Capítulo dois

2063 Words
Ellen Quando acordei, senti minha cabeça doer. Não sabia o porquê, pois não toquei em álcool. Talvez fosse porque fiquei um bom tempo pensando no que havia acontecido ontem. A imagem de Anthony no escuro quase berrando o meu nome, não saiu da minha cabeça. Ele parecia outra pessoa, uma que eu ainda não conhecia. Nunca tive uma relação com qualquer outro garoto por ser mais calada e tímida. Já me peguei tendo sonhos estranhos e inapropriados com o meu primo mais velho, uma dessas vezes foi na noite passada. Era estranho e perturbador, pois não foi como das outras vezes. Anthony não era o homem carinhoso, mas sim sombrio que me amedrontava com a sua fúria. O problema era que eu não estava com tanto medo dele. Na verdade, isso me excitou. Loucura. Depois que meu pai morreu, acredito que adquiri uma paranoia sem sentido e isso estava afetando até o meu sono. Anthony não era essa pessoa malvada que me prenderia e torturaria. Apesar da sua mudança de atitude comigo ontem, meu primo ainda era a pessoa que eu mais confiava. Levantei-me da cama sentindo que a noite não tinha sido suficiente para que meu cansaço acabasse. O dia seria cheio, assim que pisasse na universidade. Havia um grande trabalho para ser entregue e eu odiava deixar as coisas para última hora. Tomei um banho relaxante, me preparando para ir direto para a faculdade. Ainda era cedo e isso significava que minha irmã ainda estava dormindo. Eu não podia dizer que odiava Becca, ela era minha irmã e a única que ainda estava aqui, fora Anthony. Talvez sua implicância comigo vinha do rancor do nosso pai que se separou da sua mãe para casar-se com a minha. Papai e eu éramos próximos, e depois que minha mãe morreu de câncer, ele passou a se afastar aos poucos, mas ainda éramos unha e carne. Sabia que isso incomodava Becca. Ela sempre demostrou seu desagrado por mim e depois que nosso pai faleceu, isso se tornou mais evidente. Para não acabar brigando com ela, optava por sair mais cedo e não estar em casa quando ela estivesse. Era claro que tínhamos que resolver esse problema entre nós, ainda mais agora que só restávamos nós. Desci as escadas brancas que tinha corrimões dourados, dando à entrada uma impressão de realeza. Nosso pai, Dominic Goldner, era conhecido por adorar esbanjar luxo e poder. Quando minha mãe era viva, eles davam festas grandiosas com muitos convidados que elogiavam a beleza do lugar. Ele dizia que eu havia puxado a beleza e delicadeza dela, mas não a forma glamorosa que Elisabete adorava viver. Mesmo minha família tendo muito dinheiro e propriedades ao redor do mundo, nunca gostei de esbanjar o nosso dinheiro com coisas desnecessárias, só por puro prazer. Eu odiava chamar atenção. Quando tinha que ser o centro das atenções, que graças a Deus eram poucas vezes, eu me sentia como se estivesse nua na frente de todos. — Não vai tomar café? – Perguntou Meredith. A mulher trabalhava aqui desde que nasci e quando minha mãe morreu, foi ela quem praticamente me criou. – Já está magra demais, não quero que passe m*l enquanto estuda. Geralmente não tomava café e isso irritava a mulher que tinha cabelos grisalhos e olhos castanhos. Ela agia como se realmente fosse minha mãe e isso era acolhedor. Aproximei-me dela e beijei sua testa carinhosamente. Seus olhos autoritários me julgavam sem ao menos ter falado nada. — Tomo algo na cantina da faculdade, sabe que não posso me atrasar. – Falei. Ela me olhou desconfiada e colocou as mãos na cintura como sempre fazia quando iria me contestar. — Sei bem que não quer ver Rebeca, mas não pode ficar saindo de casa sem comer nada. Quer que um vento leve você como se fosse uma pluma? Rio da sua piada sabendo que não era totalmente piada. Meredith adorava usar o seu sarcasmo em qualquer situação. — Não vou. – Disse antes de abrir a porta e sair. Era besteira