( Pither )
Eu nunca estive tão pressionado na minha vida. Por um lado tinha um casamento à caminho, influenciado pelo meu pai! E por outro havia uma moça num orfanato sofrendo punições e maus tratos por uma diretora sem escrúpulos.
Eu precisava de ajuda... Por incrível que pareça! Mas eu tinha um plano! Talvez fosse meio maluco mas ele tinha que dá certo! E ele precisava do meu pai.
Cheguei na clínica apressado, Pâmela estava deixando a recepção.
- Senhor Pither, posso ajudar?
- Sim Pâmela, o meu pai está?
- Acabou de sair pra almoçar..
- Obrigado! Saí da clínica literalmente correndo, peguei meu carro e fui para minha casa. Quando cheguei no condomínio eu assoprava o ar pela boca. O calor estava intenso, nem parecia inverno. Eram quase meio dia passei pelo portão, estacionei meu carro e entrei em casa. Naná descia as escadas, com uma pilha de roupas.
- Naná, Naná! Cadê o meu pai??
Eu cheguei tão perto dela, que a fiz rodar com todas as roupas.
- Calma Pither! Você quase me fez cair com todas as camisas do seu Pai!
- Ele chegou pra almoçar? Perguntei eufórico.
- Sim... Tá no escritório!
- Obrigado!! Beijei seu rosto e fui para o escritório de papai, muito ansioso! Bati na porta e entrei.
- Pai! Posso entrar?
- Claro Pither, entre!
Papai estava sentado em sua cadeira analisando alguns papéis. Estava com seus oclinhos e percebi que ele estava calmo.
- O senhor está ocupado?
- Não filho! Só estava vendo alguns exames, precisa de alguma coisa? Ele tirou os óculos e olhou pra mim. -Sente-se !
- Preciso Pai! Prefiro ficar em pé mesmo... Minhas pernas tremiam, minha boca estava seca, voltei a mexer nos cabelos e andar pelo escritório.
- Calma Pither! Você parece tenso...
Parei de andar, e olhei pra ele.
- Pai, preciso que você adote uma garota!
- Como é quê é?? Papai se levantou na hora de sua cadeira.
- Preciso que você vá até o ''Orfanato de Boa Ventura'', e adote uma moça!
Papai olhava pra mim desacreditado.
- Pither, eu ouvi bem?! Você quer que eu adote uma garota? Sua reação era de espanto.
- Sim Pai! Ela precisa sair daquele lugar o mais rápido possível! E a única saída e a sua adoção! Você vai adota-la né?
- Nãooo! Claro que não Pither! Eu não posso sair por aí adotando alguém que eu nem se quer conheço...
- Mais eu a conheço! Eu preciso tirar ela de lá... O senhor não entende?!
Comecei a alternar a minha voz, não sabia mais o que fazer.
- Eu entendo sim... Você vem no meu escritório com uma idéia absurda de adoção?! Pither você anda bebendo outra vez?
Eu andava de um lugar para outro, essa era minha única alternativa.
- Pai! Olhei pra ele, com olhos de súplica. - Eu nunca te pedi nada! Você me deve isso!! Eu sempre faço tudo o que você quer! Você precisa reconsiderar...
- Pither ! Você está se ouvindo? Você quer que eu atenda um capricho seu! Adotar uma moça, que eu nunca vi na minha vida! E se ela não é tão boa como você pensa? Eu volto com ela pro orfanato? E isso de adoção leva tempo Pither, eu não posso simplesmente chegar lá levando alguém embora...
- Pai! Seu irmão é advogado, ele agilizaria muito as coisas! Não é um capricho! Eu preciso ajuda-la Pai, se você a conhecesse...
Eu olhava pra ele, minha mãos estavam levantadas , eu pedia por favor mais ele não me ouvia.
- Sinto muito Pither! Eu não vou te ajudar nessa loucura!
Meus olhos avermelharam se na mesma hora, mordi os lábios e a raiva explodia dentro de mim. Comecei a gritar sem parar.
