Coloco a Cecília dentro da perua escolar que a leva pra a escola, o que acaba sendo um grande alívio pra mim pois lá ela fica o dia inteiro. Como saio cedo pra trabalhar na hora de vim embora é uma correria só, pois o mais rápido que posso para pegar ela, assim economizo e acabo não precisando pagar ninguém para ficar com ela. Saio de casa tranquila para mais um dia de trabalho, deixei o Eduardo avisado de que iria trancar o portão, mais ele poderia ficar sossegado em casa. Não estou com medo de ser roubada, até porque a única coisa de valor que eu tenho já está a caminho da escola, o resto são apenas bens materiais pois assim como vieram um dia também podem ir.
Assim que chego na loja, encontro os meninos no balcão, Matheus e Erick. Esses meninos são maravilhosos e fazem do meu trabalho o melhor lugar do mundo.
Eu fico no caixa e o senhor e a senhora Gonzales donos da loja, quando estão por aqui fazem de tudo um pouco.
- E aí?
Matheus está de rolo com uma garota então eu sei que os dois tem muita história pra contar.
Matheus - E aí, nada. Essa mina acha que eu sou palhaço.
Erick - Se ela acha, eu tenho certeza. (diz zoando o coitado do Matheus)
- Para Erick, não é assim poxa.
Matheus - Como não é assim? (me pergunta bravo)
- Você mandou flores e chocolate quando ela literalmente falou que não queria mais nada. (o respondo calma)
Matheus - Claro, pra ela saber que eu sou um homem pra casar.
Erick - Mais é um trouxa. (diz só pra implicar) - Fica lambendo ela que ela vai continuar te fazendo de trouxa, você tem que entender que mulher não gosta de homem grudento….
O assunto rendeu, na verdade sempre rende. Enquanto isso eu ajudo no abastecimento das prateleiras e na organização da loja, pelo menos até aparecer alguns clientes
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Assim que apareço na esquina da minha rua, eu vejo a perua escolar. Corro para que eles consigam me ver, então o tio buzina sinalizando que já me viu e que eu posso ir tranquila, mais eu não me aguento de ansiedade sabendo que tem uma ursinha a minha espera na sua carruagem. A tia sempre alegre me me entrega ela toda sorridente e falante, como sempre ela me conta sobre o que aprendeu na aula e sobre coisas que que eu nem sei do que se tratam, eu apenas concordo e elogio sua magnífica inteligência.
Finalmente entramos portão a dentro e está um absoluto silêncio, assim que abri a porta senti um cheiro forte de produto de limpeza e a casa está brilhando de limpa.
- Eduardo?! (chamo mais ninguém responde)
Meu coração até acelera com a possibilidade dele ter voltado para a rua, o procuro nos quartos e no banheiro e nada, está tudo um brinco mais nada dele. Saio pela única porta da casa e vou até a lateral, onde fica a minha pequena lavandeira e aqui está ele, com o cabelo cortado, ou pelo menos parece que está cortado e com uma tesoura na mão aparando a barba.
- Que susto!
Eduardo - O que foi? (diz me olhando mais assustado ainda)
- Pensei que tivesse ido embora.
Eduardo - Ainda estou aqui, eu achei sua tesoura então decidi cortar a minha barba e meu cabelo.
Olho para o trabalho dele e vejo que nem de longe o que ele fez é um corte de cabelo.
- Quer ajuda? (pergunto na tentativa de concertar o que ele está fazendo)
Eduardo - Está muito r**m?
- Não está r**m, mas eu posso melhorar. (digo tentando não demotiva-lo)
Eduardo - Tudo bem.
Vou até o quarto da Ceci e vejo que está tirando a roupa da escola para o banho, como eu sempre a ensino.
- A mamãe vai brincar de salão com o tio Eduardo.
Cecília - Posso ajudar?
- Se ele deixar, você pode ser minha ajudante.
Ela coloca camiseta novamente e passa por mim como um foguete, finalmente termino de carregar a cadeira para a área na frente de casa, e vejo os dois com sorrisos lindos se encarando.
Ceci - Ele deixou!
Eduardo - E como eu vou dizer não para a vossa alteza?
Ceci - Viu mamãe, ele sabe que eu sou uma princesa. (disse cochichando um tanto alto)
Enfim ele me olha com um sorriso lindo, um sorriso tão encantador que fez meu coração acelerar, eu apenas o encaro mesmo não sabendo o porque.
Ceci - Vamos tio, senta aqui para a mamãe cortar o seu cabelo e eu pintar a suas unhas.
- Cecília, não pode …
Eduardo - Pode sim, quero ver o que ela sabe fazer.
