Beatriz
25 ANOS DEPOIS...
Eu olho para as fotos e cartas espalhadas sobre a mesa, incapaz de processar a verdade que elas revelam. Toda a minha vida foi uma mentira. Fui enganada pelas pessoas que mais confiei, usada da mesma forma que minha mãe foi. As lágrimas escorrem pelo meu rosto enquanto minha mão se apoia sobre a barriga.
— Beatriz — a voz de Lorenzo ecoa atrás de mim, e eu me viro para encarar seu olhar preocupado.
— Vai embora — respondo friamente.
— Beatriz, por favor, me escuta — ele insiste.
— Você sabia de tudo e nunca me contou! — minhas palavras são duras enquanto o encaro com raiva.
— Eu descobri quando você já estava grávida — ele admite, a voz carregada de culpa. — Não queria piorar as coisas. Sua situação já era complicada.
— Quem tinha que decidir isso era eu, não você! — retruco, furiosa. — Você não tinha o direito de esconder nada.
— Eu sei — ele murmura. — Me arrependo profundamente. Por isso contei tudo agora. Você não podia continuar idolatrando seu tio.
— Eu o odeio — declaro com a voz firme, mas o desespero toma conta. — Tudo o que quero é me vingar. Ele destruiu a vida da minha mãe, foi o culpado pela morte dos meus pais. Todo esse tempo... ele estava por trás de tudo!
Lorenzo se aproxima, tentando me acalmar.
— Se acalma, meu amor — ele diz suavemente, acariciando meu rosto.
Eu balanço a cabeça, afastando suas mãos.
— Passei minha vida inteira adorando aquele homem. Na minha mente, ele era um herói, um segundo pai. Me lembro dele em casa com meus pais, rindo, cuidando de mim. Meu pai confiou a mim nos braços dele, sem saber que tudo era parte de um plano. A gravidez da minha mãe... é tudo tão claro agora. Ele sempre quis o controle. Nunca foi apenas uma organização criminosa brasileira. Meu tio comandava algo muito maior, enquanto me moldava para ser uma ferramenta dos seus planos. E agora descubro que sou a verdadeira herdeira da máfia australiana.
Lorenzo engole em seco.
— Eu sinto muito — ele diz, a dor evidente no olhar.
— Você entende o que isso significa? — pergunto, encarando-o. — Você é o chefe da máfia francesa. Eu, por direito, sou a sucessora do meu pai. Nosso filho, Lorenzo... ele nasce carregando o peso e o poder dessas famílias.
— Ele nunca vai tocar em vocês — Lorenzo promete. — Nem em você, nem no nosso filho.
Eu balanço a cabeça, incrédula.
— Sempre foi um plano, Lorenzo. Nosso relacionamento foi manipulado desde o início. Meu tio sabia que podia cultivar em mim o desejo de vingança. Ele me criou para matar Saimon e Samuel. Quando percebeu que você também era uma ameça, ele fez com que nossos caminhos se cruzassem, moldando nosso relacionamento para servi-lo.
Lorenzo endurece o semblante.
— Esqueça o seu tio. Eu mesmo vou acabar com ele.
— Não! — respondo com firmeza. — Sou eu quem vai matá-lo.
Sem mais uma palavra, pego as chaves do carro e caminho para a porta.
— Beatriz, volta aqui! — Lorenzo grita, mas ignoro, correndo para o elevador. Aperto os botões com pressa, e as portas se fecham.
As palavras de Lorenzo ecoam na minha mente, mas nada pode me deter agora. Minha raiva é um vulcão em erupção. Confiar no meu tio foi meu maior erro, e agora, sabendo o que ele fez à minha mãe, não posso descansar até acertar as contas.
FLASHBACK
Eu e minha mãe estávamos sentadas no chão da sala, brincando de pintar.
— Aqui, pinta de rosa — ela sugeriu, apontando para um pedaço do desenho. Seu sorriso era caloroso, cheio de amor.
— Assim? — perguntei, mostrando o pincel.
— Lindo, minha pequena Beatriz — ela disse, beijando minha testa.
A porta se abriu, revelando meu pai.
— Papai! — gritei, correndo para seus braços.
Ele me ergueu no ar, rindo.
— Você está cada vez mais linda, minha princesa — ele disse, beijando minha bochecha. — O que vocês estão aprontando?
— Estamos pintando! — respondi com entusiasmo, mostrando nosso desenho.
— Duas artistas talentosas — ele elogiou, enquanto minha mãe se aproximava, sorrindo. Ele a abraçou e a beijou carinhosamente.
— Eu te amo — ele disse.
— Eu também — ela respondeu, os olhos brilhando de alegria.
FLASH BLACK OFF
Minha mãe escondia sua dor por trás daquele sorriso, protegendo a mim e ao meu pai do perigo. Seu silêncio foi um sacrifício, mas agora eu sei o peso que ela carregou.
Estaciono o carro em frente ao hotel onde meu tio está hospedado. Pego a arma no banco do passageiro, colocando-a no colo. Meu bebê chuta e instintivamente passo a mão pela barriga.
— Calma, meu amor. Essa guerra está terminando — sussurro, avistando meu tio saindo pela porta principal. — Hoje tudo isso acaba.
Com a arma em mãos, saio do carro, pronta para enfrentar o homem que destruiu minha família.