Capítulo 2

3423 Words
A maciez, o calor e a delicadeza da mão de Jean, são as únicas coisas em que consigo pensar enquanto caminho ao seu lado. Além do fato dele ser um desconhecido com o qual estou entrando na boate como se fosse meu namorado. Sei que deveria, mas não estou desconfortável com isso. E ele também não parece se incomodar com o fato, aliás, pelo sorriso estampado em seu rosto, demonstra que está apreciando a oportunidade. Então ele solta da minha mão, a colocando no meio das minhas costas, me fazendo arrepiar como se fosse gelo escorrendo da nuca até a lombar. O rosto de Jean se aproxima devagar em direção ao meu, prendo a respiração, os lábios carnudos do meu "namorado" encontram a minha orelha, pronunciando as seguintes palavras: — Bem-vinda a festa. Espero que encontre o rapaz que a aguarda aqui dentro. — Não! Não é um rapaz! Eu não tenho ninguém! Estou completamente sozinha! Quer dizer... ahn... — revelo, praticamente gritando, fazendo Jean soltar uma risada gostosa diante do meu desespero. Fico vermelha mais uma vez, droga já comecei com o pé esquerdo. Por que sou tão atrapalhada? Respiro fundo e tento explicar — Eu fui convidada por uma das formandas. — Qual delas? — pergunta Jean, tranquilamente. — Tiemi. — respondo então na testa de Jean surge uma enorme ruga, indicando que ou tem muitas "Tiemis" em medicina, ou que não tem a menor ideia de quem seja. De qualquer forma, eu teria de se esforçar para lembrar o sobrenome da Tiemi, mas nada me vem a cabeça — Ela é japonesa, não que isso seja relevante, mas acredito que não devem ter muitas Tiemi, japonesas... Droga, eu não consigo lembrar seu sobrenome. — Eu sei quem é a Tiemi. — responde Jean, sério. Sua expressão está bem fechada, como se eu tivesse dito algo errado, muito errado. Sinto-me culpada sem saber pelo quê. — Desculpa, você fez uma cara, como se o nome fosse estranho — digo, sem graça me segurando para não pedir desculpas mais uma vez. — Eu achei estranho o fato de você conhecer a Tiemi. — explica Jean acariciando as minhas costas, um toque que não passa despercebido por mim, um sinal de que está tudo bem agora. Então me vêm uma dúvida. — Por que diz isso? — pergunto me esforçando para pensar em outra coisa que não fosse a mão de Jean próxima a zíper do vestido... bem no feixe. — Por dois motivos: O primeiro que eu nunca a vi nas festas em meio as amigas da Tiemi e nem com a própria. Segundo, você não parece ser o tipo de garota que seria amiga da Tiemi. Então, eu criei duas teorias com relação a quem é essa bela garota em minha frente — E quais são as suas teorias? — pergunto mais curiosa ainda. — Bom, eu não devia estar falando com estranhas. — comenta Jean, me deixando surpresa. Ele era um estranho que me colocou para dentro de uma boate. Ele sorri — Ainda mais com aquelas que nem ao menos revelam seus nomes, mesmo que falsos. — Oh, desculpa. Meu nome é Catarina... vai querer meu sobrenome também? Sabe, eu não sou boa em inventar sobrenomes... — respondo, entrando na brincadeira. — Tudo bem, eu também não sou bom em inventar sobrenomes... muito menos nomes, por isso sempre uso Jean, é mais fácil de lembrar — responde Jean sorrindo. O sorriso dele é perfeito, alinhado e me enfeitiça — Porém, devo admitir que se esse nome for falso, você é ótima em inventar. Ainda mais um nome tão forte. Agora se for verdadeiro, quero escutar a história por trás dele. — Depois de você em contar suas teorias ao meu respeito... e o que o fez me ajudar a entrar aqui. — provoco mordendo os lábios. — Claro, mas para isso, teremos de entrar, sentar em meu bangalô, ou então no bar... Mas suponho que você precisa encontrar a Tiemi primeiro. — recorda Jean se afastando do meu rosto