Laís Narrando.
Eu abri a porta do meu quarto devagar para não fazer barulho, aparentemente estava tudo bem por aqui e meu pai não estava surtando, como todos os dias.
Eu fui até a cozinha respirando fundo para não ter um ataque e sair gritando pela casa inteira, ele nunca aprende, ele faz a maior bagunça, quebra as coisas quando está bêbado e ainda se acha no direito de me questionar.
Os potes que ficavam em cima do armário estavam pelo chão, as vasilhas espalhadas como se tivesse passado um furacão.
Toda vez que ele vem procurar dinheiro, ele derruba a casa inteira e ainda fica com raiva quando não acha.
Eu respirei fundo e comecei a arrumar tudo, varri os cacos de vidro pelo chão e limpei com bastante cloro e desinfetante.
Assim que eu terminei, eu fui até a sala para ver o estado que ele estava, ou ele estava morto de bêbado jogado no sofá, ou estava na rua fazendo mais e mais dívida.
Andei pelo corredor escuro sem fazer barulho e vi uma luz na sala, com certeza era a TV ligada.
Cheguei na porta e me deparei com ele deitado no sofá e com uma garrafa de vinho na mão, ele literalmente virava na sua boca até a última gota.
— Onde você estava, menina? — Ele perguntou se sentando. — Tu não acha que tá na hora de ir trabalhar, não? A grana já acabou.
— Se tu não tivesse bebido tanto e gastado com todas as suas porcarias, ainda teria dinheiro. — Eu falei pegando um pote de amendoim que estava no braço do sofá. — Eu estou fazendo o seu papel de sustentar essa casa.
— Eu tô nessa p***a toda porque precisei roubar pra te dar ao menos o que comer. — Ele falou alterado.
— Eu não pedi pra nascer, não... — Eu virei de costas. — Tu se vira pra pagar o Duque.
— Vai... vai... menina do caralho... — Ele falou levantando a mão e mandando eu sair. — Não tem dinheiro pra me dar, mas tu fica aí enchendo a p***a da cara de brinco...
— Tô fazendo com meu dinheiro, não com o teu... — Falei e bati a porta do quarto. — MERDA!
Eu peguei meu celular, disquei o número do Formiga e como sempre ele me atendeu de imediato.
-
Ligação on.
— Fala gata, já tá sentindo falta do teu amor? — Alguém falou ao atender o celular e começou a rir.
— Passa essa p***a pra ele logo! — Falei irritada.
— Iiii ta estressada, c*****o? Respeita nós, aqui é o Duque.
Eu senti meu estômago revirar ao ouvir o nome dele. Como ele atendeu o celular do Formiga e ainda veio fazer piadinha? O que foi que eu perdi?
— Vai passar ou não? — Fingi não me importar.
"Ae Formiga, tua mina tá na linha." Ouvi ele falar.
"Ela não é minha mina, tu sabe porra." Formiga respondeu e em seguida atendeu o celular.
— Fala aê Laís.
— Mano, tô precisando de uma grana... meu pai fez merda de novo... — Eu falei coçando a cabeça.
— De quanto dessa vez? — Ele perguntou num tom de preocupação.
— Não sei ainda... preciso ir lá no agiota pra saber.
— Suave, eu vou contigo. Marca 10 que já te pego aí.
— Obrigada. — Respondi e em seguida desliguei o celular.
Ligação of.
-
Eu vesti uma calça jeans justa, vesti um cropped, peguei uma jaqueta e calcei um tênis, dei uma ajeitada na cara e peguei meu celular e meu documento, coloquei no bolso da jaqueta e fui até a cozinha beber água.
Eu ouvi uma buzina, mas era de carro, não de moto. Fui até a janela da sala e vi que o Alquimista estava lá.
Eu respirei fundo e olhei para a cara do meu pai, ele fez que não estava sabendo o que estava acontecendo e voltou a prestar atenção na TV.
Eu abri a porta e fui até o portão pra ver o que ele queria, abri o portão e cruzei os braços.
— Cadê aquele caloteiro? — Alquimista perguntou com um pedaço de p*u na mão.
— Tu tá falando de quê, Alquimista? — Perguntei desentendida. — Eu fiz o acerto semana passada.
