Fiquei durante uma hora no banheiro, vinte minutos dos quais olhando a minha imagem ao espelho, tinha um pequeno corte no lábio, um olho n***o, e uma série de manchas rochas por todo corpo. Toquei suavemente nos meus lábios lembrando de como ele havia os tomado, o meu sexo pulsou com aquela imagem.
— Nihara, você está louca... — murmuro correndo para dentro das mantas.
Tão logo deitei na cama, fui tomada novamente pelo medo e horror que passei quando Jasper tento abusar de mim, fechei os olhos com força pedindo numa prece silenciosa para que aqueles pensamentos fossem substituídos por outros melhores. Pense em coisas boas Nia... O cheiro da terra molhada, o sorriso de Maddie, o afago de Carolinne, respiro fundo — o toque dele, as sensações que ele despertava em mim, o seu beijo. — um gemido escapa dos meus lábios. Abro as vistas e sorrio com aquele pensamento. Estou cansada demais e com olhos pesados, mais alguns segundos e sou levada pelo sono.
(…)
Fodshan (Cheshire), Julho de 1978
Num piscar de olhos o dia tinha amanhecido, pelo menos foi a impressão que tive. A luz solar que incidia pelas janelas ao amanhecer chegava a doer de tão forte que era, processo inverso acontecia às noites, da mesma forma que as manhãs eram claras, as noites eram demasiado escuras. Sentia-me como se tivesse sido atravessada por um caminhão e para piorar estava fervendo de febres. Mas não conseguia parar de pensar no homem com os olhos como o oceano.
Lembrava de ter visto alguém com os olhos iguais aos dele na vila, o senhor da mercearia. Mas aquele homem devia ser alguém demasiado importante e era extremamente bonito, a única coisa que pareciam ter em comum eram os olhos.
Fiz a minha rotina, sem ter como esconder aquele olho n***o, ao chegar à mesa do café só havia Maddie, nem sinais da Ella ou da Nora. Era sábado, não tinha muito o que fazer, o tio avô de Maddie ao meio dia veio em sua busca, ela iria ficar alguns dias em Cumberland. Eu só fiquei sabendo disso quando Ella voltou da vila com esse mesmo tio.
Não vi Jasper, estava esperando ter um momentos com Ella, para explicar o ocorrido e fazer participação na polícia. Encontrei-a na sala separando alguns papéis, acreditava se tratar de faturas.
— Ella desculpa. Tem um momento? — pergunto.
— Que seja breve Srta Malika.
— É um assunto delicado. — ela franze o sobrolho e indica uma das cadeiras onde eu sentei-me. — Eu precisava falar sobre o Jasper... — ela fecha o rosto escondendo a indignação por de trás dele.
— A menina não sabe? — pergunta.
— Não sei o que?
— O Jasper foi encontrado essa manhã na porta do hospital, foi torturado e...
— E.... — falo aflita, as minhas mãos começaram a transpirar e um temor maior assolou os meus pensamentos.
— Foi castrado. — despeja.
— Ele... Ele... foi o quê? — levantei-me, aflita.
— Foi castrado a sangue frio. A menina não imagina como foi horrível, os enfermeiros encontraram o seu sexo junto a ele desacordado, os médicos fizeram o que puderam, mas ele nunca mais voltará a... — gesticula constrangida. Eu sinto-me tão enjoada.
— A....
— Ele não poderá se relacionar com ninguém. — fala olhando curiosa pra mim. — Não sabia que a menina e ele são tão chegados...
— Não somos Ella. Ele... ele tentou me violentar na noite passada. — falo e ela se levanta horrorizada.
— Ele fez o que??
— Tentou fazer-me sua à força!! — falo com a voz embargada.
— Oh minha filha, a menina está bem? — pergunta evidentemente preocupada.
— Sim, ele... não conseguiu. Eu fugi. — respondo.
— Foi ele que deixou o seu olho nesse estado?
— Sim.
— Eu bem que avisei a Carolinne sobre os seus hábitos em se sentar tarde da noite no alpendre, temendo que alguma coisa de errado acontecesse com a menina. — exclama.— Olhe só o que teria acontecido!
— Eu nunca pensei que ele fosse chegar ao ponto de me agarrar a força!