deixando a realidade me esbofetear: Tiemi. — Sim, preciso mesmo — respondo sem graça. Por alguns minutos esqueci completamente da minha colega de casa. Eu me afasto de Jean, arrumando meu cabelo atrás da orelha. Ergo minha mão em sua direção — Então nós ficamos por aqui. Um prazer conhecê-lo, Jean e obrigada por me ajudar. — O prazer foi meu, Catarina — responde Jean com um sorriso que escorre para o canto de sua boca, lentamente, enquanto sua mão toca a minha, firme. Respiro fundo e com muito esforço me afasto para entrar na festa. Caminho devagar, com a sensação de que ele me observava. Sinto o calor, o perfume que Jean exala bem próximo, como se estivesse andando atrás de mim. Então me viro, quase trombando nele. Sorrimos um para o outro e então ele diz: — Eu tenho uma ideia que com certeza você irá gostar. — Bom, eu tenho que escutar para saber se gostei ou não — respondo já animada com o fato dele estar perto de mim novamente. — Eu decidi unir o melhor dos dois mundos. Eu quero saber mais sobre você e você quer saber mais sobre mim. —Ah é, eu quero? — irônica. — Quer sim... — responde Jean levantando a mão para tocar nos meus cabelos, os colocando para trás da orelha mais uma vez. Então sua mão desliza pelas bochechas, ficando vermelhas — Eu preciso entender você e seus detalhes — O toque e seus dedos terminam em meu queixo — Mas temos a questão da Tiemi, você precisa encontrar a sua "amiga". — Sim, eu preciso — sussurro sem ar ainda saindo do transe — Eu a prometi que a encontraria aqui. — Porém, não tem a menor ideia de encontrá-la aqui — comenta Jean recebendo um aceno afirmativo, então ele se afasta e aponta para si — Olha, eu conheço a Tiemi baladeira e sei exatamente os lugares onde ela fica em uma boate. São sete anos de convivência com aquela doida, logo eu tenho mais vantagem que você. — Então qual é a sua ideia? — curiosa — Eu a ajudo procurando a Tiemi e você me concede a honra de conhecê-la melhor. — Uma boa ideia... — Não necessariamente nessa ordem. — reforça Jean recebendo um olhar surpreso. — Como assim? — Bom, conhecendo a Tiemi, como eu conheço, tenho certeza que ela estará mais próxima possível do bar, assim ela evita se locomover tanto e pode beber mais até cair. Então ficaremos no bar aguardando que a j**a vá até lá pegar umas bebidas. Ou mandar uma das suas amigas. — Ela veio com umas meninas que eu conheço — comento, animada com a ideia. — Mais fácil ainda. Enquanto ela não aparece, você me conta mais sobre como uma garota como você veio parar aqui. Que tal? — propõe Jean olhando fixamente para mim e depois para os meus lábios. Ele me deseja e isso é recíproco, algo que nunca senti antes. — Eu aceito. — respondo sorrindo em seguida. — Perfeito. Permita-me, madame — diz Jean deixando seu braço a disposição para entrelaçar com o meu, que faço sem pestanejar. **** O que posso dizer daquela boate a menos que era um lugar que eu jamais pensei que entraria? Por todo lado tinha água, formando um imenso rio. Estátuas banhadas a ouro, os detalhes da parede em dourado, cristais para todos os lados e o aroma ímpar. No teto, bolhas de veludo e deles saem cordões de cristais e os mais belos lustres que já vi na vida. Além, de ao fundo terem bangalôs que eu só vi em filmes, com garçons circulando servindo comidas tão exóticas que ficaria em dúvida entre comer e guardar. Sem contar as pessoas que ali estavam, todas muito elegantes, me fazendo sentir um pouco incomodado, como se eu estivesse invadindo o mundo deles. Uma fraude completa. Olho para Jean que está alheio aqueles pensamentos, nada o parece surpreender, me fazendo ficar sem graça, aquele é o mundo dele. Caminhamos por entre as águas, e por instinto, aperto mais forte seu