— Semana passada… — Ele começou a gargalhar. — Esse velho no dia seguinte foi lá de novo, pegou 3 mil e falou que ia devolver na quarta feira…
— 3 mil? — Eu passei a mão na cabeça. — Só pode ser brincadeira.
— Vai deixar eu entrar pra fazer meu acerto ou vou ter que chamar o irmão? — Ele perguntou e no mesmo instante o Formiga chegou.
Ele parou a moto todo acelerado e veio até nós, ele arrumou a arma dele para que o Alquimista visse e em seguida cruzou os braços o encarando.
— O que tá pegando aqui Laís? — Ele perguntou sem tirar os olhos do Alquimista.
— Mais uma dívida… — Eu falei envergonhada.
— Vaza Alquimista, teu prazo para dívida é de pelo menos 30 dias mano, tem só uma semana. — Formiga falou.
— Eu vim cobrar e eu vou sair daqui com minha grana, ou eu levo o que tiver de valor daí desse barraco. — Ele falou marrudo.
— Dá uns dias pra eu conseguir fazer essa grana? No final de semana tem baile, eu vou vender minhas bebidas e te p**o. — Falei tentando amenizar a situação.
— Tá errado isso aqui… — Ele falou me encarando. — Se vira, eu quero a p***a da grana.
— Qual foi Alquimista, tu tá querendo desarrumar comigo? — Formiga falou tirando a arma da cintura.
Alquimista deu dois passos para trás e recuou, ele abriu a porta do carro e entrou.
— 1 semana… se tu não pagar, eu vou cobrar, mas dessa vez vai ser do meu jeito. — Ele falou me olhando com cara de safado.
— Vaza c*****o. — Formiga gritou e deu um tiro pro alto.
Ele acelerou o carro e eu me sentei na calçada na frente da minha casa, passei as mãos pelos meus cabelos e suspirei.
Está complicado ficar desse jeito com meu pai, ele só faz dívida e eu vou acabar me fodendo qualquer hora.
Eu não tenho mais de onde tirar dinheiro, eu não tenho nem comida mais em casa para ele comer e ainda tem mais essa dívida.
Formiga sentou ao meu lado e me abraçou, ele tem sido fundamental para que eu não caísse no erro, mas dessa vez, eu não tenho saída… eu preciso dar um jeito…
— Não dá… — Eu falei me afastando. — Eu preciso que você me ajude… fala com o Duque…
— Lais nós vamos dar um jeito sem ter que te envolver na vida errada. — Ele falou me olhando.
— Merda Formiga, eu não tenho mais o que fazer… — Falei nervosa. — Eu preciso dar um jeito nisso ou eu vou acabar morrendo na mão desses caras… tu viu a cara que ele fez pra mim?
— Ele não vai fazer nada, eu não vou deixar.
— Até quando tu acha que vai conseguir me livrar? — Perguntei negando. — Dessa vez ele me enrolou de verdade… não tenho essa grana, nem pra pagar o Alquimista e muito menos para acertar o agiota.
— Laís eu gosto muito de ti, sabe disso… mas eu não posso ver você se fodendo na vida e saber que a culpa é minha. — Formiga falou. — Eu não vou falar com o Duque… se tu quiser, eu te levo e acerta com ele…
— Já é alguma coisa… — Falei e me levantei. — Bora lá agora.
— Não acredito que tô fazendo isso. — Ele negou com a cabeça e subiu na moto.
O caminho inteiro eu fiquei pensando no quanto tudo seria diferente se a minha mãe estivesse aqui.
Eu nunca vi uma pessoa mudar tanto em questão de 2 anos… meu pai, que antes era super protetor, queria o meu melhor e me afastava de tudo que era errado hoje está sendo um crápula.
Ele está no fundo do poço e simplesmente quer me levar junto.
Está tudo errado, a minha vida está toda errada e todo mundo vê, menos o meu pai…
Mas, agora eu preciso ir atrás desse prejuízo e conseguir finalmente colocar as coisas em ordem. Eu vou internar o meu pai em uma clínica de reabilitação, só assim ele vai se livrar dos vícios e eu vou conseguir seguir a minha vida sem que ele me afunde mais.