Gabrielli
– Ele não pode fazer isso, vamos fugir, é isso? Vamos pegar Jorginho e ir embora. Vagner vai conosco, tenho certeza de que vai aceitar.
Irma andava de um lado para o outro visivelmente nervosa, ela sabe que não há nada que possa ser feito para evitar, olho para a janela percebendo que uma pequena comitiva de homens está parada na porta.
– Eles com certeza imaginaram que teríamos essa ideia, veja lá fora, Irma.
Ela abriu a porta olhando para o lado de fora, bateu a porta com força mostrando seu ódio com a situação que a deixava chateada.
– Vou atrás do judeu, isso não é justo. Então quer dizer que eles fizeram tudo aquilo e ainda vão sair ilesos? É isso? O que mais me entristece é seu pai, que merda de ideia é essa? Limpar honra? Ele deveria honrar vocês e não recompensar dois e**********s.
Marcele olhava para mim como se esperasse alguma explicação ou saída, não sei o que fazer, novamente me sinto acuada.
– Jorginho tem fome, mamãe.
Meu irmão foi até onde eu estava, sorrindo e beijando minha mão, pensei nele olhando cada detalhe seu, meu irmãozinho está usando uma blusa amarelada junto com uma bermuda que não cabe mais, enquanto segura seu carrinho sem uma das rodas. Jorginho merece mais, e tenho que entender que por mais que queira jamais vou conseguir dar isso a ele.
– Irma, por favor se sente, vou fazer o jantar, Jorginho está com fome.
O casamento vai trazer segurança para minha família, meus irmãos merecem mais do que estou oferecendo. Preciso ter consciência disso, não é só um casamento com os homens que destruíram nossa vida, mas também a possibilidade de dar a Jorginho e as crianças que vão nascer a possibilidade de terem uma vida melhor.
Queria gritar, chorar e brigar, mas não ia adiantar de nada, somente iria atrasar o inevitável. Os Assis são fortes, possuem influência entre todas as famílias e por isso sei que não vou conseguir evitar que coloquem suas mãos asquerosas em nós. Terminei de fazer o jantar colocando a comida primeiro para Jorginho, depois fiz o mesmo com Marcele e Irma.
Comemos em silêncio como a muito tempo não fazíamos, mais uma vez eles tiram algo de nós, sabia que não iria conseguir fugir, quem estou tentando enganar? É inútil tentar lutar uma guerra já perdida, começo a chorar sufocada com tudo que está acontecendo.
– Não quero me casar com Hugo, e nem com ninguém. Que minha honra fique suja para sempre, não ligo, mas não posso me enganar, como vou cuidar de vocês? Do meu menino que ainda cresce em meu ventre? Marcele, lamento tanto, não queria que aquele homem chegasse perto de você, ele é um animal, você merecia um homem bom e gentil.
– Está tudo bem, Gabi, vou ficar bem. Ele vai me desprezar quando souber que estou grávida de uma menina, lembra como papai desprezava mamãe por nossa causa? Jorginho merece mais do que temos a oferecer, talvez esse casamento seja só fachada. Eles com certeza têm ódio de nós, pois estão sendo obrigados a se casar.
Irma começou a chorar também sentindo nossa dor, nunca a vi chorar assim, talvez sinta a mesma impotência que nós.
– Vocês não merecem isso, estávamos indo tão bem, sabe? Não entendo por que Deus tem essa forma horrível de nos punir por erros que não foram nossa culpa.
– Não foi Deus, Irma, é a vida que nos impuseram. Eles não vão querer consumar o casamento, viveremos longe deles, pois as mulheres são separadas dos homens na família Assis, com certeza não vão querer conviver com as crianças. Só precisamos lidar com essa nova situação da melhor forma possível, apressar o casamento é o melhor assim não vão poder tocar em nós, depois do parto virá o resguardo e ficaremos feias para servi-los.
Hugo e Gregório devem gostar de mulheres magras e bem cuidadas, a vaidade e beleza foram embora no dia que nos violaram, portanto tenho certeza de que tem nojo de nós.
– Sim, tem razão, irmã. Não temos que ser bonitas, podemos continuar assim, sem a obrigação de parecer impecáveis. Terão nojo e vergonha de nós, não seremos obrigadas a ir em festas ou organizar nenhum evento, a senhora Assis ficará feliz em nos deixar de lado.
