Capítulo 4 - Helen

1966 Words
Depois que toda a choradeira acabou passamos o resto da tarde conversando e compartilhando problemas e experiências. Fazia tanto tempo que eu não me sentava com amigas e simplesmente conversava como fizemos hoje, era libertador. O sol já tinha se posto quando deixamos a casa de Bete e o céu estava escuro, mas as luzes e estrelas iluminavam toda a extensão azul acima de nós, aqui em uma cidade sem prédios e arranha-céus era bem mais fácil de apreciar as estrelas em uma noite como aquela, parecia até uma daquelas imagens da NASA, onde o céu está perfeitamente limpo e iluminado, um cobertor azul escuro bordado com pontos de luz sobre nossas cabeças. Continuei com a cabeça para fora do carro aproveitando a brisa no rosto e a paisagem até que Emily estacionasse a caminhonete na entrada de casa. Tudo o que eu queria a essa altura era uma cama e colocar os pés para cima, por mais divertido que fosse passar o dia fora era cansativo somado a viagem e gravidez. Assim que abri a porta meus pensamentos foram interrompidos pela cena a minha frente. Fernando estava fazendo a vez de goleiro, em um gol improvisado com gravetos fincados no chão. Enquanto Fábio e Miguel disputavam a bola, mas rapidamente o menino driblou o mais velho, mostrando o quão bom era e então correu para o gol. A bola passou por baixo das pernas de Fernando e os três explodiram em comemoração. Antes que percebesse eu estava sorrindo para a cena. Aquele homem ali era com quem eu havia me casado, descontraído, feliz, positivo, espalhando alegria por onde passava. — Esse é o meu garoto! — ele gritou jogando o menino sobre os ombros e girando com ele. Aquilo partiu meu coração, a ideia de que ele nunca faria isso com nosso filho, que nunca estaria orgulhoso de algo, ou simplesmente brincando como faziam agora. Me quebrou novamente ver que ele preferia fingir que o bebê não existia, que para ele a melhor escolha era desistir sem nem tentar. Corri para dentro não suportando olhá-lo, não me importei se a porta bateu alto de mais, se estava sendo rude com todos. Eu estava cansada e machucada. Em alguns segundos ele tinha conseguido levar embora a áurea de felicidade e tranquilidade da tarde. Logo quando descobrimos a gravidez ele era inseparável da barriga, conversava sempre compartilhando o seu dia, explicando algum jogo de futebol i****a na televisão, Fernando passava horas tocando minha barriga, como se esperasse algo, uma resposta, um chute. Mas agora tudo era diferente. Ouvi uma batida forte na porta, que se desesperou ao ouvir meus soluços aumentarem, mas não me mexi, não queria ver ninguém agora. Tinha quase certeza de que deveria ser Emy ou Miguel ali e eu não queria ser confortada quando o motivo ainda estava ali, sobre o mesmo teto me causando dor. Não sei a que horas consegui pegar no sono, mas acordei no meio da madrugada com um serzinho implorando por comida. Eu tinha errado em dormir sem jantar, já era um milagre que tivesse conseguido dormir por tanto tempo. Então tratei de descer as escadas, tentando não fazer barulho e iluminei o caminho com a lanterna do celular, sabia que Emy estava dormindo na sala e não queria acordá-la ou incomodar. Do jeito mais silencioso que consegui tirei o macarrão que estava na geladeira, o frango frito e maionese, misturei tudo em prato e coloquei no micro-ondas. Podia parecer nojento, mas nos últimos dias eu tinha adquirido uma obsessão por maionese, era ela em tudo que eu fosse comer. Mas assim que me virei lá estava ele, na penumbra da cozinha, vestido apenas com uma calça de moletom, com a luz parcial do quintal iluminando sua pele nua. O peito subindo e descendo com antecipação, os olhos ávidos na espera por alguma reação, e eu tinha certeza de que se pressionasse minhas mãos em seu peito seu coração estaria batendo tão rápido quanto o meu. Não tinha dúvidas porque era assim desde que o conheci. Lembrança: Tínhamos acabado de ganhar um dos processos mais gordos da firma, e o dinheiro que rendeu era só a ponta do iceberg, há algumas semanas já vínhamos recebendo ligações de outras pessoas com interesse em serem defendidos por nossa empresa e agora que havíamos ganhado a tendência era só aumentar. — Aqui! — alguém gritou na mesa acenando para o garçom voltar a trazer mais uma rodada. Estávamos comemorando no bar no fim da rua, as opções por ali eram escassas, era esse bar ou o dos motoqueiros, como ninguém ali fazia o estilo mais selvagem tínhamos que nos apertar para caber em uma mesa que comportava apenas a metade do nosso grupo. Fazer o que, estávamos felizes de mais para nos importar com aquilo. Pela primeira vez em muito tempo eu me permiti beber mais do que uma garrafa de cerveja, se estivesse em casa sozinha provavelmente teria acabado com a garrafa de vinho mais caro que tivesse, mas no bar onde estávamos eu me contentava com a cerveja. O estresse e os meses exaustivos de conciliações, barganha, revisão contratual e muita briga, também foram o fator para eu dar o braço a torcer e aceitar beber com a equipe. — Ele não para de olhar pra você. — Luiza sussurrou no meu ouvido não tão baixo quanto deveria, claramente ela estava mais alta do que eu. E sim, eu sabia que Fernando estava me olhando, ele fazia questão de não ser discreto. Apesar de trabalharmos para a mesma firma, éramos de setores diferentes, o que parecia ter dado a ele a ideia de que podia flertar comigo todo o tempo. Sempre que me via lá estava ele abrindo o sorriso largo, me elogiando e me arrancando pensamentos impuros. O garoto