Ciclo Vicioso

5001 Words
Parte: Inicial (bem depressiva) O inverno de 2005 estava quase chegando, com ele a quase certeza de um Meraki quebrado. Sentado perto de alguns trilhos de trens abandonados, o vento cortante causava uma leve ardência em seu rosto, o cigarro entre os dedos e Help de The Beatles tocando no som de seu Porsche 1968, enquanto observava as estrelas. Ali era o seu único momento de paz. Não sabia em que ponto havia se perdido, e nem em qual momento passou a perder tudo o que tinha, mas ali sentado ele percebia. Estava quase sozinho, sem nada, sem ninguém, todos haviam o deixado, até mesmo a felicidade. Talvez ela nunca nem tivesse de fato aqui, talvez ela nunca nem tivesse feito questão dele. Mas está tudo bem, tudo ficara bem, porque ele nunca desistiu. Porque seu nome era Meraki. "Dar parte de si em algo" "Fazer algo com a alma", era o significado do seu nome para o dicionário grego. Mas sua mãe sempre acariciava seus cabelos e dizia: “ É Meraki, porque coloquei minha essência em você, te criei com a mais pura paixão existente, sempre que escutar seu nome, lembre-se, foi do mais puro e sincero amor que te fiz.” Talvez tivesse sido criado do mais lindo e verdadeiro amor, mas não do mais eterno. Talvez o amor que seu nascimento trouxe não fosse o suficiente, não tenha tido tanto efeito. Talvez tudo havia mudado quando seu pai, seu herói, saiu por aquelas portas exageradamente grandes, e nunca mais entrou por elas. Ou talvez quando sua mãe passou a ficar tempo demais trancada no quarto, até que um dia tivesse uma overdose. Quando perdeu seu melhor amigo. Talvez o dia que Ela foi embora, levando o resto de seu quebrado coração embora. Ou pior, talvez o dia que se viu sozinho com Minutiae, quando a solidão se fez presente, quando percebeu que a irmã era tudo o quê tinha. Mas pelo menos a tinha. Mas nada se compara ao dia que viu aquele homem saindo do quarto de sua amada irmã. Eles trocaram olhares por tempo demais para as simples palavras que saíram dos lábios de Minutiae. "É o jeito que eu encontrei de superar, Meraki". As lagrimas que caiam de ambos olhos queimava o resto de esperança que os dias iriam melhorar. Agora está tudo acabado. Talvez ele tivesse desejado não a ter também. Talvez desejasse que ela encontrasse alguém e o abandonasse, que não fosse mais um peso para ela. Ele só queria que a felicidade encontrasse novamente sua casa. Queria que ela utilizasse sua dor para pintar, para ler como ele, não se entregando para pessoas imundas que nem sequer tratariam ela como a pessoa incrível que é. Mas Minutiae era quanto triste quanto Meraki, talvez mais, ela precisava de uma escapatória. Mas agora sua irmã seria rodeada de homens nojentos, enquanto dança em uma boate qualquer, trabalharia em outros b***s e ainda lutaria para terminar a faculdade de direito. Tudo por sua culpa. Ele devia trazer mais dinheiro para casa, mas vivia triste demais para pensar em outra coisa que não fosse a si próprio. Vivia preso demais aos seus próprios sentimentos, que nem conseguia ver que todos ao seu redor sofriam, talvez sofressem até mais. Mas o quê esperar? Afinal, nem adulto ele ainda era, como poderia adquirir tamanha maduridade do dia para noite? Nem sequer sabia lidar consigo próprio, não conseguiria ajudar os outros. Vida infeliz que dissipa as esperanças de puras e inocentes pessoas. Era tão mais tão injusto. Meraki se encontrava com seus 18 anos, em uma vida miserável demais para somente 18 anos de vida. Podia jurar que a nicotina tinha substituído seus glóbulos vermelhos em sua corrente sanguínea. Havia pegado essa mania recentemente, não sabia como aliviar as dores e as tremedeiras que tinha, em um dia qualquer comprou um maço, descobriu ali, naquele pedaço de câncer, sua paz. E era sempre assim, um cigarro entre os dedos, um lápis, The Beatles entrando em contato com a sua doce audição e estrelas. Elas eram sua salvação. Passar os fins de tarde sobre um campo abandonado era tudo o que precisava. Era seu lugar, seu esconderijo, seu porto seguro. Sem pessoas, sem julgamentos, sem problemas, sem decepções. Só ele, The