Capítulo 1
GABRIELA:
Eu chorava enquanto o caixão da minha mãe era enterrado, e com ela, ia meu coração junto. Abracei minha melhor amiga, Fernanda, que também chorava.
Ainda não tinha caído a ficha que minha mãe se foi, que ela me deixou. Ela sempre disse pra mim que iria ficar comigo a vida toda, e agora ela se foi, sem dar tempo de eu me despedir dela.
Ela era uma única que eu tinha sobrado. Meu pai morreu quando eu tinha quatro anos, minha irmã foi embora pro Rio de Janeiro para estudar, e hoje em dia nem olhar na minha cara ela olha.
O nosso santo não bate, ela não gosta de mim simplesmente por achar que nossa mãe sempre deu mais atenção a mim.
O que é mentira!
Nossa mãe sempre fez de tudo por nós duas. Ela só era mais protetora comigo, por que eu tenho Asma, e quando era menor eu tinha várias crises, e até parar no hospital eu já fui.
Mas ela nunca deixou de amar nós duas igualmente.
Mas na mente dela, nossa mãe só gostava de mim.
Não tenho nenhum rancor dela, mas as coisas que ela me falou antes de ir, eu nunca vou esquecer ...
“Gabriela, eu sinceramente estou pouco me fodendo real pra você, pra mim você não é ninguém. Eu te odeio tanto Gabriela, que se você morresse agora, eu iria fazer uma festa pra comemorar, que não tenho mais você pra perturbar a minha vida. Eu quero que você se f**a na vida, que fique sozinha, sem ninguém pra te amar. ”
Isso me machucou demais. Na época que ela foi embora, eu só tinha doze anos e ela dezoito. Você acha que uma criança iria querer ouvir isso da irmã mais velha?
Nunca!
Eu ainda tinha que ligar pra ela para avisar sobre a morte da nossa mãe. Eu tinha esquecido, pois tanta coisa passava na minha cabeça que acabei me esquecendo de tudo.
Quando recebi a notícia que minha mãe faleceu, parecia que meu mundo tinha sumido, que tudo já não faz mais sentido.
Ela era tudo pra mim, tudo o que eu tinha, e como os outros ... ela se foi.
Fui pra casa que eu e minha mãe morava, no Grajaú, em São Paulo. Essa casa meus pais compraram com muito custo. Depois de anos trabalhando, eles conseguiram guardas dinheiro e comprar essa casa.
Com a minha cabeça quase explodindo de tanta dor, eu peguei meu celular e fui ligar pra Giulia.
Eu ligava, mas só tocava, e tocava. Acho que ela não queria me atender mesmo. Liguei a última vez e dessa vez atenderam.
LIGAÇÃO:
Giulia: Que é c*****o? Quem é o arrombado que me liga essas horas da manhã? Que inferno.
Gabi: Oi pra você também, Giulia. - suspirei, me sentando no sofá da sala.
Giulia: Gabriela? O que você quer? - perguntou com um certo tom de nojo.
Gabi: Eu só queria dizer que ... nossa mãe morreu essa madrugada ...- falei baixo, deixando como lágrimas caírem por meu rosto.
Giulia: O que? Como ... assim? Ela morreu como?
Gabi: Leucemia. - funguei.
Giulia: Quando vai ser o velório?
Gabi: Não teve velório, ela já foi enterrada.
Giulia: Por que você não me ligou antes, c*****o? - gritou.
Gabi: Eu esqueci, desculpa. - falei baixo.
Giulia: Sua i****a!
Gabi: Giulia? Eu queria te pedir uma coisa. - ela não respondeu. - Será que tem como eu ir passar um tempo na sua casa? Por favor.
Giulia: Nunca!
Ouvi outra voz falando algo que não entendi muito bem. Acho que ela estava em ligação viva voz.
Giulia: Que inferno! Olha, você pode passar uns tempos aqui em casa, mais é só uns tempos. Não sou sua babá, não.
Gabi: Obrigada! De verdade, Giulia.
Giulia: Tá. Tchau.
LIGAÇÃO.
Sorri fraco e levantei do sofá. Eu iria pro Rio tentar ter uma vida melhor, e tentar me acertar com a minha irmã, por que, p***a, a gente é irmã cara, se odiar nesse nível não é bom, não.
Por mais que ela me tenha falado coisas horríveis, eu quero tentar fazer ela parar de sentir esse ódio todo por mim, sem motivo algum. Fazer ela ver que não sou essa pessoa horrível que ela acha que eu sou.
Peguei duas malas e cosméticosi a arrumar minhas coisas.
Eu tinha um dinheiro guardado, usaria pra comprar uma passagem. Lá eu arranjaria um emprego pra ajudar a Giulia nas despesas de casa e ir atrás de uma casa para eu morar, e não ficar se pendurando na Giulia pra sempre.
Precisava ser “independente”, e dependente somente de mim, por que sei que não vou poder contar com a Giulia nunca.
Aquela lá pra ajudar alguém, é difícil.
•••
Quando desembarquei no Rio, metade de mim ficou feliz, mas a outra ficou triste por minha mãe não estar aqui comigo.
Suspirei alto, tentando afastar esses pensamentos. Peguei minhas malas e fui em direção a saída.
