Ele segurou a mensagem com as mãos trêmulas, após ler e reler o seu conteúdo quase incrédulo, temeroso de tudo ser apenas um sonho. O coração dele batia acelerado e estava a cada segundo mais difícil controlar a fera de sua essência.
Ele não era mais um adolescente, um alfa de trinta anos, líder de um clã cujo m****o mais jovem passava dos vinte. Era difícil mensurar a alegria que aquela notícia traria para o clã inteiro e não apenas para a sua fera.
Beta Eli observava o amigo e líder de cabeça baixa, ajoelhado no chão, pois o desequilíbrio da força que emanava do alfa o deixava apreensivo, até mesmo apavorado. Dérik era um dos alfas mais poderosos em existência, um dos únicos a alcançarem a terceira forma.
Beta Eli temia que seu clã estivesse em perigo, o que explicaria a ansiedade do seu líder ao ler a mensagem urgente enviada pelo grupo de busca liderado pelo general Adanir, o gama do clã.
— Alfa, estamos com problemas? Quer que eu acione o exército?
Dérik virou-se na direção do beta atordoado, por alguns instantes havia esquecido da presença dele.
— Eli, reúna o clã na beira da praia. Ordene as fêmeas do harém para prepararem um banquete!
A fala do alfa não o surpreendeu mais do que o tom de voz exuberante usado por ele.
— Um banquete? — Perguntou o beta confuso. — Mas… Me perdoe pela insolência, mas posso perguntar a razão para uma celebração em meio a uma guerra?
Uma guerra entre espécies que estava próxima de levar os lobos de sue clã à extinção, caso um milagre não acontecesse me breve.
— A chegada da minha Luna não é motivo o suficiente para celebrar, meu amigo?— Respondeu o alfa com um raro sorriso no rosto.
Beta Eli arregalou os olhos e levantou sorridente. Era um milagre! Por anos ele e sua esposa imploraram à Hecate que enviasse uma Luna. Seu peito parecia querer explodir de alegria. Finalmente, seu clã prosperaria, ele e sua esposa realizariam o sonho de ter uma família.
Finalmente o clã estaria completo!
— O quê? Senhor, o filho da mãe do Adanir realmente encontrou a nossa Luna?
— Sim! Ele disse que a encontrou e a está trazendo para nós. — O sorriso do alfa se tornou contagiante. — A fera dele a reconheceu assim que a viu. Ele diz na mensagem que por instinto não aceita sair de perto dela e não permite que ninguém se aproxime. Disse também que eu entenderei quando a vir. Veja o que ele escreveu!
Alfa Dérik mostrou a mensagem para o beta, que parabenizou e abraçou o alfa.
— Vou agora mesmo ordenar que preparem a chegada de nossa Luna. Teremos a maior celebração de todos os tempos! Parabéns, alfa! Que os deuses abençoem vocês com saúde e muitos filhos!
— Assim seja, meu amigo! Assim seja!
*****
O clã dos Lobos Negros estava em festa, certos de que os deuses estavam favorecendo aquele território. Quando um alfa encontrava sua alma gêmea, o futuro do clã estava garantido. A fertilidade das fêmeas de um clã depende da existência da Luna.
Machos e fêmeas agitados, corriam de um lado para o outro, preparando a recepção da fêmea tão aguardada. Alfa Dérik estava de pé na beira da praia, olhando ansioso para o horizonte, de onde a pequena imagem de um navio se formava.
Beta Eli estava abraçado à esposa, que sorria, esperançosa, com a mão no ventre vazio, sonhando com a promessa de uma vida se desenvolver no futuro.
Dérik levou a mão ao peito ao sentir uma fraca conexão começando a se formar. Seu último medo, de que o Gama poderia estar enganado, se esvaiu. Ele ergueu a cabeça e liberou um uivo poderoso de confirmação e seu clã o acompanhou.
Ele conseguiu senti-la se aproximando, a conexão entre almas gêmeas cada vez mais forte.
O navio podia ser visto a olho nu, em poucas horas ele a teria nos braços.
Havia música, som de conversas animadas, planos para o fruto, gargalhadas. O clã estava em frenesi de tanto contentamento. Em um canto afastado, porém, a fêmea líder do harém assistia à cena com amargura.
Ela não estava feliz com a chegada da Luna, e desejou de todo o coração que algo acontecesse, que tudo fosse uma farsa, que nenhuma fêmea se atrevesse a atrapalhar seus planos...
O universo conspirava contra ela, seu prometido, o antigo beta, foi morto na guerra antes mesmo de marcá-la. A perda do seu companheiro fez dela uma das mulheres do harém. De Beta fêmea, Hira foi reduzida a uma serviçal, e o rancor em seu âmago aumentou com a notícia da chegada da Luna.
Hecate era a deusa mãe de todas as Lunas, a mais cultuada no clã, mas Hira tinha tanto rancor da deusa que se tornou devota à Sargat, a deusa da morte e do desespero, única que a acompanhou por toda a vida. De olhos fechados, ela rezou para que Sargat agisse naquele momento e fizesse valer a servidão que havia lhe oferecido.
Como resposta às suas preces, o som de explosão precedeu um silêncio fúnebre. Dérik inclinou a cabeça, seu foco no navio a distância. Logo uma espessa fumaça se formou sobre o navio.
Outra explosão trouxe consigo o aterrador som dos gritos dos tripulantes. Sem demora, Dérik se atirou na água, lutando contra as ondas, ele apressado na direção do navio, mas a distância ainda era grande demais para que chegasse a tempo.
Os gritos de dor e medo ficavam cada vez mais altos enquanto ele se aproximava. Tudo o que tinha em mente é que precisava salvar a sua fêmea. Os deuses não seriam tão cruéis ao ponto de tirarem a levarem sem que ele ao menos visse o seu rosto.
Ele era Dérik, um dos alfas mais fortes que existiam, se ele não fosse capaz de proteger a sua fêmea, como poderia liderar seu clã?
A conexão mais forte, e apesar da maresia, o perfume de sua fêmea atingiu suas narinas. Ela estava naquela direção, onde o fogo consumia o navio com mais furor. Ele saltou da água para o casco, mas outra explosão o lançou de volta ao mar. Determinado, ele reuniu toda a força que tinha, ignorando seus ferimentos, e tornou a nadar, porém, uma forte dor no peito o paralisou.
Naquele instante, o tempo pareceu parar e uma corrente gélida atravessou sua espinha. A conexão foi rompida, o perfume se extinguiu.
A dor excruciante fez com que a terceira forma assumisse seu corpo, porém, a escuridão tomou seus olhos.
Era tarde demais…
Ele nunca veria o rosto dela…