Beatles, lápis, folha e estrelas. Poderia ser quem queria, podia gritar, podia chorar e ninguém veria, ninguém falaria que era um menino novo demais para estar chorando e fumando. Mas quem eram eles? Todos julgavam que os problemas começavam só na fase adulta, porém Meraki sempre sofreu com as conseqüências da vida. Quem dera os problemas aparecessem só depois dos 20. Quem dera a vida fosse tão fácil quanto diziam. Quem derá pudesse ser só um menino normal. Que se revoltaria por coisas idiotas e pensaria em fugir de casa por acontecimentos sem nexo. Quem dera fosse só vitimismo. Ali ninguém falaria para parar, não diria que ele estava quebrado. Porque ele não precisa escutar aquilo, ele sabia. Era doloroso demais, talvez isso explicasse os incontáveis meses que se via evitando o espelho. Não escutaria as frases de pena. “Tão jovem, mas perdeu tudo o que tinha, tenho dó dele” “Dó? Talvez ele que atraia tanta desgraça para a vida da própria família”. "Os Millers eram felizes, depois que ele nasceu tudo foi se acabando." O espelho era seu maior inimigo, tão sincero, apontava todas as evidencias, todas as verdades. ‘Mas tudo bem, tudo ficará bem, uma hora tudo ficará bem’ Meraki nunca foi muito de ter amigos. Apesar dos cabelos pretos como a noite, que sempre estavam bagunçados, olhos castanhos e profundos, talvez os mais intensos, algumas tatuagens espalhadas pelo braço esquerdo, o cheiro amadeirado de um perfume qualquer misturado com a nicotina, que sempre chamavam a atenção por onde quer que ele passase. Sempre foi bonito demais, fodidamente maravilhoso mesmo com as olheiras e as expressões um tanto indecifráveis. Sempre chamou os olhares de todos por onde passava, facilmente se tornava o tipo popular nas escolas que estudou ao decorrer da vida. Popular e solitário. Afinal, quem não se atraía por um cara bonito, misterioso, com cheiro de nicotina, que sem querer ficava extremamente sexy ao encostar-se a uma parede do refeitório, enquanto a fumaça saia lentamente entre seus lábios? Mesmo com todos os detalhes, ele sempre afastou todos que se aproximavam. Ele não confiava, não podia confiar e nem se apegar, quebraria mais, doeria mais. Então novamente a mascara era posta em seu rosto, um sorriso gentil que contrastava com as palavras acidas que saiam dos seus lábios. Elas sempre afastavam todos, e nunca ninguém tentou mais de uma vez. Incrível como sempre desistiam tão fácil de si. Mas não os culpava, nem queria que insistissem, não era do seu agrado pensar na possibilidade de acabar com a vida de mais alguém. Que seu negativismo ficasse somente para si. Ele se encontrava á tempo demais ali parado só observando. Sentir a sombra de um sorriso cheio de amargura ao constar o toque de Let It Be começando, era como um alívio,era uma droga fazendo efeito e o levando ao céu. Afinal, era nesses momentos que constava que não estava quebrado completamente, havia algo ali no fundo, tinha como se recuperar. Pelo menos tentava pensar assim, enquanto sabia que na verdade afundava-se mais e mais. Mas o que podia pensar? O sorriso mais sincero e o coração agitado, ao passo que a música se desenrolava, jamais o deixariam amargo. Talvez estivesse se apegando aos minimos detalhes. Levantou o tronco que se encontra em contato com a grama, deixando um último olhar sobre a constelação conhecida como Cruzeiro do Sul, para então se dirigir até seu Porsche. Sentia-se bem ali, sentado sobre o banco de couro do carro, particularmente, bem antigo. Andava sobre um Porsche 68, talvez a única coisa que seu pai deixou para trás que ele não tinha queimado. Todas as faixas que mais amava estavam ali: Beatles, The cure, The Police, Queen e Paul Mccartney. Era inevitável não se sentir deslocado emoutros local que não fosse ali. Seu corpo era jovem, mas seu espírito era antigo. Constava isso quando olhava para as pessoas ao seu redor, se via em um mundo que tudo girava em torno de bebidas, festa e um amor para viver. Achava aquilo tudo tão vazio para se viver. A maioria das experiências amorosas que tivera eram tão vazias, sem sentido, sem importância, que nem mesmo lembrava-se o rosto das