Capítulo um

1252 Words
Elisabete Eu não era de acreditar em superstições e mau agouro, porém hoje estava sendo um daqueles dias em que tudo dava errado. A sorte nem sempre estava a meu favor, no início pensava que era coisa da minha cabeça, que tinha que me esforçar mais para conseguir as coisas, mas com o tempo, tive que admitir que havia algo errado. Mesmo que ainda negasse que alguém podia carregar esse m*l, alguns fatos ainda me faziam ficar em dúvida. Hoje era um desses dias. Não sei o porquê, mas meu celular alarmou muito cedo. Muito adiantado! Duas horas adiantado! Quando olhei no aparelho, achei que estava atrasada, pois as horas marcavam duas horas a mais do que eu esperava. Quando olhei no espelho, meu rosto parecia ter sido amassado por um trator e o pior de tudo era que eu achava que não tinha tempo para tomar café. Eu era uma pessoa simpática e bem-humorada, mas de barriga vazia as coisas mudavam, pois uma substituta m*l-humorada possuía o meu corpo e me dava dor de cabeça. Como o dia estava só começando, os ônibus estavam lotados. Não como eu já estava habituada, mas de forma anormal. As pessoas se amontoavam como em uma lata de sardinha, e o cheiro não era dos melhores. Eu não sabia como alguém poderia sair de casa de manhã sem tomar um banho. Quando cheguei à empresa, não havia ninguém além do vigia. Para falar a verdade, eu deveria ter notado as pistas durante o trajeto. Primeiro, estava mais frio que o normal para as oito da manhã. Até o ônibus. Tudo estava lá, porém, como não havia tomado café e havia acordado duas horas mais cedo, o que dificultava o meu raciocínio, não percebi o meu erro. Trabalhava na empresa Duarte investimentos há três anos e não era na minha área de formação. Depois que sai da faculdade, você pensa que será tudo um mar de rosas, mas tristemente descobri que o mundo era c***l e existem milhares de pessoas tão boas quanto eu. Tive que fazer uma escolha: continuava tentando buscar o meu sonho ou pagava o aluguel e o supermercado. Confesso que passei três anos com os pés no chão, deprimida por não ter conseguido. — Bom dia, senhor Antônio. — Falei me aproximando do homem de quarenta anos com o sorriso simpático. — O senhor sabe por que está tudo tão… vazio? O homem me olhou com o cenho franzido, parecendo que eu tinha feito a pergunta mais burra que ele havia ouvido, mas continuei firme, o olhando com um sorriso amarelo. — São seis da manhã, sabe que as coisas só começam a funcionar aqui a partir das sete. — Ele disse. Na hora eu ainda estava refletindo sobre a palavra sete, e estava cética sobre o horário. Abri a bolsa abruptamente e peguei o aparelho que estava no fundo, escondido. — Senhor, são nove horas. — Falei não querendo acreditar no que o homem estava falando. O homem tirou do seu bolso o celular que não era um dos mais novos da sua linha, e o estendeu para mim, mostrando o horário correto. Olhei para o objeto, ainda sem acreditar, aos poucos tudo veio à minha mente e desejei morrer.  Nenhum palavrão era o mais adequado para se designar a mim naquele momento. Eu só continuei olhando para o nada, esperando que algum tipo de explicação óbvia viesse a mente, mas nada aconteceu. Eu poderia ter feito a maior cena na frente do homem, pois sempre que algo assim acontecia, sendo tão cedo, meus olhos se enchiam de lágrimas. Eu não era assim tão frágil, porém, se meu estômago estivesse vazio e o sono ainda estivesse pairando sobre a minha mente, corroborava para esse fim. No entanto, optei por me conter e arranjar uma alternativa. Primeiro, eu teria que comer algo, pois se não houvesse comida no meu estômago, não trabalhava nesse ambiente estressante, e minha chefe era como o próprio d***o. Se eu ficasse dessa forma até o almoço, com certeza ficaria sem emprego, já que diversas vezes tive que me conter para não a xingar. A sorte era que o prédio ficava perto de várias lanchonetes, onde eu poderia comer e passar o tempo. Retirei o aparelho diabólico da bolsa e acertei as horas para que não houvesse mais problemas. *** Depois daquele contratempo inicial, eu finalmente estava melhor. Voltei e comecei o dia com uma pilha de documentos para reorganizar. Carolina estava tensa quando chegou e m*l falou comigo, o que era estranho, pois a mulher adorava me importunar logo quando chegava. Fiquei bastante cansada após organizar tudo. Graças ao sono que me consumia, tive que tomar café a mais, só para não dormir em cima do computador. No almoço, a chefe saiu mais cedo, ela ainda estava estranha, mas não me importei e dei graças a Deus por ela não ter me incomodado, pelo menos ainda. Saí com algumas colegas para comer e na volta fiquei envergonhada ao encontrar o porteiro, que era o único que sabia do meu desastre do início de dia. Antes de ir embora, fui chamada na sala de Carolina e senti a tensão no ar. Eu sentia um mau pressentimento de que iria ser demitida. Assim que entrei e sentei-me, vi a expressão de preocupação da mulher. Ela estava estranha o dia todo, e agora estava me olhando como se fosse dizer que alguém morreu. — Alguma coisa aconteceu? — Perguntei cautelosa. — Sim, infelizmente. — Disse deixando os ombros caírem e se encostou à cadeira. — Falimos. Ouvir isso fez meu coração pular. Era o nosso fim e a minha demissão. Já havia ouvido rumores sobre as condutas indevidas do chefão. Ele estava roubando e jogava tudo em pôquer. — O que farão agora? — Perguntei triste. — Todos vocês serão pagos e o que sobrar será para pagar as dívidas. — Respondeu. Depois dessa breve conversa, foi acertado o dia que deveríamos voltar e receber. Todos que saíam estavam como eu: tristes e para baixo. Uns piores que outros. Passei todo o caminho pensando no que fazer. Gastei três anos da minha vida em um emprego que não me valorizava, e nem era do meu ramo. Agora estava sem nada e acreditava que seria difícil arranjar outro agora. A situação do país não era a melhor e perder o emprego agora seria um grande problema. Mas talvez seja essa a oportunidade que eu esperava para finalmente trabalhar em paisagismo, que era a área que me formei. Eu tinha uma casa, e meu namorado tinha um bom trabalho. Mesmo que demorasse um pouco, talvez conseguisse algo. Andei poucos metros até a casa que tínhamos alugado. Não era muito grande, mas servia. Vivíamos trabalhando, e era Miguel que passava a maior parte do tempo em casa. Pelo menos até agora. Entrei já tirando o sapato e jogando a minha bolsa no sofá. As luzes estavam acesas, mas nada do homem. Um barulho vindo do quarto, chamou minha atenção. Não chamei seu nome, porém, a curiosidade era maior e caminhei até o quarto, devagar. A porta estava entreaberta e quando vi duas pessoas trepando em cima da minha cama, quase caí. Miguel e Ângela transavam como dois coelhos enquanto eu assistia chocada. Uma raiva tomou conta do meu corpo, e abri a porta com uma batida forte. — QUE p***a É ESSA? Parecia que alguém havia me jogado o pior feitiço do mundo. Primeiro perdi o emprego, agora descubro que sou corna. 
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