Irma enxugou as lágrimas percebendo nosso plano, gosto da minha versão sem obrigação nenhuma de parecer bonita ou elegante, Marcele também, ela sempre está com uma flor enfeitando os cabelos ou presa em seu vestido, algo que jamais seria aceito como elegante e fino.
– Além disso, terão minha cia nessa empreitada, a ex prostituta e filha bastarda de uma das cinco famílias. Vagner vai me assumir como sua mulher, aconteceu tanta coisa que não pude contar, tenho outra novidade também.
Ela tirou do bolso um teste de gravidez sorrindo feito uma boba, nunca acreditei que ela não pudesse ser mãe, desconfiava que usava algum método, mas não que fosse estéril.
– Como Vagner reagiu ou ele não sabe?
– Ele sabe. Começou com aquela história de ser velho demais para mim, e aquele monte de baboseira que vocês já sabem. O fato dele ter 35 e eu 22 o incomoda, mas vamos ver como será a vida daqui para frente. Pelo menos uma notícia boa no meio de tantas ruins, mas e agora começamos com o nosso plano quando?
Limpei o rosto usando a minha melhor expressão, sabia bem o que fazer para iniciar nosso plano. Fui até a porta pedindo para falar com o chefe dos seguranças, o homem apareceu com o semblante fechado como é de se esperar.
– Gostaria de falar por ligação com meu futuro marido, mas infelizmente não tenho celular, pode por favor ligar para mim?
O homem pegou o celular digitando o número do seu superior, vi que conversou um pouco com ele e logo passou o aparelho celular para mim. Tenho certeza de que se souber fazer tudo da forma certa vou conseguir afastá-los de nós e das crianças.
Hugo
– Senhor Hugo, desculpe ligar assim, o assunto do nosso casamento é algo que acredito ser de extrema urgência por isso quis ligar.
– Claro, Gabrielli, ainda mais por saber que está grávida de um filho meu, é menino?
– Sim, senhor, mas voltando ao assunto do casamento: o que acha de celebrarmos os casamentos juntos na próxima semana?
Foi uma surpresa saber sobre a gravidez ainda mais por Jorge ter escondido esse detalhe tão importante, Gregório está do meu lado ouvindo toda a conversa também interessado em saber de tudo.
– Por que tão rápido? O certo é fazermos o noivado primeiro como manda a tradição.
– Sei que é um homem ponderado e com certeza entende como para nós será humilhante aparecer no estado que estamos. Entende que quanto mais rápido nossos casamentos acontecerem melhor será para evitar que nossa reputação seja mais exposta.
Coloquei o telefone no mudo para perguntar a Gregório o que ele achava dessa questão.
– Ela tem razão, e será bom para nós, quanto mais rápido acontecer esse casamento melhor, quero minha Marcele ao meu lado logo.
Voltei para a ligação assim que tive a resposta por parte do meu irmão.
– Estamos de acordo com essa questão, mas porque está mais aberta ao casamento?
– É o melhor, senhor, quero que meu irmão, meu filho e minha sobrinha tenham o que tive na minha infância, gosto de viver aqui, mas reconheço que passarei necessidade com mais duas crianças para alimentar.
Ela é inteligente, sabe que por mais que goste de viver naquele lugar fedido tem opções melhores e quer poder oferecer isso as crianças.
– Entendi! Agiu bem em reconsiderar Gabrielli, semana que vem é excelente. Podemos marcar ainda hoje com o padre.
– Se incomodaria se não fosse um casamento religioso, senhor? Apenas assinamos os papéis e estamos casados como manda a lei.
Não sou um homem religioso, e pelo jeito, minha futura esposa também não.
– Sem festa também, suponho?
– Sim, é o melhor, senhor. Não queremos nada chamativo, nem mesmo uma recepção, apenas o casamento no cartório, é excelente para mim e minha irmã.
– Perfeito! Aproveitando: precisa de algo? Dinheiro, roupas, mantimentos ou qualquer outra necessidade? Como seu futuro marido quero suprir as suas necessidades, e meu irmão quer fazer o mesmo por Marcele.
Sua aceitação foi uma surpresa agradável agora será uma questão de tempo até sentir o mesmo que eu.
– Não, senhor, estamos muito bem. Agradeço a atenção, aguardo seus próximos contatos, tenha uma boa noite e bom descanso.
Quando ia me despedir ela desligou o telefone, também não posso exigir que seja aberta a tudo. Mas só de receber sua ligação fiquei animado, Gabrielli espera meu primeiro filho, já consigo imaginar como será quando nascer, estou realizando meu maior sonho tendo a mulher que sempre quis para mim.