Capítulo 1 - Promessas são Dívidas

2288 Words
Eu sou Isabella Lion. Não que isso importe muito ou que faça alguma diferença no mundo real onde nós vivemos, eu só acho importante dizer logo o peso do meu nome e sobrenome para que ele não seja dito como um palavrão quando todos vocês descobrirem do que eu sou feita. Sim... eles todos estão certos, as lendas estão certas, e eu, assim como todos os outros membros desse clã, somos feitos de sangue, suor, lágrimas e dentes afiados como os monstros de histórias infantis. Eu acho que o meu sobrenome vai ajudar vocês a encontrarem exatamente as versões sobre mim e minha família espalhadas por aí, a família mafiosa mais importante da toscana, os responsáveis pelas mortes mais absurdas e todo o blábláblá que inventaram ao nosso redor apenas para criar dentro da cabeça um mito, os seres humanos precisam muito de alguém que eles possam odiar. Estou sempre sofrendo pelos mesmos motivos que todas as pessoas normais sofrem, mas em um ambiente onde nenhuma pessoa normal deveria viver... assim eu fui criada, assim eu vivi, assim eu cresci e provavelmente assim será a minha morte. Quando o meu coração que é feito de mim, decidir parar o corpo que também é feito de mim. Amo as citações dos meus livros e enquanto eu for contando a minha vida vocês vão perceber a quantidade de coisas que eu só expresso com as palavras dos outros. - Eu já disse Beatrice não tenho nenhum interesse se quer nos planos do nosso pai, eu não sou como você... - eu disse enquanto minha irmã mais velha afofava o meu vestido de baile, ela fazia a função de mim mãe desde que ela meteu uma bala na cabeça no meu aniversário de cinco anos de idade, trágico, mas eu evitava pensar muito nisso para não acabar enlouquecendo mais do que já era de praxe - eu agradeço que esse baile seja para te apresentar um marido, por que assim eu posso ficar um pouco mais livre. Até parece que estamos no ano de mil e quinhentos onde uma mulher não tem chance de se apaixonar de verdade. Não sei como você não se incomoda com isso! - No fundo eu gostava tanto de desafiar que eu nem sabia mais como parar, era mais forte do que eu. - Eu não me incomodo com isso porque eu sigo ordens Isabella, você deveria seguir também! Porque eu estou cansada de sempre salvar você da fúria de nosso pai. Você sabe como tem sido difícil ultimamente - com ultimamente ela está querendo dizer desde que a minha mãe se foi por escolha própria, desde que ela resolveu deixar esse mundo e as duas filhas à mercê de um cara doce, mas megalomaníaco que colocava a famiglia da máfia acima da famiglia de sangue - Então você não ajuda em nada reclamando... - Quem vem para o baile hoje? - eu perguntei evitando brigar com ela, Beatrice era de um tipo "boa demais para ser verdade" exibia por todos os lados o seu nariz delicado e os seus olhos azuis emoldurados por seus cabelos loiros e extremamente lisos, além de ter um coração enorme e aceitar tudo o que o meu pai Arturo colocava como regra, por mais absurda que a regra poderia parecer a olhos humanos. - Você sabe Isabella, o de sempre, as famílias... - ela sempre era tão evasiva, me irritava a falta de vontade até de responder coisas simples, parecia sempre estar escondida. A verdade é que eu comecei a achar que ela, no fundo, ou não tão lá no fundo, adorava os planos que o meu pai tinha para ela. Mas aquela era apenas uma impressão talvez enciumada e infantil de uma irmã mais nova. O casamento com um homem rico e influente parte integrante da Famiglia não parecia nada mau. Verões na Toscana sob o sol intenso com um drink para bancar a esposa bronzeada e troféu, uns três ou quatro filhos para que ela cumprisse à risca a função da mulher... Bom, parecia ficar feliz ao saber que esse era o seu destino, embora dissesse que não ligaria de ficar em casa aquele ano, sem casamento, sem verões radiantes e sob a supervisão constante de nosso pai. - E ele já te prometeu a alguma família especificamente? - eu continuei perguntando por que além de uma chata palestrinha eu também era extremamente curiosa com tudo. - Me prometeu para a família Salvatore... - ela disse já saindo de perto de mim, por que sabia que iria escutar as maiores baixarias - E