CHRISTIAN
Saio de la e vou pra casa da minha mãe, entro com minha roupa toda suja e ela esta sentada na poltrona que ela sempre fica.
- É você filho? a Flora veio também? - eu não consigo dizer nada e só me jogo pra deitar com cabeça no colo dela - meu Deus o que aconteceu com você? - nesse momento já estou chorando, algo que com certeza faz tempo que minha mãe não me ver fazendo - eu sou um peso na sua vida né?
- Não mãe, você não é... sou eu que não sei fazer nada direito - nesse momento o Timtim começa a me cheirar e pular em cima de mim.
- Você sempre faz tudo direito, eu que estou sendo uma péssima mãe, depois que seu irmão foi...
- NÃO FALA DELE - ela se assusta com a minha reação - não fala dele agora, eu tô aqui mãe, eu que estou aqui no seu colo, eu que estou aqui com você, eu que estou lutando pela gente, eu que estou precisando de você mãe... eu.
Ela não diz nada e começa a fazer carinho no meu cabelo, e passa um filme na minha cabeça, todas as coisas que já vivi, todas as coisas que eu já passei e sentir, todas as coisas que eu deixei de viver, todas as vidas que eu já tirei... todas as noites que ouvi minha mãe chorar e se lamentar , e ver ele ali na minha frente, respirando, falando, é como se um sonho tivesse se tornado realidade e ao mesmo tempo um pesadelo que só acabou de começar.
Há doze anos atrás eu vi uma arma pela primeira vez na vida e ela estava apontada pra minha cabeça, há doze anos atrás eu vi alguém morrendo na minha frente, e esse alguém era meu irmão, há doze anos atrás foi a última vez que eu vi um sorriso verdadeiro da minha mãe.
E o motivo de todas essas coisas, estava na minha frente... ele passou doze anos se fazendo de morto, eu penso no que eu poderia ter me tornado, em como minha vida estaria agora. Mas infelizmente isso é so pensamentos, nada disso vai voltar a atrás, nenhum momento, nenhuma memória, nenhum sofrimento, nenhum trauma vai voltar atrás, eles sempre vão existir dentro de mim.
- Eu vou tomar banho - falo levantando e indo na direção do banheiro.
...
Quando entro embaixo do chuveiro, parece que quando eu me limpo mais eu fico sujo.
Por mais que meus pensamentos fiquem no que eu podia, no que deveria... só uma coisa persiste na minha cabeça... eu perdi a Flora.
A imagem dela saindo do meu apartamento com medo de mim, me achando um monstro, pode ter certeza que me quebrou muito mais do que qualquer outra coisa.
(...)
Chego na sala e minha mãe não está, quando entro na cozinha vejo ela no fogão, já passaram quase 40 minutos que sair daqui e fui pro banheiro.
- O seu preferido - olho e minha mãe está fazendo meu prato preferido, é algo que me deixa surpreso, faz tempo que ela não faz - senta, vamos comer.
Sentamos pra comer e não sei se estou com cabeça pra me alimentar.
- Tá r**m? acho que perdi a prática - diz preoucupada.
- Não é isso mãe, está ótimo
- O que aconteceu? você quer falar?
- Nada demais mãe - eu não vou falar pra ela.
- Eu nunca vi você daquele jeito, estou precupada - minha mãe sabe que eu faço coisas erradas, mas não exatamente o que, e nem pra quem, nunca conversamos sobre, mas ela já me viu várias vezes chegando sujo de sangue ou até machucado, ela não me pergunta e nem eu falo.
- Tá tudo bem, vai passar.
- Liga pra Flora, ela deve saber o que falar pra você... você quando está com ela sempre tem um sorriso no
rosto - dou um sorriso de lado.
- Ela sempre sabe o que fazer né?
- Sim, eu notei que você está mais reluzente com ela ... ela realmente é uma menina boa, eu me sinto bem com ela por perto - quando ela diz isso, meu olho fica marejado, só de imaginar que não vou ter mais ela aqui... ela parecia um remédio pra mim e principalmente pra minha mãe.
- Depois vou ligar pra ela - nesse momento o Timtim senta no meu pé, ele pelo menos ficou.
FLORA
Quando cheguei em casa não tinha ninguém, minha mãe esta trabalhando e a Lua não está em casa.
Mas eu agradeço porque não queria ter que explicar porque estou chorando.
Saber de tudo isso foi um baque, eu so consigo ver aquelas armas e imaginar as formas mais cruéis possíveis que ele já usou elas.
Mas não parece, esse Christian que eu vi hoje, com aquelas armas, com milhões de morte nas costas, não é o meu Christian, o cara carinhoso, engraçado, o cara que cuida da mãe como uma rainha. Ele não pode ser o mesmo cara que faz milhares de mães chorar por aí.
Por mais que me doa, eu não consigo viver com ele sabendo de tudo isso, eu não sou tão sangue frio assim.
Eu amo ele, e já fiz de tudo por ele e sem arrependimento nenhum... mas eu não consigo simplesmente ignorar o fato que ele mata pessoas.
Eu moro em um lugar que é cheio de traficantes, eu sei a realidade deles, eu até já namorei um e não... eu não quero isso pra minha vida.
Eu estou sentindo uma dor enorme, parece que estão arrancando meu coração, eu só sei chorar... e sei que vai ser assim por um bom tempo.
Mas a sensação de ser engana, a sensação de se sentir traida de alguma forma, a sensação de ter vivido uma mentira, de fazer planos e mais planos e ver tudo caindo de água abaixo é desgastante e doloroso.
- Filha? está tudo bem? - minha mãe bate na porta.
- Tá - falo em meio ao choro, esqueci de trancar a porta e minha mãe abre.
- O que aconteceu? - fala agachando na minha frente pós estou sentada no chão.
- Eu e o Christian terminamos.
- Ué vocês estavam tão bem, o que aconteceu?
- Acabou tudo mãe, tá doendo
tan... - não consigo terminar a frase e minha mãe vem até mim e me abraça.
- Vai ficar tudo bem meu amor, vai passar.