Um dia da caça...

2494 Words
Ter o número do Carlos ao mesmo tempo que é um bônus , também é um ônus. Que desculpa eu usaria para falar com ele? Sem dúvidas Carlos ia perguntar como eu consegui seu número... Depois de muitos dias pensando, o único plano que me pareceu viável só poderia acontecer após o retorno das aulas. Então fiquei mais quinze dias com o telefone nas mãos enquanto eu concretizava a ideia. Carlos parece ser o tipo de homem que ajuda donzelas em perigo e é isso que eu serei para conquistá—lo, mesmo não gostando muito de ser uma mocinha indefesa. Então em uma bela tarde quente , sento com meu celular nas mãos: está na hora de por meu plano em prática. Disco o número de Carlos e a cada toque meu coração acelera. Passa mil coisas em minha mente , desde escutar sua voz até o fato da chamada ser encaminhada para a caixa de mensagens. Então os toques cessam, e aquele espaço entre o final do toque e a expectativa de ouvir sua voz , me deixa nervosa. Respiro fundo com meus olhos fechados... —Alô?— atende a voz grossa de Carlos. Abro meus olhos para ter certeza de que ele não está dentro do meu quarto. Ele respira e diz — Alô? —Oi... — respondo com a minha voz embargada. Odeio quando estou nervosa e minha voz afina. Respiro fundo e digo— Olá , Carlos. —Olá... — responde Carlos com um tom de dúvida — Com quem eu estou falando? —Que indelicadeza da minha parte — digo de forma sedutora — Aqui é a Dália Penedo , nos conhecemos na festa do Júlio Castillos. —Ah... claro — diz Carlos, sem muito entusiasmo. O seu tom me irrita, pois parece que minha lembrança para ele é tão significante quanto a de qualquer outro convidado — Como está, Dália Penedo? — Muito bem — respondo, fria. Respiro fundo e esqueço a formalidade de perguntar como ele está , partindo logo para o meu plano, mudo meu tom para um mais doce , sem ser irritante — Peguei seu número com o Júlio esses dias, pois tenho um projeto da escola sobre o mercado de pescas de Barcelona e ele me disse que você trabalha na área. Eu gostaria de saber se teria como me ajudar? — as próximas palavras finalizam a minha isca — Já estou desesperada ,pois não tenho ninguém que possa me ajudar. — Claro que posso te ajudar — responde Carlos mais solicito e confirmando minhas suspeitas: Ele um príncipe que não recusa ajudar uma donzela indefesa — Do que precisa? —Muitas coisas — digo . Então decido fazer uma jogada arriscada, sei que ele pode recusar , mas eu realmente estou desesperada... para vê—lo  — Será que não teria como a gente se encontrar pessoalmente? Acho que seria melhor até mesmo para mostrar como seria o projeto... O que acha? Quando está disponível? — Acho que é uma ótima ideia — diz Carlos ,empolgado — Que tal amanhã? —Excelente — digo ,prontamente. Penso em como foi fácil atraí—lo — Que horas? — Deixa eu só confirmar se a minha noiva está disponível — responde Carlos, quase me fazendo cair da cadeira. Noiva? COmo assim ele vai levar a noiva dele? Não se pode mesmo contar com o ovo antes de ser chocado... — Sabe , os pais dela também trabalham com pescado.Vai ser ótimo ver a nossa área ser valorizada... — Nossa!— digo quase gritando no telefone. Preciso de uma desculpa para sair dessa enrascada— Acabei de me lembrar que amanhã não vai dar... Tenho que estudar Cálculo ... para a prova... — Sério, que pena — diz Carlos com a voz decepcionada. —Bom , veja um dia que fica bom para você e me avise, estarei à sua disposição. —Claro , eu vejo sim — respondo meiga. Pode ter certeza que será um dia em que a sua noiva não estará presente. Respiro aliviada para ele escutar e agradeço — Obrigada, você não tem ideia do quanto estou agradecida por você me ajudar. — Fico feliz em saber — diz Carlos tímido. Fico escutando sua respiração e acabo perdendo a noção do tempo. —Bom , me ligue para marcar o nosso encontro. Até. —Até breve, Carlos — digo desligando meu telefone. Meu coração está prestes a sair pela boca. Jogo—me na cama olhando para o teto, pego meu telefone e o encho com todos os beijos que gostaria de ter dado pessoalmente em Carlos. *** Lógico que a desculpa do projeto da escola tinha um prazo de validade,mas todas as vezes em que tentava marcar com Carlos ,ele sempre queria colocar bendita noiva dele no meio. E em todas elas eu usei uma desculpa diferente: doença , viagem, escola... aquilo realmente já está me tirando do sério. Então para tirar aquela desculpa da jogada, peço que ele me mande tudo o que ele tinha sobre o mercado de pescado para o meu e—mail.  