você está achando normal ser prometida para alguém daquela família? você ficou maluca? - Acreditem em mim, a minha reação era muito apropriada para aquela situação. - Supera isso Isabella, aconteceu a mais de dez anos, não somos mais as crianças do parquinho, somos adultos com intenções de casamento! - disse ela indo até a gaveta de joias da minha mãe, era tudo o que eu não queria usar, mas era a única exigência do meu pai. Acho que era assim que ele fingia manter a memória dela viva enquanto transava em todos os cômodos com uma menina com a mesma idade da minha irmã. - Eles têm fama r**m Beatrice, e você sabe muito bem disso! A família inteira é extremamente mau educada, falam alto demais, comem com a boca aberta... você já deu uma boa olhada na Donatella? a irmã? - Não importa Isabella, qual é a sua? por que está tentando me desanimar? chega desse assunto, eu já cuidei demais de você... agora se vira, eu também preciso ir me arrumar. Peça ajuda a algum empregado. Sim, ela ficou realmente ofendida com as minhas colocações infames. Mas entenda, não me levem a m*l, eu não estou querendo detonar a minha irmã, eu não sou contra o casamento e muito menos contra viver um grande amor. Mas tudo tem que ser feito desse jeito tão triste e comercial? Um casamento arranjado em pleno 2022 como se fossemos extremistas religiosos... eu não posso dar conta disso. Ela não parecia feliz, não chegou com borboletas no estômago após um encontro dizendo que estava profundamente apaixonada, ao ponto de não conseguir fazer outra coisa a não ser pensar naquele homem. Eu não a vi chorar ao assistir um pôr do sol com o seu amado, e muito menos ficar ansiosa por sua próxima visita. Tudo era tão frio, tão montado... que dava...medo. Eu queria me apaixonar, isso estava na minha lista de objetivos... me apaixonar de uma forma tão doida e gigante que eu não consiga ficar um segundo longe da pessoa amada... porque depois que eu descobri a sua existência era impossível que eu conseguisse viver sem ela. Eu queria a emoção dos filmes, a emoção do cortejo... a emoção de um beijo molhado no meio da chuva. Parece ser uma coisa que não pode acontecer? estou exigindo demais ao dizer que quero me casar por amor? - Senhorita Isabella... sua irmã me mandou aqui para te ajudar... - disse uma das empregadas - Não se preocupe com isso, acho que dou conta de fechar a minha sandália... não acredito que ela foi te perturbar com uma coisa tão trivial! - Ah, não tem problema. Estamos aqui para isso... - disse ela sorrindo. - Lá embaixo, está muito cheio? o meu pai já desceu? - Sim, ele já está lá embaixo... algumas famílias chegaram também... mas eu não diria que está muito cheio, só o normal. - Então está CHEIO! - Eu disse olhando para ela e caindo em um riso farto, mas melancólico, não sei por que eu tinha essa sensação de que estava indo para um matadouro. Eu tinha a sensação de que depois que eu descesse aquelas escadas alguma coisa realmente mudaria para sempre. Eu me peguei pensando no medo que eu estava sentindo de perder a minha protetora para sempre. Ela teria outras coisas para se preocupar e não seria mais comigo. Eu ia sentir falta de Beatrice, ia sentir falta de poder ir até o quarto dela a noite mesmo sendo uma cavalona de dezoito anos, ia sentir falta da sua fala doce sempre que eu me magoava com algo que o meu pai aprontou. Vou sentir falta de ter a mão sempre a sua paciência de um buda e conselhos práticos sobre a vida e sobre como resolver conflitos. Talvez seja por isso que ela quer tanto se afastar para viver a própria vida. Eu terminei de me arrumar e esperei que Beatrice aparecesse no meu quarto para o nosso ritual de bailes. Passou vinte minutos e lá estava ela dentro do quarto com o seu sorriso farto. - Vamos querida? - disse ela da mesma forma que a minha mãe falava - Vamos minha irmã... - eu respondi como sempre, mas naquela noite eu senti necessidade de dizer algo a mais - Bea... desculpa ser esse fardo para você! eu desejo muita felicidade nessa sua nova etapa, e que o seu futuro marido se encante por você hoje! - Obrigada Isabella... eu estava tão preocupada... em... deixar você aqui... e isso que você disse... obrigada minha irmã! - ela me abraçou