MIA
Quando cheguei na favela já era noite, passei no cabo (boca) para verificar se receberam o carregamento de drogas, estava tudo certo, então deixei meu gerente, que no caso era meu tio, e fui até a casa da Diega. Ela era minha melhor amiga, desde sempre. Entrei em seu barraco sem bater, afinal já sou de casa, ela estava deitada vendo televisão.
— c*****o, não faz nada. — Sorri. — Ai eu vi que é desocupada mesmo.
— Já arrumei a casa toda viu amiga. — Ela disse se levantando do sofá e abrindo um sorriso simpático.
— Vamos em algum barzinho? Tô precisando me distrair.
— Claro meu amor, só vou tomar um banho e trocar de roupa.
— Daqui a pouco passo aqui pra te buscar.
Ela assentiu e eu sai de sua casa. Atravessei a rua e caminhei alguns minutos até finalmente chegar em casa.
Tomei um banho de mais ou menos quinze minutos,fiquei pensando em como minha vida mudou da água pro vinho, senti uma saudade enorme de meus pais e uma vontade de chorar apareceu, segurei as lágrimas e saí do banho. Me trajei com uma calça jeans de lavagem clara, uma blusa preta em cima do umbigo e por cima dela coloquei uma jaqueta de couro rosa, calcei um salto com a cor nude de bico fino, me maquiei e prendi o cabelo em um r**o de cavalo. Peguei minha bolsa Victor Hugo, coloquei meu celular, meu nextel, meu revólver, dinheiro e outras coisas mais. Fui até a garagem e escolhi o carro, iríamos de Veloster branco. Coloquei a música Vida bandida II do Mc Smith, coloquei o volume no máximo e fui para a casa da Diega. Buzinei e em um curto espaço de tempo ela saiu de casa e entrou no carro.
— Pronta para partir pro crime ? — Sorri maliciosa.
— Sempre estou amor. — Ela sorriu também.
— Mas e aí, me conta essa história do seu irmão.
Contei cada detalhe pra ela, que me ouviu atentamente e me esperou terminar antes de fazer qualquer pergunta. Graças a Deus ela não fez nenhum comentário falso como todos que dizem que sentem muito ou que tudo vai melhorar. Ela apenas assentiu e disse que os ricos são esnobes assim mesmo. Nós decidimos ir na Boate 021 que iria ter show da Mc Britney.
Vi um Honda Civic modelo novo todo modificado estacionado na minha frente, só que meu carro dava de mil a zero no do playboy que era dono daquele Civic. A Diega e eu saímos do carro em cima do salto, chamando toda atenção, foi quando os donos do carro da frente saíram de dentro do mesmo e eu os reconheci no mesmo instante. Será que uma pessoa pode ser tão azarada quanto eu? Eles me olharam e pela sua expressão facial estavam surpresos e não muito contentes. Meu irmão deu a volta no carro por trás, babando no meu Veloster, e passou direto. O amigo dele ficou babando mais em mim do que no carro, será que ele não entendeu o recadinho? Pisquei pra ele, que sorriu e balançou a cabeça pros lados e entrou sendo puxado pelo Matheus, eu graças a Deus nem sei o nome do playboy. A Diega ficou observando a cena, mas não comentou nada. Nós entramos de graça porque minha amiguinha conhecia o segurança que estava cuidando da portaria... "conhecia". Vocês nem fazem ideia do quanto eu amo boates, até mais do que os bailes funk, é um lugar abafado, com as melhores iluminações, e o bar só tem as bebidas mais perfeitas. Encontramos alguns amigos de Niterói e ficamos junto com eles, eram seis ao todo, PH, Pixote, Menor, Anita, Loirão e Indiana, fico impressionada com a criatividade desse povo pra arrumar apelido. Ri com meus pensamentos e fui até o bar, sozinha mesmo. Pedi um copo de vodka pura mesmo. Estava voltando com o copo na mão, remexendo o corpo lentamente ao som da música e me distrai, não sei como, e acabei esbarrando em um garoto e derrubando parte da minha bebida nele, comecei a implorar que me desculpasse, porque quando meus pais eram vivos me deram educação. Passei a mão na sua blusa que estava um pouco molhada, ainda murmurando pedidos de desculpa, mas quando olhei pro seu rosto... MEU DEUS! Eu devo ter jogado pedra na cruz, só pode. Com tantos garotos para eu esbarrar tinha que ser logo esse playboy metido a b***a? Respirei fundo e fiquei olhando pra sua cara com uma expressão nada boa.
— Você está me seguindo, só pode. — Ele revirou os olhos. — Garota porque você não evapora ?
— Querido, eu também não gosto nenhum pouco de ficar te encontrando a todo instante.
