Quem vai acreditar?

2130 Words
- O que há de tão importante pra você me acordar à essa hora Deborah? Lúcia me encontrou em frente ao portão do orfanato. - Preciso de ajuda... Falei sem cerimônias. - Liam foi preso, a polícia está investigando e eu preciso de um lugar pra ficar. Expliquei. - Esperai... Você quer ficar na minha casa? Impossível Deborah! Lá é muito pequeno até pra mim! Disse sendo precipitada. - Não quero ficar na sua casa! Quero ficar aqui no orfanato! - O que eu tenho a ver com os crimes de Liam e você? Ela cruzou seus braços sobre o peito. - Você está envolvida até o pescoço Lúcia! A polícia está investigando a vida de Esther pois estão ligando o assédio de Liam, a tentativa de assassinato do Pither. E se descobrirem que você praticamente vendeu a Esther... Lúcia deu uma tossida e depois pigarreou disfarçando o nervosismo. - Quero ficar no orfanato pois sei que aqui seria o último lugar onde a polícia viria fazer batida! Pelo contrário você já estaria presa! Respondi destemida. - Entre! Ela disse empurrando o portão enferrujado. - Ainda é madrugada, provavelmente às crianças estão dormindo. - Não quero incomodar! Preciso de apenas um quarto em que eu possa ficar! Falei. - Não temos quartos disponíveis princesa! Lúcia disse em tom de deboche. - A não ser... - A não ser? Perguntei. - Só tem aquele muquifo onde a Esther dormia... Ela fez uma cara de agonia. - Ele fica no porão e está em péssimas condições... - Eu aceito! Respondi imediatamente.- Sei que em uma cela de prisão estarei pior! - Você devia estar atrás do Pither! Ela disse subindo as escadas. - Você não está sabendo que eu o coloquei contra a Esther, e ele a expulsou daquela casa? Lúcia falava com ar triunfal, m*l sabia ela que seu planinho ridículo tem prazo de validade. - Já vi que quem está m*l informada é você! Respondi sorrindo. Lúcia abriu a porta principal e seguimos um corredor a esquerda passando em frente por diversas portas fechadas, que ficavam no corredor. No final do corredor havia uma pequena porta no piso que dava acesso ao porão. Embaixo dessa portinha havia uma escada de ferro caracol. Descemos uma de cada vez por essa escada que rangia mais do que porta velha. Era uma situação horrível, e eu não estaria aqui se não estivesse realmente precisando. Seguimos por aquele lugar assustador até chegarmos enfim a porta no final do corredor. Lúcia tirou o molho de chaves do bolso da calça social, e pegou uma pequena chave encaixando-a na fechadura. Abriu a porta e estendeu o braço para que eu entrasse. - Essa é a sua suíte vip madame! Disse em tom de deboche. Entrei devagar observando cada detalhe daquele lugar. - Preciso buscar o resto das minhas coisas que ficaram no carro! Falei mostrando que estava apenas com uma bolsa de mão com poucas coisas. - Hummm... É corajosa! Zombou andando pelo quarto destemida. - Não se preocupe Saulo vindo pela manhã irá trazer todas as suas coisas. Concordei colocando a bolsa com a mão que não estava enfaixada. Lúcia acendeu as luzes deixando amostra o quão deprimente era aquele quarto. - Oh machucou a patinha? Ela disse em tom de riso. - Vou pedir ao Saulo que estacione seu carro atrás do prédio para que não levante suspeitas! Assenti ignorando o fato dela ter me chamado de animal recentemente. - Aqui dentro é muito abafado! Reclamei. - Você não viu nada! Durante o dia aqui dentro parece insuportável! Pois não se pode abrir a janela... Bom agora pode, já que o doutorzinho gato fez questão de quebrar a fechadura! Ela disse como se contasse uma piada. - Não sei como a Esther suportou morar aqui! Falei extremamente incomodada com o ar pesado daquele lugar. - Ela não teve paciência Deborah! Pois quando fizesse dezoito anos eu iria manda-la para a Turquia numa viagem só de volta! Respondeu gargalhando. Meu Deus! Essa mulher é um monstro! - Ela teve sorte daquele médico gostoso ter a comprado! Disse passando seu dedo indicador pelos móveis deixando evidente a poeira. - Pither ama ela! Respondi sem me dar conta de que estava a defendendo. - Só