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1045 Words
Capítulo 1 Kamila Alcântara Pela primeira vez, depois de quase três semanas, consegui entrar no escritório do meu pai. Esse era o lugar onde ele passava a maior parte do tempo, imerso em seus pensamentos e segredos. Tudo está exatamente como ele deixou. Poucas pessoas sabiam da existência desse escritório no porão da nossa casa. Eu mesma nunca fui convidada a entrar aqui. Por ironia, minha primeira vez nesse lugar foi após a sua morte. Olho ao redor com cuidado, cada detalhe parece contar uma história. Pilhas de papéis, pastas velhas, recortes de jornal. Ele realmente estava investigando a máfia italiana, assim como mencionou naquela última noite. A identidade do chefão era o mistério que ele tentava desvendar. E não era algo recente. Eu descubro que, há anos, meu pai estava profundamente envolvido nessa investigação. Ele sempre dizia que tudo começou com as chacinas em Nápoles. Aquilo o consumiu, tornou-se sua obsessão, como se fosse o único motivo para ele continuar respirando. Agora, três meses depois de sua morte, e após receber o laudo da polícia afirmando que o acidente de trem foi causado por uma falha mecânica, algo não me parece certo. O que vejo aqui, em seu escritório, me faz acreditar que essa investigação o levou à morte. Pequenas evidências — documentos, anotações rabiscadas, e a sensação sufocante de que ele estava perto demais da verdade — me fazem duvidar de tudo. Meu pai tinha se tornado um arquivo morto. Provavelmente, foi assassinado a mando da máfia italiana. **Flashback on** — Fez café? — ele perguntou, entrando na cozinha. — Sim. Imaginei que ficaria lá embaixo por muito tempo. — Não desta vez — ele respondeu, com um sorriso discreto. — Queria ser uma mosquinha para saber o que tanto faz lá embaixo — comentei, brincando, enquanto ele me encarava e, inesperadamente, abriu um sorriso. — Acho que chegou a hora de dividir isso com você — disse ele, me entregando uma pasta. Peguei o objeto, estreitando os olhos ao ler o que estava escrito. — Máfia italiana, papai? — perguntei, intrigada, ao ver a silhueta de um rosto com um ponto de interrogação. — Ainda está atrás da identidade desse homem? — Kamila, você não entenderia meus motivos — ele respondeu, com um tom sério. — Mas quero que fique com isso. — Por quê? — questionei, confusa. — Caso algo aconteça comigo, essa pasta será crucial para você continuar a investigação. — Papai, eu não vou investigar a máfia italiana — respondi, surpresa e assustada. — Não é uma questão de escolha. Se algo me acontecer, você vai precisar fazer isso — disse ele, me olhando nos olhos, e eu senti o peso daquelas palavras. — Por que está falando assim? Está me deixando nervosa! — Você é uma jornalista investigativa. Se precisar usar essa pasta, saberá do que estou falando — ele disse, com um sorriso enigmático. — O café está ótimo, mas se tivesse açúcar, eu ficaria ainda mais feliz. — O senhor não pode tomar açúcar, esqueceu da sua diabete — Já basta a vida ser amarga, minha filha — respondeu, com um sorriso leve. **Flashback off** Eu poderia simplesmente aceitar o laudo da polícia e engolir a explicação de que o acidente de trem foi uma falha mecânica. Mas, como filha dele, e como jornalista investigativa, não posso ignorar as evidências que estão bem na minha frente. Na minha mente, conhecendo o meu pai como conhecia, sabia que toda essa investigação não se tratava apenas das chacinas. Havia algo mais profundo, algo que conectava ao seu passado, e minha intuição gritava isso a cada novo detalhe que eu descobria. Comecei a vasculhar todas as gavetas, mexendo em pastas, documentos, tudo que pudesse me dar uma pista. E então, encontrei algo. Um convite para um jantar em Nápoles. Estava guardado em uma pasta, junto com um rascunho escrito à mão pelo meu pai e uma lista de convidados. Alguns nomes estavam marcados com asteriscos, outros com pontos de interrogação. Havia endereços de pessoas, e até mesmo um cronograma detalhado das investigações que ele planejava conduzir. Meu coração disparou. Aquele convite... meu pai morreu em um trem a caminho de Nápoles. Engoli em seco, sentindo o peso da descoberta. Segurei o convite nas mãos, sabendo que era naquele jantar que eu precisava estar. Mesmo que minha intuição me dissesse para abandonar tudo e fugir, recomeçar a vida em algum outro lugar, longe desse pesadelo, meu coração não permitiria. Não antes de vingar a morte do meu pai. — Eu vou descobrir, papai... tudo sobre a máfia italiana. E vou acabar com eles — murmurei, decidida. O jantar seria em uma semana, em um palacete no coração de Nápoles. A lista de convidados incluía empresários, políticos e outras figuras influentes, muitos dos quais desconhecidos para mim. Mas meu pai sabia. Cada nome marcado com um asterisco ou um ponto de interrogação significava algo. Precisava descobrir o que. Meu primeiro impulso foi ligar para Laura, minha melhor amiga e colega jornalista. Ela sempre fora meu apoio, a pessoa com quem eu compartilhava tudo, e sabia que me ajudaria nessa. Mas hesitei. Quanto mais eu envolvesse pessoas próximas, mais as colocaria em perigo. Já tinha perdido meu pai; não poderia perder mais ninguém. Olhei novamente para a lista. Alguns dos endereços estavam em bairros nobres da cidade, outros, curiosamente, em locais mais obscuros, o tipo de lugar onde os segredos permanecem enterrados. Decidi que o primeiro passo seria investigar quem eram essas pessoas e por que estavam envolvidas com a máfia. Havia um nome em particular que me chamou a atenção: Raymond Bellini. Um empresário italiano, com grandes negócios em Milão, mas muito pouco conhecido fora desse círculo fechado. Ele tinha um asterisco e uma anotação: Suspeita de ligação direta com o amuleto. Isso era tudo o que eu precisava para começar. Mas, que amuleto? Decidida, tirei uma foto da lista de convidados e do convite, salvando tudo no meu celular. Sabia que precisaria de provas concretas para derrubar essas pessoas, mas, antes de mais nada, precisava de informações. Despedi-me silenciosamente do escritório do meu pai, fechando a porta atrás de mim, como se quisesse proteger tudo o que ele havia deixado. Eu já sabia o próximo passo: investigar Raymond Bellini.
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