— Olha o que você fez! Minha blusa está arruinada, sabe quanto custou? Mais de trezentos reais.
— Eu já pedi desculpas c*****o. — Fiz uma pausa. — Ah! Então o problema é o dinheiro? Não se preocupe. — Abri minha bolsa e tirei um bolo de notas de cem e atirei pra ele. Devia ter quase o dobro ali. Ele ficou me olhando surpreso e sem palavras.
— Sabia que meus pais são da polícia? E eu sou estagiário no departamento? Pelo que vejo você é dona de um morro, tem porte de armas ilegal, trafica... interessante.
— Amor, você não me conhece nem a metade. — Dei um leve tapinha em seu rosto. — E sabe que se me denunciar, eu faço da sua vida um inferno.
— Obrigado por estragar minha blusa boneca, mas eu já vou indo. — Ele apertou meu queixo e se virou, em seguida foi andando até meu irmão e os amigos. Quando eu pensei que estava livre daquele mala, ele se virou. — Psiu! A propósito, meu nome é Brian.
Revirei os olhos e caminhei em direção aos meus amigos.
Ficamos assistindo ao show enquanto fazíamos uma pequena competição, era apenas para ver quem era mais "forte". O que conseguisse virar todos as seis doses de tequila levaria duzentos reais. A Diega virou dois, assim como o Pedro Henrique e o Menor. A Anita e a Indiana viraram três. Eu virei quatro. E a Loirão e o Pixote viraram os seis. Pagamos eles e eu fui ao banheiro em seguida. Entrei em uma das cabines e fiz o que tinha que fazer. Saí e lavei minhas mãos, olhei no espelho e minha maquiagem havia borrado, limpei-a com a ponta dos dedos e em seguida retoquei meu batom. Havia algumas garotas conversando do meu lado, elas falavam de dois garotos, uma delas chorava enquanto a outra tentava a acalmar. Pelo que entendi o ex namorado dela estava lá na boate com outra, essas meninas de hoje em dia fazem tempestade em copo d'água. Como eu queria ter perdido um namorado e não meus pais. Balancei a cabeça em sinal negativo e sai do banheiro.
Senti uma leve tontura e resolvi ir embora pois o turno da manhã no cabo seria meu. Me despedi do pessoal e caminhei em direção a saída da boate quando esbarrei, de novo, no meu irmão e em seus amigos. Já estava ficando chato, na moral. Resolvi ignorar, respirei fundo e continuei caminhando em direção a saída. Por incrível que pareça eles também estavam saindo. Andei depressa em direção ao meu carro e destravei o alarme. Eu já ia entrando no mesmo quando escutei uma das garotas daquele grupo ridículo de esnobes mandar uma indireta, ou melhor, era quase uma direta só que ela não sabia meu nome.
Ela disse:
— Tenho nojo dessas faveladas que vem para nossa área querendo ser alguém. — Ela riu. — E ainda usam o nome do lixo da família para conseguir grana.
Se ela tivesse apenas falado favelada tudo bem, porque não renego meu lar, mas ela disse família, ela tocou em uma ferida muito grande. Fechei a porta do carro novamente e caminhei até ela, coloquei a mão no seu ombro e ficamos frente a frente.
— Você não viu o que eu fiz com seu amiguinho não? — Ela engoliu seco. — Porque eu posso fazer bem pior com você sua rapariga esnobe. — Tirei a arma da minha bolsa, e destravei. Pareceu que não ouvia som nenhum na rua, porque eu ouvia cada batimento cardíaco daquele ser desprezível em forma humana. Coloquei a arma na cabeça dela, qualquer encosto no gatilho iria fazer um estrago dos grandes. — Se você tocar no nome da minha família mais uma única vez, eu estouro seu miolos. Estamos entendidas? — Me dirigi a ela calmamente, o que só a deixou mais nervosa. As lágrimas escorreram do seu rosto e ela começou a soluçar. Puxei seu cabelo com tanta força que seu pescoço inclinou. — Me responde quando eu falo com você! Estamos entendidas? — Ela assentiu com a cabeça. — Que bom então meu amor. — Travei a arma novamente e a guardei na bolsa. Olhei em direção a amiga dela e aos meninos, eles cobriam a boca de desespero, o mais despreocupado era o Brian, que ainda era desaforado porque ficava me olhando com uma cara de s****o. Um dia eu ainda dou um tiro na cabeça dele. Respirei fundo controlando as lágrimas. Era difícil pensar ou falar nos meus pais, eu sempre me estressava ou ficava deprimida.
Caminhei até meu carro, entrei no mesmo, liguei o som no último volume e deixei tocar alguma música r**m o suficiente para que eu nem me lembrasse qual era. Liguei o carro e saí em alta velocidade.