Cap 4:Amor e Ódio

2033 Words
A música alta adentravam meus ouvidos causando-me um leve incômodo,pois anos dentro de uma cela e uma penitenciária na qual não se ouvia nada além de conversas e discussões de presidiárias, deixariam qualquer ouvido sensível. As luzes faziam-me sentir o quão sensível meus olhos estavam,porém ignorava aquele fato e focava apenas em minha bebida sobre aquela mesa e a garrafa em minha frente ao lado do copo de whisky. As pessoas dançando na pista,uma se encostando nas outras enquanto o suor se formava em seus corpos,a batida eletrônica e os olhares das pessoas ao meu redor,eram algo que não me importava, pois meus pensamentos estavam distantes e em uma distância considerável. Os olhares daquelas pessoas ao me verem em suas frentes, emoção indescritível em seus olhos e a surpresa que os dominavam era algo que me chamou a atenção e me causou a sensação de que tudo poderia não ser como o imaginado,poderia haver alguma peça que não se encaixava naquele jogo. Mas minha mente e coração lembrava-me de tudo que passei e senti,de cada lágrima que derramei enquanto implorava para que alguém aparecesse e dissesse que tudo ficaria bem e que estariam ali para me apoiar, fazia-me lembrar de quantas noites desejei ter alguém me esperando do lado de fora daqueles portões quando minha pena tivesse sido chegado ao fim. Era fraqueza sentir amor e ser dependente de alguém, é fraqueza sentir misericórdia e é sua destruição acreditar nas pessoas. Com as chaves de meu carro em mãos, levanto-me daquela cadeira e saio daquela boate na qual me pertencia desde os dezesseis anos,me pertencia desde que Luke exigiu para o juíz todos os meus pertences. Passando entre aquelas pessoas,sigo para a saída da frente e passo pelos seguranças que demonstravam respeito a cada momento que tinham minha presença,seja por segundos ou horas. Me aproximando do Audi R8 coupé V10 plus - um dos muitos carros que estavam em minha garagem - entro e saio daquela rua. Com as janelas abaixadas e a brisa fria batendo contra meu rosto juntamente a respingos de gotas de chuva, observo a paisagem passar em forma borrada por meus olhos,pois a velocidade que fazia o carro andar,seria impossível ter uma visão limpa de tudo que aquela cidade proporcionava. A cada segundo,cada minuto que passava naquele lugar, fazia-me reviver o quão estúpida estava sendo a anos atrás,o quão ingênua me deixei ser. Londres foi a minha ruína,foi minha maior destruição e ao menos percebi isso,apenas acreditei que poderia viver uma vida tranquila,estável e feliz,acreditei que após um abandono,maus tratos daquela que deveria ser minha mãe e um inferno descrito de todas as formas possíveis,teria enfim o conhecimento do que seria a verdadeira felicidade. Tudo começou com Erick, começou no momento em que confunde aquilo que não sentia a anos,mas desandou quando retornei para esse lugar,para essa maldita cidade que carrega meus maiores segredos e piores pesadelos. Amizade, carinho e amor são coisas que destruíram quem fui e construíram em quem me tornei. Aquela família matou a Malia, destruiu a fracassada e ingênua,mas também proporcionou o meu renascimento,proporcionou o ódio que me domina e a amargura que me sufoca. Rancor não chega nem perto do que carrego em meu coração. Onze da noite, atravesso os portões de minha casa e estaciono meu carro em frente a entrada. Sem me importar com a chuva caindo,saio do veículo acionando o alarme e subo as escadas que davam na porta. Apesar de nunca ter feito questão e nunca ter me importado com luxo e entre outras coisas que o dinheiro pode proporcionar ao ser humano,esse foi o único imóvel no qual adquiri por motivos intencionais,foi a única coisa que pude me identificar e idealizar um futuro. Fechando a porta atrás de mim,soube que havia tido uma queda de energia devido ao m*l tempo,porém ao sentir o perfume masculino naquela sala de estar, empunhei a arma em minha cintura e apontei para a pessoa sentada em meu sofá enquanto segurava um copo com bebida. Não precisaria de muito para desvendar quem era,pois seu cheiro