pessoas. Particularmente queria não depender disso, mas às vezes era inevitável não procurar por um amor de uma noite, um abraço, um aconchego. E era isso, amores de uma noite, sem sentimentos. Só corpos desconhecidos que se abraçavam, buscando um amor por minutos, que dialogavam e até tentavam, mas quando a realidade voltava a sensação de desprezo chegava. Só isso, amores que não tinham amor. Porque o verdadeiro amor ele nunca teria coragem de encarar. Optava pelos sem sentimentos, sem justificativa, sem falhas, sem os fogos de artifício, o suor e o nervosismo de uma paixão. Porque esses não machucavam. “Porque eu nunca quis viver um amor, nunca quis sentir as famosas borboletas, nem as palpitações irregulares no coração. Eu nunca quis me apaixonar, nem sonhar com o primeiro beijo que daria nela, nem em nossas mãos entrelaçadas. Eu só queria paz, porque ás vezes dizem que amor traz paz, mas ele só carrega consigo uma montanha russa de sentimentos, possessão, insuficiência, a incapacidade de se sentir merecedor. O caos. “ Nunca foi sociável, quem diria se dar bem com festas. Ódio era uma palavra forte demais, e pesada, mas odiava festas com todas as forças. Preferia comprar uma garrafa de whisky, um maço de cigarro e dirigir sem rumo. Sentia-se livre. Diferente de festas onde se sentia preso, sem ar, sem escapatória, sem vida. Suas gargalhadas ácidas queimavam sua garganta sempre que viam a expressão "amor". Um dia ele até chegou a acreditar em toda essa besteira, mas atualmente abominava. O que era muito contraditório, pois entre os dedos de sua canhota sempre havia um cigarro, e da destra um lápis. Este que escrevia palavras bonitas, triste e sobre um amor que um dia acreditava e hoje não mais. Não precisava dele, mas desejava as outras pessoas. Sempre desejou que todos tivessem um amor puro e indecente, feroz e calmo, que levasse ao céu e ao inferno, um amor que não machucasse. Um amor o qual nunca viveu. Um amor que fosse eterno, diferente dos seus pais. Mas o quê podia fazer? Os livros sempre lhe contaram que o amor verdadeiro não machuca, não fere, não sofre. Mas desde sempre sofreu, se machucou e cadê vez mais se fere por um amor que todos falam que é o mais puro, o mais amável. Mas em que estado você se encontraria se as duas pessoas que mais amou se fossem? O que fazer quando as duas pessoas que mais amou vão embora? E a terceira estivesse quase abandonando? Como superar um amor que não é superável? Livros ensinam como superar uma paixão, não como superar a falta de amor. Livros ensinam como superar um par romântico, mas não ensinam como superar um amor que devia ser eterno, que devia ser para sempre. O amor de mãe. Como superar um amor que devia ser o maior de todos? Que é o mais endeusado? O mais verdadeiro? Como? Era sempre assim, Meraki amou tanto seu pai que um dia o viu dirigindo um sorriso para si e logo em seguida dando as costas. Nunca mais o vi. Ele amou tanto sua mãe que um dia ela o abraçou e disse para ficar bem, para superar tudo porque ele é forte, mas ela havia de ir, porque seu grande amor não estava mais com ela. Ele amou tanto Henry, seu melhor amigo, que um dia ele o abraçou e disse que teria que ir, porque ali já não era mais seu lugar. Amou tão pouco a si mesmo, que um dia viu sua própria esperança dando as costas para si dizendo que haviadesistido e devia dedicar seu tempo a outra coisa, o que era injusto, porque ele continuou tentando, talvez até mais que antes. Ele ama tanto Minutiae que ela praticamente não olha em seu rosto, talvez seja a vergonha pelas circunstâncias que se encontra, talvez seja porque ela não tem tempo, deve ser difícil trabalha, estudar, lamentar e ainda ter tantas outras responsabilidades. Um coração cheio de cicatrizes que talvez nunca se fechem. Um corpo destruído pela porcaria que é a vida. Maldito destino que acaba com as esperanças. Maldita vida que acaba com o sorriso de uma doce e inocente criança. Ele não foi o suficiente para seu pai ficar, não foi o suficiente para sua mãe decidir viver, não foi o suficiente para seu melhor amigo não o abandonar. Não foi o suficiente para o seu