CAPÍTULO 7 | DIVINA COMÉDIA

1202 Words
_Pessoal! Vamos repetir essa cena da maçã, não está boa! – compenetrada, Maitê tentava conduzir o ensaio de mais uma de suas produções teatrais. Cada um se colocou em sua "marca" para repetir a cena. "Preta de Sujo", sua mais nova criação: uma releitura de A Branca de Neve e fazia uma crítica aos contos de fada e a questão de as princesas serem sempre brancas e apáticas sem nenhum papel atuante nessas histórias. Ela queria que as princesas fossem mais decididas e poderosas. Mais empoderadas e diversas. Sua personagem era mestiça filha de um fidalgo do Brasil Colônia com uma escrava alforriada que se rebelava contra a patroa tirana e "ia à luta" para vencer na vida na cidade grande. O "príncipe encantado" era um rico empresário da moda que, no lugar de "salvar" a Preta, via nela potencial e contratava ela como estilista de sua boutique de luxo. Maitê estava empolgadíssima com sua mais recente produção que seria encenada na SEMANA CULTURAL da escola; seria o primeiro papel da "carreira" de Bernardo que havia sido "eleito" o príncipe pela turma. Desde o começo das aulas, eles meio que não se desgrudavam. Ela não sabia como, mas o danado acaba participando de tudo com ela, inclusive "se convidara" para ajudar com a peça e, claro, terminou virando o personagem principal por "sugestão" das amigas. Muito a contragosto, Maitê havia aceitado, só que já começava a se arrepender porque a criatura não tinha a menor disciplina e ela levava suas produções muito a sério desde o fundamental e não era agora que ela já estava no ensino médio que ia perder a sua reputação... _Mais uma vez ele estava bagunçando seu ensaio! – pensou respirando fundo para não atirar os papéis do roteiro nele – Tinha que confessar que gostava da companhia daquele garoto, apesar de ele ser tão diferente dela que era centrada, pensava mil vezes antes de fazer alguma coisa e detestava chamar a atenção para si mesma. Ele até que tinha talento para atuar, mas sabia que ia ter problemas com ele na peça., mas não conseguia ficar zangada com ele: era tão genial e naturalmente engraçado! Só que manter ele na peça era um verdadeiro pesadelo; quando não era ele, era Carina ( sua protagonista) que desatava a rir no meio da fala da cena principal da peça. _Gente, quando o Armand diz "Preta, meu grande amor! Case-se comigo" e ela diz: "Não!" Toda a ordem mundial dos contos de fada se subverte! - gastava energia tentando engajar aquele povo s*******o - É nossa principal cena! Parem de rir! _Mas quando Bernardo diz isso é muito engraçado! – reclama Carina, "a Preta", olhando toda derretida para seus par romântico na peça. _Jesus! Será que a Sofia Coppola passou por isso? _Quem é Coppola? Personagem novo? – Carina pergunta. _Santa ignorância! – reclama Fatinha. _Tenha paciência. É o "efeito " Bernardo" – dizia Maitê entre dentes observando o amigo abrir um dos seus sorrisos estonteantes e Carina suspirar hipnotizada. _Deixa de ser b***a, Cari! – retruca Rogério com ares de sabe tudo – Coppola é o sobrenome do Roberto da turma C4, mas o que ele tem com a peça? A turma dele não ficou com a parte da cantina? Maitê revira os olhos e Bernardo já achando que a amiga teve demais por um dia, sugere uma pausa e arrasta Maitê para um sorvete na cantina. Na hora da saída ela ouve uns assobios e olha disfarçadamente na direção do som: uma turminha do último ano estava ali reunida e Maitê divisou Arnaldo no meio deles – estranhou, já que o irmão mais velho do Bernardo já era calouro na faculdade. _ E ai Sofia Coppola!? Já se recuperou do ensaio? – Bernardo foi chegando, abraçando- a pelos ombros e começando a conversa. Super relaxado, ele parecia alheio ao fato de que todas as garotas da turma ali fora estavam com os olhos grudados neles dois - Mais calma? - brincou - Não quer ir com a gente? Meu irmão tá de carro. – perguntou logo após ter ouvido dela que estava bem. – Não se preocupe, eu te protejo destes animais! – brincou falando baixinho no ouvido dela e abraçando-a um pouco mais forte, quando percebeu que ela olhava desconfiada para os garotos e para o irmão dele. _ Melhor não...Você sabe que eu e seu irmão não somos muito chegados... _Por favor...- ele pediu dedicando a ela um "daqueles" sorrisos e ela não foi capaz de negar. O "carro" era uma dessas caminhonetes de cabine dupla e ela foi no banco da frente entre o motorista e o amigo enquanto a turma do Arnaldo ia no fundo fazendo a maior algazarra. Maitê podia sentir os olhares de inveja das outras meninas acompanhando o carro passar. m*l tirou o uniforme, já tinha um verdadeiro pelotão na porta de sua casa. _Sua bandida! Nem pra chamar a gente! _ Gente, eu vim de carona, não sou dona do carro _E que carona, hein? Não basta ser dona do Bernardo, agora vai querer "pegar" o Arnaldo também? _Pêra ai! Eu sou "dona" do Bernardo? De onde tirou isso? Além do mais, falem baixo! Esqueceram que eles são meus vizinhos? _Minha filha! Esquecer isso é impossível!- Até parece que eles não sabem que são lindos de morrer e que a escola toda tá de quatro por eles. _ Isso sem falar dos amigos! - completou Rebeca. _Quanto aos amigos, eu não sei, mas eu sou todo de vocês, "minhas bernadetes"! – a voz de Bernardo chegou até elas. Encostado na porta de seu apartamento, descalço e sem camisa ele acompanhava o ataque que Maitê estava sofrendo – mas antes - o palhaço ainda fez uma pausa dramática - preciso cumprir meu papel de príncipe e salvar minha "donzela em perigo". – anuncia atravessando o corredor polonês de meninas para entregar um punhado de papeis a ela. _ Sua apostila de matemática estava de "namoro" com o meu script, "diretora". – falou abrindo um sorriso "daqueles". _Obrigada. – agradeceu para depois voltar a carga – Vamos ver se amanhã melhoramos os resultados, pois o ensaio de hoje foi um horror. _Sabe o que é diretora... - começou cínico – Eu estou tendo dificuldade de "entrar no meu papel", acho que preciso de uma "atenção especial' – falava todo meloso para o deleite de todas as amigas dela que não tinham nem a dignidade de disfarçar.- Quem sabe se repassássemos "juntos' as cenas...Você sabe, sozinhos... _ Ai amiga! Não sei como você resiste! - suspira Tati e Maitê quis abrir uma cratera no chão e se enfiar dentro. _Deixe de conversa mole que ainda tem ensaio hoje à noite! – falou arrancando protestos das amigas. – E nem adianta reclamar! – e voltando-se para ele - Me dê só uns minutinhos que vou tomar um banho e nós repassamos o texto. _Posso ajudar? _O que? – ela pergunta já focada, a mente cheia de planos para melhorar a performance teatral de Bernardo. _Ajudar no banho... - provocou ele entre risos esperando a reação inflamada dela que lhe atira a apostila nas costas mandando que ele volta para seu apartamento.
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