Três meses se passaram e as coisas pareciam estagnadas. A vida parecia sem cor, sem ar... sem sentido. Após a conversa esclarecedora entre Ethan e Jane, o que poderia ser o começo de um entendimento ou até mesmo o inicio de uma amizade não aconteceu. Da parte de Jane havia o medo de voltar a confiar. E aliás ela não via motivo para confiar. Até então ele não tinha feito nada para mostrar ser digno de sua confiança. Da parte dele havia o medo de qualquer investida colocar tudo a perder. Acreditou que recuar seria sua melhor arma. Talvez a convivência fizesse com que Jane passasse a vê-lo de forma diferente.
Mas como isso poderia acontecer se pareciam dois estranhos em casa? Duas semanas após o casamento Jane conseguiu uma colocação em um hospital da cidade e Ethan se enfiava cada vez mais no trabalho. Conversavam um pouco, é verdade, mas somente durante o café da manhã ou a noite. Os únicos momentos em que mais se encontravam. Mas às vezes nem isso acontecia. Jane fazia seus plantões o que muitas vezes fazia com que ela chegasse em casa quando Ethan já tinha saído para o trabalho.
Os finais de semana se resumiam a visitas de Jane aos pais ou amigos... e o sumiço de Ethan. E isso vinha deixando Jane com a pulga atrás da orelha. Todos os sábados ele saía cedo vestido com roupas simples e so voltava após as três da tarde. Mas isso não teria nada demais se ele não voltasse sempre com a expressão da mais genuína felicidade. E Jane se mordia de curiosidade, mas sem coragem alguma para perguntar.
Hoje era um desses dias. Sábado ensolarado e embora estivesse de folga no hospital Jane não sentia vontade alguma de sair de casa. Queria muito ver como a mãe estava, mas o cansaço da semana atribulada a impedia. Diana estava melhorando a olhos vistos, o que de certa forma também deixava Jane confusa. Se era tão grave... como ela poderia estar tão bem?
Claro... essa era uma notícia maravilhosa, mas Jane tinha a sensação de estar deixando algo passar. Pensando nisso ela se levantou e foi até o banheiro. Tomaria um banho e então visitaria os pais. Mas ao mesmo tempo queria saber onde Ethan estava.
Fechou os olhos sob a ducha e tentou reorganizar seus pensamentos. Nas duas primeiras semanas de casada ela agiu rudemente, até mesmo de forma infantil, sempre acusando Ethan do rompimento dos dois. Usava palavras ferinas que sabiam que o magoavam. Mas depois disso analisou seus atos. Ela não era esse tipo de pessoa. Ela mesma não disse que o perdoou? Então por qual motivo o estava desprezando desse jeito?
A resposta tinha sido imediata. Era uma fuga. Uma forma de não ter a mínima chance de um deslize. Ela sabia, e era mulher o bastante para admitir que Ethan mexia com sua libido. Mas era apenas isso. Talvez a curiosidade em saber como teria sido fazer amor com ele. Por isso saiu da fase da agressão e passou para a indiferença. E sequer fazia ideia de que isso doía nele muito mais do que suas palavras rudes.
Após sair do banho vestiu um jeans e camisa de malha, calçou tênis e pegou a chave de um dos carros de Ethan. Meia hora depois ela estacionava em frente a casa dos pais, franzindo a testa ao ver uma movimentação de pessoas desconhecidas. Olhou ao redor vendo materiais de construção, latas de tinta e vários homens que inclusive a olharam maliciosamente. Ignorando-os ela entrou em casa e parou ao ver Tess que estava na sala.
— Tess?
— Janette! Que alegria vê-la mocinha.
— Como? Você não estava aqui antes...
— Ah sim, mas agora eu estou de volta.
— O que eu perdi? Fiquei apenas uma semana sem aparecer e agora isso...
— Vão reformar a casa. Aliás ficaremos aqui por poucos dias. Ficaremos em um apartamento enquanto deixam essa casa maravilhosa novamente.
Ela entendeu bem? Estavam reformando a casa? Tess estava ali como empregada? E iriam para um apartamento? Seu pai ficou louco? Com que dinheiro? E a saúde da mãe? E mais...