era irreconhecível e sua presença possuía algo que me alertava. — Em muitas vezes que passei por essas estradas,me perguntava quem poderia ser o dono dessa mansão escondida por trás daqueles portões. Confesso que me surpreendi — sua voz grave preenche aquele ambiente — vejo que suas corridas te proporcionavam uma quantia extraordinária. Em passos cautelosos, aproximo-me mantendo minha arma apontada em sua direção e no momento em que o gerador foi ativado,tive a visão perfeita de seu corpo. Me colocando à sua frente com a arma ainda em mãos,o vejo com um cigarro entre os dedos e a bebida pela metade enquanto seu olhar se mantinha sob a garrafa de whisky sobre a mesinha de centro. — Como conseguiu entrar? Deveria estar curtindo seus últimos dias de vida — com sarcasmo em minha voz, sento-me na poltrona ao lado da lareira. — Gostaria que meus últimos dias fossem ao seu lado,fossem sentindo seu toque,o calor de seu corpo contra o meu,a forma que me beijava demonstrando sentir algo intenso por mim...— com o olhar vago,se relembra daqueles momentos que fiz questão de menosprezar — gostaria que fosse com a menina mulher que amei e ainda amo. Rindo de forma sarcástica e descrente em suas palavras,o encaro fazendo-o devolver o olhar,a única diferença é que o meu abrigava desprezo,a incredulidade e o ódio que percorria por todas as minhas veias, enquanto o seu demonstrava sentimentos inúteis e que lhe tornam fraco. — Me ama? — questiono obtendo sua confirmação — a que ponto? Você mataria por mim? — Sem pensar duas vezes — afirma voltando seu olhar para a bebida. — Engraçado! Esse seu amor hipócrita não permitiu uma visita na penitenciária, não foi o bastante para comparecer em meu julgamento e não foi o suficiente para dizer desistir da p***a da minha existência! — Me altero engatilhando minha arma e mirando em sua cabeça — me dê um motivo para não puxar o gatilho e lhe matar agora? Não o mataria naquele momento,pois assim como faria com os outros,tinha planos para acabar com sua vida. No auge da minha vida, ninguém seria convincente o bastante para me fazer desistir de meus planos e de minha pequena e descontraída vingança, pois o ódio que sinto e o desprezo que criei durante todos esses anos, não seriam esquecido como um vacilo qualquer, não seria perdoado facilmente, somente com o sangue de todos derramado sobre o chão que piso. — Eu ainda tenho suas mensagens,seus emails e declarações... Olhe para a tatuagem em seu corpo e lembre-se do momento em que a revelou para mim,olhe as fotos em seu closet. Tudo isso dará um motivo para enxergar a verdade e entender que há um motivo,uma explicação para nunca termos lhe procurado — confiante em suas palavras,sinto a tranquilidade em seu corpo e naquela situação. — Você ainda não entendeu? Não existe passado com você ou com qualquer outra pessoa, não existe nada além de minha satisfação em poder exterminar ratos e baratas como vocês — esbravejo sem me sentir abalada com suas informações. — A Malia existe em você,a minha menina está em algum lugar nesse corpo repleto de ódio infundado,pois você não sabe dos nossos motivos, não sabe o que nos fez te abandonar... Disparando a arma próxima a seu ombro acertando o sofá, fazendo a bala o perfurar e acertando minha parede, demonstro estar exausta daquele assunto inútil e sem fundamento. Tendo seu olhar sobre mim, sorrio de forma psicopata e me levanto da poltrona pegando um cigarro no maço sobre a mesinha de centro. — Aproveite seus últimos dias,pois em breve estarei em sua porta pronta para puxar o gatilho e comparecer em seu funeral me passando por alguém inocente que desconhecia os acontecimentos de sua vidinha miserável. Com o cigarro entre meus lábios e arma em mãos,sigo em direção às escadas e subo tranquilamente aqueles degraus. Não me abalei e isso não aconteceria em momento algum,pois o que nutri,o que adaptei em minha vida por todos esses anos,era indestrutível e forte o bastante para não existir culpa e sequer possibilidade de perdão. Adentrando meu quarto, encontro um notebook sobre minha cama, exatamente