Ele , como um bom cavalheiro que é , prontamente manda um enorme e—mail com tudo o que era necessário , se meu projeto fosse real , com certeza eu tirava um dez. Pensei em guardar aquele e—mail até eu ler o final: "Atenciosamente, Carlos Salazar e Antônia Vegas" Não consigo acreditar que até no e—mail ela tinha de aparecer. Imediatamente jogo o e—mail na lixeira e a limpo. Aquilo era uma afronta que não pretendo tolerar. Respiro fundo e pego meu telefone mandando uma mensagem para ele: "Obrigada pelo e—mail. Você me salvou , e ficarei em dívida eterna com você." Não demorou cinco minutos e meu celular vibra com sua mensagem surgindo na tela: " Sempre às ordens, senhorita Penedo." Mordo meus lábios e então escrevo: "Me chame de Dália, Carlos. Espero retribuir a altura um dia..." Sua mensagem chega logo em seguida: "Dália..." E assim durante os próximos três meses trocamos mensagens. Mas geralmente eu não resistia e acabava ligando para ele.Assuntos banais, como foi na escola , ou o trabalho dele, quase todo o tipo de assunto eram conversados entre a gente.Quase ,pois o assunto noiva estava fora de cogitação. Sempre que ele a citava , fazia questão de mostrar a minha insatisfação, mas ou ele era muito ingênuo ou se fazia muito bem , pois ele nunca contestou isso. A nossa "amizade" estava indo muito bem , tirando o fato de nunca mais termos nos encontrado depois do ano novo. Nem mesmo quando eu disse que tinha tirado dez no falso projeto , não consegui comemorar com ele. Aquilo já está me matando quando em uma bela sexta feira , meu celular toca. Ao ver o nome do Carlos ,meu coração dispara, corro da sala de estar, onde estava assistindo televisão com a valéria , para o quarto. Atendo meu telefone ,antes mesmo de recuperar meu fôlego: —Alô ... —Dália?—pergunta Carlos — Você está bem? — Sim... —respondo ofegante— Eu ... eu estava malhando... fazendo umas abdominais... —Desde quando você malha?— pergunta Carlos, desconfiado. De fato eu sou uma verdadeira sedentária abençoada pelo metabolismo rápido. —Eu comecei esses dias... não te contei porque não sabia se eu ia conseguir continuar com essa nova rotina... mas você não me ligou para isso , certo? — pergunto, nervosa. — Não... — diz Carlo , misterioso. Ele dá um riso baixo e continua — Estou ligando para saber se você quer sair hoje? —Sair... Hoje?— repito , surpresa. Por alguns instante me sinto flutuar em meu quarto, parece um sonho , o sonho que eu tanto desejava. Agora ele está acontecendo. —Dália , você tem certeza que está tudo bem?—pergunta Carlos , preocupado. — Eu aceito... eu aceito sair com você — respondo o mais rápido que eu consigo... quase com todo o meu desespero e alívio. —Ótimo. Te encontro no Mallorca, daqui uma hora, certo? — pergunta Carlos ,empolgado. —Sem dúvidas— respondo , animada. —Te espero, até mais— diz Carlos desligando. Jogo meu celular na cama e corro para o closet, peciso encontrar algo a altura. Desconsidero calças jeans e blusinhas, não quero ser casual demais. Porém , tenho de eliminar metade dos meus vestidos também, não quero parecer que estou facilitando as coisas. Então o que me resta é um vestido branco florido e um vestido roxo. Pelo o que eu conheço do Carlos, o branco florido é o melhor já que tenho de ser ainda a mocinha indefesa. Tomo banho e faço uma bela trança em meus cabelos castanhos escuros, deixando a minha franja solta. Quando volto ao meu quarto , tomo um susto ,minha mãe está olhando todas as minhas roupas jogadas na cama. — O que está acontecendo aqui? — pergunta com cara de poucos amigos. —Nada... eu estava procurando meu vestido que estava praticamente escondido— explico fazendo pouco caso da situação. Sento na minha penteadeira e passando um batom. Noto que minha mãe está me analisando — O que foi? —Você vai sair? — ela pergunta cruzando os braços. —Sim, vou. Tenho um trabalho de escola para fazer com a Alicia — minto colocando a minha melhor amiga Alicia no meio. Não se preocupem, ela sempre me acoberta e sabe todas as desculpas que uso. Sem contar que a casa dela é bem perto do Mallorca. O crime perfeito. —E você vai assim? — pergunta minha mãe , desconfiada — Toda arrumada?   — Sim — respondo colocando meus brincos de pérola. Pronto , estou a princesa perfeita — A senhora sempre disse que precisamos estar prontas para tudo. Vai que os pais dela me convida para jantar, não posso ficar indo e vindo não é mesmo? —Está certo — responde minha mãe não muito convencida — Quer que eu te levo? — Sim — digo tentando não demonstrar o quanto aquilo iria atrapalhar meus planos. Mas se eu me recusasse ia levantar muitas suspeitas. Sem contar que sei que aquilo pode ser um blefe da minha mãe. Ela odeia dirigir até o centro, por isso sempre nos deslocamos de metrô. — Se não for atrapalhar a senhora , sabe como o trânsito anda terrível no fim de semana. —Verdade... pensando bem é melhor você ir de metrô — concorda minha mãe tocando em meu ombro — Só não demore para chegar em casa, eu e seu pai iremos sair e preciso que fique com a Valéria. —Sem problemas , mamãe. Volto antes da senhora notar. Mas espero que ela não conte muito com isso, pois se depender de mim , passarei a vida no encontro de hoje. *** Aquela sexta— feira está bela , nunca tinha visto um céu tão azul e as ruas tão tranquilas. Ao meu redor as pessoas caminham alegres. Pego o metrô e na minha frente senta um casal bem jovem. Ele pareciam tão apaixonados... do jeito que eu gostaria de estar com o Carlos. Desci na estação que fica a duas quadras do restaurante, confiro meu visual no espelho da escada rolante. Meu coração está disparado, sinto falta de ar, estou virando a esquina que dá para o restaurante. Eu o vejo sentado em uma mesa, distraído. Está exatamente quando o vi no ano novo. Sorrio acelerando os passos , quando penso em acenar, arregalo meu olhos. Elson senta à mesa onde está Carlos. Eu quase infarto de raiva, decido ir embora , quando Carlos acena para mim ,sorridente. Como se não bastasse , ele tinha de vir em minha direção... com aquele sorriso descontraído...com aqueles olhos esverdeados... — Oi, Dália — diz Carlos sem graça — Que bom que você veio. —Olá — digo ,irritada. Não consigo evitar e já pergunto — O que o Elson está fazendo aqui? —Eu o convidei também — responde Carlos dando um tchau para o amigo — Eu vim trazer a Antônia no serviço e aí como tenho de ficar esperando ela sair , chamei o Elson . E , lógico , você também, já que nós sempre ficamos de marcar de sair. Vamos? Passo por ele , irritada. Aquela não era bem a tarde que eu tinha programado passar com ele. Enquanto ficamos conversando , fico pensando se ele é tão puro a ponto de não perceber as minhas reais intenções. O Elson parecia uma gralha falando sem parar, enquanto eu me mantinha monossilábica. Agredeci imensamente quando o belo dia se tornou ventoso , mostrando que uma tempestade viria por aí. — Tenho de ir — digo me levantando , apressada. Acho que essa foi a maior frase que disse durante a conversa— Prometi aos pais que chegaria em casa cedo. —Tudo bem — diz Elson. Ele pisca para mim e diz — Um prazer falar com você. — Uma pena que você já vai... — diz Carlos, fazendo uma careta decepcionada. Quase desisto da ideia de ir embora quando ele fala — Estava planejando te apresentar para minha noiva. Falo tanto de você para ela que acho que está na hora de se conhecerem. —Tchau — digo , fria me virando em direção a rua. Aquilo passou todos os meus limites. Eu simplesmente não consigo ficar mais um minuto perto do Carlos. Como ele se atreve a me tratar como se eu fosse... eu fosse... uma amiga dele. As gotas de chuva começam a cair e eu tenho de correr para chegar na estação. Dentro do metrô, minhas lágrimas de raiva começam a cair. Nunca tinha sido tratada com tanta indiferença por alguém , como fui pelo Carlos. A minha ira não passa até chegar em casa. Passo pelos meus pais e vou direto para o meu quarto. Arranco aquele vestido i****a e me jogo na cama, socando meu travesseiro como se ele fosse a cara do Carlos.Três meses esperando por ele e nada... mas a raiva ainda permanece, até que decido pegar meu telefone e ligar para o Carlos... Cansei de esperar , tá na hora de jogar a real com ele, mesmo que isso destrua tudo o que eu construi. Ele demora , mas atende e antes que ele diga seu famoso alô , disparo: —Não sei se você percebeu, mas não quero ser sua amiga,nossa relação nunca será de amigos. Eu quero ficar com você! Então quando você despachar sua noivinha, me liga! Pois ja estou farta desse jogo de gato e rato! —Dália...—começa a dizer Carlos , mas não me importo. Desligo na cara dele. Deito na minha cama e respiro fundo. Mesmo que essa abordagem direta , o afaste de mim , não me importo. Aliás , não me importo com mais nada.
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