primeiro amor o escolher, não foi o suficiente para ela o amar de volta. Não foi o suficiente. Não foi o suficiente para salvar a irmã de um destino tão covarde, sujo e injusto. Não é o suficiente para se achar forte, porque se fosse não estaria quebrado. E era isso, seu pai disse para ser um homem forte, sua mãe disse que tudo ficaria bem, Henry disse que um destino lindo aguardava os dois. Seu primeiro amor disse para ele seguir em frente, que ficaria tudo bem em algum momento. Minutiae disse que eles superariam juntos, que um dia voltariam a ser feliz. Mas ele não consegue ser forte vendo todos os pilares desmoronarem, não consegue acreditar que tudo ficara bem sendo que tudo está indo de m*l á pior. Como um destino lindo o aguarda? Se o destino está levando tudo que ama, tudo que precisa para sorrir. Como ele espera ter um lindo futuro, sendo que está cheio de cicatrizes e nicotina? Como ele ira superar se não tem motivos para seguir? ‘Tudo bem, isso é só um drama momentâneo, você vai ficar bem, i****a, um dia será feliz.’ Devia parar de amar. Tudo que ele ama, ele estraga. Tudo que era tocado por Meraki ficava com cheiro de nicotina e melancolia. Um ciclo sorrateiramente desprezível. Talvez fosse o vitimismo, talvez fosse a procrastinação. Às vezes o garoto perguntava-se em algum momento foi diferente, se um dia seria alguém diferente, se voltaria á ser a criança brincalhona que ria com sinceridade. Se algum dia deixaria de ser preto, e se tornaria cinza, ou talvez até amarelo, vermelho, branco. Se algum dia voltaria á ser feliz. E ele se via em um ciclo. Sobre as estrelas, sentado no banco de couro, enquanto a fumava saia por suas narinas, os dedos trabalhavam em colocar no papel tudo que a mente pensava. "E nestes pequenos fragmentos De meu coração Irei me enganado em uma leve E superficial felicidade Entretanto no final Eu sei que por trás De cada sorriso á de ter uma lágrima E por cada fração de felicidade Á uma melancolia." Não se considerava alguém com muitos talentos, mas os poucos de que tinha, que se estendiam em poemas e músicas, já eram os suficientes para si. Desde sempre havia um lápis na ponta de seus dedos, descartando palavras diversas sobre alguma folha, era algo natural para si e até divertido. Era gratificante terminar algum poema e ler ele, até mesmos os que se tratavam da palavra "amor". Com o constante hábito era normal sempre vê-lo com um dicionário em mãos, e cada palavra havia algo escrito. Era um simples ato que adquiriu com o passar do tempo. Assim como tocar sua guitarra sempre que se sentia nervoso. Ou piano quando estivesse triste. Ou então, o costume de acordar de madrugada para ver documentários aleatórios, até porque ele não era de ter paixões, mas mentiria se dissesse que não se atraia por certas coisas relacionadas à medicina. Não era sem motivos que escolheu biomedicina. Havia de valorizar e dar orgulho a sua irmã. Por ela Ele tentaria. ... Quase Inverno de 2006. E naquele momento, sentado em alguma mesa afastada das demais no refeitório. As vozes harmoniosas saindo dos fones cantando Yesterday, os dedos impacientes batendo o lápis contra a mesa, em um suspiro deixando a fumaça sair por seus lábios, em um claro sinal de busca pela paciência. O dicionário aberto na palavra "quebrado" e uma certeza. Afinal, por que seu nome não está ali ainda? Talvez seja o medo de admitir á verdade. Inclinou o corpo e escreveu seu nome, acrescentando mais um significado á palavra “quebrado”, que agora havia 3 significados em seu dicionário. Quebrado adjetivo 1. feito em pedaços; fragmentado, partido. "copo q." 2. cuja intensidade diminuiu; enfraquecido. "som q." 3. Meraki. “mrk q.” Não evitou deixar um sorriso amargo nos lábios, enquanto a visão era embasada pela fumava. Suspirou cansado fechando o dicionário, logo levando o olhar para frente, o que claramente se arrependeu de fazer um segundo após encontrar o olhar de Kalon Campbell O sorriso debochado nos lábios carnudos, e o olhar penetrante faziam Meraki revirar os olhos. Ele sempre chamou a atenção mais do que devia, e isso nunca o incomodou, porque sempre conseguia