1° Capítulo - Tenho um encontro nada amigável com o sangue do meu sangue

1400 Words
MIA Vamos ver, por onde eu começo? Ah sim, as últimas palavras dos meus pais: eles me pediram que cuidasse do morro, se desculparam por não serem pais perfeitos (o que é uma tremenda idiotice porque eles eram os melhores pais que alguém poderia querer) e por me fazerem carregar aquele fardo. Mas aquele era meu lar, eu tinha a obrigação de protegê-lo. Eles também me contaram que eu tenho um irmão, que mora com meus avós, me disseram para procurá-lo e pedir sua ajuda, contar-lhe quem eram seus pais. Tentei fazer tantas perguntas, mas as lágrimas e o soluço não deixavam eu me expressar corretamente. E em poucos segundos, meus pais se foram. Era duro aceitar que eu não os veria nunca mais, que não seria mais a princesinha ou o orgulho da família. Mas eu tinha responsabilidades e a partir de agora uma nova vida. Bom, mas tinha uma coisa boa nisso tudo, o dono da Rocinha e a maioria do seus soldados também morreram na troca de tiros, então aquela velha história de quem mata dono vira dono não se aplicou ao meu futuro morro. A favela inteira ficou de luto. Eu fui forte. Não chorei depois da morte dos meus pais, não chorei no velório, não chorei no enterro, e nem mesmo no resto da semana. Meu tio que também morava no morro me ensinou tudo que eu precisava saber. Me explicou sobre carregamento de drogas, sobre pagamentos, como se manuseia uma arma (até porque só porque sou filha de dono de morro não quer dizer que eu tenha nascido sabendo essas coisas)  Depois de tanto revirar as gavetas do meus pais, encontrei o endereço de meu irmão, seu nome era Matheus Sampaio. Típico nome de ricos metidos a b***a, mas tudo bem não o julguei antes de o conhecer, que foi um péssimo erro.  Fazia mais ou menos oito dias que meus pais tinham morrido e que o morro estava sobre o meu comando, minha personalidade já havia se alterado muito, senti o peso da responsabilidade e do sofrimento durante todos os segundos dos últimos dias. Enfim, foi nesse dia em que fui procurar meu irmão; era por volta das seis da tarde, o clima estava razoavelmente agradável então vesti uma roupa leve, escolhi uma arma pequena e de fácil manuseio para levar comigo, só para o caso de ocorrer algum problema no transcurso até sua casa. Fui de moto, escolhi uma 600 cilindradas rosa porque é fofa. Subi na mesma, coloquei o capacete, enfiei a chave e girei, puxei o pezinho da moto para cima e sai numa velocidade extremamente alta. O vento bagunçava meus cabelos e por incrível que pareça me senti bem, eu estava totalmente livre. Por volta de quinze minutos cheguei em frente uma mansão maravilhosa em um bairro super chique, ela era toda branca com pequenos detalhes dourados nos enfeites, como no portão, em lâmpadas e detalhes na pintura das paredes. Estacionei a moto em frente a casa porém com passagem livre da garagem e com o capacete na mão fui até o portão. Toquei o interfone e uma empregada me atendeu, pedi para falar com Matheus Sampaio e ela abriu o portão e veio ao meu encontro, me disse para ir até a área da piscina que ele estaria lá, agradeci e andei em direção ao local. O sol estava quase se pondo e uma leve brisa corria pelo ar, me arrependi um pouco por ter ido até lá de short e camiseta, vi três garotos e duas garotas, abaixei um pouco mais o revólver na bainha do short e puxei a camiseta para baixo. Dois dos garotos estavam na piscina, um estava pegando cerveja no freezer que tinha próximo às cadeiras de sol, e as duas garotas estavam deitadas nas mesmas. Eles pararam de conversar e pousaram os olhos sobre mim, tirei o óculos da face e o empurrei para cabeça, abri um sorriso e continuei a caminhar até eles.  — Olá! — Esbocei um sorriso e eles fizeram uma expressão nada amigável. — Não me olham com essas caras de "o que essa favelada está fazendo aqui?". Eu estou procurando o Matheus. Todos ficaram boquiabertos, o garoto de cabelos castanhos e olhos verde-mar que estava em pé pegando cerveja semicerrou os dentes e se dirigiu diretamente a mim com uma expressão confusa no rosto: — Sou eu. — Ele me olhou dos pés a cabeça. — Quem é você ? — Meu nome é Mia Divine, e eu preciso ter uma conversa em particular com você. — Dei ênfase em particular. Ele assentiu com a cabeça e me conduziu para dentro da casa, deixando seus amigos na piscina (detestei todos), ele pediu para que eu me sentasse no sofá da sala de estar, era bonita, bem ampla e com decoração vintage, os sofás eram de veludo branco, com algumas almofadas pretas do mesmo tecido sobre eles. As paredes eram de cor escura, acredito que era tabaco, e quadros famosos estavam por toda a parte. Ele pediu a empregada que nos trouxesse um suco e se sentou de frente para mim. — É um prazer conhecê-lo! Você é bem diferente do que imaginei. — Fiz uma pausa. — Como eu disse, sou Mia Divine. Tenho dezenove anos e sou dona da favela do Mandela. — Nessa hora me lembro como ele arregalou os olhos e tossiu, foi bem engraçado. E antes que ele perguntasse alguma coisa, eu prossegui. — Eu sou filha de Ryan e Alice, e também sua irmã. Fomos separados quando pequenos, você ficou com nossos avós e eu com nossos pais. Nossa mãe, Alice, largou toda essa vida luxuosa para viver em uma favela com um bandido porque se apaixonou por ele, e nós dois somos frutos desse amor. — Respirei fundo. — Mas infelizmente eles morreram, a pouco mais de uma semana. — Espera, você está me dizendo que sou seu irmão  Filho de favelados? — Ele fez cara de nojo. Juro que se eu não estivesse dentro de sua casa eu teria socado seu nariz, mas ao invés disso respirei fundo e prossegui. — Guarde seu preconceito nojento para você. Antes de nossos pais morrerem eles me pediram para te procurar. — Me procurar para o que? Acha que vou liberar meu dinheiro pra essa porcaria de favela? — Na hora não me segurei, dei um soco com toda força na mesa que havia entre os sofás, o vidro trincou e os olhos de meu irmão se arregalaram mais. — Não vim aqui pedir seu dinheiro! Vim para te contar sua história, lhe dizer quem são seus pais, porque eu aposto a minha favela que nossos avós nunca te disseram nada, e que você nem sequer se deu ao trabalho de perguntar quem são seus pais. Até porque você vive no luxo, na mordomia, porque iria se preocupar com uma coisa que não faz falta na sua vida? Ou melhor, será? Será que você nunca sentiu falta de um amor paterno ou materno? — Nessa hora ele baixou o olhar. — Mas não quero sua ajuda, seu contato comigo, achei que poderíamos ser irmãos, que você poderia me apoiar. Mas já vi que você é só um riquinho mimado. Se não se importa, estou de saída. — Me levantei e sai pela área da piscina. Escutei passos atrás de mim, seus amigos que antes estavam na piscina agora estavam de pé conversando com as duas garotas, um deles, que era de pele branca, olhos cor de âmbar melancólicos e cabelos castanhos com algumas luzes me olhou dos pés a cabeça e mordeu os lábios, fiz continência para ele e continuei andando em direção a saída da mansão. Mas para minha infelicidade ele veio atrás de mim e me puxou pela cintura colando nossos corpos. Na mesma hora me desgrudei dele e o peguei pelo braço, o girei em 180 graus no ar, lhe fazendo voar por cima de mim e cair no chão bem à minha frente. Em seguida coloquei meu joelho sobre seu tórax e meu braço em sua garganta, com o braço livre tirei a arma da bainha do short e coloquei na sua cabeça. Pisquei pra ele. — Amorzinho, não te dei essa ousadia, da próxima vez você será um homem morto. Estamos entendidos? — Sorri desafiadora. Ele assentiu com a cabeça e todos ficaram assustados, o soltei e estendi minha mão o ajudando a se levantar. Em seguida saí daquela casa sem olhar para trás.
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