Júlia
Acordo no meio da noite assustada, suando o pesadelo de hoje foi horrível. Nesse o Bruno estava todo cortado querendo pegar a Vitória pra levar com ele, ele estava sujo e machucado. Levanto da cama afim de esquecer tudo isso. Entro no banheiro e tomo um banho rápido, assim que saio pego o celular pra saber que horas são, olho pra minha filha deitada cama em seu sono tranquilo.
A Vitória tá sofrendo tanto longe do pai, já são cinco meses que o Bruno tá em coma, dói não ter mais meu ogro. Eu continuo morando no morro, agora o Menor tá de patrão.
Vejo que já são 7:00 então visto um vestido e desço preparar um café, cada cantinho dessa casa me lembra o Bruno, eu tenho tanto medo dele nunca mais voltar pra mim.
As vezes sinto um leve toque dele, mas as enfermeiras dizem que é coisa da minha cabeça, e já estou começando a pensar que sim.
Mais tarde vou no hospital, eu não perco a fé nunca. Já ouvi várias pessoas falarem que o Bruno mereceu tudo isso que foi bem feito. Pode até ser que ele pediu por isso, talvez esteja pagando pelo monte de coisas que já fez na vida, mas tenho muita raiva de ver as pessoas falando assim dele, dói por que por mais que ele seja um traficante, ele tem família tem gente que ama ele, e quem conhece o verdadeiro Bruno por trás daquela casca toda sabe o quanto ele é bom. Ele tem uma filha que está sofrendo por não ter mais a presença do pai, e quanto ao Bruno não sendo mais patrão, digamos que o Menor está fazendo um ótimo trabalho, ele é justo e cuidadoso com todos do morro.
Depois de tomar café, levanto e pego a louça que sujei pra lavar, quando já estou terminando ouço batidas na porta, já sei que é a Amanda. É ela quem fica com a Vitória pra eu ir visitar o Bruno. A Vitória nunca foi ver o pai, eu acho melhor assim.
Ela pergunta o tempo todo por ele, mas prefiro inventar uma desculpa, do que levar minha filha no hospital pra ver o pai dela deitado em um leito cheio de vários aparelhos ligados nele.
Abro a porta pra minha amiga e recebo um belo abraço de bom dia.
Amanda: Cê tá bem? Tá com uma carinha.
Júlia: Não tem como tá bem né
De repente ouço um grito da Vitória vindo da parte de cima do quarto e corro pra ver o que é, meu coração parece que vai sair pela boca.
Assim que eu e a Amanda chegamos no quarto vejo a Vitória sentada na cama, com as mãos no rosto.
Júlia: O que foi filha? - me aproximo e pego ela no colo
Vitória: Eu quero ver meu pai mãe, eu quero! - ela chorava muito, perecendo prever algo ruim
Júlia.: Papai tá trabalhando Vi
Amanda: Leva ela Ju, ela tá sofrendo tanto
Júlia: Ela vai sofrer mais se for, ela é tão pequena - quero proteger minha filha, ela é meu tudo e não quero que ela se sinta m*l por ver o pai dela assim.
Amanda: Um dia ela precisa entender, e se ele não voltar mais? Deixa ela ver ele enquanto é tempo nega
Pensar na possibilidade do Bruno não votar mais me perturba tanto, eu não quero nem pensar nisso mesmo sabendo que é verdade.
Júlia: Tá mais tu vai junto!
A Amanda concorda com a cabeça e mesmo contra gosto eu arrumo a Vitória pra irmos até o hospital.
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Bruno
Ao longe ouço alguém me chamar, sinto um toque carinhoso no meu rosto, um toque leve de uma mão pequena. Esse toque me lembra alguém, eu lembro de algo mais aos poucos minha memória tá ficando fraca, eu tento acordar, me mexer mas não dá. Ouço tudo ao meu redor mas as pessoas parecem tá tão longe, as vozes são como ecos e meu corpo parece tá flutuando, sinto que estou deitado mas é como se tivesse tudo adormecido. É muita informação que não consigo entender e só quero sair daqui, quero despertar mas não consigo. Mas uma vez meu corpo toma as redias da situação e vai tentando se mexer, sem resultados. Por mais que eu tente forçar é como se o cérebro não conseguisse comandar.
Ultimamente muitas lembranças vem até minha mente, mas é difícil de saber o por que, muitas delas são de pessoas mortas. Elas me incomodam eu tento por tudo me livrar delas e me mexer, quero sair daqui, e saber onde eu estou. E principalmente de quem é esse toque gostoso que sinto todos os dias. Minhas lembranças vão ficando cada vez mais distante, parece que a cada dia eu esqueço de mais coisas, eu sei disso porque antes viva lembrando, vivia aparecendo rostos na minha mente e eu sabia de quem era cada um deles e porque eu pensava tanto mas agora eu não consigo reconhecer quase nada
O toque tá diferente, tá como se fosse uma criança. Pensando em crianças, eu lembro de uma bebê pequena, eu acho que ela havia acabado de nascer, ela estava enrolada em um tipo de lençol azul, e era muito pequena.
O difícil de entender essa lembrança, essas imagens que me perturbam é que eu não me acho em nenhuma delas, é tudo desconhecido pra mim
Vitória: Pai por que tu tá aí? Levanta - aquela voz doce acompanhada do toque em meu rosto me acalma me trás paz.
Júlia: Tu ama o papai Vitória
Vitória, esse nome me lembra alguém. Lembro de uma menina sapeca com uma risada gostosa, ela me chama de pai e sinto que fico feliz com isso. Eu consigo lembrar do nome, mas não vejo rosto na minha lembrança
Eu quero me mexer e saber quem é, quem é a mulher que me chama de amor todos os dias, eu tento mas não consigo lembrar.
Vem algumas coisas na minha mente mas nada que me faça entender tudo isso, onde eu estou e nem por que não consigo me mexer. Quem são essas pessoas, é tudo um quebra cabeça gigante com várias peças perdidas