maneiras, que mamãe poderia me dar.
- Então eu disse que viria, para saber como você está.
- Você disse o quê?! - aumento o tom de voz, surpresa por ter feito isso.
- Na sua cabeça deve estar parecendo estranho, mas ninguém ligou. - ele dá de ombros novamente. - Deve ter parecido a coisa mais normal do mundo... O que todo mundo já esperava...
- Tá... Mas... O que você realmente veio fazer aqui?
- Conversar com você, sobre minha viagem. - fico quieta, então ele continua. - Eu fiquei sabendo na sexta, e estava procurando o melhor jeito de te falar. Eu sei que é seu sonho, eu não quero te magoar...
- Não estou chateada, por você ir estudar onde eu sempre quis. Estou chateada por você ir para longe, e também por não ter me contado antes.
- Mas...
- Eu sei... A gente nem se fala, e quando eu não estou sendo ignorante com você, você está sendo comigo... Mas... Lucas, eu realmente gosto de você. Tudo que eu te falo nos sonhos é real. Você é meu melhor amigo, e o cara por quem estou totalmente apaixonada.
- Au... - ele volta a ficar vermelho, mas não o deixo falar.
- Estou preocupada se ainda vamos sonhar, quando você se for... Se vai ser a mesma coisa, ou se vai mudar.
- Não sei como vai ficar. Nem sabemos como e porquê começou. Acho que vai ser difícil saber como e porquê vai acabar.
- Eu sei, mas... Estou tão cansada...
- Já conversamos sobre isso. Se já era difícil ficarmos juntos, agora então... - ele balança a cabeça, talvez indignado. - Parece que tudo conspira contra nós.
- Lucas. - Ele olha para mim, com um brilho no olhar que já vi algumas vezes, nos sonhos, mas não tão nítido e real como agora. - Se eu te dissesse que te amo, o que você faria?
Lucas se aproxima, me segura pela cintura e apoia sua outra mão na minha nuca. Ele me beija tão intensamente que por um segundo me esqueço de tudo, e sinto como se tudo fosse ficar bem. Fico até com vontade de chorar, mas seguro.
Sei que nada vai ficar bem, e eu também não me esqueci que ele não me respondeu nada.