Um silêncio constrangedor tomou conta da cafeteria que tinha dentro do condomínio em que morava. Apenas o som das unhas da Ágata, batendo contra a mesa enquanto esperávamos os pedidos, cortava aquela tranquilidade.
— Poderia falar de uma vez o que quer.— Resmungou Otto.
Ágata virou o rosto pálido na direção dele. Seus olhos azuis, frios e indiferentes, pareciam cortá-lo como gelo.
— Eu já disse na praia. Preciso que sua irmã recupere um documento muito importante.
— Do que se trata esse documento? Com quem precisamos pegar?— Perguntou Stella.
Antes que Ágata pudesse responder, a garçonete se aproximou com a bandeja.
Ela serviu cada um com seu respectivo pedido.
Eu fazia o jogo da Ágata, fingia não me importar com nada, por mais que meu coração parecesse prestes a explodir.
A agente degustou o bolo de brigadeiro que havia pedido, com calma.
— Isso é maravilhoso. Se eu morasse no Brasil, com certeza já pesaria uns cem quilos.
Meus irmãos a fuzilavam com os olhos.
Estávamos com problemas reais, o último que queríamos saber era informações sobre o peso da agente.
— Imagino que estejam querendo saber mais da missão.
— Ah, por favor.— disse Otto, com ironia.
— Ernest Kaufmann, o dono da Kaufmann, uma fábrica têxtil, detém um documento muito importante para o governo austríaco. Ele roubou esse documentos há alguns anos e fugiu para o Brasil. Não temos provas concretas, por isso não podemos prendê-lo.
— Acho que estou entendendo onde quer chegar.— disse, seguindo a linha de raciocínio da mulher.
— Você precisará criar a identidade de Júlia Werner para se aproximar da família. Veja a melhor forma de fazer isso.— Ágata abriu a bolsa e tirou de dentro uma pasta cheia de folhas.
Ela colocou sobre a mesa, na minha frente.
— Aí está o dossiê da família. Você tem seis meses para conseguir recuperar o documento, ou do contrário, levo você e toda a sua família para o governo italiano, onde você aplicou os seus últimos golpes. Ah, e nem pense em fugir. Já viu que sou muito hábil em rastrear. Se precisar, encontro vocês até no inf*erno.
Segurei a pasta, determinada.
— Em seis meses você terá o que procura, Ágata. E depois disso, irá sumir das nossas vidas.
— Te dou minha palavra.— Concordou Ágata.
Sem dizer mais nada, fiquei de pé, meus irmãos fizeram o mesmo.
Deixamos o lugar com as xícaras de café ainda cheias.
Ágata não deu a mínima, continuou degustando o seu bolo.
— Eu ainda m*ato essa mulher.— Murmurei, cheia de ódio.
Entramos no elevador que nos levaria direto para a cobertura.
— Algo me diz que ela vai aprontar com a gente. Pode ter certeza que quando tiver o que quer, essa mulher vai ferrar com a gente!— disse Otto, preocupado.
As portas se abriram já dentro de nossa sala de estar.
— Eu também tenho essa certeza.— Concordei.— Temos seis meses para decidirmos o que fazer com essa mulher. Até lá, vamos focar na nossa missão.
— Temos uma nova missão?— Perguntou uma voz feminina conhecida.
Ao me voltar na direção dela, tive uma agradável surpresa.
— Sofia!— Exclamei, indo na direção da minha irmã mais velha para abraçá-la.
— Estava com saudades dos meus irmãos caçulas.
Ela retribuiu.
Stella e Otto se aproximaram logo depois.
— Quando foi que chegou?— Perguntou Stella.
— Chegamos, você quis dizer.— Corrigiu Sofia.
O nosso irmão mais velho surgiu logo em seguida.
— Agora, sim, nossa família está quase reunida.— disse Otto, tomando a iniciativa de abraçar o outro.— Faltam nossos pais.
— Acho que não.— Pontuou Hugo.
Não tivemos tempo de perguntar nada.
Mamãe e papai adentraram o lugar, em seguida.
— Que sol, que mar… Meus filhos, sem dúvida o Brasil foi uma escolha perfeita.— Comentou minha mãe, empolgada.— Já estou pronta para tirar longas férias.
— É melhor não se animar, mamma. As férias foram suspensas, temos um novo trabalho.— disse, com a expressão sombria.
Meus pais e meus irmãos mais velhos lançaram olhares questionadores, afinal, combinamos de que passaríamos uma longa temporada sem precisar dar golpes.
Expliquei resumidamente o meu encontro não tão agradável com a agente Müller, enfatizando que precisaria da ajuda de todos para pôr o plano em prática.
— Precisaremos montar uma estrutura diferente dessa vez. Nossos personagens não serão mais empregados dos outros, teremos nossa própria empresa.— Expliquei.
— Do que seria a nossa empresa?— Perguntou Hugo, meu irmão mais velho.
— Iremos aproveitar as experiências de todos nós. Abriremos uma fábrica de tecidos no nome da mãe e do pai.
— Tecidos? Tipo o que fabrica as roupas?— Perguntou Stella, a caçula.
— Não, para fabricar ovelhas.— Provocou Otto, o irmão do meio.
Apenas dois anos mais novo que eu e quatro anos mais novo que a Sofia, que veio logo depois do Hugo.
— Como pretende organizar, Carolina?— Perguntou a Sofia, ignorando a briga dos mais novos.
— O pai foi gerente de vendas a vida toda, e a mãe supervisora comercial. Nada mais justo do que eles ficarem a frente de tudo. No entanto, todos nós teremos uma porcentagem igualitária na empresa. Hugo e Sofia, que são formados em contabilidade, serão os nossos contadores. Otto, vamos tirar o seu diploma de advogado da gaveta, é melhor se atualizar porque você será o gerente do jurídico.
— Otto não serve nem para ser advogado de porta de cadeia.— Provocou Stella.
— Eu pelo menos tenho um diploma, e você? É a única que não tem.— Ele rebateu.
— Já chega vocês dois. Não estão vendo que estamos pisando na corda bamba? Essa maldita agente pode nos mandar para a cadeia e a julgar pela quantidade de golpes que demos, não sairemos tão cedo. Então, foco!— Exclamou Giorgia, minha mãe.
O olhar severo da minha mãe fez com que os dois ficassem quietos - pelo menos por um tempo-.
— Preciso admitir, Carol. Eu não tenho experiência como o Hugo e a Sofi para assumir um cargo alto.— Pontuou Otto.
— Eu admiro a sua humildade, meu irmão. Mas não se preocupe, contrataremos alguém capacitado para te treinar e ele será muito bem p**o por isso.
Em seguida, voltei-me para a minha irmã caçula.
— Stella, chegou a hora de você entrar para a faculdade. E de todos nós, será a única com o privilégio de começar e terminar no mesmo lugar. Já decidiu o que quer?— Perguntei.
Minha irmã aquiesceu.
— Moda. Quero estudar moda.
Todos ficaram em silêncio, não pareciam concordar. No entanto, eu sempre acreditei que uma pessoa deve lutar e correr atrás do que quer, seja no que for.
— Você entrará na faculdade de moda, está decidido.
Stella foi a única a comemorar com a minha afirmação.
— E você, boa vida?— Hugo tentou me provocar.
— Eu fico na frente das negociações. Precisam admitir que de nós, sou a melhor nisso.
Ninguém parecia se opor.
— E assim nasce a família Werner. Chegou a hora de colocarmos o nosso plano em ação.—Disse, confiante.