Monique narrando
Mais uma surra dada pela minha mãe, eu tô a uma semana apanhando feito uma condenada, eu já tomei remédio pra me matar duas vezes, fui parar no hospital, mas nem pra me matar eu sirvo, eu tô arrasada, tudo no meu corpo dói, perdi mais um semestre da faculdade por conta das surras que ela me dá, eu já tranquei a faculdade duas vezes por esse motivo, já cansei de ir estudar toda roxa e as pessoas ficavam me questionando, e eu não queria explicar nada, já era vergonhoso estar naquela situação, e ter que me explicar também, era demais pra mim
Eu desde que me entendo por gente, sempre fui sozinha, minha mãe mora comigo, mas ela nunca foi e nem fez questão de ser presente, sempre fui criada pela minha babá, mas quando eu fiz quinze anos minha mãe mandou ela embora, tive que aprender a fazer tudo sozinha, desde arrumar a casa, a fazer comida, estudar, enfim, tudo absolutamente sozinha, já que minha mãe dificilmente estava em casa comigo
Já teve época de eu ficar dois meses sozinha direto, ela me monitorava pelas câmeras do apartamento e so, e quando eu ligava pra ela, tomava esporro, porque ela dizia que sabia que eu estava bem e pra eu parar de drama
Eu não sei quem é meu pai, eu sei que minha mãe é casada, e que ela tem uma vida com o meu pai, só falei com ele por telefone duas vezes, mas nunca cheguei a ver o seu rosto, e posso afirmar que as duas vezes que ele falou comigo foi contra gosto é isso eu percebia pela sua voz
Muitos me chamam de mimada, sempre frequentei as melhores escolas, melhores cursos, melhores lugares, estou na melhor faculdade dessa cidade, mas nada disso me faz, se eu tenho as melhores notas é porque eu estudo muito, se eu sou a número um de todas as minhas turmas é porque eu sempre estudei muito, mas infelizmente eu reprovei várias vezes por falta, os professores sempre tentaram me ajudar, mas eu infelizmente falto muito por conta da minha mãe, já fui com braço quebrado pra escola, já denunciaram a minha mãe, é esse foi o pior dia da minha vida, foi a última vez que eu falei com o meu pai, eu tomei uma surra que minha mãe chegou a me amarrar na cama por dois dias, foi nojento, humilhante é vergonhoso, depois disso, obviamente eu fui parar em um hospital
Mas tem algo que eu nunca entendi, sempre que eu vou parar no hospital, ninguém pergunta nada, sempre são os mesmos médicos, e ninguém nem olha na minha cara, eu posso não saber quem é meu pai, mas sem dúvidas, uma boa pessoa ele não é, disso eu tenho absoluta certeza
Eu tenho uma única amiga, Alice, doidinha, fez de tudo pra se aproximar de mim, já que eu não falo com ninguém, quantas vezes eu deixei ela falando sozinha, mas ela não desistiu, sempre veio falar comigo, me mandava mensagem, já falsificou inúmeras assinaturas minha na faculdade, já fez trabalho por mim em sala quando eu não conseguia ir, e nunca me questionou nada
Nessa última surra que eu levei, foi a pior de todas, eu fiquei uma semana sem conseguir colocar a cara do lado de fora, em cima da cama feito uma indigente, tenho certeza que minha perna tá quebrada, eu tô completamente quebrada, por dentro eu já não tenho mais sentimentos, nada me abala ou me dói mais, se não fosse a Alice acampar na porta do meu apartamento é quase arrombar a porta, eu não teria aberto, mas eu já estava entregue ao mundo e ia me despedir dela, mas a baixinha saiu me arrastando do jeito que eu estava e fez eu contar toda a minha vida pra ela, ela insistiu tanto, foi tão incisiva em saber de tudo, sem ligar se estava me invadindo ou não, ela só queria saber e não admitia a forma em que eu me encontrava, me ganhou no cansaço