braço. Então, meu "namorado" olha para mim: — Sua primeira vez aqui né? — pergunta com aquele sorriso. Por algum motivo, seu sorriso me acalma. Eu aceno com a cabeça então ele aponta para água — Essa é uma representação do rio Chao Phraya, o principal da Tailândia. As peças são genuinamente tailandesas, bem como as estátuas banhadas a ouro e outras peças que são do cotidiano tailandês. Sabe aquele barco no telhado? O nome dele é "tuc tuc" e descreve o funcionamento dos mercados flutuantes. Esse aroma é resultado da junção de especiarias daquele país. Existem mais de trinta budas, quarenta lustres e cristais no teto... e também no bar. — finaliza Jean apontando para o bar. — Bem-vinda ao bar de cristal, ele retrata exatamente como é a Tailândia. O bar era uma ilha de cristal para todos os lados, os cristais parecem gelo tomando conta de cada centímetro, cada garrafa, com toda delicadeza e luxo que aquele lugar tinha. Sentamos no bar e recebemos o cardápio, mas assim que abro vejo que realmente aquele não era meu lugar: champanhes exclusivos de 1,4 mil reais até três mil reais a garrafa. Sem falar nos brindes, eram 15 diferentes e nenhum deles saía por menos de cinquenta reais, e eu tenho exatamente oitenta reais na carteira. Calculo mentalmente, cinquenta para pagar o táxi de volta para casa e o restante que seria para tomar algo, ou seja, nada de bebida para mim, nem mesmo uma água se querem saber. Observo Jean por cima do cardápio e ele analisa com cuidado item a item. — Dois Tiki Mug — pede Jean ao garçom. Ele sorri em minha direção e tudo o que eu sinto é meu rosto em chamas. Olho o "Tiki Mug", ele é feito de gomas de tangerina, gengibre e pimenta... e deve ter ouro no meio, pelo preço no cardápio. —Ah, eu não irei beber nada — digo, sem graça — Obrigada. — Não aceito não, como resposta — alega Jean colocando seu dedo em cima dos meus lábios, descendo até meu queixo. — Aliás, as únicas respostas que desejo de você é a seu respeito. — Okay... Fico devendo essa — respondo, sorrindo. — Não, é o mínimo que eu posso fazer. — comenta Jean. — Bom você é um perfeito cavalheiro. — elogio. — Os cavalheiros à moda antiga não morreram, apenas trocamos nossas armaduras por ternos e socorremos nossas donzelas das portas das boates. O que me lembra, o que uma garota como você está fazendo aqui? E como se tornou amiga da Tiemi? — Uma garota como eu? — pergunto surpresa. Como assim, uma garota como eu? — Sim, desculpa, mas você não parece fazer parte de nada disso. Você não pertence a esse mundo — explica Jean. Fico séria, ele está falando da minha condição social, tenho certeza. Sou pobre ele é rico, claro que iria notar que eu não faço parte do mundo dele. Que tola sou eu de ter vindo aqui. Os drinques chegam com clima de tensão entre nós. — Não mesmo. Se quiser saber, eu sou pobre. Bem pobre, não tenho a menor condição de pagar esse drinque que você pediu, sem pensar que se eu pagar não tenho como ir para casa e terei que pegar ônibus, algo que eu não sei pegar aqui ainda, pois sou nova na cidade. Então, você está certo, eu não deveria estar aqui, no seu mundo. É melhor eu ir procurar a Tiemi — digo me levantando. — Ei, relaxa — diz Jean segurando meu braço — Eu não estava falando da sua condição social. Até porque eu sou tão pobre quanto você. Eu estava falando do fato de você não se comportar como elas... Você parece tão séria... meiga... pura... inocente. Aposto que você era uma daquelas garotas que estudavam no final de semana enquanto via suas amigas saindo, curtindo, festando, pegando... Mas se quer saber, eu admiro garotas como você. — Como pode ter certeza que sou esse tipo de garota? — pergunto séria. — Porque enquanto entrávamos, ao invés de