Priscilla
Acordei e notei que o Pesadelo não estava mais ao meu lado. A brisa suave da manhã atravessava a janela semiaberta, fazendo com que as cortinas balançassem levemente. Olhei para a mesinha ao lado da minha cama e vi um remédio e um bilhete escrito com a letra dele:
"Tá aí o remédio, bebe essa p***a direito, e me manda um vídeo bebendo, demoro, quero ter um filho contigo, não sua mandada."
Revirei os olhos e resmunguei comigo mesma, "É cada coisa...", enquanto pegava o remédio. Diogo sempre foi mandão e um tanto possessivo, mas nunca a ponto de determinar cada detalhe da minha rotina. Peguei uma garrafa de água no frigobar e, relutantemente, bebi o remédio. Gravei o vídeo? Óbvio que não. Ele não manda em mim.
Levei um tempo para me recompor da surpresa matinal. Fui ao banheiro, fiz minha higiene e aproveitei para tomar um banho revigorante. A água quente ajudava a afastar o cansaço da noite anterior e clarear meus pensamentos. Lembrei das últimas conversas com Kauã sobre Sophia, a bebê que encontramos e pela qual nos afeiçoamos tanto. Minha mente se encheu de preocupações enquanto a água caía sobre mim.
Desci as escadas ainda enrolada na toalha, meus cabelos úmidos gotejando, e encontrei meu pai, conversando com Carlos, o amigo policial dele. Eles pareciam profundamente envolvidos na conversa, e a expressão séria de ambos indicava que havia novidades.
Murilo— Bom dia, filha. Que bom que você acordou — disse meu pai, assim que me viu. — O Carlos tem notícias sobre a mãe da Sophia.
Meu coração acelerou. A questão da mãe de Sophia sempre fora um ponto de angústia para nós. Será que a encontramos? Será que ela queria a filha de volta?
Priscilla- Ai meu Deus, sério?! — perguntei, a preocupação evidente na minha voz.
Carlos confirmou com um aceno e começou a falar, mas eu o interrompi, ansiosa.
Priscilla— E qual foi o motivo? Qual seria o motivo pra abandonar a criança? — falei nervosa, quase sem fôlego.
Murilo— Calma, filha. Ele vai te explicar, mas fica calma, tá bom? — disse, tentando me tranquilizar.
Carlos respirou fundo antes de continuar.
Carlos— Bom, eu conversei com a Ariele, a mãe da Sophia. Ela disse que abandonou a criança porque o namorado dela não quis aceitar ter uma filha. Ele disse que se ela ficasse com a bebê, ele ia largar ela. Então, ela preferiu abandonar a própria filha pra ir viver com esse homem.
Meus olhos se encheram de lágrimas. Era difícil acreditar que alguém pudesse abandonar um bebê por causa de um homem.
Priscilla— Eu não acredito nisso — sussurrei, a voz embargada de emoção. — Ela abandonou a própria filha pra viver com um homem escroto desses. Eles vão ser presos, né?
Carlos suspirou, parecendo tão frustrado quanto eu.
Carlos— A mãe pode até ser presa. Agora, o namorado, eu não sei ainda. Só a justiça pode decidir. Eles marcaram a audiência pra segunda-feira. Você e o Kauã precisam comparecer, já que foram vocês que encontraram a bebê, e também porque você está pedindo a guarda da criança, né?
A menção da audiência me trouxe uma nova onda de ansiedade.
Priscilla— E se algum outro familiar quiser a guarda dela? — perguntei, preocupada.
Carlos— Se houver outro familiar que queira a guarda da menor, infelizmente ele vai ter mais direito. Mas vai haver uma investigação pra saber se essa pessoa tem a capacidade de cuidar dela — explicou.
Concordei, um pouco nervosa. Sabia que Sophia era apenas um bebê e não podia se defender sozinha. Precisávamos garantir que ela ficaria em boas mãos.
Carlos— E só isso, preciso ir agora — disse, se despedindo de nós.
Nos despedimos dele e ele saiu. Meu pai, olhou para mim com uma expressão mista de preocupação e carinho.
Murilo— Então é isso, né, filha? Temos que esperar até segunda agora.
Assenti, sentindo o peso da responsabilidade sobre meus ombros. Fui para a cozinha, onde preparei um café forte. Precisava de algo para me manter focada. Cada gole parecia me dar mais clareza sobre o que precisava fazer. Murilo se juntou a mim na cozinha, pegando sua xícara de café.
Priscilla- Pai, você acha que temos chances de ficar com a Sophia? — perguntei, olhando para ele.
Murilo deu de ombros e suspirou.
Murilo—Difícil dizer, Priscilla. Depende muito de como a audiência vai se desenrolar e se algum outro familiar aparecer. Mas você está fazendo tudo certo. Estamos juntos nisso.