— com que dinheiro?
A pergunta saiu pelos seus lábios sem que ela percebesse. So se deu conta disso quando Tess sorriu meio surpresa e respondeu ainda sorrindo.
— Com o dinheiro do seu marido, é claro. Ele é quem está pagando tudo.
— Eu já deveria saber.
Vociferou e subiu as escadas correndo indo em direção ao quarto dos pais. Entrou sem bater e parou ao ver o casal abraçado na cama e sorrindo de alguma brincadeira como dois namorados adolescentes.
— Jane! Que saudade minha filha.
Com a testa levemente franzida Jane se aproximou da cama onde estavam e se sentou encarando os dois. Diana parou de sorrir ao ver que a filha não estava com uma expressão muito boa.
— O que significa essa loucura de reforma? E pior... usando dinheiro do Ethan? Vocês ficaram loucos?
— Ele se ofereceu Jane.
— Oh claro... mais um truque para se mostrar um bom moço. Eu bem que deveria ter desconfiado. Ele está tão quieto, tão distante que so poderia estar mesmo armando. Ele não desistiria tão fácil.
— Não é da forma que está pensando filha. Ethan já tinha proposto isso há muito tempo. Estávamos apenas... esperando as coisas melhorarem.
— Que coisas?
Perguntou cruzando os braços em frente ao peito, mas sua atenção não estava no pai e sim no rosto da mãe. Diana estava mais corada, os cabelos embora ainda enfraquecidos estavam mais brilhantes. Ela estava visivelmente mais sadia em relação ao estado em que Jane a encontrou ao retornar.
— Eu esperei muito tempo, mãe. Eu fingi não perceber nada para não aborrece-la, mas agora está mais do que óbvio que seu estado de saúde não é tão critico assim. E por isso mesmo eu exijo que me contem a verdade. O que estão escondendo de mim? E não ousem dizer que não estão.
O casal suspirou e Peter apertou a mão de Diana, gesto que não passou despercebido a Jane. Não havia dúvida. Estavam mesmo escondendo alguma coisa. E não pode evitar uma ponta de mágoa por acreditar que Ethan estava envolvido nisso.
— Tudo bem, filha. Eu prometo a você que contarei tudo, mas, por favor... Dê-me apenas alguns dias para que eu possa organizar meus pensamentos e expor a situação para você da melhor maneira.
— É tão grave assim que precisa de tempo?
— Não seja sarcástica Janette. Isso não combina com você. É apenas um assunto delicado e eu não quero que você interprete de outra forma.
Jane suspirou amaldiçoando-se por usar esse tom com a mãe. Seus pais mereciam respeito, independente da situação.
— Desculpe mãe. Eu só fiquei nervosa vendo as coisas acontecerem e eu evidentemente sem saber de nada. Mas tem dedo do Ethan nisso não é?
— Não o julgue precipitadamente. Jane... Nós amamos você de uma forma que você sequer pode imaginar. Tudo o que queremos é sua felicidade. Se soubéssemos que Ethan pudesse ser algo tão nocivo quanto você diz seríamos os primeiros a escorraça-lo da sua vida.
— A menos que ele usasse sua doença não é? Mãe, eu estou realmente feliz em vê-la melhor, como se nunca tivesse ficado doente. Mas como pode ser isso? Seu caso era gravíssimo e eu sou médica esqueceu? Uma doença tão grave no fígado não se cura sozinha, pelo amor de Deus.
— Não foi uma cura sozinha, um milagre. Eu... Realmente sofri muito e pensei que fosse morrer. Mas quando você voltou...
Diana baixou a cabeça e não segurou seu choro. Ela chegou a acreditar que nunca mais veria a filha, já que não permitiu que Peter a informasse a respeito da doença. O que Jane não sabia é que quando ela retornou Diana já estava em fase de reabilitação após o transplante. Ainda não era o momento de ela saber a verdade, mas agora não havia mais motivos para mentir para a filha.
— Quando você voltou eu estava me recuperando.