o mesmo aparelho no qual possuí a anos atrás e que foi o receptor ideal para fazer uma despedida melancólica em relação a Erick. A tela virada em minha direção exibindo o e-mail de anos atrás,um dos muitos que mostrei o quão fraca era, faz-me aproximar pegando o notebook lendo aquelas palavras: "Erick, Não sei o que aconteceu, não consigo encontrar uma resposta plausível para justificar sua forma de me ignorar, sua indiferença em sequer me responder,apenas gostaria de saber o que está acontecendo,o que fiz de errado para agir desta forma comigo. Eu tentei te ligar,te mandei inúmeras mensagens que nunca foram abertas, te mandei incontáveis e-mails,tudo na esperança de ouvir ou ler uma justificativa como “Oi, Malia! Então, não quero continuar com isso" ou “ Não quero nenhum contato com você". Essas são frases que doeria bem menos do que esse silêncio, doeria bem menos do que a maldita mágoa que me sufoca ao ver que não há nenhuma resposta sua. Quando você me ligou,pensei que cumpriria sua promessa, pensei que realmente era importante para você,mas ao lhe ver me ignorando,lhe ver me esquecendo como fez a anos atrás,soube que jamais poderia confiar em suas palavras,sabia que todas as vezes que me olhasse no espelho,a sua feição viria em minha mente,me torturando,me destruindo lentamente. Em uma de nossas noites juntos, você disse não se orgulhar de estar comigo, você disse se arrepender do momento em que deixou tudo ir além do devido,mas hoje,quem diz se arrepender amargamente sou eu. Há um tempo atrás,Logan me disse algo que sempre carreguei em minha lembrança: " Não importa o que acontecer, a vida lhe trará as melhores respostas,as melhores soluções e os melhores amores". Agora, vivendo tudo isso,soube que você não era a minha resposta, não era a minha solução e... não era o meu melhor amor. Você nunca sentiu isso por mim, não como filha e nunca como mulher. Me abri pela primeira vez,deixei que entrasse em meu coração e me decepcionei,me magoei intensamente,tudo para descobrir quem você é realmente de verdade. Mas a verdade é que não me importo,pelo menos não mais... E,embora saiba que isso nunca te importou,quero que nunca se esqueça;no começo,desejei que você fosse o pai que me fez falta,mas depois,eu me interessei pelo homem que você é,era apenas atração no início,mas com o passar dos dias,algo aumentou,mas o fato é,saiba que sempre haverá aquele mesmo sentimento,porém estou abrindo mão dele,estou abrindo mão da pessoa que me tornei somente por você,estou abrindo mão da garota que deixei nascer em Londres,mas que irei mata-la, pois ela jamais deveria ter sequer existido. Somos duas pessoas normais como qualquer outra,mas não podemos agir assim, não podemos simplesmente virar as costas para o mundo e viver algo que sabemos não dar certo, não podemos ver a vida como desejamos,eu não posso ver a vida como imaginei. Entrei na sua casa,vivi dias ruins e dias bons, encontrei 30% da paz que sempre procurei,me permiti me apaixonar pela primeira vez,mesmo que tenha sido pela pessoa errada,me vi idealizar como seria abandonar tudo,como seria lhe contar meus maiores segredos. Mas hoje,lhe escrevendo esse pequeno texto via e-mail,sei que em hipótese alguma deveria ter me aberto,nunca deveria ter acreditado poder haver algo bem mais que esse nosso sentimento fraterno. Sou jovem com mente adulta,acredito que tudo tenha sido esclarecido,acho que está mais que na hora de lhe dizer um " até logo" ou um"adeus" ,pois depois dessa sua frieza,juro que não quero lhe ver em minha frente. Chegou a hora de voltar a ser a Malia que sempre fui,a Lia que desembarcou no aeroporto de Londres,a Malia que o mundo conhece. Seja feliz Erick,pois acredite, embora esteja lhe odiando intensamente, desejo-lhe toda felicidade que possa encontrar em sua vida. Mesmo meu coração chamando por ti, não permitirei meu raciocínio dar razão a esse órgão que tanto se machuca, não permitirei meu coração tomar frente ao comando de meu cérebro... Com meu eterno amor e ódio.... Malia Miller..."
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