Separados

871 Words
Daniel Me deito cedo hoje. São dez da noite, e já estou na cama, exausto. Mas exausto de verdade! Sempre ouvi dizer que o que está r**m pode piorar, e é exatamente isso que tenho vivido. Por sorte — e muita luta — consegui pagar o aluguel este mês. Foi uma batalha, literalmente. Meu rosto, que por semanas pareceu o de um monstro, começa a se recuperar. Antes eu estava mais parecido com o filho do Frankenstein. Agora, os hematomas estão mais claros, num tom esverdeado f**o, mas pelo menos melhorando. O dono do restaurante onde trabalho começou a implicar comigo. Ele me julga um arruaceiro por causa das marcas no rosto. Precisei explicar que luto em ringues improvisados para ganhar um extra e conseguir pagar as contas. Francisco Valverde, o chefe, é um homem grosso. Me mandou ficar escondido na cozinha e sair pelos fundos quando terminasse o serviço, para não assustar os clientes. Fecho os olhos, e o pensamento inevitavelmente vai para Kate. Ela tem estado nos meus pensamentos o tempo todo. Meu peito se aperta de saudade, e me sinto afundar em tristeza ao lembrar que fui eu quem decidiu tirá-la da minha vida. Cada parte de mim deseja vê-la novamente. Virei as costas para a única mulher que mexe comigo de verdade. Como posso lidar com isso? Difícil! Tento me convencer de que foi melhor assim, repetindo isso como um mantra. "Foi melhor assim, foi melhor assim...", mas a verdade é que dói pra caramba. Como eu poderia trazê-la para a minha realidade tão dura e caótica? Me viro no colchão duro e soco o travesseiro, tentando afastar o desespero. Não! Foi melhor assim... Kate  A música "The Man Who Sold The World" do Nirvana ecoa no bar. Normalmente, essa é uma das minhas músicas preferidas, mas hoje não sinto vontade de dançar. Karen me chama para a pista, fazendo sinal com a mão, mas balanço a cabeça em negativa e dou mais um gole na minha vodca. Não sou de beber, mas hoje me sinto sem ânimo para nada, por isso pedi a bebida. Renata está mais à frente, dançando com um cara moreno, alto, de ombros largos e braços musculosos. Ele é lindo. Enquanto isso, Karen pula e dança, toda animada, e acaba vindo até mim. Ela é magra, o rosto lindo, dentes perfeitos. Se não fosse pela altura, ela certamente seria uma grande modelo. — O que há com você? Você ama essa música! — grita ela, tentando ser ouvida por cima do som. — Vai ficar aí se lamentando por um cara que não te quer? Esquece ele! — Não estou chorando. Só não estou com vontade de dançar. — Tento soar indiferente. — Não está chorando, mas está afogando as mágoas nessa bebida. Você nunca bebe! Ela está certa. Preciso sair dessa fossa em que me enfiei. — Ok, vamos dançar então. — Isso aí! Levanto e começo a caminhar em direção à pista de dança, tentando me animar. De repente, sinto uma mão tocar meu ombro. Me viro e, para minha surpresa, é Jake. — Oi — diz ele, sorrindo. Percebo que ele fica mais bonito quando sorri. — Oi — respondo, um tanto desconcertada. — Que coincidência nos encontrarmos aqui — comenta ele, iniciando a conversa. Não sinto muita afinidade com Jake, e isso me deixa um pouco desconfortável, como se estivesse fora do lugar. — Pois é. Estou indo para a pista de dança. Se quiser me acompanhar... — o convido. Prefiro dançar do que continuar conversando. — Claro — ele responde, e faz uma pausa. — Você está acompanhada? — Estou com uma amiga. Vem, vou te apresentar a ela. Ele acena positivamente. Quando me viro para procurar Karen, ela me encara com um sorriso malicioso, provavelmente já imaginando coisas que não existem. — Karen, esse é o Jake, filho de um amigo do meu pai. Estamos os três parados no meio da pista de dança, enquanto todos ao redor se movem ao som da música. — Oi — diz Karen, dançando. — Nunca te vi por aqui antes. Jake começa a dançar também, e eu faço o mesmo, meio no automático. — É a minha primeira vez aqui. Vim com meu primo, mas ele sumiu, ou talvez tenha se perdido — explica Jake. Karen sorri para ele. — Se perdeu, né? Mas pode ficar com a gente. — Vou aceitar o convite — responde ele. Dançando, me afasto de Jake e vou para perto de Karen. Me mexo de forma quase mecânica, enquanto minha mente viaja para longe. Fico me perguntando o que vi em Daniel, por que me sentia tão conectada a ele. Nunca conversamos de verdade. E no único dia em que fui atrás dele, ele me afastou. Talvez seja um sentimento que irradia, que não precisa de palavras para se manifestar. É como conversar em silêncio, entender sem falar nada... Dançamos até não aguentarmos mais. Percebo que Karen está interessada em Jake; eles já estão conversando animadamente em um canto do bar. Preciso avisá-la sobre ele. Jake troca de mulheres como troca de roupa, e não quero que ela se machuque. Ela me chama, e eu vou até lá, sentindo uma pontada de preocupação.
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