Prólogo

1504 Words
Os gemidos do meu pai podiam ser ouvidos de dentro do meu quarto — onde a porta ainda estava trancada —, me encolho ainda mais embaixo da cama, pressionando meus olhos molhados pelas lágrimas de caiam no carpete. Tampo a minha boca, estrangulando um soluço que queria sair dos meus lábios. — Eu avisei que voltaria. — O grito fez meu corpo balançar em um susto. Socos. Vozes desconexas. Enfim, o silêncio. Um silêncio quase que crucial. Me arrastei para fora da cama com cuidado, cravando meus dedos no chão, então, me arrastei em direção a janela. Puxei o trinco e a ergui, colocando meu rosto para fora. Minha casa era a mais precária da rua. Na verdade, com um pai alcoolatra e viciado em apostas, e uma mãe morta, não teria como esse cenário ser melhor. Eu trabalho muito para conseguir pagar as contas e mesmo que minha avó implore pelo dia em que eu, finalmente, vou ceder e ir embora com ela, ainda me sinto m*l por pensar em largar o meu pai sozinho — e com fome. Não é como se mudasse alguma coisa, ele não muda em nada na minha existência, além de me deixar um pouco mais exausta por causa da minha jornada interminável de trabalho. Hoje, meu único dia de folga, um dia deverás importante para mim, e eu estou presa em meu quarto, com um monte de homens agressivos socando o rosto do meu pai. Eles queriam o dinheiro. O maldito dinheiro que meu pai tinha torrado em um cassino — e perdido. Me lembro de quando tudo começou. Éramos normais, ele era um pai presente, amoroso... até a minha mãe morrer em um acidente de carro. Desde então, ele tem agido dessa maneira, se afundando a cada dia mais em um mundo que como todos sabemos raramente existe alguma volta. Eu tremi quando escutei o som da porcaria da naçaneta sendo girada e me recostei novamente na parede, puxando o ar descontroladamente para os meus pulmões. — Voltamos depois. — Pude escutar, antes que a voz se afastasse o suficiente. Eu soltei o ar dos meus pulmões, em alivio e me sentei na minha cama, soluçando durante do choro amargo. Eu já começava a ficar esgotada com toda essa vida de merd.a, onde não tinha respeito sobre mim ou sobre a minha paz. O meu pai tinha perdido todo o senso de perigo. Isso era um fato! — Carine! — Meu pai gemeu. — Carine! Ergui meu rosto, andando em passos lentos até a porta. Encostei meu ouvido na porta na esperança de escutar alguma coisa, mas foi em vão. Ele parecia sozinho e parecia com dor, por isso, abri a porta com cuidado, colocando apenas um dos meus olhos pela fresta. Cocei meu couro cabeludo, esfregando meus olhos, secando as lágrimas. Abri a porta com cuidado, colocando apenas os meus olhos para fora, no entanto, a porta foi empurrada com força, me fazendo cair no chão de uma vez. Gemi. O homem nojento se aproximou de mim, um sorriso nojento estampado no seu rosto, enquanto ele caminhava em minha direção. — O que você quer? — Perguntei. — AH, docinho! — Ele riu, se aproximando. Seus dedos seguraram com força em meu braço e eu me debati. — Não lute! Um revolver apontou para a minha têmpora. Suspiro, sentindo o desespero tomar todo o meu corpo de uma vez. Solucei. — Não sou seu docinho. — Resmungo, entredentes. — Ainda, você não deve valer muito. — Revirei os olhos. — O que você quer? — Eu pressiono meus olhos juntos. Ele me arrasta até a sala. O sangue do meu pai está em todos os móveis, manchando-os. Eu arregalo os meus olhos, resmungando com o aperto que aumenta em meu braço com mais força. — Quer fazer as honras? — O homem pergunta, dando um sorriso enorme. — Q-que honras? — Pergunta. Meu pai tosse, cuspindo o sangue sobre o carpete do carro. — O seu papai, ele acabou de vender você para nós. — Ele ri. — Ou melhor, ele pagou a dívida dele com você! — C-como? — Grunhi. — Como ? — Ele segura em meus cabelos. — Ele disse "leve a minha filha1", e estamos levando. Meu pai não fala nada. Não tem coragem. Ele apenas me encara, com um careta. Entro em desespero, quero gritar, mas dedos fortes demais tampam o meu rosto. Sinto