— Como assim? Quando eu voltei a senhora estava tão abatida por estar em recuperação? Já estava curada? O que foi feito?
—Eu vou contar... Daqui a dois dias. Eu prometo. Não esconderei nada de você.
E porque não queria ser a causadora de algum m*l estar na mãe Jane acabou concordando. Mas sua mente ainda fervilhava com as várias possibilidades que iam surgindo. Só esperava sinceramente que não fosse algo tão grave. Não queria de forma nenhuma ficar magoada com os pais.
— Ok... Então me contem a respeito dessa reforma. Ethan não comentou nada.
— Em algum momento você deu a ele a chance de conversar algum assunto?
Jane engoliu seco percebendo que os pais sabiam muito bem como ia seu relacionamento com Ethan. Preferiu se calar. No fundo porque sabia que estava sendo talvez intolerante demais.
Jane conferiu as horas em seu relógio assim que entrou em casa. Pouco mais de dezesseis horas, portanto Ethan já devia ter chegado. No caminho de volta para casa ela veio pensando em tudo o que conversou com os pais, em como estava sua vida sob o mesmo teto com Ethan... e se decidiu. Sempre se orgulhou de ser uma pessoa justa e então não seria diferente agora. Várias pessoas falavam muito bem de Ethan. Seus pais inexplicavelmente o defenderam com veemência o que levou Jane a crer que talvez estivesse sendo dura demais.
Se todos defendem e apenas um é contra... onde estava o problema? A resposta era óbvia. Portanto chegou disposta a uma trégua. Tentaria conhecer esse novo Ethan.
Antes que seguisse para o seu quarto porem Ethan surgiu vindo do seu escritório. Ainda estava com a roupa com a qual Jane o viu sair pela manhã. Jeans claro, camisa vermelha e tênis. Ele parou ao vê-la, visivelmente desconcertado diante dela. A verdade é que Ethan já não sabia mais como agir perto de Jane. Estava se sentindo acuado dentro de sua própria casa.
— Oi.
Falou baixo como se desejasse que ela não o ouvisse, mas sem sucesso.
— Oi Ethan.
Ele sentiu o corpo inteiro arrepiar e puxou a respiração com força. Precisava sair dali o mais rápido possível. Jane o desestabilizava completamente e o impedia de pensar direito.
— Eu...eu vou tomar um banho.
Jane permaneceu calada, mas antes que ele saísse ela falou atropeladamente.
— Tem algum programa para hoje?
— Como?
Ethan perguntou se virando para ela, incrédulo diante daquelas palavras. Ela estava mesmo perguntando aquilo?
— Você. Tem algum programa para hoje a noite?
— Não. Eu... ia ficar em casa mesmo.
— Eu pensei em jantarmos juntos... sei la... conversar um pouco.
Ethan piscou várias vezes. Aquilo era um sonho so poderia ser. Mas felizmente sua mente trabalhou rápido e não o decepcionou.
— Claro. Por que não? Quer que eu peça algo?
— Eu posso cozinhar se você não se importar.
— De forma alguma. Eu ajudo.
— Ótimo então.
— Ok.
Ethan saiu apressadamente da sala e se refugiou em seu quarto. Suas mãos tremiam tanto que acabou deixando cair o celular que segurava. Não se preocupou em pega-lo, deixando-o aberto no chão, sem a bateria que se desprendeu com a queda.
Sentou-se na cama e passou a mão nos cabelos. Um jantar. Ele e Jane. Ela queria conversar. Mas o que? Vinha o ignorando há tantos meses! Precisava se controlar... Mas nada de álcool. Há tempos deixou de procurar consolo na bebida. Em vez disso entrou no banheiro, se despiu e pouco depois estava nu sob a ducha. Colocou a testa no box e fechou os olhos.
— Jane...
Igualmente abalada, Jane permanecia parada na sala quase sem acreditar que tinha realmente feito aquilo. Essa era sua intenção na verdade, mas não queria parecer tão desesperada. A verdade é que ficou impressionada com a aparência quase frágil de Ethan. Ele parecia quebrado, perdido... Desnorteado e ela sabia que isso era culpa dela. Mas agora já estava feito e não adiantava recuar.