- Claro que não! Aqui a gente só faz o que você quer! Balancei minha cabeça pra ele. - Se minha mãe estivesse viva, com certeza me apoiaria! Eu nunca posso contar com você pra nada!
Papai se aproximou de mim.
- Não chega perto de mim! Virei me de costas, coloquei as mãos no rosto e ia saindo do escritório, mas antes olhei pra ele e apontei o meu dedo.
- Vai se arrepender de não ter me ajudado! Porque eu vou conseguir sozinho. E dê adeus ao seu teatro com os D'Ávila!
Abri a porta do escritório e sai para a fora, antes pude ouvir ele me chamar.
- Pither espera!
Mais eu não o esperei, saí e pude encontrar com Naná no corredor, ela se aproximou de mim preocupada.
- O que foi filho? Por que você está gritando?
Papai vinha logo atrás furioso, eu olhei pra ela. Olhos marejados de indignação.
- Eu odeio ele Naná! Eu odeio!
Naná me abraçou, e me colocou atrás dela quando viu que Papai estava ao lado.
- Sabe porque ele é assim? Porque você o mimou demais! Você o mima o tempo todo... Papai dirigia se a Naná.
Ela o analisou sem medo, não se importou que era uma funcionária. Não abaixou a cabeça, permaneceu firme.
- Senhor Álvaro, eu tenho muito respeito com o senhor, mas não vou permitir que continue magoando o meu menino...
Papai estava preparando uma de suas sentenças, e eu intervi. Não podia prejudica la com isso.
- Deixe Naná! Não ligue pra isso... Meu pai já é um caso perdido!
Beijei seu rosto e sai, eles ficaram me olhando, Naná tentou me chamar mais eu sai pela porta da sala. Liguei meu carro e fui embora.
( Esther )
Depois que voltei pro meu quarto, sentei junto à minha cabeceira da cama e chorei intensamente. Não com lágrimas apenas mas com desespero.
Tudo estava acabado, não havia mais esperança pra mim! Pela primeira vez eu tinha sonhado. E pra que? Ela venceu outra vez! Ela sempre vence! Não é justo!! Porque será que Miriam morreu naquele incêndio? Porque? Ela faz tanta falta.
Há anos eu venho me perguntando, como seria diferente se a antiga diretora do orfanato tivesse sobrevivido. Não teríamos sido transferidas pra cá... E aquela bruxa nunca teria conseguido ser diretora.
Quando a porta abriu-se com tudo, ela entrou com seu salto ecoando pelo quarto. Eu limpei os olhos, mas não valeu o disfarce. Ela me pegou pelo braço e me ergueu ate eu sair da cama.
- O que você pensa que está fazendo garota estúpida?! Olha pra mim! O que você andou dizendo pra aquele médico, hein?
Eu olhei pra ela com desprezo, que é o que eu sentia por ela.
- Eu não disse nada! Falei firme.
Sem chorar.
- Espero que seja a verdade! Por que se não as crianças!... Vão pagar muito caro pelas sua rebeldia Esther.... Ela me atirou na cama outra vez e saiu batendo a porta.
Aquele dia fiquei sem café da manhã e sem almoço. Tomei um copo de água e ele me saciou até a tarde.
Eu torcia muito para que Deus desse uma guia para o Pither. Apesar de tudo está perdido, ele precisava entregar um laudo médico aquela mulher, e precisava ser convincente; ou ela descontaria tudo... Nas inocentes crianças!
(Pither)
Eu não tinha pra onde ir, não podia voltar pra casa, não agora! E eu não queria ir no Apê dos meninos, ver o Miguel. Provavelmente eu sairia bêbado de lá e isso complicaria ainda mais as coisas.
Pensei em tudo o que meu pai me disse. Uma raiva me tomou, então encostei o carro e começei a socar o volante. Depois de descontar a minha raiva, eu debrucei sobre ele com a minha testa sobre o braço, e me senti um derrotado. Foi aí que olhei pro lado, e vi o cemitério da cidade.
Eu estava tão desolado, e sem rumo que nem percebi que estive pegando a rodovia rumo acesso ao cemitério. Lá estava enterrada a minha mãe.