dor em diversos pontos do meu corpo, meu couro cabeludo arde e eu gemo. Sou arrastada para o lado de fora da casa e enfiada em um carro enorme e preto, sem chance de lutar, sem chance de correr. Sem chance de conseguir ir mais a frente. Meus pés e mãos são amarrados e não tem nada que eu possa fazer além de ser arrastada para fora. *-* Não demorou muito para que o homem velho e gordo aparecesse na minha frente, dentro da sala escura. Somente eu estava ali. Ele sorri nojento, se aproximando de mim com passos arrastados. — Então, essa é a coisinha! — Ele segura o meu rosto entre seus dedos oleosos. Ele fede a chigarro e a cachaça. Eu estremeço. — Sim, achei uma delicia! — O homem ao lado dele diz, o mesmo que estava na minha casa. — Isso aqui não é para o seu bico. — Ele me solta, encarando o amigo. — Quero ela no leilão de hoje a noite. — No leilão de hoje a noite? — Pisco. — Sim! — Ele me encara. — Eu não... você não... por favor, eu trabalho, eu p**o tudo. Eu p**o cada centavo, mas não... não faça isso! — Imploro. — Garota, você acha mesmo que conseguiria pagar um pouco do que o seu pai nos deve? — Ele ri. — Aceitar somente você ainda foi bondade da nossa parte. — Por favor, eu imploro! — Eu digo, enquanto me arrasto em sua direção. Estar com os pés e mão atadas nunca foi tão literal. — Você tem um milhão? — Ele pergunta. — Um milhão? — Indago, boquiaberta. — Sim, você tem:? — Não, mas... — Tento pensar em uma solução. — Mesmo que você trabalhasse o restante da sua vida, você jamais me pagaria tudo o que o cretino do seu pai me deve. — Anda até a porta. — Meu único acordo é o dinheiro todo na minha mão hoje, caso contrário, você irá para o leilão, E ele sai, me deixando sozinha naquela sala escura e úmida. Soluço em um choro magoado e esfrego meus olhos. Não pode ser. Não pode mesmo ser. Como o meu próprio pai teve a coragem de fazer isso comigo? — * — O desespero me tomava com completo, a minha garganta estava fechando, enquanto eu respirava fundo, tentando parecer o mais calma e sincera o possível. O pânico tomava o meu corpo aos poucos. — Toma! — Uma mulher jogou uma calcinha em meu colo. Estremeço, pressionando meus olhos olhos; — E a parte de cima? — Gaguejo, durante a minha perguna. Ela dá uma risada sem graça, piscando para mim. — Que parte de cima? — Ergue as sobrancelhas. — Não existe isso aqui! — Claro que existe. — Eu me levanto, andando até ela. — Não, não existe! — Diz. Nesse momento, um tiro é ouvido a alguns metros. Me rescosto na parede, tremendo. — Fique aqui e se troque, vou ver o que está acontecendo. — Diz, enquanto sai pela porta. Os disparos continuam sendo ouvidos. Os sons ecoam, me obrigando a me encolher. Não existe defesa para mim, independente do que esteja acontecendo lá fora. Só espero que seja uma morte rápido e indolor. A borta é aberta com brusquidão. Um homem está parado a minha frente. Está usando uma calça social preta e uma camisa social branca suja com sangue — que tenho um leve palpite de que não é dele. Seus olhos passeiam por todo o meu corpo e rosto e ele encara um homem atrás dele, que parece ansioso e acelerado. — Mande o carro ficar preparado. — Ordena. Sua voz é grossa e ecoa por todo o ambiente, ecoa em meu interior. Limpo minha garganta nervosa e pisco para ele. — Vem, menina! Eu vou tirar você daqui. — Estende a mão para mim. E como alguém que não tem nada mais a perder, eu seguro entre os seus dedos gelados e o sigo. Era isso ou ficar e ser demonstrada como gado em um show de horrores na frente de milhares de homens nojentos. Eu sempre imaginei que isso poderia mesmo acontecer em algum lugar, mas nunca pensei que aconteceria comigo. Eu corro com ele, indo em direção a pequena porta dos fundos. O ar gelado entra em meus pulmões e ele abre a porta de um SUV preta. Eu pulo para dentro muito mais rápido do que deveria. Está na hora de ir embora e depois, quando ele me soltar, eu posso procurar outro lugar para ficar.

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