Foi até a cozinha e verificou a geladeira e armários tentando se decidir o que cozinhar. De repente fosse mais sensato perguntar a ele o que gostaria de comer. Ficou na cozinha um tempo tentando decidir a melhor opção e por fim desistiu. Conversaria com Ethan e descobririam a melhor opção.
Ao passar pela sala o telefone tocou e ela se apressou em atender. Queria tomar um banho e descansar um pouco antes de começar o jantar.
— Alô.
— Por favor, eu gostaria de falar com Ethan.
— Quem gostaria?
— É Verônica. Por favor, é muito importante. Liguei no celular, mas ele está fora de área.
— Verônica... Ok. Verei se ele pode atendê-la.
Respondeu friamente tentando descobrir quem era essa mulher. Ficou parada pensando se mentia e dizia que ele não podia atender, mas logo afastou esses pensamentos. Que Ideia mais i****a era essa? A troco do que faria isso?
Seguiu até o quarto de Ethan e foi preciso bater à porta três vezes antes que fosse aberta. E ela se arrependeu de ter feito isso. Engoliu seco ao ver Ethan com o peito desnudo e ainda úmido e a toalha escura em volta da cintura.
— Er... Desculpe. Verônica quer falar com você.
— Ah sim. Eu estava no banho. Obrigado.
— Por nada.
Jane começou a se afastar, quase em transe, mas assim que Ethan fechou a porta ela voltou até la. Não entendia o motivo, mas sentia uma necessidade urgente de ouvir o que ele dizia.
— Não. É claro que não. Não atrapalha nunca.
Jane aguardou com o coração disparado e a pele arrepiada ao ouvir a risada dele.
— Sério? Eu também já estou com saudade. Olhe só... eu tenho um compromisso mais tarde, mas ainda da tempo de passar ai. Só vou me vestir e estarei ai em vinte minutos, ok?
Jane não esperou para ouvir mais nada e correu para o seu quarto. Andou de um lado a outro roendo as unhas. Quem era essa verônica por quem ele já sentia saudade? Ele iria mesmo ao encontro dela mesmo tendo combinado um jantar com ela?
Distraiu-se com suas conjecturas e se assustou quando ouviu a batida em sua porta. Mordeu a ponta dos dedos, pois sabia que era Ethan. E claro... Ele vinha avisar que não haveria mais jantar. A tal Verônica ligou e imediatamente ele se esquecia do seu compromisso com ela. Ela merecia uma explicação não é? Afinal eram casados.
Irritada além do necessário Jane foi até a porta e a abriu bruscamente. Ethan agora usava jeans escuro e camisa azul marinho de mangas compridas. Estava de tirar o fôlego, principalmente porque aquele cheiro que emanava dele chegava a ser viciante.
— Ethan...
— Jane eu sei que combinei de ajudá-la a preparar o jantar, mas houve um imprevisto. Eu preciso sair, mas eu juro... Eu volto para o nosso jantar.
— Podemos deixar para outro dia. Não é importante.
— Sim é. Olha... Descanse um pouco e esqueça a cozinha. Eu encomendo um jantar especial para nós. Comida chinesa... Eu sei que você gosta. Por favor... Eu preciso realmente sair. É importante.
— Não se preocupe. Vá tranquilo.
— Jane...
— Eu já disse que está tudo bem, Ethan. Quando você voltar decidimos juntos o que fazer.
Ele deu um sorriso que acelerou o coração da esposa. E Jane odiou essa sensação.
— Eu não me demoro.
Fechou a porta assim que ele se afastou. Inquieta, andou de um lado a outro. Sabia que estava agindo estupidamente, mas precisava tentar descobrir quem era essa Verônica. Foi até a porta do quarto, mas sua mente gritou um sonoro não.
Ia se rebaixar tanto? Esse casamento não era verdadeiro! Não importava quem era essa Verônica que estava ligando para o seu Ethan. Eles tinham um compromisso e ele preferiu sair não foi? Então ela faria o mesmo.
E os dois então voltariam novamente...à estava zero.