era dez anos mais novo do que eu, sim eu fiz a pesquisa, de uma cidadezinha no interior de São Paulo, o que explicava o ar sempre otimista. Ele ainda não tinha sido devorado pela cidade, mas aconteceria eventualmente, o que era uma verdadeira pena já que ele tinha um sorriso de ferrar com a cabeça de qualquer pessoa, e se você somar a pintinha sexy que ele tem perto do lábio superior, com certeza não vai precisar de mais que um par de palavras para estar abaixando a calcinha e deixando que ele faça tudo o que aquele ar de bom moço n**a que ele seja capaz, mas que cá entre nós ele é totalmente capaz de nos fazer perder a cabeça. Nos últimos meses eu tinha visto pelo menos três mulheres que estavam em processo de divórcio flertarem com ele no corredor do prédio. Seria antiético se ele correspondesse, ele era advogado delas, mas como minhas amigas insistiam em me lembrar ele parecia só gostar de fazer isso comigo. — Ele tá vindo aí. Ele tá vindo. — Gisele praticamente gritou do outro lado se afastando assim que a sombra dele parou ao meu lado. — Posso me juntar as damas? — a voz grossa soou ao pé do ouvido. Ele não tinha aquela voz, geralmente era algo doce e sedutor. Como uma barra de chocolate, o melhor e mais caro chocolate, daquele que derrete na sua boca e te faz gemer de satisfação. Merda, lá ia eu com os pensamentos impuros novamente. — Claro, senta aqui. — Luiza saiu do meu lado esquerdo e se juntou a Gi, apenas para me assistirem perder a cabeça de camarote. — Já disse que você está linda hoje? — eu revirei meus olhos e levei o gargalo da cerveja a boca. — Não faz assim, não me tortura desse jeito! — sua voz saiu mais baixa dessa vez chamando minha atenção. — Você sabe que adoro quando me esnoba e ainda levando a long-necks na boquinha assim, fazendo biquinho. Minhas amigas gargalharam enquanto eu apertei meus olhos com força tentando não entrar no joguinho sujo dele. Eu sabia bem que era muito fogo no r**o que ele tinha, o garoto fazia questão de deixar bem explicito em seu olhar, sempre parecendo com fome, ou salivando. Fernando mantinha a distância física, mas aqueles olhares junto ao sorriso sacana de lado pareciam surtir mais efeito que um toque, ele era o cúmulo. — Você é ridículo, sabia? Devia ser crime ser i****a assim como você. — resmunguei fingindo me concentrar em um ponto a minha frente, mas não me concentrando a nada na verdade, apenas atenta a sua presença. — Devia ser crime ser sexy como você. — Fernando lançou na lata, sem rodeios ou filtro. — Na boa, quem fica tão sexy assim com terninho? Me desculpem meninas, mas a dona aqui ganhou de vocês. — Garoto se controla! — reclamei apenas querendo que ele parasse com todas as cantadas engraçadinhas. Algumas ele era tão inteligente que me deixava até sem palavras, mas hoje não parecia o caso. O que eu agradecia, pois não conseguia mais ficar por muito tempo perto dele e não ficar envergonhada. Alguém tinha que dar um controle, colocar um fim nisso, mas ele parecia não entender a palavra: sai fora! De algum jeito ele acreditava que teria chance comigo, se ele ao menos soubesse que eu não queria me envolver com nenhum homem, nem nessa vida nem na próxima. Eu estava em busca de paz de espírito e homens eram o completo oposto. Sem falar no quesito idade que era gritante. Me envolver com alguém da idade dele era o mesmo que tatuar CRECHE na testa. Ok, talvez eu estivesse exagerando, mas dez anos não era algo a se ignorar. Eu estava o que? Na quarta ou quinta série quando esse garoto nasceu. Pelo amor. — Quem sabe você não me controla, nada como uma boa adestradora para ensinar limites para um cachorrão. — ele sussurrou me arrancando uma gargalhada. Era por esse motivo que ele se encorajava, eu podia até tentar, mas não conseguia ficar indiferente por muito tempo. — Que tal se o cachorrão for ajudar ela na mudança? — Gi se intrometeu quando viu que eu não o responderia. — Helen precisa de alguém assim sabe, forte, disposto, cheio de vontade. Eu a encarei perplexa, não podia acreditar que a i****a estava fazendo aquilo comigo, arregalei meus olhos como um aviso para que ela parasse ali mesmo, só o que me faltava era ter o pentelho me enchendo fora da empresa também. — Sabe pra ajudar a carregar caixas e mais caixas, apertar em alguns lugares, fazer um pouco de exercícios, sair de lá bem suado. — Luiza se juntou a ela. — Ela está precisando de um faz tudo sabe, com mãos grandes que goste de colocar com... — Chega vocês duas! — interrompi antes que continuassem com a conversa de duplo sentido. As duas cínicas apenas sorriram inocentes, elas podiam acreditar que estavam me fazendo um favor, mas eu duvidava muito. — Se você me queria era só falar doutora. — Fernando se curvou aproximando a boca de meu pescoço. — Tenho prazer em servir. — a forma como as palavras saíram da sua boca me fizeram fechar os olhos esperando por mais, ao que atiçasse minha imaginação, que me deixasse sonhando a noite, algo que pudesse usar como inspiração mais tarde com meu vibrador. — Até amanhã então? — eu abri os olhos inconformada com a situação e suspirei frustrada avaliando minhas opções. Sim eu precisava de ajuda na mudança, sim eu era péssima em qualquer coisa como montagem ou instalações em geral. Mas podia muito bem arrumar uma firma que fizesse isso, ou esperar até que meu irmão decidisse se compadecer de mim e me ajudar. Mas assim que virei e encarei os olhos dele eu soube que ali estava a resposta para a maioria dos meus problemas.
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