E eu que já não aguentava mais, desabafei, coloquei tudo pra fora, chorei, me desesperei, tive crise de ansiedade, e ela me acolheu, me abraçou, e o mais importante, em momento nenhum ela me julgou, eu pude colocar tudo pra fora, pude chorar, pude sofrer, e me senti acolhida por ela
Sem dizer nada ela me levou pra sua casa, eu não sabia de onde ela era, só vi que entramos em uma favela e ninguém a parou, ela simplesmente entrou e parou na entrada de uma boca, onde veio um homem gritando com ela, sua expressão não era das melhores e eu sai do carro com muito medo
Quando aquele homem alto veio pra cima de mim, eu engoli seco pensando que ia tomar outra surra, Alice entrou no meio e o chamou de irmão e saiu com ele, todos me encaravam, e eu estava me sentindo humilhada
Por fim quando eles me levaram pro hospital, é aquele homem falou comigo, meu corpo todo se arrepiou, eu comecei a suar frio, um medo assustador do seu tom de voz firme e sério, seu olhar penetrante e eu estava desesperada
Alice entrou comigo no hospital e minhas pernas doíam muito, ela pediu preferência e logo entraram comigo, fizeram todo tipo de exame em mim, tiraram vários tubos de sangue, e a Alice não saiu um minuto do meu lado, ela é a melhor amiga que poderia ter aparecido na minha vida
O resultado chegou, braço quebrado em três lugares, tornozelo torcido, a outra perna quebrada, ia precisar de cirurgia, é uma anemia grave, e minhas taxas metabólicas todas desreguladas, resumindo, fiquei internada, e em pânico
- olha tem a festa de aniversário do meu pai agora é eu tenho que ir - Alice fala segurando minha mão- aqui você tá segura, meus segurancas vão ficar aqui na porta, qualquer coisa você pede pra eles me ligarem - ela fala tranquila - assim que a festa acabar eu venho correndo pra cá, não se preocupa - ela fala e eu concordo chorando
- obrigada por tudo Alice, de coração - falo e ela n**a sorrindo - você é a minha melhor amiga mas assim que eu melhorar eu vou embora - falo e ela n**a- não quero e nem posso trazer problemas pra você e sua família, não sei se a minha mãe vai atrás de mim ou o que pode acontecer- falo insegura do meu futuro- mas eu te agradeço muito por tudo que tem feito por mim- falo e ela n**a se despedindo
Fico ali sozinha lembrando das palavras e do olhar duro da minha mãe, da sua raiva, seu desprezo, eu chorei tanto, eu chorei até dormir, são muitos remédios, minha imunidade está baixíssima, e eu acabei apagando
Acordei horas depois com barulhos no quarto e olhei assustada dois homens, Alice e uma mulher idêntica a ela, me encolhi na cama assustada e encarando o olhar frio dos homens sobre mim
- você é a Monique né ?- a mulher que a Alice é a cópia se aproxima e eu concordo - sou Aline mãe da Alice e do tom que você já conheceu- ela fala perto de mim e eu continuo encolhida - o que aconteceu com você ?- ela me questiona e eu olho pra Alice com medo de falar
- fala amiga - Alice me incentiva - nós queremos te ajudar - ela fala perto de mim- o ogro que você conheceu é meu irmão- ela aponta - aquele ali é meu pai e essa é a minha mãe - ela específica e eu engulo seco já que estão todos fortemente armados e eu fico morrendo de medo
Já fui ameacada com uma arma, minha mãe me ameacou, e eu tenho pavor de arma, e agora não é uma pistola que tá na minha frente, são fuzis, o que faz meu corpo todo tremer
- conta a tua história aí - o ogro que falou comigo mais cedo me olha com um olhar duro
Eu fecho os olhos, respiro fundo, engolindo seco eu começo a contar tudo pra eles, sem conseguir os encarar de tanta vergonha