Rotina quebrada

1427 Words
— Kagami... O ruivo ouviu o chamado preguiçoso e não se abalou. Apenas esticou a mão esquerda, pegou o controle remoto e aumentou um pouco o volume da televisão. Sequer desviou os olhos do caderno ou parou de escrever com a mão direita. Estava sentado no chão da sala, reclinado sobre a mesinha de centro, resolvendo as lições de inglês de Aomine, o folgado deitado no sofá jogando vídeo-game. — Kagami... Dessa vez largou o lápis e levantou-se. Foi até o quarto pegar um segundo travesseiro, voltou para a sala e ajeitou sobre o que Aomine já usava, assim que o rapaz ergueu-se um pouco. Dois travesseiros eram melhores do que um. Sentou-se no chão e retomou a lição. m*l respondeu duas questões e o silêncio foi quebrado. — Kagami... Sem reclamar levantou-se outra vez. Foi até a janela e puxou as cortinhas escuras, diminuindo consideravelmente a claridade na sala, não a ponto de atrapalhar a leitura do caderno, mas o bastante para dar certo “clima” ao ambiente. Sentou-se no chão e concentrou-se nas respostas. Conseguiu virar a página (wow) antes de ouvir seu nome. — Kagami... Girou os olhos usando toda sua concentração para não perder a paciência. Ergueu-se e foi até o canto da sala pegar o aquecedor de ar portátil. Ligou o aparelho na velocidade mediana e assim que o ar mais quente se esparramou pela sala voltou ao seu lugar resolvendo exercícios. Por quase dois minutos. — Kagami... Engoliu um palavrão, não ia adiantar perder a paciência de qualquer jeito. Foi até a cozinha buscar uma garrafinha de água gelada, mesmo com o clima cada vez mais frio. Ao voltar para a sala arremessou para Aomine que a pegou no ar, com um sorriso muito satisfeito. Agora sim! O ritual estava completo. Fazia quase uma semana que estavam naquela rotina. Depois de dois dias Taiga pegara o jeito. Cada chamado era sempre para uma coisa específica, e geralmente vinha em ordem: volume da televisão, travesseiro extra, cortina semicerrada, aquecedor de ar no médio e água gelada. Então ganhava como prêmio a paz para que resolvesse as tarefas de casa até que tivesse que improvisar algo para comerem e então Aomine ia embora. Já se acostumara. Apesar de chato e inconveniente, quando entrava na rotina podia seguir o fluxo sem se estressar ou irritar. Além disso, Taiga tinha outro assunto mais sério em mente... — Kagami... O ruivo soltou o lápis sobre o caderno e fez menção de se erguer, mas parou. Franziu as sobrancelhas, confuso. Aquele chamado fora inusitado! — O que você quer, Aomine? — hesitação de dois segundos — SAMA! — Nada. É que esse é o nome da febre que estou criando. O que acha: Kagami1 N1? Vou dizimar o mundo com ela. Taiga fez uma careta. — Faça como quiser — baixou os olhos para o caderno. — O que você prefere: contágio pela água ou pelo ar? — Pela água — respondeu sem dar muita atenção ao caso. — Os sintomas... as pessoas contagiadas com Kagami1 N1 vão se encher de bolhas de pus e sangrar ou sofrer degeneração cerebral? — Que jogo nojento! — Taiga resmungou — Eles deviam ser Aominezados. Isso!! Todo ser humano Aominezado vai ficar chato pra c****e, daí um mata o outro e fim. Daiki riu da resposta. — Não tem essa opção no menu ainda. São as bolhas ou a degeneração. — Faça como quiser, inferno — deu de ombros. — Oe, Kagami. Vou começar o contágio pelos Estados Unidos. Faz de conta que você ta lá ainda, o que acha? — O máximo. Mas devia começar pelo Japão e se m***r no processo. — Olha o respeito, e*****o. Melhor contagiar o Sudão. Ao ouvir isso Kagami ergueu a cabeça e olhou a tela da TV. — Por quê? Eles já têm tanto problema por lá... devia jogar algo mais útil. Daiki observou o outro rapaz. Estava estranhando aquela passividade toda. Pelo jeito Kagami resolvera ser o melhor e*****o do mundo, sem reclamar ou criar caso. Não vira a menor chance de aumentar o castigo. Jogariam a revanche no dia seguinte. — Isso que é levar um jogo a sério — se viu dizendo sem poder controlar, um pouco