Então levantei a minha cabeça, tirei meu cinto de segurança e saí do carro. A estrada era deserta, fechei a porta e atravessei rumo ao portão daquele lugar. Ele estava aberto então entrei.
Fui andando pelo corredor principal, desanimado. Depois que fui para o Estados Unidos, nunca mais minhas visitas foram frequentes, somente nas férias que eu conseguia levar alguma flor à minha mãe. Mas agora que voltei pra casa, tento levar rosas sempre que posso ao seu túmulo.
"Em Memória de Raquel Monteiro de Fragma.
Mãe e Esposa adorada."
- Oi Mãe! Falei de frente ao túmulo, e fiquei analisando ele por alguns segundos.- Eu briguei com o papai outra vez! Mais dessa vez eu tive razão!... Daí peguei o carro e não sei como acabei chegando aqui!
Respirei fundo, a tarde estava começando a ficar gelada, o inverno não era piedoso com ninguém. Então as folhas começaram a voar por toda a parte e eu agachei pra limpar algumas que caíram na lápide.
- Se você estivesse viva diria pra mim ter um pouco mais de paciência com ele. Você dizia " Deixa seu pai achar que está no controle! Mas quem comanda tudo somos nós!"
Sorri ao lembrar da frase que ela sempre me falou.
- Mãe! Me sinto tão perdido! Talvez a Naná tenha razão, e eu tenho esse coração nobre e bom como o seu! Mas você mãe... Sempre tinha uma saída para os problemas. Não importa o quanto difícil eles eram, tudo no final se ajeitava...
Acho que nessa altura, onde quer que esteja está decepcionada comigo! Com o que me tornei!
Respirei fundo e lágrimas caíram dos meus olhos..." Droga eu não queria chorar!"
Suspirei, secando as com as pontas dos dedos. Olhei pra cima.
- Mãe eu quero te pedir perdão, por você estar aqui. Eu sei que é a minha culpa. Sempre fui um inresponsavel! Mas hoje... Eu realmente queria fazer algo que valesse a pena! Eu queria mãe, tirar aquela garota daquele lugar... Não é justo o meu Pai não me ajudar! Balancei a cabeça e me levantei.- Aposto que deve está aí rindo de mim, por eu estar desistindo né?
Olhei pro lado e comecei a lembrar de quando eu não ganhei a partida de futebol na escola. Ela sorriu e disse " Você perdeu uma partida, não o campeonato! Levante a cabeça e lute pelo seu time!" Sorri, eu tinha dez anos.
Olhei pela última vez para a lápide e disse com meus braços abertos.
- Tá Dona Raquel o que você quer que eu faça? Que eu entre naquele lugar e rapite a moça?
Parei por um momento, meus neurônios iam a mil, eu realmente tinha um plano B. Levantei minhas sobrancelhas e falei sorrindo.
- Obrigado Mãe! Foi uma excelente idéia... Você é um gênio mesmo!!
(Esther)
Olhei para o relógio em cima do criado mudo, faltavam cinco minutos pra seis. Eu tinha acabado de tomar banho, coloquei uma roupa limpa e sentei na cama para pentear os cabelos.
Eles estavam tão compridos que eu precisava divido-los para pentea-los. Foi aí que eu lembrei dos grampos que eu tinha deixado na caixinha. Abri minha gaveta pegando a caixinha e virei a toda em cima da cama. Caíram alguns grampos, as cartinhas que eu ganhei no último natal das crianças, e o colar da minha mãe.
Aquele colar, possui um valor muito grande pra mim. Pois quando me deixaram na porta daquele orfanato dentro de uma cesta... Mirian me disse que o colar estava junto. Ele era prata, com um pingente de coração e atrás tinha a letra R.
Imagino que essa seja a primeira letra do nome da minha mãe. Junto com com o colar, a cesta e eu também veio uma carta que parecia ser escrita pelo meu pai. Eu já tinha lido centenas de vezes, e sempre me emociono. Imaginando o dia em que eles virão me buscar daquele lugar.