procurar o bar, você ficou admirada com o resto. Nunca vi uma garota como você por aqui... Logo, sei que é diferente... e que deve se orgulhar disso. — responde Jean tomando um gole do Tiki Mug — E convenhamos você não parece ser o tipo de pessoa que teria a Tiemi como amiga. Ela é toda popular, livre, leve e solta. Faz o que quer, adora dar show em boate, sai com vários caras, bebe até cair e não ter a menor ideia de onde está no dia seguinte. Esse jeito dela é o que afasta os homens... E já você, está aqui, séria, tomando seu drinque, apenas conversando, sem qualquer pretensão. Talvez dance, mas não a ponto de se expor para os caras. Irá se divertir e então irá para casa, sabendo exatamente o que fez e com quem fez. Mas duvido que faça algo que irá se arrepender depois, e isso atrai os homens. Notou a diferença? — finaliza me encarando. Então sorri, já sabe a resposta. Ele está certo, mas seria oposto, garotas como a Tiemi nunca quiseram ser minhas amigas. Eu sempre me achei sem graça e elas sempre foram tão decididas, espertas, bonitas e populares. O tipo de garota que os homens seguiam iguais cachorrinhos adestrados. Então, na minha frente, está um homem dizendo que tudo o que eu sempre quis era r**m, e dizendo não haver nada de errado comigo. Algo a se admirar... Quem é ele e por que demorou tanto tempo para aparecer? — Você é linda — dispara ele, me deixando sem defesa. — Catarina, ou quem quer que seja. — Meu nome é Catarina mesmo. Catarina Araújo Freitas — respondo tomando mais um pouco do meu drinque. — Então, Catarina, o que veio fazer em Campo Grande? — pergunta Jean, curioso. — Acredito que o que todo jovem vem fazer: estudar. — respondo. — Claro, mas qual o curso te motivou você a sair da sua cidade... — Ourinhos. — completo — Interior de São Paulo. — Ourinhos e vir para cá? — Bom, eu passei em Letras, algo que eu sempre quis. — Uau, corajosa — exclama Jean tocando a borda de seu copo. — Por que acha isso? — pergunto curiosa. De tudo o que falaram sobre minha decisão de mudar de cidade, coragem, nunca foi uma palavra dita. — Porque eu jamais sairia daqui para outro lugar se o curso não valesse a pena — responde Jean. — Você não acredita que Letras é um curso que vale a pena?- pergunto confusa. — O que eu acho é que na sua cidade sem dúvida tem esse curso. Mas que você preferiu sair de lá por um motivo maior. Estou certo? — pergunta Jean. — Quer conversar sobre isso? Eu sou um ótimo ouvinte. — É uma longa história, nada que deva estar em pauta em uma conversa de boate — respondo, evitando o assunto. Nem o conheço direito, claro que não irei contar-lhe sobre minha vida, o divórcio dos meus pais... apesar de sentir vontade de fazê-lo. — Como quiser — diz Jean finalizando seu drinque — Quer mais um? — Não, estou satisfeita — respondo olhando para a pista de dança. A música está tão boa que até sinto vontade de dançar... — Quer dançar? — pergunta Jean lendo os meus pensamentos — Não sou um bom dançarino, mas posso arriscar uns passos. — Eu estou bem. Afinal, estamos aqui para esperar a Tiemi aparecer... — Acredito que não tem problema dançarmos só uma e o seu corpo demonstra que quer isso — argumenta Jean olhando de cima até embaixo, devagar. Ele não consegue evitar morder os lábios, me deixando sem jeito — Vamos, Catarina, sei que irá gostar. — finaliza segurando minha mão e me puxando contra o seu corpo. Levantamos e caminhamos até a pista de dança. A música muda para algo mais sensual, nos olhamos sem saber o que fazer ou como agir, enquanto o resto do pessoal já está praticamente simulando sexo na pista. Então Jean passa o braço pela minha cintura me puxando em direção aos seus quadris, nos encaixamos perfeitamente, ele não dança m*l