ignorar todos. Mas os olhares cortantes de uma certa baixinha, que sempre andava com um sorriso debochado nos lábios, havia uma auréola indiferente, ostentava uma aparência de causar inveja com os seus cabelos negros e longos, que possuíam algumas mechas avermelhas, tatuagens tímida e pequenas espalhadas pelo corpo e a pele morena que brilhava, eram o motivo dos seus surtos diários. Era inevitável, seus olhares sempre se encontravam e sempre resultava na mesma coisa: Kalon com sorrisos indecentes sobre os lábios e Meraki indiferente e impaciente, que na maioria das vezes revirava os olhos e fazia de tudo para não acabar esbarrando sobre o olhar alheio. Porque secretamente seu coração batia um pouco mais rápido ao encarar aquela figura perfeita, porque mais secretamente ainda ele tinha medo, porque ela parecia demais com o passado, o mesmo passado que o abandonou. Porque ela conseguia o desestruturar. Porque secretamente observava Kalon desde a primeira vez que a viu, era como um imã, sempre era atraído até a Campbell. ... Foi no inverno de 2005 que viu Kalon pela primeira vez. Havia estudado por meses e finalmente havia alcançado algo bom. Conseguiu passar para uma universidade. Inicialmente não pensava em fazer faculdade, assim que acabasse a escola iria pegar seu Porsche 1968, alguns maços de cigarro e sair sem rumo. Só aproveitar e esperar que magicamente o mundo melhorasse. Mas Minutiae não concordou com a idéia, ela disse que pelo menos um deles teria que ter um futuro, pelo menos um deles teria que ter algo. E como ele iria contra as palavras da irmã sendo que era a mais pura verdade? A vida não pararia e esperaria ele se curar, se erguer. Ela continuaria acontecendo e Meraki cada vez mais se perdendo, e principalmente perdendo tempo. O mais prudente seria seguir os conselhos da irmã, se esforçar e dar o melhor de si para conseguir logo um emprego e a ajudar. Afinal, ela também fazia faculdade e para a felicidade dos dois, estava quase no final. Mesmo com tantas coisas ela conseguiu, ele também conseguiria. Mal sabia Meraki que a faculdade traria mais problemas. Com o tempo ele veria. Talvez o maior deles tivesse 1,63, cursava medicina e tinha o sorriso mais lindo que ele já viu. Assim que chegou as férias de inverno, ele prosseguiu até o mais novo estabelecimento que iria estudar. Minutiae o acompanhou e levou os devidos documentos para que o irmão mais novo pudesse estudar. Não esperava encontra ninguém ali, justamente por ser férias e normalmente ninguém, além de alguns funcionários, ficar por ali naquele período. Entretanto alguns alunos estavam sentados em uma mureta próxima a entrada principal. E foi ali que viu ela pela primeira vez. Linda com um sorriso contornando os lábios, suas mechas vermelhas perfeitamente desalinhadas, o olhar debochado enquanto praticamente se pendurava no pescoço de um menino. E por míseros segundos ficou enfeitiçado. Era tão linda que o coração chegava a doer. Foi, também, a primeira vez que os olhares se cruzarem. Kalon dirigiu um sorriso tão sacana á Meraki, que o mesmo pensou que iria pegar fogo. Mas o calouro não se deixou abalar, não podia, tinha que ser indiferente, então só firmou os passos, levantou a cabeça e seguiu a passos longos para fora da instituição. E desde daquele dia sempre seria assim. Uma veterana que o olhava descaradamente, e sempre que os olhos se encontrassem teria a sensação que queimaria de dentro para fora, mas acabava fugindo sempre. Mas não podia culpar Kalon, até porque sempre que podia se encostava a algum lugar e ficava observando a figura menor. Os cabelos perfeitamente arrumados, a pele perfeitamente morena, e o sorriso, era o mais lindo que havia visto. E se Meraki soubesse que perderia noites de sono por causa daquele ser, e que aquele queimar se intensificaria e se tornaria bom, nunca teria olhado para Kalon e muito menos deixado-a perto demais dos seus pensamentos. ... Quase Verão de 2005. E foi em uma tarde extremamente gelada, não se sabe bem quando e nem como, mas Kalon estava ali em frente a si com o maldito sorriso contornando os lábios bonitos. E Meraki a