Daniel
É difícil ter força de vontade e lembrar por que não quero me envolver com Kate quando ela me beija desse jeito. Sinto meu corpo todo reagir; meus lábios, que deveriam afastá-la, acabam cedendo. Liberto minha boca dela por um segundo, tentando colocar algum espaço entre nós, mas antes que eu consiga expressar meu arrependimento, ela me puxa de volta, colando nossos corpos outra vez. Suas mãos firmes me envolvem, e eu sinto meu desejo crescer, latejando de uma maneira que chega a doer.
Seus lábios são quentes, úmidos, e se movem sobre os meus com uma necessidade que me desarma. Mesmo louco de desejo, luto contra isso. Tento reunir argumentos para afastá-la, mas minha mente está um caos. d***a! Ela é jovem, recém-saída da adolescência, ingênua demais para entender no que está se metendo. Mesmo que eu tenha apenas dois anos a mais, já vivi o suficiente para saber que essa vida é uma selva. Eu não posso me iludir com ela, nem deixá-la se iludir comigo.
Seguro seus braços e a afasto com firmeza, lutando contra o impulso de puxá-la de volta para mim. Ofegante, faço uma carranca e encaro-a duramente, tentando quebrar o encanto.
— Não! — Digo entre dentes. — Vá para casa, Kate. Eu não gosto dessa sua insistência. A última coisa que preciso é arruinar a pouca paz que me resta.
Ela me olha em choque, claramente não esperando minha reação. Seus olhos azuis se tornam opacos, cheios de uma raiva misturada com mágoa. Mas eu sei o que preciso fazer. Quero que ela desista de mim, mesmo sabendo que isso vai doer em mim muito mais do que nela.
— Você é uma garota mimada, que nunca ouviu um "não" na vida. Filinha de papai. Pois bem, agora você tem seu primeiro "não".
As palavras saem cruéis, e posso ver o impacto delas em seu rosto. Ela desvia os olhos, lutando contra as lágrimas. E, por dentro, sinto um misto de raiva e desprezo — mas não é por ela, é por mim. Estou furioso com a minha própria situação, com a pobreza que me aflige, com a luta diária para conseguir pagar o aluguel. O peso da realidade me esmaga, e a última coisa que quero é uma testemunha para o meu fracasso iminente. Meu futuro é uma incógnita sombria, e tenho medo de que, em breve, eu possa acabar nas ruas, sendo julgado como mais um viciado qualquer, por vícios que nem sequer tenho.
Kate me encara em silêncio, absorvendo cada palavra minha. Seu rosto está pálido, mas, em vez de recuar, ela avança.
— Você está enganado comigo, Daniel. Eu não sou assim. — Sua voz é firme, mesmo que eu veja lágrimas se acumulando em seus olhos.
Eu rio amargamente, balançando a cabeça.
— No começo, tudo são flores — respondo, quase num sussurro. — Mas depois vem a rotina, o desgaste. O encantamento acaba, e sobra só a realidade. E a realidade sou eu, Kate. Uma catástrofe ambulante. Eu vou te arruinar.
— A escolha é minha! — Ela rebate, sem hesitar. — Eu sei o que eu quero. E o que eu quero é você.
Seu olhar é determinado, e sinto meu coração apertar. Ela está decidida, e eu estou fraco demais para lutar. Kate se aproxima e, antes que eu possa impedi-la, suas mãos seguram meu rosto, e ela me beija novamente. Há tanta doçura e desejo em seu beijo que minhas últimas defesas se desmoronam. Meus braços se fecham ao redor dela, puxando-a para mim, e toda a culpa e medo são substituídos por uma necessidade avassaladora.
Eu a empurro contra a parede, segurando seu rosto com minhas mãos, e a beijo com uma intensidade que nunca senti antes. Seus dedos se entrelaçam em meu cabelo, e um gemido suave escapa de seus lábios, fazendo meu corpo inteiro vibrar. Estamos perdidos um no outro, e o mundo ao nosso redor desaparece.
— Kate... — Murmuro contra seus lábios, ofegante. — Isso é errado. Você merece algo melhor, alguém que possa te dar uma vida de verdade, e tudo o que eu tenho são pedaços quebrados de mim mesmo.
Ela me encara, e seus olhos estão cheios de lágrimas, mas também de uma força inabalável.
— Eu não preciso de alguém perfeito, Daniel. Eu só preciso de você.
Ela me beija de novo, e, desta vez, não há mais resistência. Eu me rendo. Puxo-a para mais perto, querendo sentir cada pedaço dela contra mim, desejando que esse momento dure para sempre, mesmo sabendo que é uma ilusão.
Por um instante, deixo-me esquecer de tudo. Deixo-me perder nela, porque, por mais que eu saiba que isso só vai trazer mais dor depois, agora, neste momento, preciso dela mais do que de qualquer outra coisa.
Sinto Kate estremecer em meus braços, e por um instante, me permito afundar nessa sensação. É um consolo e uma tortura ao mesmo tempo, como se o universo inteiro estivesse suspenso em nosso beijo. Minhas mãos deslizam pelas suas costas, subindo até seu pescoço, enquanto ela me segura firme, como se tivesse medo de me deixar ir.
Seus lábios se movem desesperadamente contra os meus, e posso sentir sua urgência. É como se ela estivesse tentando me provar que o que sente é real, que tudo o que eu disse sobre nossa diferença de mundos não importa. E, no fundo, eu sei que ela acredita nisso. Que ela vê algo em mim que nem eu consigo enxergar. Isso me destrói e me cura ao mesmo tempo.
Finalmente, rompo o beijo, nossas testas encostadas, ambos respirando pesadamente. Minha vontade é de continuar, de arrancar suas roupas ali mesmo, de esquecer tudo o que falei, tudo o que estou tentando resistir. Mas o som do vento batendo na janela traz a realidade de volta como um balde de água fria. Minha pequena casa, vazia e sombria, parece assistir ao nosso momento como uma lembrança constante do porquê isso não pode funcionar.
— Você não devia estar aqui, Kate. — Minha voz é um sussurro, quase um pedido de desculpas.
Ela segura meu rosto entre as mãos, me forçando a olhar em seus olhos, cheios de determinação e ternura.
— Então me mande embora, Daniel. Olhe nos meus olhos e diga que você não me quer aqui.
Eu respiro fundo, minha garganta se aperta. Tudo dentro de mim grita para mentir, para afastá-la antes que ela se machuque ainda mais. Mas as palavras não saem. Em vez disso, fico em silêncio, preso nesse momento que deveria ser uma despedida, mas se transforma em algo mais.
— Você é teimosa. — Sussurro, sorrindo de canto, derrotado.
— E você é um i****a por pensar que eu desistiria tão fácil. — Ela responde, com um meio sorriso, enquanto passa os dedos suavemente pelo meu rosto, traçando as linhas duras e marcadas pela vida.
Meu peito aperta, e por um segundo, sinto um nó na garganta. É uma sensação nova para mim. Não é desejo, é algo mais profundo, algo que eu nem sei como nomear. Talvez seja esperança, talvez seja o medo de que, se eu deixar ela ir, estarei abrindo mão da única coisa boa que me apareceu em anos, contudo insisto.
— Não. Melhor você ir embora. —digo sem vacilar.