Fiquei procurando minha irmã, mas não estava achando ela em lugar daquele aeroporto. Meu celular apitou, e peguei vendo ser uma mensagem dela, era um endereço, e logo ela mandou outra falando para eu pegar um táxi e ir pra esse endereço.
Bufei e fui atrás de táxi. Fiquei uma cota esperando algum aparecer, mas assim que encontrei um, ele coloque minhas malas no porta malas e entramos no carro. Dei o endereço vendo ele fazer uma careta estranha.
Não entendi o por que, mas nem perguntei o motivo daquilo.
Fui o caminho inteiro olhando como coisas que passavam. Era tudo lindo !. Diferente de São Paulo, que só tinha prédios e o céu cinza, aqui já era aquele sol do c*****o, cheio de gente nas praias.
Desfiz meu sorriso quando o motorista parou em frente a uma favela enorme.
Gabi: Moço? Acho que você parou no lugar errado. - sorri.
- Não. Esse é o endereço que você me passou.
Parei um pouco, e penso. Não é possível. Giulia deve estar brincando com a minha cara. Só pode.
Nem falei nada, sai do carro, peguei minhas malas e depois paguei o cara, que saiu do milhão dali.
Fiquei um cota, parada ali, só olhando para aquele morro enorme. Cai em mim, e andei mais um pouco até uns homens armados que estavam parados olhando pra mim.
Gabi: Oi. - sorri amigável. - Vocês sabem aonde a Giulia mora? Se ela mora aqui ?. - olhei pra ladeira, vendo um pouco descendo, e alguns subindo.
- O que tu quer com a patroa?
Patroa? Meu Deus. A Giulia deve tá doida. Num é possível, cara. Não é !.
Gabi: Chama ela pra mim. Por favor. - sorri falso.
Ele me olhou por um tempo, mas logo pegou um rádio e falou com alguém.
Eu estava quase me ajoelhando aqui, e pedindo a Deus que não fosse a Giulia, minha irmã que iria vir aqui. Que isso fosse um engano, apenas.
Mas quando eu vi ela descendo a ladeira, com um shorts minúsculo, minhas esperanças foram embora, junto com a minha felicidade.
Giulia: Oi, irmãzinha. - sorriu falsa e veio me abraçar.
- E ai patroa, apresenta ai pá nós. - um cara alto e magrinho falou me olhando.
Giulia: Essa é minha irmã, Gabriela. - falou com um certo tom de nojo.
- Satisfação ai, nova. Sou o Formiga. Qualquer papo, é só mandar.
Gabi: Tá bom. - sorri falsa pra ele, que só balançou a cabeça.
Giulia: Logotipo da Vamos. - puxou meu braço, em direção a ladeira.
Subimos aquela ladeira, passando por vários becos e vielas. Eu sinceramente, já estava morrendo, suando pra c*****o, e não aguentando mais subir aquilo.
Alguns moradores me olhavam confusos, acho que por que nunca me viram por aqui.
Alguns falavam com a Giulia, e ela ignorava. Pra não ser m*l educada eu sorria para as pessoas que falavam com ela.
Gabi: Por que as pessoas aqui te chama de patroa, Giulia?
Giulia: Por que eu sou uma mulher do patrão, o dono daqui da CDD.
Gabi: CDD?
Giulia: Cidade de Deus. - revirou os olhos. - Sou a fiel dele faz três anos já. - sorriso, jogando os cabelos.
Fiquei horrorizada com tudo isso.
Minha irmã, mulher de bandido? p**a que pariu !.
E eu e minha mãe achando que ela estava aqui estudando. Estávamos muito enganada. Enquanto a gente pensava que ela estava estudando pra ser alguém na vida, ela apenas estava se envolvendo com bandido.
Giulia: Eu queria ter ido ver minha mãe. Mas tinha muita coisa pra fazer. - suspirou.
Gabi: Ela disse que te ama muito, e pediu ... pra gente tentar ser amigas, ou apenas parar de implicar uma com a outra.
Ela deu uma risada alta e irônica e saiu andando na frente. Ela abre o portão de uma casa grande, e bonita até.
Entramos na casa e ela era toda mobiliada por dentro. Uma TV enorme, um sofá de couro preto, uma mesinha de centro de vidro. Várias coisas que deixavam uma sala aconchegante e bonita.
Giulia: Você vai ficar no quarto de hóspedes. Mas é só por um tempo, como eu já disse, não sou babá de ninguém, muito menos de você, e aqui não é pensão. - me olhou de cima a baixo.
Ela me levou até um quarto no andar de cima. Não era um quarto grande, e nem pequeno. Tinha uma cama de solteiro, um guarda roupa e uma cômoda. Era ótimo pra mim.
Giulia: Banheiro no final do corredor. - saiu do quarto batendo a porta, me deixando sozinha cômodo.
Eu via nos olhos da Giulia que ela não me queria aqui. Isso me incomodava, pois eu estava incomodando ela, tirando sua privacidade.
Mas eu não tenho mais ninguém. Só ela. Minha única família agora, e ela tinha que oensar assim também, por que, querendo ou não eu era uma única que ela tinha, uma única de sua família.
Mas, parecia que ela estava pouco se fodendo se eu era uma única de sua família, ou não, só queria me ver longe, e já era !.