como disse. Seus olhos me observam, enquanto eu danço, jogando meus cabelos, meus braços, me sinto livre... Suas mãos deslizam pela minha cintura, quadris... seu corpo remexe com o meu... morde seus lábios me admirando. Então ele me vira, encaixando perfeitamente, posso senti-lo, suas mãos deslizam em minha coxa, subindo... calor... desejo... uma voz em minha cabeça me repreendeu, mas meu corpo o que mais... suas mãos estão em minha barriga e subindo... Ele me vira novamente, fazendo nossos rostos ficarem bem próximos. Suas mãos seguraram meu cabelo puxando, enquanto seus lábios tocaram meu pescoço subindo devagar... Meus lábios se abrem em busca dos seus que me aguardam... — Aí está você! — grita Tiemi surgindo no meio da multidão. Afasto-me rapidamente dos braços de Jean que a encarou, irritado. Mas ela não percebe, soltando dos braços de dois rapazes e pulando em cima de nós, quase me fazendo cair. Atrás da Tiemi, estão dois caras a cobiçando descaradamente, como se fosse um pedaço de carne dentro de um vestido preto tomara que caia e salto, aquilo me dá nojo, mas ela está tão bêbada que nem nota a real intenção daqueles homens. —Pensei que você tivesse desistido... como as outras — continua Tiemi tocando no meu rosto — E aí! Te… encoooontro com ooooo partidãaaaooo ... da festa! Jay, Jay! Como... Como... como foi que voxxeeeess se conhe... conheceram? Opa me olha sendo uma péssimaaa amiga... –se joga de costas, sendo amparada pelos dois rapazes que fazem questão de segurar em sua nádega e s***s. Ela sorri para os dois enquanto toca em seus rostos — Esse são... Bernaaaardooo e rafaeeeeel, ou o contrário, ou descontrário... sei lá. Quem se importa? Enfim, voxê não foi a única que se deu bem essa noite. — Acho melhor eu levar a Tiemi para casa — comentei com Jean que continua com o semblante sério olhando toda a situação. Então ele se vira para mim e em seus olhos vejo exatamente o que sente: nojo. Sinto-me envergonhada por ela e por toda aquela situação, ainda mais por que agora Tiemi está beijando os dois caras ao mesmo tempo, na frente de Jean. Seguro no braço dela, chamando sua atenção — Vamos, Tiemi, está na hora de irmos embora. — Não, tá cedo ainda — solta um dos caras puxando Tiemi de volta. Ela sorri para eles — Ela não está a fim de ir embora. — Mas ela vai. Tiemi, Tiemi, vamos — digo estalando meus dedos em direção a ela que sorri para mim. Por algum motivo, não acredito que Tiemi esteja apenas bêbada. — Ei, que tal você tomar seu rumo e deixar a sua amiguinha aqui conosco? — sugere o outro rapaz praticamente agarrando a garota. Sua mão está mais atrevida, indo para o meio de suas coxas— Prometemos cuidar muito bem dela. — De um jeito que ela nunca irá esquecer — garante o outro. Tento ir em direção a Tiemi, mas ele se põe na minha frente e me empurra quase me derrubando, mas sou segurada por Jean. — É melhor você cuidar da sua mina e deixá-la longe de problemas. — É melhor vocês irem — diz Jean se colocando em minha frente. — E o que você vai fazer playboy? — pergunta o meu agressor, irritado. Mas o Jean não responde, pelo menos não com palavras. Ele desferiu vários socos na cara do rapaz o derrubando. Ele continua chutando repetidamente, então o outro cara solta Tiemi e vai para cima de Jean que sorri em minha direção e então chuta o outro que cambaleia no meio da multidão que só então percebe o que está acontecendo. Jean continua batendo sem parar... seus olhos estão vívidos, sua respiração ofegante e o que mais me impressiona é o sorriso estampado em seu rosto. Ele está gostando disso? Em nada lembra o rapaz que há pouco ria comigo e me dizia belas palavras. Aquela cena me deu um frio na espinha, algo muito r**m. Não aguento