está encantado! Disse com desdém. - Acha mesmo que isso vai durar? Um homem como aquele apaixonado por uma garotinha tapada como a Esther! Lúcia sempre falava de Esther com total desprezo. - E o seu filho é do Liam ou do doutorzinho? Ela investigou me olhando de frente. - Nem um nem outro! Respondi um pouco irritada de como ela era inconveniente. - Você é mais safada que eu pensava! Ela soltou uma risada. - Vamos nos dar super bem! Por hora aproveite sua suíte Master querida! Está bem instalada, até mais tarde. E saiu me dando um tchauzinho. (...) Naquele momento eu precisava ficar no orfanato. Não tinha a mínima idéia de onde ir! Além disso não tinha tanto dinheiro assim para pagar tanto tempo um quarto de hotel! Coloquei a mala sobre a cadeira e me deitei na cama morrendo de nojo. Por um instante me lembrei dos maravilhosos lençóis de minha casa. E dos travesseiros de pena de ganso da casa do Pither. Senti lágrimas quentes rolarem por meu rosto. Eu não tinha pra onde ir! Nem com quem contar! Estava absolutamente sozinha com um filho no ventre. Meu corpo ainda doía pela queda da escada. Tomei um analgésico forte e voltei-me a deitar. Tudo naquele quarto me incomodava, principalmente o excesso de poeira! Naquele momento eu senti que minha alma gritava! Não era só tristeza carnal, era uma angústia absurda! Uma angústia de morte! Passou me a idéia de tomar todos aqueles remédios de uma só vez , e acabar com toda aquela dor que me consumia! Eu sou uma v***a desempregada e mentirosa! Minto pra todo mundo, inclusive pra polícia! Eu fiz tanto m*l a mim mesma, muito mais do que fiz pros outros! Era pra tudo ter sido mais fácil se eu tivesse aceitado fugir com o Enzo. Meu menino lindo de olhos azuis. Agora ele vai pra Londres, terminar seu curso de Engenharia. Vai aprender inglês e nunca mais se lembrará da vida que teve aqui! Adormeci ainda chorando... Acordei com meu celular vibrando sobre o colchão. Era mamãe. - Alô! - Filha?! Graças a Deus! Ela disse sempre exagerando. - Como você está ? - Estou bem mamãe! Respondi pacífica. - Não me conte onde você está! Quanto menos eu souber melhor! Ela disse um pouco apreensiva. - Liam foi indiciado filha! O suspeito confessou que foi Liam que pagou pra ele atirar no Pither. Fiquei perplexa com a notícia. - Aconteça o que acontecer Deborah não saia daí! Ela pediu. - Fica tranquila mamãe! Respondi. - Qualquer notícia te aviso! Vou tentar conseguir mais dinheiro e te mando! - Não precisa me mandar dinheiro mamãe! Estou bem! E ela se despediu desligando o telefone. Ainda com o celular nas mãos tentei mandar uma mensagem pro Lorenzo. Mas o "Visto por último dele era ontem a noite." Tentei ligar só caixa postal, então liguei na mecânica onde ele trabalhava. E o dono me avisou que o pai do Enzo tinha falecido. Fiquei arrasada! Ele já era órfão de mãe agora seu pai tinha ido também. E eu nem estava lá para lhe dar um abraço apertado! Fui até o banheiro desejando tomar um banho mas tive repulsa ao me deparar com aquele sanitário decadente. Definitivamente eu estava pagando todos o meus pecados. Alguém bateu na porta e ela se abriu em seguida. - Bom dia moça! Um homem muito grande entrou. - A Dona Lúcia pediu que eu trouxesse suas malas. Ele adentrou no quarto deixando minhas bagagens sobre o piso. - Por que está chorando? Me perguntou com piedade e isso me incomodou um pouco. - Não é nada! Sequei a lágrima com a manga do casaco. - É só aquele banheiro... Ele foi até o banheiro enquanto eu me sentava na cama. - Vou trazer seu café da manhã... Mas já aviso que terá que comer a mesma coisa que as crianças! Explicou. - Eu não me importo! Neguei com a cabeça. - Depois vá tomar um sol no jardim! Eu dou um jeito nisso aqui! Ele disse me olhando nos olhos. Apenas assenti vendo-o sair. Eu tinha medo daquele homem que mais parecia um guarda roupas. Talvez eu devesse ir embora daqui, e me instalar em um daqueles hotéis em beira de estrada. Eles custam mais baratos, mas imaginei o tanto de germes piores do que aqui que aqueles lugares