sair fugida só porque não queria encontrar a minha irmã babaca, mas isso me salvava de um dia terrível e mau humor. Quando mais jovem diziam que eu poderia ser o que eu quisesse, só porque tinha memória fotográfica e conseguia aprender rápido. Porém, quando completei quinze anos descobri a minha paixão: literatura. O curso não era algo tão brilhante como medicina, direito ou engenharia, mas eu era apaixonada por livros. Quando abria um livro, o mundo ao meu redor mudava completamente, levando-me para outra realidade. Eu poderia dizer que me via em cada personagem que lia e isso me fez abrir a mente para as demais coisas. Quando cheguei a universidade, quase não tive tempo para comprar um café no Starbucks e um pedaço generoso de bolo. Mere podia até imaginar que minha magreza era devido à falta de alimentação, mas na verdade eu era como uma formiga que adorava devorar tudo o que fosse doce ou salgado. Eu era a aluna que sentava na frente para entender melhor o assunto, mesmo já sabendo o que seria. Era difícil fazer amigos, e eu nem sabia como tinha conseguido me tornar amiga de Eva. Ela era totalmente o oposto de mim: não tinha medo de nada, chamava atenção, sempre estava vestida com roupas sexy e não tinha dificuldade em fazer amizade com ninguém.  Às vezes eu a invejava. Eu estava começando a escrever um romance, o problema era a falta de experiência em relacionamento. Claro que sabia a teoria da coisa, pois como já dito, adorava ler livros, mas sabia que para um bom romance a autora deveria saber do que estava escrevendo e eu não fazia ideia de muita coisa. Como sempre, assim que as aulas haviam acabado, fui direto para a grande biblioteca da universidade em que estudava. A bibliotecária já me conhecia de tanto que eu frequentava. As horas pareciam voar quando estava aconchegada a uma poltrona lendo um bom livro. Como já estava adiantada, não precisava me preocupar com o trabalho que entregaria na próxima semana. Quando olhei as horas parecia que havia se passado dias. Saí do lugar quase correndo. Não era como se eu fosse a algum lugar importante, mas havia prometido a Mere que chegaria às seis. Ela completará sessenta e sete anos, e desejei preparar um pequeno jantar para dois. A mulher fazia tanto por mim, coisas que não eram um dever para ela, pois o amor que me dava era real, e isso era raro de se achar. Quando o taxi me deixou na porta da mansão, não ousei entrar. Por sorte a governanta tinha sua própria casa que ficava dentro da propriedade dos Goldner, mas quando cheguei ela não estava. Tudo estava escuro e silencioso. Achei estranho, pois havíamos combinado. Pelo visto eu teria que entrar em casa e dar de cara com a Becca e escutar mais algumas gracinhas que ela insistia em dizer mesmo depois de anos de convivência. O mais intrigante era que até a cozinha estava vazia e silenciosa. Parecia que todos haviam se mudado e me deixado para trás. Eu já estava desanimada, e ao chegar ao hall de entrada a imagem de Becca só me fez pensar que minha noite ainda ficaria r**m. Talvez as pessoas tivessem razão em dizer que eu deveria sair mais, mas como comprovado ontem, eu não era o tipo de pessoa que ia à festa e curtia. — Achou que fugiria de mim para sempre? – Questionou ela com sua pose típica de superioridade. Não poderia negar que Rebeca era uma mulher linda, poderia ser uma top model, mas decidiu optar por marketing. Os cabelos escuros, caíam pelos ombros firmes, o nariz arrebitado era consequência de uma cirurgia plástica, que não era a única que ela tinha feito. Rebeca adorava usar roupas chiques da moda atual, juntamente com joias glamorosas e caras, moldadas em ouro e diamante. Ela também tinha a segurança e determinação que eu tanto gostaria de ter. Claro que deixaria de fora a arrogância e egocentrismo, mas lá no fundo, eu queria ser mais como ela. Pelo menos