continuar vendo aquilo e então grito em sua direção: — Jean, para! Para com isso! Ele para, solta o colarinho do cara e vem em minha direção, segurando meu rosto, meus braços, analisando cada parte a procura de um hematoma. Então, Jean pega Tiemi nos braços e começa a andar em direção a saída. Acompanho os dois, mas não sem antes olhar para trás e ver as pessoas nos observando, essa foi a primeira vez que fingi não me importar com aqueles olhares. Na saída, pede para o manobrista seu carro enquanto o ajudo a segurar Tiemi que está apagada. A espera pelo carro é infinita e desconfortável: — Era disso que eu estava falando- solta Jean sem me encarar — Essa é a diferença entre vocês. Você jamais estaria nesse estado... — Eu não penso que seja só bebida — revelo. — Catarina, você não entende mesmo o que rola nessas festas? Acha mesmo que ela só bebeu? — Desculpa, eu realmente não entendo nada desse tipo de festas, mas tenho certeza que ela foi dopada. Olha o estado dela — argumento. — Catarina, a Tiemi não é uma garota inocente. Aliás, ela nunca foi. Ela é o tipo de garota que se deixa levar por outras coisas. Acredite em mim, o que aconteceu hoje foi só mais uma balada para ela. — O que você está querendo dizer? — pergunto consternada com as revelações de Jean. — Que ela estaria muito bem se não tivesse interferido. Catarina, ela sempre faz isso. Não é novidade para ninguém. Bom, mas depois desse escândalo, talvez ela aprenda a lição. Eu acho muito difícil, conhecendo a peça. — Se isso é tão normal... Por que você bateu naqueles caras? — pergunto, transtornada. — Eu fiz aquilo por você. — responde Jean com um sorriso fraco. Abro minha boca para fazer mais uma pergunta, mas o manobrista aparece com um belo carro executivo preto, atrás escrito BMW, ele entrega as chaves para o Jean que encolhe os ombros diante da minha pergunta silenciosa: — Eu sou pobre, mas meus pais não. — responde abrindo a porta de trás para colocarmos Tiemi lá dentro. Então, ele abre a porta do passageiro para mim e depois entra no carro. O trajeto pela cidade é feito em ritmo de Bossa Nova, se não fossem as marcas vermelhas nas juntas dos dedos de Jean, parecia que nada aconteceu e estávamos apenas voltando da balada. Mas muita coisa aconteceu e aquelas imagens apareciam toda vez que ousava a fechar meus olhos. Então, olho para o Jean que parecia bem calmo e até feliz. — Por que você disse aquilo? — pergunto enquanto passo a mão nos meus cabelos. — Disse o quê? — pergunta Jean sem tirar os olhos da pista. — Aquilo de ter... batido nos caras por mim. — Porque é verdade. Eu fiz aquilo por você, Catarina. E faria mil vezes. — Mas por quê? — Por que precisa ter um motivo? Só você ser o motivo não basta? — questiona Jean, confuso. — Porque ninguém sai por aí batendo nas outras pessoas sem motivo. — respondo nervosa. E muito menos daquela forma, penso. — Mas tem um motivo: você — responde Jean estacionando — Chegamos senhorita. Ficamos em silêncio no carro, apenas escutando a respiração forte de Tiemi no banco traseiro. Tiro o cinto de segurança e então me esforço para lhe dar meu melhor sorriso como agradecimento por tudo o que fez hoje: — Obrigada por hoje — sussurro. Jean segura minha mão esquerda a conduzindo para os seus lábios, selando com um beijo. — Sempre às ordens, minha Catarina. Saio do carro e abro a porta traseira, para despertar Tiemi que com muita dificuldade, acorda. Ela ainda balbucia coisas sem sentido até o portão que consigo abrir com dificuldade. Olho mais uma vez para Jean que sorri e então sai da frente da casa com seu belo carro. O céu já está clareando, indicando que aquela noite finalmente chegou ao fim.
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