muito forte - eu estou com medo... - ela confidenciou - Por quê? - Tenho medo de que ele não goste de mim...e eu... eu... sou apaixonada pelo Matteo, desde que somos pequenos. Uma informação nova em folha, eu jamais imaginei que ela fosse apaixonada por aquele moleque nojento da nossa infância. Mas isso explicava a falta de aversão por aquele casamento. Eu resolvi deixar para lá, afinal de contas, não era momento de julgar os sentimentos dela. Decidi ser o apoio que ela foi para mim a vida inteira. - Isso é impossível Beatrice, você é um encanto... doce, linda, inteligente... ele tem é sorte que o seu pai é louco e está arranjando esse casamento! - dei um sorriso largo para ela e disse - Vamos descer? Ela segurou a minha mão e partimos para o corredor antes da escada, ela estava mesmo muito nervosa, eu estava percebendo pelo jeito como a voz dela estava ecoando no corredor vazio. - Se acalma Beatrice! - Eu estou calma, eu estou respirando fundo... - Ela não estava respirando fundo. - Pense bem, temos sempre a vantagem de ser um casamento arranjado... então ele pode até te odiar, mas ainda assim vai ser obrigado a casar com você. Nossa, eu mandei muito m*l nessa. - Você não está ajudando Isabella Lion... p***a! - eu nunca a ouvia falando palavrão, a coisa estava crítica. E assim como quem não quer nada ela deu mais uma respirada profunda, se recuperou totalmente do próprio surto e desceu as escadas enquanto todos olhavam para ela, era o efeito Beatrice pelo salão... todos ficavam admirados com sua graça e beleza, com sua forma de ser sempre doce e ter sempre um sorriso leve estampado no rosto. E a mulher surtada de alguns minutos atrás já não existia mais na realidade, agora ela era novamente Beatrice Lion. Eu, a ovelha n***a da família desci logo atrás, eu não era dada a essas convenções por isso eu não sorri, não acenei e muito menos desci as escadas de um jeito chamativo e pomposo, eu só desci mesmo, o mais rápido que consegui para me misturar em meio aquele povo todo, se eu tivesse sorte ninguém notaria a minha presença durante toda a noite e eu poderia vez ou outra dar uma respirada longa no jardim. - Ah... minhas meninas... como estão lindas! - disse o meu pai se aproximando para nos abraçar. - Você está falando de mim e da Beatrice ou está incluindo sua amante quase menor de idade? - eu disse sendo sarcástica. - Pega leve Isabella... - disse Beatrice me repreendendo. - Hoje não é dia para brigas minha filha, hoje é dia de celebração, é um dia importante para a sua irmã e eu espero que você não estrague tudo! - o recado foi claro, eu deveria me afastar. E eu o fiz, porque eu não me importava com a festa, eu não estava nem aí para ser vista por todos, eu não ligava se a música era boa ou r**m, eu só queria que Beatrice estivesse alguma mostra do que é uma experiência normal de relacionamento, que não seja com toda essa pressão da idade média. Mas ela estava sorrindo, ela estava feliz! Eu olhei em seus olhos e toda aquela atenção estava sendo importante! E por dois segundos, eu fiquei feliz por ela. - Eles chegaram? - ela disse ansiosa - Sim, olha ali... estão vindo em nossa direção... Eu procurei todas as formas de fugir e consegui, graças a Deus. Eu não tive que presenciar aquele momento horrível e constrangedor e antes que a terrível família Salvatore chegasse perto eu sumi pela porta principal e fui até o primeiro arbusto que eu achei. Enquanto eu respirava o ar puro do jardim eu tentei não pensar em nada, aquele era um exercício tão bom que eu quase conseguia, pena que a minha mente era fodida o suficiente para não se calar nem por um segundo. - Alguém veio se esconder também... - disse um homem alto, eu não vou mentir, era lindo|! Lindo de você não conseguir parar de olhar para ele. Os cabelos castanhos estavam desalinhados e os olhos verdes marcavam a sua beleza. Os lábios carnudos emolduravam o sorriso branco e alinhado, estava fumando um cigarro despreocupado... o que não tinha nada a ver com o smoking que ele estava usando. Eu fiquei sem palavras sem rumo... sem saber se corria ou se eu ficava. Mas como sempre fui insistente até com situações de pressão, EU FIQUEI.
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