E lá se foi uma criança eufórica pegar a maleta de esmaltes e algumas maquiagens que eu comprei pra ela.
- Agora vamos lá, tira a camisa e senta logo aqui.
Eduardo meio constrangido, tira a camisa e eu pude notar um pouco do seu passado. Ele tem uma tatuagem na costela que me parece ser um falcão, com um bico bem desenhado e fundo algumas montanhas. Mas não foi isso que me deu pistas de que ele viveu, e sim suas cicatrizes. Cicatrizes essas que não estão totalmente curadas pois muitas delas ainda estão vermelhas.
- O que é tudo isso? (pergunto chocada mesmo sabendo que é indiscreto da minha parte)
Eu não deveria ser tão intrometida assim, mais todas essas marcas me mostram que ele padeceu e não foi pouco, e se ele tem esse olhar acuado e com muito receio é porque ele sofreu muito.
Eduardo - Eu realmente não sei, caminhei por muito tempo assim machucado, até que parei em um hospital e por não saber meu nome todo nem de onde eu vim, eles me deram todos os atendimentos que eu precisei e depois mandaram de novo pra rua.
- Eduardo, eu …
Se quer conseguir terminar a frase, meus olhos queriam transbordar, eu não quero constrangê-lo a mais isso, porém é sufocante saber que ele passou por todos esses traumas e ninguém foi humano suficiente para prestar um atendimento ou dar uma ajuda digna.
Eduardo - Amanda, está tudo bem, não chora. Eu estou bem.
Cecília - Tio, por que você tem tanto dodói? (diz aparecendo na porta olhando o corpo dele)
Eduardo - O tio não lembra, pequena princesa.
Ceci - Foram as pessoas más, né? Pessoas más só sabem fazer m*l aos outros, mais no final tio, elas sempre se dão m*l. Foi assim com o lobo mau, a bruxa má, a madrasta da branca de neve, não é mamãe?
Apenas concordo com a cabeça, pois tem um bem no meio da minha garganta me impedindo de pronunciar qualquer tipo de palavra.
Ele se senta na cadeira sorrindo pra minha ursinha, enquanto eu tento controlar minhas mãos. Pego o borrifador e elas ainda tremem muito, respiro fundo para me controlar e assim consigo me acalmar um pouco. Consigo fazer o meu trabalho e tenho que admitir que ficou muito bom por sinal.
Felipe costumava me agradecer muito quando eu cortava o seu cabelo, aprendi com a minha mãe que sempre foi uma dona de casa exemplar e sabia fazer de tudo, ela fez questão de me ensinar tudo, mais aquele não era o meu caminhos eu queria mais, e mesmo que eu tenha quebrado a cara eu sei que eu mereço mais, muito mais.
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- Pronto, agora você tem um cabelo cortado. (digo finalizando o meu trabalho)
Ceci - Eu não acabei mamãe.
Ela realmente está pintando as unhas dele de rosa e amarelo, e enquanto faz sua obra de arte ela sorri se divertindo com tal situação.
- Pois então acabe logo, porque você ainda tem que tomar banho mocinha.
Assim que ela terminou Eduardo não poupou elogios para o trabalho de minha pequena , e ela agora tá toda se achando com o sorriso de orelha a orelha.
Eu sinto que ele não é uma má pessoa, sem falar que ele demonstra muito cuidado e atenção com a Ceci … Logo após o jantar, assim que o Eduardo vai para o quarto, eu decido ligar para o Kinho e pedir uma ajuda sem que o Eduardo perceba.
Eduardo está usando as mesmas roupas, até porque eu não tenho outras.
Kinho - Mana?
- Oi Kinho, tudo bem?
Kinho - Eu ia mesmo te ligar, mais já que você me ligou. Diz aí o que é que manda?
- Então, é um assunto meio que complicado sabe, mais se você não puder ajudar tudo bem, eu vou entender.
Kinho - Fala Manda, sabe que nós somos família né? Se eu não tiver condições sabe que dou um jeito.
- É que eu estou ajudando uma pessoa, ele não tem nada nem mesmo a memória, e está precisando muito de algumas roupas. Eu gostaria de saber se você pode doar algumas roupas suas.
Kinho - Como assim mana? Quem é essa pessoa?
- Pode parecer loucura, mais eu estava saindo do trabalho e ele me pediu comida, eu dei. E só o trouxe pra casa pra ele poder tomar um banho e ficar mais confortável e ter uma boa noite de sono.