ignorava, não estava com paciência para as provocações da outra. Bom, pelo menos tentou ignorar. – Eai, esquentadinho, não vai falar comigo? – A voz harmoniosa que saia um pouco baixa, pela risada reprimida e o frio abundante que fazia, fez o sangue do Miller ferver, e a vontade de socar o rosto bonito da Campbell rondar em sua mente. – Não vai me dizer seu nome? Não adianta revirar os olhos e nem fazer cara feia, você não me assusta. – Olha só, vou deixar uma coisa bem clara, garota. – O timbre mais rouco que o normal, pelo tempo que ficou sem se pronunciar, pelos cigarros fumados e pela preguiça que o frio causava, se fez presente desestabilizando Kalon por breves segundos. E Meraki fez questão de jogar a fumaça que saia dos seus lábios sobre o rosto da Campbell, tendo o prazer de ter um sorriso nos lábios somente para provocá-la. – Você não é bem vinda aqui se não percebeu, não quero papo, então a porta da rua é a serventia da casa. Pode tirar esse traseiro gordo daqui, da meia volta e voltar para perto dos seus amigos.– Sorriu vitorioso ao perceber que o sorriso debochado de Kalon havia murchado, enquanto jogava o resto do cigarro no chão, pisando sobre ele. – Aliás, não me chama de esquentadinho ou o que seja... Melhor, não fala comigo. Era sempre assim, nunca deixava ninguém se aproximar. Tinha problema demais sendo sozinho, quanto mais pessoas, mais problema teria, mais decepções, mais tempo gasto. "Todo mundo que eu amar esta condenado a me abandonar." O quê era tão injusto, afinal, o quê ele fez de errado? Nunca fez nada demais. Mas a vida é filha da p**a demais, sempre punindo a pessoa errada. Mas o quê podia fazer? No momento nada, porém, m*l sabia que dessa vez encontrou uma pessoa bem mais teimosa que si. Seus dias de paz estavam contados. Meraki andava para longe de Kalon, se olhasse para trás provavelmente veria a veterana abismada. Era o efeito de suas palavras em todos, não que fosse alguém sem educação, grosso ou frio. Mas preferia assim, pelo menos não criaria mais problemas. Os dedos foram socados desesperadamente dentro do bolso da calça desgastada procurando por um cigarro. Sempre era o mesmo ciclo, a paz e os suspiros começavam assim que a fumaça saia dos seus lábios. Estava viciado na paz que o vício o trazia. “Não tem problema se um dia eu acordar Em outra dimensão Em outro lugar São os efeitos que você causa em mim Totalmente dopado Continuo e continuo Para conseguir prosseguir Não me importo se você me matar um dia Agora você me faz viajar Em uma felicidade superficial As margens, vivendo superficialmente” . Depois do incidente Kalon não olhou mais para ele, não deu mais sorrisos debochados, ou piscadas maliciosas, muito menos tentou se aproximar. Era de se esperar, afinal Kalon podia ter qualquer um a sua volta e em suas mãos, era bonita pra caramba, sociável, popular e com um futuro brilhante pela frente. Já Meraki era quieto, misterioso e cheio de cicatrizes abertas. Nem sabia se teria um futuro. Às vezes sem querer se pegava imaginando se tivesse dado espaço para a Campbell, seriam amigos? Ou desistiria quando visse suas feridas? Ela também o culparia? She loves you tocava no volume máximo, causando certa excitação em Meraki que caminhava balançando o corpo no ritmo da música. Em segundos se encontrava dentro do banheiro onde ficou poucos minutos parado em frente á porta. Normalmente não entrava ali, havia espelhos demais, e Meraki evita eles. Evita a verdade. Juntou todas as forças que tinha e deu um passo á frente parando em frente a pia, tentou ignorar os espelhos focando em jogar um pouco de água sobre seu rosto. Mas foi inevitável ver a sombra que o atraiu, e ali estava ele. As olheiras fundas denunciavam a falta que fazia uma boa noite de sono, os cabelos bagunçados mostravam o quanto fazia falta um pente na vida de um homem, e seus olhos diziam, gritavam, o quanto estava cansado. Ele se tornou um porta retrato despedaçado no chão. A foto ainda estava ali, rasgada e amassada, mas estavam. Sua alma continuava ali, com algumas feridas, mas seu corpo estava aos cacos. – Olha se não é o misterioso e grosseiro