Ouvi passos no corredor, então coloquei tudo dentro da caixinha bem rapidinho e joguei-a debaixo da cama. Junto com o relógio que estava no criado.
Voltei a pentear os cabelos quando Saulo entrou no quarto com uma bandeja.
- Seu Jantar, Rapunzel... Ele me disse colocando a na escrivaninha e sorrindo como um jacaré, com aqueles dentes horríveis dele. Eu não o respondi, continuei penteando os cabelos, e imaginando até quando passaria por isso.
- Olha, coma tudo tá ! Eu volto pegar a bandeja amanhã... Ele saiu, antes acenou pra mim pelo vão da porta - Tchauzinho...
Bufei quando ele trancou a porta outra vez . E coloquei os grampos na minha franja, desejando ter pelo menos um espelho para poder ver o meu reflexo.
Aproveitei que estava ali, e peguei o livro que o Pither me deu. Sorri ao ver a capa "Como eu era antes de você ".
Comecei a ler o primeiro capítulo, quando ouvi alguns passos no corredor. Parei de ler e olhei para porta tentando ouvir... Não parecia ser Saulo, ele provavelmente desceria aquela maldita escada como um trovão. Os passos eram leves, como se estivessem de pontas de pé. Não podia ser de Lúcia, ela provavelmente desceria com seus saltos absurdamente grandes. Fechei o livro, e me levantei da cama praticamente rastejando como se estivesse na espreita. Foi aí que a maçaneta girou, e como estava fechada a porta ela voltou no lugar.
" Meu Deus quem será que pode ser?"
Alguém bateu . Soquinhos leves, e uma voz rouca inconfundível ecoou atrás da porta.
- Esther! Esther! Sou eu Pither...
Era ele!! Coração quase saiu pela boca.
- Pither?! Coloquei a boca no vão, para que ele pudesse me ouvir. - O que você está fazendo aqui?
- Esther, a gente não tem muito tempo. Você tem algum alfinete, clipes, ou grampos aí? Se tiver me passa por debaixo da porta. Eu vou tentar abrir...
Fiquei sem reação. Onde eu ia achar um alfinete? Mais daí lembrei do grampo no cabelo. Puxei o da franja, e passei pra ele por debaixo da porta.
- Pither, toma aqui! Joguei e ele pegou o grampo pela fresta.
Eu estava tão ansiosa, e amendontrada! Se alguém visse ele aqui, o que aconteceria com a gente?! Mordi minhas unhas de nervoso. Pither mexia o grampo no buraco da fechadura e nada acontecia..." Ai que desespero!!"
Ele empurrava a porta e mexia o grampo, e os minutos iam se passando.
Foi aí que do nada, ele parou de mexer o grampo. Virei meu rosto para a porta e vi quando a maçaneta girou outra vez, a porta se abriu... E ele entrou!
Pither apareceu entre a porta, e eu pude enfim soltar o ar. Ele entrou e eu consegui dar o meu sorriso não sei se de angústia, ou de alívio. O abracei e dessa vez ele retribuiu.
- Pither! Graças a Deus!
Olhei pra ele eu estava tremendo ao lembrar do grande perigo que corríamos.
- O que você faz aqui? Perguntei.
- Esther! Preste bem atenção em mim. Ele tocou meus ombros, e me encarou sério. Seus olhos verdes brilharam.- A gente precisa sair daqui... Agora!
- Pither o Saulo pode nos pegar fugindo...
Eu estava com tanto medo, que meus olhos começaram a lacrimejar.
Ele segurou meu rosto entre as mãos.
- Ei, Ei! Calma! Olha pra mim! Eu olhei pra ele... Respirava com dificuldades. - Você confia em mim ?
Pither me perguntou sério, me olhava enquanto seus dedos tocavam meu queixo.
- Confio! Falei balançando a cabeça.
- Então tá! Vamos sair daqui! Eu e você... Juntos, tabom?
Assenti e o abracei outra vez, ele colocou meu cabelo atrás da orelha e beijou o topo da minha cabeça. Naquele momento eu senti que tinha chegado a minha hora... Enfim a minha libertação!
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