Maíra
Voltei para casa e ao entrar já ouvi:
— Onde você se meteu?
— Bom dia pra você também.
— Você não brinca comigo, Maíra!
— Fui buscar pão. Não tem nada pra comer.
Ele olhou a sacola de pães na minha mão e não falou mais nada. Segui para a cozinha e preparei o café. Em pouco tempo Alexandre estava sentado e me encarando de um jeito estranho. Vou ter que falar sobre a viagem. Mesmo ele estando com esse mau humor.
— Vou ter que viajar a trabalho.
— Como assim?
— Alguns funcionários terão que acompanhar o senhor Becker em uma viagem de negócios e eu também tenho que ir. A Renata também vai. Pode perguntar a ela se quiser — disparei tudo de uma vez.
— Pra onde?
— Nova York.
— Tá de s*******m?
— Claro que não. É uma viagem muito importante.
— E porque diabos você tem que ir?
— Porque ele também precisa dos meus serviços lá.
— Duvido!
— Se fui chamada é porque precisam de mim também.
— Quem mais vai?
— A Renata, o marido dela e alguns funcionários da empresa.
— Por que ele precisaria de tanta gente? Não dá conta do próprio trabalho?
— Não sei. Só sei que tenho que ir.
— Você não tem que ir coisa nenhuma! Ninguém é obrigado a viajar assim! Ainda mais uma mulher casada! Onde já se viu isso?
— Tenho que ir se quiser continuar no emprego. A viagem é a trabalho, não estou indo tirar férias, muito pelo contrário.
Ele me encarou pensativo.
— E não sou a única funcionária a ir. Inclusive tem uma moça que também é casada e vai — menti.
— Sem o marido?
— Sim. O marido dela não é funcionário da empresa.
Alexandre ficou pensativo o resto do dia. Não falou mais nada comigo. Só veio falar quando me viu arrumando as malas.
— Então você vai mesmo?
— Eu preciso ir. Não quero perder meu emprego.
— Que dia?
— Amanhã.
— Já?
— É uma viagem de emergência.
Alexandre me encarou com desconfiança. Merda! Ele vai dar piti.
— E volta quando?
— Em uma semana.
— Isso tudo? O que vou fazer nesse tempo?
— Vou deixar comida pronta pra semana toda.
Ficou quieto me encarando. Não dê piti, por favor não dê piti!
— Tá certo. Se vai deixar comida e vão mais pessoas com vocês. Pode ir.
Suspirei, bastante aliviada. Graças a Deus! Foi mais fácil do que pensei. Apesar de horrível mesmo assim.
Às vezes me pego pensando em quando era solteira. Tudo era tão diferente… eu fazia o que queria, sem precisar avisar a ninguém cada passo dado. Tempo bom.
Passei o dia fazendo comida para a semana toda. Congelei separadamente uma quentinha para cada dia e falei com ele que era só esquentar no microondas. Tudo bem fácil. Alexandre parecia ainda desconfiado, mesmo vendo tudo pronto e preparado para ele.
Espero não ter problemas por causa dessa viagem.
***
No dia seguinte, rezei para ele não mudar de ideia quando estava indo de encontro ao senhor Becker. Terminei de arrumar minhas malas longe dele para não dar ideia de tentar me impedir.
Quando deu o horário e coloquei as malas na sala, ele ficou me observando de braços cruzados e uma cara nada agradável. Ai meu Deus!
— Já está indo?
— Sim. O voo é daqui a pouco.
— Hum… Vai com a Renata?
— Não combinei nada com ela — respondi, nervosa. Droga!
— Por que não? Se vão viajar juntas, porque não ir juntas?
— Não pensei nisso. Fiquei sem graça de pedir carona ao marido dela. E você também não gosta que eu fale com outros homens sem você por perto, lembra?
— Verdade. Mas vamos até lá. Quem sabe eles ainda não estão em casa?
— Tudo bem.
Alexandre pegou minhas malas e foi na frente. Merda e agora?
Paramos em frente a casa da Renata e ela apareceu depois que chamei. Vim o caminho todo rezando para que ela entre na mentira ou me ajude na mentira. E espero que sejamos bem convincentes… Ou ele vai estragar tudo.
— Oi. Tudo bem?
— Vim perguntar se seu marido não pode dar uma carona a Maíra, afinal, vocês vão viajar juntos, não é?
— Vamos sim. Mas ele precisou levar o patrão, então foi na frente. Eu vou sozinha. Se quiser ir comigo, Maíra, vamos juntas.
— Por mim tudo bem. Pode me deixar aqui mesmo Alexandre. Vou com ela.
— Tá certo — falou, desconfiado. — Nos vemos em uma semana então.
— Sim.
Ele se aproximou e me beijou bem rápido e com um pouco de arrogância. Pelo visto está puto da vida, mas o importante é que não deu chilique e me levou para casa puxando pelo braço.
Ficamos olhando ele ir para casa e quando se distanciou muito, respirei de novo. Nem notei que prendi a respiração assim.
— Fica tranquila. Ele já foi.
— Foi, mas agora por isso perdi o ônibus e vou me atrasar.
— Não se preocupe. O senhor Tobias vai entender.
— Como se eu fosse contar isso pra ele… — resmunguei.
— Vai falar o que então?
— Não sei, vejo na hora. Agora preciso correr e achar um Uber.
— Vamos dividir um. Meu caminho passa por onde você tem que ir.
— Jura?
— Sim. Vai ser melhor, não é? Ele pode estar em alguma esquina esperando pra ter certeza se está indo comigo mesmo.
— Verdade… Eu agradeço, Renata.
Pedimos o Uber e ele demorou um pouquinho, me deixando nervosa. Não quero problemas com o senhor Becker. Finalmente entramos no carro e eu queria que ele corresse para não me atrasar mais.
— Ainda bem que saímos juntas.
— Como assim?
— Você não viu? O Alexandre estava realmente na esquina olhando.
Arregalei os olhos. Estava tão preocupada com a hora que não reparei nada disso. Que desgraçado! Pra que isso? Não confia em mim? Ou o que é?
— Está tudo bem?
— Não entendo porque faz isso. Por que não acredita em mim? — falei, irritada.
— Não acho que seja por não acreditar em você.
— O que seria então?
— Talvez ele só queira te controlar mesmo.
— Me controlar?
— Sim. Quer que você faça tudo o que ele quer, tudo do jeito dele é o melhor e às vezes tenta te afastar das pessoas e faz esse tipo de coisa pra ter certeza de que está sendo do jeito dele.
— Você acha?
— Creio que sim.
Não falamos mais no assunto. Na verdade, não falamos mais nada até que desci do carro e agradeci de novo tudo o que ela fez por mim e para me ajudar.