— Nihara, a menina não tem alguma coisa haver com o que aconteceu com Jasper? Tem?? — seu tom mudou drasticamente para o mais duro, os olhos arregalados mostravam que tal como eu ela estava com medo da resposta que eu daria.
— Não, não! Eu fugi pro meio da mata, voltei muito tempo depois. Não quis acordar a senhora, mas Jasper já não estava aqui quando voltei. — falo sincera. Ela me abraça em desculpa.
— Desculpa. Você precisa esconder essa mancha, à polícia virá investigar isso e não será bom pra ti se verem o seu rosto e você contar essa mesma história pra eles. Irão te condenar apenas por... — hesita. — Por ser...
— n***a. — falo. — Eu sou culpada de tudo apenas por ser n***a. — constato. Ela baixa a cara envergonhada. — Porquê acredita em mim Ella? — ela sorri melancólica.
— Porque se eu não ficar do seu lado, mais ninguém irá ficar! Prometi a Carolinne que estaria do seu lado sempre. — quis dizer que havia mais alguém que acreditava e que cuidava de mim, mas estaria colocando-o na mira da polícia. Não quero que nada de m*l aconteça com ele. — Além do mais, a menina é tão inocente quanto Maddie, não tem maldade. As vezes até, penso que Maddie é mais perigosa que a Nihara... — nos rimos da sua última frase.
— Ela não é uma criança má. — falo em defesa de Maddie.
— Não é! Eu sei... Apenas gosta de colocar todo mundo fazendo as suas vontades. A Nihara é um bom exemplo pra ela, por isso, ela é amorosa.
— Sim.
— Vai colocar alguma coisa nesse rosto, não deixe que Nora a veja toda marcada. Procure usar roupas que tapem seus braços e pernas.
(…)
Se Ella não tivesse dito aos policiais que eu estava doente, provavelmente eles já teriam me dado como culpada, fiquei tão atrapalhada quando começaram a perguntar a que horas me deitei, se não tinha visto nada ou alguém estranho na propriedade e se não saí de casa depois da hora do recolher... quase partia a língua por ter palavras presas na boca, do tipo toda verdade sobre o que realmente havia acontecido, Ella respondeu que eu estava febril, e ela estava a controlar-me todo esse período. Um dos policiais tentou contestar e Ella mandou ele mesmo medir a minha temperatura.
Após isso, voltei pra cama, não tinha Maddie para entreter e Nora estava o tempo todo soltando no ar indiretas sobre os possíveis culpados com o que havia ocorrido com Jasper. Não havia um único culpado se não ele próprio, mas não abri a minha boca, para evitar troca de farpas com ela.
Nem mesmo com os analgésicos que Ella me deu a febre baixava, não sentia nenhuma dor, só o frio nos ossos. Eram vinte e duas e quarenta, não havia vivalma em pé na mansão, e com o Jasper entravado na cama do hospital podia novamente voltar a me sentar no alpendre sem medo e continuar com a minha leitura do Conde Monte Cristo, já andava para terminar há vários dias. Contudo não podia, pelo menos não antes dessa febre baixar.
Era o quarto banho gelado que tomava hoje, pelo menos agora não tremia tanto, olhei para o espelho a espera que aquela mancha n***a sumisse como por magia, fiquei irritada, não me achava uma pessoa feia, sempre tive cuidados com a minha imagem e a minha aparência, mas o facto de usar cabelos curtíssimos ou não usar de todo, havia pessoas que me consideravam menos feminina, nunca me importei com isso, mas agora, estranhamente começava a me preocupar em estar ou não bonita na próxima vez que ele surgisse.
Enrolei a toalha, não fazia sentido algum continuar lamentando por um olho n***o quando o causador já estava pagando por isso e não só, me sentia até um pouquinho culpada, mas aí lembrava do quão horrível ele foi comigo e esse sentimento passava logo.
Ao abrir a porta que separa o banheiro do quarto encontrei todas as luzes desligadas, sabia que já não estava sozinha, queria voltar pro banheiro mas as minhas pernas já não obedeciam os meus comandos, se estava apavorada? Com toda certeza, mas também estava aliviada por ele não ter sido pego pela polícia, porque eu sentia que tinha alguma coisa haver com o que ocorrera com Jasper.