Apoiar-me em meu pai sempre me dava forças. Ele sempre foi uma rocha em momentos de turbulência.
Passei o restante da manhã tentando me concentrar em outras tarefas, mas minha mente sempre voltava para a audiência e para Sophia. Peguei meu celular e enviei uma mensagem para Kauã, informando-o sobre as últimas novidades e a audiência marcada para segunda-feira. Ele respondeu rapidamente, dizendo que estaria lá comigo e que faria tudo o que fosse necessário para ajudar Sophia.
Depois do almoço, decidi me encontrar com Kauã para discutirmos a audiência e traçarmos um plano. Ele estava a poucas quadras de distância, ela tinha ido se encontrar com alguns amigos, então decidi ir a pé para clarear a mente. O sol brilhava intensamente, e o calor da tarde de verão era reconfortante de certa forma. Quando cheguei os amigos de Kauã já não estavam mais lá.
Kauã -Como você está? — perguntou, a preocupação visível em seus olhos.
Priscilla —Meio nervosa — admiti. — Mas acho que estamos fazendo a coisa certa.
Sentamos na mesa de uma lanchonete começamos a planejar nossa abordagem para a audiência. Discutimos o que diríamos ao juiz, como apresentaríamos nosso caso e que tipo de evidências levaríamos para mostrar que éramos capazes de cuidar de Sophia. Kauã sugeriu que falássemos com algumas pessoas que conheciam nossa situação e poderiam testemunhar a nosso favor.
Passamos a tarde toda planejando e preparando tudo. Enquanto falávamos, eu não podia deixar de sentir um misto de ansiedade e esperança. Sabia que a audiência seria um momento crucial para o futuro de Sophia, e queria estar preparada para qualquer coisa.
Quando voltamos para casa, já era noite. O céu estava escuro e pontilhado de estrelas. Entrei em casa e encontrei meu pai assistindo TV na sala. Ele sorriu quando nos viu,e perguntou o que tinhamos decidido. Contei a ele sobre nosso plano e ele parecia aliviado ao ouvir que estávamos nos preparando bem.
Priscilla— Vai dar tudo certo, filha — disse ele, tentando me tranquilizar. — Você é forte e determinada. Sophia tem sorte de ter você cuidando dela.
Sorri e agradeci. Suas palavras eram exatamente o que eu precisava ouvir naquele momento.
Os dias seguintes passaram em um borrão de preparações e ansiedade. Falei com vários amigos e familiares, pedindo que testemunhassem a nosso favor na audiência. Todos foram incrivelmente solidários e dispostos a ajudar. Isso me deu um novo alento, um sentimento de que não estávamos sozinhos nessa batalha.
Na véspera da audiência, m*l consegui dormir. Meus pensamentos giravam em torno de Sophia e do que aconteceria no dia seguinte. Finalmente, o sol começou a nascer, e me levantei sentindo uma mistura de cansaço e determinação. Era o dia da audiência, e eu precisava estar no meu melhor.
Vesti-me cuidadosamente, escolhendo roupas que passassem uma imagem de responsabilidade e seriedade. Quando desci, encontrei meu pai já pronto, me esperando com um café da manhã reforçado. Comemos em silêncio, ambos absorvidos em nossos pensamentos.
Kauã chegou logo depois, e nós três seguimos para o tribunal. O edifício imponente parecia ainda mais intimidante à luz da manhã. Entramos e nos dirigimos para a sala de audiência, onde outros já estavam reunidos. Entre eles, vi Ariele, a mãe de Sophia, acompanhada por um advogado.
A audiência começou e, aos poucos, fomos chamados para depor. Contei ao juiz como encontramos Sophia, como cuidamos dela desde então e nosso desejo de dar a ela um lar seguro e amoroso. Kauã também deu seu depoimento, falando sobre nosso compromisso com a criança e nossa capacidade de cuidar dela.
Ariele foi a última a depor. Ela parecia nervosa e arrependida, contando sua história com a voz trêmula. Disse que se arrependeu de ter abandonado Sophia, mas que no dia estava desesperada e sob pressão do namorado. Seu advogado tentou pintar um quadro mais favorável, mas o dano já estava feito.
O juiz ouviu pacientemente todos os lados e, depois de um intervalo, voltou com sua decisão. Meu coração batia tão forte que parecia que iria saltar do peito. Ele começou falando sobre a seriedade do caso e a importância de tomar uma decisão baseada no melhor interesse da criança.
Finalmente, ele anunciou que, após considerar todas as evidências e depoimentos, decidiu que Sophia ficaria sob nossa guarda temporária, enquanto uma investigação mais aprofundada era conduzida para determinar a melhor solução permanente. A sala ficou em silêncio por um momento, e então senti uma onda de alívio e gratidão.
continua....