Marcel
Quando a água quente tocou meu corpo eu gemi de dor. A essa hora ela, aquela menina sombria estava a caminho da mansão do meu irmão com sua adaga, pronta para ceifar sua vida.
Por mais que ele tenha me destruído por completo, me quebrado em milhões de pedaços eu ainda o quero bem, e o bem para ele nesse momento é ter uma morte dolorosa e fria.
Olivia vai fazer isso, e eu sinto que mesmo o amando ela sabe que é necessário. Pierre não vai parar até conquistar tudo o que quer, até destruir tudo o que mais deseja.
Meu irmão é como uma praga em uma plantação. Ele consome tudo por onde passa.
Sai do chuveiro e me observei no espelho. Um dia eu fui um homem, mas hoje sou somente aquilo que sobrou de um.
Ouvi uma batida na porta. A última vez que isso aconteceu acabei na sarjeta. Fiquei esperando pelo pior, mas era somente um soldado com uma bandeja de comida. Ele colocou em cima de uma pequena mesa que havia no quarto de hotel e saiu. Olivia deixou claro que eu não deveria sair daqui, e assim farei. Não é por medo de morrer, a morte pode ser um alívio, é apenas cansaço. Me sinto exausto.
Ouvi outra batida e aguardei, o mesmo soldado voltou com uma maleta.
_ Olivia mandou para você.
Disse ele enquanto a colocava em cima da cama. Ele saiu e eu permaneci sem dizer uma única palavra. Quando finalmente consegui terminar de comer me senti enjoado. Faz tanto tempo que não me alimento bem que meu corpo pareceu nem reconhecer uma comida boa e saudável.
Sentei na cama me sentindo tonto. Abri e fechei meus olhos diversas vezes e em todas olhei para a maleta prateada em cima da cama.
Vagarosamente a peguei em minhas mãos e abri. Havia um terno feito sob medida para alguém bem magro, eu, e uma pistola banhada a ouro com um símbolo em seu cano, parecia ser um pássaro em chamas.
_ Phénix..
Murmurei enquanto passava a ponta do meu dedo no desenho.
Voltei a me observar no espelho. Aparei a barba e cortei o cabelo, agora talvez eu estivesse mais ‘’apresentável’’ como Olivia disse que eu deveria ficar. Não me ofendi com o jeito indelicado dela dizer que eu estava h******l, que nem parecia um homem e sim alguma coisa bem parecida com um mas ao mesmo tempo bem longe.
Pessoas me disseram coisas piores, bem piores.
(...)
Demorou dias até que finalmente me levaram até a minha antiga casa. Haviam muitos soldados rendidos nos fundos da mansão mas não dei bola, estavam todos amarrados.
Os soldados de Olivia caminhavam pra lá e pra cá.
_ Onde ela está?
Perguntei a um rapaz que estava passando por mim.
_ Na Itália, senhor.
Itália?
_ Sim.
Disse ele. Percebi que estávamos na frente do quarto do meu irmão. Empurrei a porta.
_ Onde.. onde está a cabeça dele?
_ Ela levou senhor, levou como troféu.
Disse ele calmamente.
_ Pensei que fosse alguma forma de expressão.
_ Não, ela não brinca em serviço.
Disse ele. Observei o que restou do meu irmão e não consegui sentir nada, absolutamente nada. O chão estava banhado em sangue. Ordenei que limpassem e fui até uma grande sala de reuniões, os responsáveis pelo meu coroamento estavam ali, todos em silêncio. Os anciãos nunca aprovaram as atitudes do meu irmão, não me admira que eles em algum momento fossem tentar golpeá-lo.
_ Senhor Marcel, é um imenso prazer tê-lo de volta.
Disse um senhor de idade bem avançada. Forcei um sorriso e me sentei aguardando os próximos a me dizerem mentiras e me parabenizarem por um título que nunca fiz questão.
Depois de um tempo de conversas jogadas fora me levantei, oficialmente eu era o Capo da França.
_ Senhor, e sobre os apoiadores de Pierre?
Perguntou um dos anciãos.
_ Podem executá-los.
Falei friamente. Eles sorriram com a ordem. Era isso que eles mais queriam, erradicar qualquer praga que Pierre tivesse deixado pra trás. Sentei em uma cadeira e observei cada um deles cair, cada soldado e apoiador das atrocidades do meu irmão.
Nesse meio tempo, enquanto os homens eram mortos um por um, muitas fofocas vieram até meus ouvidos e descobri que eu acabara de me tornar o rei de um império quase falido.
_ E como está a situação dos soldados ? Os pagamentos ?
_ Está tudo atrasado senhor, estamos quase falidos e nem mesmo as famílias mais ricas conseguiram fugir dos abusos do Capo Pierre. Ele usurpou até os últimos centavos. Muitas empresas em nosso nome faliram também.
Passei minha mão pelos meus cabelos bem irritado. Papai prezava muito nossas finanças e a de nossos sócios, meu irmão simplesmente destruiu tudo.
_ Atualmente temos bom relacionamento com quais máfias ?
_ Com nenhuma, senhor.
Disse o conselheiro. Olhei para ele, ele estava falando a verdade.
_ Ótimo..
Resmunguei ao ver o último homem cair.
Preciso de apoiadores e acima de tudo, preciso de novos acordos.
_ Faça com que todos saibam que agora quem está no comando sou eu, e que a França em breve retornará com toda sua glória. Estaremos abertos a acordos com outras máfias por tempo limitado.
_ E sobre a Capo Olivia senhor?
_ O que tem ela?
Perguntei olhando nos olhos do velho.
_ Ela não é muito bem vista pelos homens mais velhos..
_ Mas ela tem muito mais poder e influência do que nós.
Respondi seco. Ele balançou a cabeça concordando e se retirou. Tirei a arma da cintura e observei novamente o símbolo. Preciso me reerguer assim como essa Fênix, preciso renascer das cinzas e reinar da maneira que me foi destinado!