menino Miller. – Imediatamente o olhar de Meraki se dirigiu até uma das cabines. Tinha que confirmar se era quem pensava. Afirmando suas suposições acabou encontrando Kalon encostada sobre o batente da porta. Tinha um cigarro entre dedos e o maldito sorriso brincando nos lábios juntamente a fumaça, contrariando todas as suas afirmações, afinal ela dirigiu uma palavra a si novamente. "Ela fuma? Não era o povo de medicina que estava fazendo movimento anti fumo esses dias? Hipócritas!" - pensou. Por breves segundos saiu do transe, procurou por alguma coisa que o dissesse que não entrou no banheiro errado, e respirou aliviado ao constatar que não, não era o errado da história. – Achei que tinha deixado claro que quero você bem longe de mim, Campbell. Alias, é um novo hobby entrar no banheiro errado? Está tão desesperada assim por mim?– Sua voz era suave e calma, contrariando as palavras grossas desferidas. Mas para a sua surpresa, dessa vez só recebeu uma gargalhada debochada como resposta. Merda de garota. – Eu já saquei qual é a sua, Miller. Gosta que corram atrás de você, não é? – Kalon tragou uma última vez, pagando o cigarro na parede, assim caminhou em passos preguiçosos até Meraki, deixando-o encurralado entre seu corpo e a pia. – Não tem problema, eu posso correr atrás de você, mas só dessa vez, esquentadinho. –Como sabe meu nome? – Miller ignorou totalmente qualquer outra palavra dita, afinal não sabia o que responder, nunca tinha chegado nessa fase, o que acabou causando altas gargantas da baixinha. Mas o que Kalon queira? Meraki não tinha a mínima idéia do que dizer, em toda a sua vida sempre foi despedidas, nunca ninguém esteve disposto a correr atrás dele. Muito menos de sua amizade, ou o que for que Kalon quisesse. – Eu tenho meus contatos, menino Miller. – Meraki começava a se perguntar se o rosto de Kalon não doía de tanto que a mesma sorria. Mas talvez fosse aquele sorriso que ainda permitia ele de continuar ali. E p***a! Campbell era mais bonita ainda de perto, os olhos escuros com um brilho incomum, os lábios grossos e extremamente convidativos, não havia falhas. Defeitos? Estava procurando por eles, mas não encontrava. – Por que tanto olha para minha boca? 'Qualé' quer me beijar? Se quiser posso te oferecer uma boa f**a agora, Esquentadinho. Quem sabe seu mau humor vai embora. – No cômodo era cada vez mais constante os sons das melodiosas gargalhadas de Kalon e bufares vindo da parte de Meraki, que revirava os olhos tentando se distrair e não acabar se perdendo na beleza da veterana. Como podia uma garotar ser tão sem vergonha? Todas que eles já tinha encontrado eram tímidas, ás vezes até diziam algo, mas nunca com essa naturalidade. Nunca com um brilho tão incomum e perverso em seu olhar. Isso o assustava ainda mais, queria correr para longe, detestava pessoas assim, detestava pessoas que tratavam coisas desse tipo como algo comum. Não que ele fosse muito diferente, mas pelo menos tinha um pouco de vergonha na cara. – Não sei o quê te faz pensar que faz meu tipo. Gosto de todos os tipos, menos o seu, garota Campbell. – Uma ironia acida se fez presente na língua de Miller ao pronunciar a ultima parte. E agora Meraki tinha um sorriso pairando sobre os lábios, enquanto admirava as caretas que Kalon fazia enquanto concluía que tinha sido rejeitada. Aquilo era uma ótima recompensa por ter que aguentar a presença irritante da veterana. Talvez não tão irritante assim, mas negaria isso com toda a força da sua alma. Ele odiava a presença dela, ele tinha que odiar. Só podia conseguir pensar em sinônimos de ódio. – Você não engana nem a si próprio falando isso. – Um passo dado por parte da veterana e logo os corpos estavam perfeitamente alinhados. Perigosamente perto demais. Era evidente o nervosismo repetindo que o corpo de Meraki se encontrava. Sinal de alerta. Campbell se divertia com tudo, e o sorriso bonito em seus lábios eram mais constantes do que nunca foram em sua vida. Locomoveu uma das mãos até a nuca do Miller, ficando com o rosto próximo ao seu ouvido para sussurrar-lhe:

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