não teria tanto medo de uma irmã mais velha que me odiava apenas por eu existir. — O que deseja? – Questionei, deixando os meus ombros cansados caírem. Já tinha desistido e provavelmente deixaria que as baboseiras dela entrassem por um ouvido e saíssem pelo outro. – Estou cansada, não quero ouvir qualquer coisa que tenha que dizer sobre mim que possam me deixar ainda mais cansada. Ela me olhou como se eu fosse a pior pessoa do mundo e impediu que eu subisse as escadas. Achei estranho a forma como estava agindo, isso somado ao fato de não ter mais ninguém nessa casa além de mim e ela, me deixava desconfiada. Os olhos claros estavam escuros de raiva. Eu não estava surpresa, desde muito jovem Rebeca me olhava com desdém. Quando criança, ela já me trancou em lugares escuros e sujos, só para me provocar medo. Mesmo nosso pai a punindo depois disso, ela fazia mesmo assim, e as punições só aumentavam o seu ódio pela minha presença. — Está cansada? – Questionou irritada, empurrando-me contra a parede. Bati a cabeça e pensei em reclamar, mas ela apertou as minhas bochechas com suas unhas longas e afiadas. – Eu estou cansada, Ellen. Cansada de ouvir você, de ver você e dividir tudo o que tenho com você, até o meu pai. – Eu sempre soube da sua mágoa, suas ações deixavam isso bem claro, porém, ela nunca tinha me machucado como agora. Me sentia m*l por saber que minha irmã não gostava de mim devido a isso. O papai nunca foi o melhor homem do mundo e, depois que Elisabete morreu, descobri que ele só havia se separado da mãe da Becca porque a traiu com a minha. – Você é irritante. Uma sugadora como a sua mãe. — Becca, sei que está... – Tentei dizer, mas ela apertou a minha pele com mais força. — JÁ CHEGA! – Eu não desejava sentir medo dela. Apesar de ser uma bruxa, duvidava que me fizesse algum m*l físico, no entanto, era capaz de tudo, pois minha pele ardia com o seu aperto. – Eu não quero mais ouvir a sua voz ou os seus pensamentos, lamurias ou suspiros. Meu pai já morreu e não tenho que suportar nada que tenha relação a você. — O que está dizendo? – Questionei a empurrando com força e tentando segurar as lágrimas que ardiam no meu rosto. – Eu sou sua irmã, apesar de tudo. O olhar que me lançou foi assustador e seu sorriso pareceu até psicótico. — Você é um rato que suga a energia dessa casa, até do papai que morreu por sua causa. — Ele teve um infarto. – Sussurrei já não aguentando o peso que estava nos meus olhos. – Por que está fazendo isso? — Quero que saia dessa casa agora! – Falou apontando as suas longas unhas pitadas de vermelho para mim. – Vou dar uma boa quantia para que não precise me dar dor de cabeça no futuro. Pagarei a faculdade e depois disso você deve sumir da minha vida. Fiquei estática ao ouvir esse absurdo. — Não preciso da sua esmola. – Falei ainda chorando e soluçando. Odiava parecer fraca, mas era impossível não ser afetada com as palavras malvadas que ela acabou de desferir. – Se acha que sou uma sugadora, devo lhe informar que não sou. Ao contrário de você, não preciso de luxo para viver. Tenho dinheiro o suficiente para pagar a minha faculdade, não se preocupe com isso. A verdade era que eu deveria ter saído dessa casa no dia seguinte em que enterramos nosso pai. Ela sempre me maltratou e deixou claro seu ódio por mim, mas resolvi empurrar esse problema com a barriga por conta de Mere e das lembranças que eu tinha nessa casa. Corri subindo as escadas ainda em prantos. Eu tinha perdido tudo, meus pais e agora minha casa. Não importava quanto luxo ela tinha, mas me acolhia nas noites frias e protegia da chuva. Assim que entrei em meu quarto liguei para Eva para lhe pedir ajuda. Ela morava sozinha, mas sabia que seu namorado ioiô vivia por lá também, porém, não pretendia fiar em sua casa por mais que uma noite.  
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