Kinho - E deixa eu adivinhar o resto, ele está aí até hoje porque você não consegue mandar o cara de volta pra rua. Você sabe que isso é completamente perigoso né? É um estranho! Eu sei que seu coração é bom, Manda mais o mundo está perigoso demais. Você não pode colocar um estranho assim dentro da sua casa, ainda mais com uma filha pequena.
- Eu sei.
Ouvir suas palavras me deixa triste, até porque sei que ele é verdade e que ele está certo. Apesar de eu sempre ver o lado bom das coisas, a maldade ronda os quatro cantos da terra.
Kinho - Ele vai ficar aí? Ele contou de onde veio? Você sabe alguma coisa dele?
- Não. Ele está totalmente sem memória e com o corpo cheio de cicatrizes, ele só se lembra do seu primeiro nome que por um acaso é Eduardo.
Kinho - Estou preocupado, não vou mentir.
- Eu não consigo mandar ele de volta pra rua. Ele carrega tanta tristeza no olhar.
Kinho - E você acha que consegue abrigar todos que precisam de ajuda nesse mundo?
Fico em silêncio porque é bem isso que eu sou capaz de fazer.
Kinho - Vou separar algumas coisas aqui. Ele sabe quanto veste? Calçado?
- Acho que o mesmo que você, ele só está um pouco magro, mais é bem alto, calçado acho que 42.
Kinho - Viu está por aí perto do metrô, amanhã com o carro da companhia aí levo algumas roupas, vou comprar um chinelo e um tênis pra ele porque calço 44.
- Obrigada, muito obrigada Kinho. (digo com um sorriso maior que minha boca)
Kinho - Não tem de quê, ainda estou cismado mais confio em você. E ó, final de semana que vem estou indo pra praia, quero levar minha princesa.
- Aí que legal!
Kinho - A Karla me pediu pra eu falar com você para levar ela.
Karla é a namorada, noiva, mulher dele. Ela é o máximo de descolada possível, super alto astral sem falar no cabelo ruivo selvagem que eu amo.
- Ela vai amar.
Kinho - Eu sei. (diz sorrindo porque conhece a sobrinha que tem) - Eu tenho a namorada mais confusa do mundo, não quer ter filhos mais ama a minha sobrinha.
- Escolhas, mulheres tem escolhas.
Kinho - Eu sei, sou cercado das mais lindas e confusas mulheres, tinha que aprender alguma coisa né?
- Obrigada.
Eu sei que ele sabe do porque de todo o agradecimento, Kinho é completamente o oposto do irmão. Eu devo muito a ele por tudo que eu passei e se hoje permaneço de pé, foi por causa de suas conversas e apoio, durante todo esse tempo que nos conhecemos.
Kinho - Que isso, amanhã eu passo na loja pra deixar as coisas com você.
- Combinado, só não vou falar nada pra Ceci ainda, porque se não ela vai ficar super ansiosa.
Kinho - Tá bom. Manda?
- Oi.
Kinho - Cuidado, presta atenção em tudo aí.
- Fica em paz, eu sinto que eu devo ajudar.
Depois que desligo o celular, vou para o quarto e não encontro a minha pequena na cama arrumando a sua bicharada de pelúcia como deveria ser. Meu coração acelera um pouco e vou onde sei que posso encontrá-la.
Ceci - A mamãe fala que eu tenho que cuidar de todos para eu ter sempre.
Eduardo - E ela está certa.
- Mocinha, onde você deveria estar?
Os dois que estão sentados na cama enquanto ela escova a juba do leão e o Eduardo coloca a meia no fofura, olham pra mim.
Ceci - A senhora demorou, e o tio está me ajudando a arrumar eles para dormir.
- Então vamos que eu te ajudo, deixa o Eduardo descansar.
Eduardo - Não estou cansado, deixa que eu termino de ajudar a Ceci. (diz de cabeça baixa)
- Então vamos todos ajudar pra acabar mais rápido.
Sento atrás da minha pequena enquanto ela arruma os ursinhos, um leão, um tigre, a galinha pintadinha e o fofura que desde sempre é o bichinho inseparável dela, eu começo a arrumar seu cabelo pra dormir.
Enquanto eu faço isso reparo em Eduardo, ele é tão bonito talvez ele esteja perdido e sua família deve estar procurando ele desesperadamente, ele deve até ter filhos pelo jeito que ele trata a Ceci com certeza deve ter filhos. Esse pensamento me faz ter mais certeza de que eu devo ajudá-lo.
- Pronto meu amor, estão todos preparados para dormir.
Ceci - Tio, pode me contar uma história hoje?
Ele olha pra ela espantado e logo em seguida olha pra mim, como que pedindo socorro não sabendo o que fazer.
- Eu conto filha.