possuí. Estou perdida definitivamente! Saulo não demorou muito com o café da manhã. Era leite com café e pão com manteiga, mas não me importei. Estava com fome demais para reclamar da refeição. Ele por um instante ficou me olhando comer e eu me senti constrangida. Depois ele sorriu com aqueles dentes assustadores e disse que ia pegar algumas coisas. Terminei meu café em minutos, e fiquei olhando as paredes daquele quarto. Por um instante eu pensei na Esther, e o tanto de sofrimento que ela tinha vívido aqui. Saulo voltou novamente cheio de utensílios doméstico. - Não conta pra Lúcia tá! Ele disse colocando o balde e o rodo dentro do banheiro. - Obrigada! Agradeci sendo sincera. - Moça, desculpa perguntar... Mas você parece ser fina, e bem criada. O que faz escondida aqui? Perguntou intrigado. - Falou bem estou escondida! Admiti. - Eu queria saber se meu carro está atrás do prédio? - Ainda não guardei. - Eu vou sair um pouco com o carro... Preciso de analgésicos pra aliviar isso daqui! Falei mostrando a tala na mão. - Quando você voltar provavelmente esse quarto estará bem mais habitável! Brincou. - Quer alguma coisa da cidade? Perguntei me levantando. - Talvez cigarros... Deu de ombros. E eu assenti concordando. (...) Fui até a cidade dirigindo, se mamãe soubesse me desaprovaria. Mas eu não estava nem aí! Precisava espairecer daquele lugar horroroso! Passei numa farmácia no centro da cidade para que o farmacêutico avaliasse meus ferimentos. Eu precisava de um analgésico mais forte, mas devido a minha atual condição ele se rejeitou a me vender. Tive que me conformar com pomadas antiinflamatória, para os hematomas que percorriam o meu corpo devida a maldita queda da escada. Eu devia ter morrido nela! Só assim todo mundo sentiria paz! Eu não fazia idéia de que Liam estava contando sua versão na cadeia. Se fazendo de vítima disse aos pais que eu o ameacei diversas vezes alegando que: "Que se eu caísse levava ele comigo!" Pelo amor dê Deus você que está lendo esse diário desde o início lembra bem que essas foram as palavras de Liam no escritório da minha casa. "Mas quem vai acreditar numa mentirosa?" No semáforo parei esperando o sinal verde para avançar. Olhei pro lado e vi uma loja, ela era toda de vidros, e na frente um manequim infantil bem pequenininho. Um vestidinho rosa me chamou atenção, não sei porque fiquei olhando pra ele um certo tempo. Eu nem sabia que sexo meu bebê realmente era. Eu queria fazer um ultrassom mais especializado. Mas sozinha eu não queria estar nesse momento tão importante. Se bem que mamãe deixou bem claro que eu deveria entregá-la a adoção logo que nascesse. E começar uma nova vida bem longe daqui... Essas foram suas palavras antes de me entregar as jóias e o carro. Ouvi o motorista atrás de mim buzinar, estava distraída e não percebi que interrompia o trânsito. Voltei a circular pela cidade, estava com pena de penhorar as jóias de mamãe. Aquelas jóias eram todas uma geração de D'Ávilas, e eu aqui manchando todo um legado. Fui até um driver thu e comprei um fast food barato. Sentei-me atrás da faculdade, no mesmo lugar onde sempre ia quando precisava pensar, na área dos fumantes. Dessa vez ele não foi! Ele não estava na cidade, estava com a família. Certamente já enterraram o seu pai, e ele provavelmente esta sozinho num canto, calado como sempre foi. Como me dói ter perdido esse homem! Lorenzo era perfeito pra mim, se não fosse o maldito dinheiro! Eu queria ter a grana do Pither para poder assumir a Esther sem se importar com nada, eu faria o mesmo com o Enzo! Coloquei as embalagens na lixeira e vim embora, passei pelo centro uma última vez. Dessa vez mais devagar, queria guardar todo aquela movimentação na minha memória, já que ia ficar trancafiada os próximos dias naquele orfanato horroroso. Num barzinho de esquina, pequeno porém aconchegante eu vi o Pither. Ele estava sentado em umas das mesinhas bebendo, ao seu lado uma moça o acariciava sensualizando-o. O que ele faz aqui?
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