impressionado. — Hn? — Kagami voltou os olhos em Daiki, mas logo a compreensão do que ele dissera venceu a distração. Animou-se completamente — Claro! Sempre levo meus jogos a sério. Faz uns dois dias que não estou dormindo direito de empolgação. Aomine pausou o game. — Dois dias sem dormir? Oe, é exagero, Kagami! — Exagero?! É uma disputa de vida ou morte — parou e pensou um pouco — Ta, não é de vida ou morte. Mas eu não quero perder de jeito algum! — E você acha que vai ganhar? — ergueu uma sobrancelha, desdenhando das esperanças do ruivo. p***e coitado, acreditando que ia ficar livre. A pergunta depreciativa não diminuiu a empolgação de Taiga. Pelo contrário! Foi como se chamas se acendessem naquelas íris avermelhadas. Nunca vira o outro tão empolgado com algo! Incrível. — Com certeza! — Quanta esperança... — Oe, eu sei que não será fácil. Ele já viu quase todos os nossos truques — baixou o tom de voz — E nosso último jogo terminou em empate. Mas dessa vez vou vencer com certeza!! Daiki não compreendeu. “Ele”? “Empate”? Do que o i****a estava falando? — Bakagami, só pra ficar claro: o assunto atual é o jogo de amanhã? O ruivo abriu os lábios para responder, mas refreou-se a tempo. Deu a impressão de pensar, enrugando a testa. Havia um ponto de interrogação quase visível pairando sobre sua cabeça. — Que jogo de amanhã? — c*****o, Kagami! Nosso um-contra-um! — Daiki irritou-se. — Ow. Verdade! Eu tinha me esquecido... é amanhã! — E do que você tá falando afinal? — perguntou meio chocado com o que acabara de ouvir. Taiga inclinou-se para trás e apoiou as duas mãos no piso de madeira. Abriu um sorriso tão iluminado que Daiki pensou que ia ficar cego! — Nosa técnica conseguiu marcar um amistoso contra Shutoku. Vou enfrentar Midorima na sexta-feira! m*l posso esperar. Daiki fez uma careta. — Desde quando jogar contra o Midorima é mais emocionante do que jogar contra mim? Kagami caiu de costas o chão e riu. Riu muito. — Não fode, Ahomine! Partida séria é diferente! Nosso um-contra-um é só uma brincadeira de rua. Mas jogar pra valer contra o Midorima vai ser demais! Terminamos empatados da ultima vez. Agora eu tenho que ganhar! — Ee? Você perdeu o sono só por causa disso? — Claro! Estou empolgado demais, não consigo parar de pensar na sexta-feira! Aquele cara é um monstro! To contando as horas... — sentou-se no chão e lançou um olhar para Daiki que comprovava o quão ansioso o ruivo se sentia — Esqueci completamente nosso um-contra-um amanhã. Mas não se preocupa, eu vou jogar muito a sério e... Aomine balançou a cabeça e estreitou os olhos, mirando Taiga com raiva. — Não vai ter revanche amanhã, baka. — O quê?! — foi a vez de Kagami ficar chocado. — Mudei de ideia. Sem revanche pra você tão cedo. — n******e fazer isso! — Claro que posso — ficou em pé, deixando o joystick sobre o sofá. A v*****e de jogar desaparecera. Seu bom humor levara uma rasteira, caíra no chão e se partira em milhões de pedacinhos — Meu e*****o, minhas regras. — Não é justo! — Taiga desesperou-se. — Eu nunca disse que seria — pegou a mochila e colocou sobre o ombro, preparando-se para ir embora. Não se preocupou em recolher o caderno que o ruivo respondia. — AOMINE! — Nosso jogo não é só uma “brincadeira” de rua. Leve mais a sério. — Eu levo! Espera! — ficou de pé enquanto Daiki calçava os tênis no genkan. Nem se deu ao trabalho de amarrar o cadarço, apenas encaixando-os nos pés cobertos com a meia grossa. — Quando passar sua crise de menininha eu marco outra data. Mas é melhor ter foco, baka. E não pensar em mais nada além de mim — ordenou antes de sair pela porta, deixando um rastro n***o de puro mau humor. Kagami sentiu o sangue gelar nas veias. Seu queixo foi ao chão e esqueceu o caminho de volta. Em segundos o rosto pegou fogo, enquanto corava do pescoço até as orelhas. Aquele animal tinha a menor noção da coisa estranha que tinha acabado de exigir?! E que diabos fora aquela cena?!
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