Cap 1
Sierra
Toc toc toc...
Ouço as batidas na porta, me tirando dos meus pensamentos de liberdade.
Desde as cinco horas da manhã, estão de pé, na verdade, eu m*l dormi a noite, tamanha era a minha ansiedade.
Hoje, pela primeira vez, vou sair sozinha, sempre estive confinada nesse convento, minhas únicas companhias eram as Freitas e as outras garotas do orfanato, mesmo assim, ano após ano, eu via elas indo embora, sendo adotadas e partindo felizes com suas novas famílias.
Isso nunca aconteceu comigo, a irmã Marta meio que me adotou quando me encontrou em uma cesta na porta do convento. Eu era apenas um bebê e ela se encantou por mim, como ela mesma costuma dizer, foi amor à primeira vista.
E realmente ela foi uma mãe para mim, por isso, sempre que as famílias vinham, eu me escondia, não queria ficar longe da irmã Marta, ela era tudo de que precisava.
Para mim só faltava uma coisa, liberdade. Eu queria ser como as outras crianças, poder sair, ir ao shopping, ao parque, sei lá, participar de um baile na escola.
Mas a vida em um convento convertido a orfanato é muito reclusa e nada disse nos era permitido.
Por isso, cheguei aos dezessete anos sem nunca ter tido contato com um garoto, nem mesmo na escola, que era só para meninas.
Os únicos homens de quem estive perto eram o padre e os professores, no caso apenas dois, pois o resto do corpo docente era todo composto de mulheres.
Mas hoje isso mudaria, não que eu estivesse ansiosa para estar perto do sexo oposto, na verdade, nem sei como me comportar perto de um garoto.
Eu só quero mesmo sair e ver um pouco do mundo, ser livre.
E hoje darei o meu primeiro passo para a liberdade, vou conhecer algumas universidades que me ofereceram bolsas de estudos. Ao que parece, minhas boas notas e alguns prêmios em concursos literários que venci chamaram a atenção de muitas delas.
No entanto, escolhi junto à irmã Marta a cidade de Nova York por ser mais perto de Montclair e assim eu poderei visitá-la aos fins de semana e é para lá que irei hoje.
Vou conhecer três faculdades, uma delas será o lugar que chamarei de lar a partir do próximo ano e onde vou cursar literatura inglesa.
Toc toc toc...
As batidas soam novamente, me tirando do meu torpor.
Sierra_ Já estou indo.
Irmã Marta _ Espero que já esteja de pé e pronta ou vai perder o ônibus na rodoviária.
Sierra_, Sim, já estou de pé e pronta.
Respondo ao abrir a porta e encontrar uma senhora de sorriso bondoso à minha frente. Sempre que olho para ela e vejo seu olhar amoroso direcionado a mim, eu tenho certeza de que fiz a escolha certa ao fugir das adoções.
Irmã Marta_ Pegou tudo o que precisa?
Sierra_, Sim, está tudo aqui.
Respondo levantando a pequena bolsa de mão que carrego, quer dizer, ao anoitecer já estarei de volta, não há muito o que carregar.
Irmã Marta_ E o dinheiro que te dei para a passagem? E outras despesas?
Sierra_ Esta aqui também.
Irmã Marta_ Acho que estou mais nervosa do que você, se pudesse iria junto.
Sierra_ Vai ficar tudo bem, mamãe.
Falo carinhosamente, é assim que eu a chamo quando não estamos perto das outras freiras.
Irmã Marta _ O mundo lá fora é perigoso, as pessoas são más, sempre há alguém m*l-intencionado à espreita esperando apenas por um descuido nosso para nos fazer m*l.
Sierra_ Serei cuidadosa, eu prometo.
Irmã Marta_, Sim, minha filha, se cuide.
Ela diz, me abraçando com lágrimas nos olhos.
Irmã Marta_ Agora vamos descer para você tomar o seu café da manhã, ou vai se atrasar de verdade.
Nos descemos até a cozinha, eu tomo rapidamente uma xícara de café e como um pãozinho doce.
Já na saída, minha mãe do coração me dá mais um abraço emocionado e se despede de mim.
Irmã Marta _ Se cuida, minha filha e por favor me ligue assim que chegar na... Qual a sua primeira visita?
Sierra_ Universidade de Colúmbia.
Digo sorrindo.
Irmã Marta _, Sim, isso, assim que chegar lá me ligue por favor.
Sierra_ Eu ligo sim.
Dou um último abraço nela e passo pelo portão rumo à liberdade.
Confesso que estou com um pouco de medo, nunca saí de Montclair antes e, para ser sincera, nem minha própria cidade eu conheço direto, sempre foi da escola para o convento e nunca fizemos um passeio ou coisa assim.
As poucas vezes que fiz um caminho diferente foram quando acompanhava a irmã Marta ao mercado e só.
Agora estou aqui seguindo o caminho indicado por ela até a rodoviária, que fica a dez minutos de onde moramos.
Não vou mentir, m*l presto atenção em quem passa por mim, tamanho é o meu medo de me perder.
Em minha inocência, eu só consigo olhar deslumbrada para as casas e prédios que surgem no meu caminho, me esquecendo do conselho que a irmã Marta me deu sobre o m*l à espreita.
É difícil se manter vigilante quando tudo que está diante dos seus olhos é novidade.
Estive a minha vida inteira como um passarinho preso na gaiola, não que eu seja uma ingrata, sei da sorte que tive em ser encontrada pela minha mãe e ser criada por ela e pelas outras freiras.
Eu era apenas um bebê e poderia ter morrido naquela noite fria abandonada em uma cesta a Deus-dará.
Mas eu queria que elas tivessem me dado mais liberdade, quer dizer, eu nunca fui nem ao cinema, lembro o quanto ficava triste quando via algumas garotas que estudavam comigo combinando de sair, de fazer festas de pijamas ou quando recebia o convite para o aniversário de uma delas e não podia ir.
Talvez se tivesse tido uma vida normal, com alguma das famílias que buscavam meninas para adotar eu fosse mais esperta e menos inocente, talvez não estivesse tão deslumbrada e prestasse mais atenção ao meu redor e nas pessoas que passavam por mim, talvez eu teria percebido o homem que me seguia desde que sai do convento, mas isso são só suposições eu nunca saberei de fato se funcionaria porque quando dobro uma esquina já avistando a rodoviária a alguns metros de distância sinto alguém me puxar pelo pescoço e colocar um pano com um cheiro estranho no meu nariz e eu apago.
Quando saí daquele convento toda feliz, não fazia ideia de que esse seria o meu primeiro e último dia de liberdade...