38" Laços de sangue "

1885 Words
Maria Luiza Eu avistei uma garota sentada na calçada, com uma criança no colo. Quando ela me viu, levantou-se apressada, com uma expressão estranha, como se estivesse com raiva ou talvez medo. Desci da moto com o Águia ao meu lado, o vento quente do morro soprando nossos rostos. Águia foi direto ao ponto, sua voz firme e cortante: Águia _ Essa é a Maria Luiza que você estava procurando? _ falou encarando a garota. Amanda_ Sim, é ela sim!_ a garota respondeu, me olhando com uma mistura de nervosismo e determinação. Minha mente ficou confusa; eu não fazia ideia de quem ela era. Malu_ Eu acho que você se enganou, eu não te conheço._ respondi, tentando entender o que estava acontecendo. Águia cruzou os braços, seus olhos afiados como navalhas. Águia _Tá vindo de caô pra cima de bandido, mina?_ sua voz era fria e ameaçadora. Amanda_ Não é isso... _a garota gaguejou, visivelmente nervosa. _Você é a ex do Gabriel, não é? Assim que essas palavras saíram da boca dela, meu corpo gelou, um arrepio subiu pela minha espinha. Meus olhos caíram sobre o garotinho no colo dela, e meu coração parou. Ele era a cara do Gabriel. Águia, sempre rápido em ler as situações, falou antes de mim: Águia _Tá falando de que, garota? Amanda_ Eu sou a amante do Gabriel... Ele te traía comigo._ ela confessou, seu olhar carregado de nervosismo. Malu _Como é que é? _perguntei, incrédula. As palavras dela batiam como um soco no estômago. Amanda _Eu conheci o Gabriel em uma casa noturna. Eu trabalhava lá... A gente se envolveu, e depois disso, ele ia me procurar quase todas as noites. _sua voz tremia, mas havia uma verdade amarga em cada palavra. Malu _Tá me dizendo que tu é garota de programa?_ perguntei, minha voz um misto de descrença e desprezo. Águia, ainda analisando a situação, entrou na conversa: Águia _Quantos anos você tem? Amanda _ Na verdade, eu era garota de programa... E tenho 17 anos._ respondeu, abaixando o olhar, talvez com vergonha, talvez tentando esconder as lágrimas que ameaçavam cair. Águia _ E esse menino, é seu filho? _ Águia continuou, sem mostrar um pingo de emoção. Amanda _ É, filho meu e do Gabriel._ As palavras dela caíram como pedras sobre mim. Minha cabeça girava com as revelações que não paravam de vir. Malu _ Como você descobriu onde eu morava?_ minha voz saiu trêmula, meu coração batendo descompassado. Amanda _ Eu sempre soube de você... Ele sempre deixou isso bem claro pra mim._ A amargura em sua voz era palpável._ Ele me falava de você o tempo todo..._ completou, revirando os olhos como se quisesse afastar as lembranças. Olhei para Águia, que estava agora com uma expressão séria, analisando cada movimento da garota. Águia _ O que veio fazer aqui?_ ele perguntou, a voz fria como uma lâmina. Malu_ Ela veio jogar na minha cara que eu era uma trouxa, e que estava sendo traída debaixo do meu nariz._ minha irritação transbordou nas palavras. Amanda _Eu vim saber onde o Gabriel está... Ele nunca ficou tanto tempo sem ver o filho. Desde que o Vinicius nasceu, ele sempre esteve presente na vida dele. _a dor e a preocupação transpareciam em sua voz. Águia _ Quantos anos o moleque tem?_ perguntou, agora focado no garotinho. Amanda _Fez dois anos há dois meses._ respondeu, e minha mente começou a juntar as peças de um quebra-cabeça c***l. Malu _ Dois anos... Então, desde o início, o Gabriel me traía..._ minha voz quase falhou, meu nariz ardia, e um nó se formava na minha garganta. O gosto amargo da traição era quase insuportável. Águia _Lamento em te dizer, mas o Gabriel tá morto._Águia disse, seco, cortando o ar com a notícia. Vi o semblante da garota mudar completamente. Seus olhos se encheram de lágrimas, o choque estampado em seu rosto. Amanda _É mentira, né? Me fala que é mentira! _Ela me olhou assustada, como se esperasse que eu desfizesse aquela realidade. Malu _ Não é mentira... Ele realmente está morto._ As palavras saíram com dificuldade. Amanda _ O que eu vou fazer da minha vida? Eu não tenho para onde ir, Maria Luiza, me ajuda!_ Ela agarrou meu braço, o desespero transbordando em cada palavra. Águia _Solta ela, tá maluca! _ interveio, nervoso, afastando a garota de mim. Amanda_ Como ele morreu?_ Ela perguntou, as lágrimas agora escorrendo livremente pelo rosto. Águia _ Foi em uma invasão aqui no morro... Infelizmente, o Gabriel foi vítima de bala perdida._ Águia respondeu, balançando a cabeça, mantendo a frieza. Amanda _O que eu vou fazer da minha vida? Não tenho pra onde ir... Meu pai me expulsou de casa._ o desespero em sua voz era de cortar o coração. Malu _Infelizmente, não posso ajudar._ Respondi, minha voz fria, tentando não me deixar envolver. Amanda _ Não me deixa na rua, por favor, Maria Luiza... Meu filho não merece isso, me ajuda, por favor!_ Ela implorou, as lágrimas misturando-se com o desespero em seu olhar. Águia _ É melhor você meter o pé. Aqui não tem lugar pra você._ cortou, seco e direto. Ela olhou para ele com ódio nos olhos antes de se afastar. Águia _ Você tá bem?_ perguntou, me olhando com preocupação. Malu _Não, não estou nada bem. _ As lágrimas que eu tentava segurar finalmente escaparam, e comecei a chorar. Águia _ Precisa chorar não, pô... Isso já passou, o cara tá queimando no inferno agora._ Ele tentou me consolar, mas as palavras dele pareciam tão vazias quanto o sentimento que agora tomava conta de mim. Malu _ Eu sei disso, mas eu me sinto tão burra... Esse tempo todo, eu nunca desconfiei do Gabriel. Eu sou tão burra, burra..._ falei, batendo na minha cabeça, tentando aliviar a dor que parecia me consumir. Águia _ E doida também. Para com isso, vou te levar pra casa, bora lá._ Águia, tentando me tirar daquele lugar onde as lembranças pesavam mais que o ar. Malu _ Tenho que ir trabalhar..._ suspirei, sabendo que o trabalho era a única coisa que poderia me distrair naquele momento. Águia _ Quer que eu te leve?_ Ele ofereceu, mas neguei com a cabeça. Malu _ Vou com as meninas... Eu não tenho a vida ganha._ Respondi, tentando me convencer de que ainda havia um caminho a seguir. Águia _ Eu sei, eu não falei nada disso. Vai lá então, pô. Mais tarde a gente se vê._ Ele respondeu, respeitando minha decisão. Subi o morro até onde as meninas estavam, peguei minhas coisas que havia deixado com elas e seguimos até o salão, onde pelo menos por algumas horas eu poderia esquecer a realidade que insistia em me perseguir. Águia Voltei pra boca e o Gb ainda estava lá, terminando de fazer a contabilidade. Só não dei casa pra garota porque sei exatamente o que vai acabar acontecendo. Sou bandido de anos já, conheço essa história de cor e salteado. O moleque vai crescer com sangue nos olhos, vai querer ir atrás do cara que matou o pai. E mesmo eu dizendo que o desgraçado foi vítima de bala perdida, deu pra ver que a garota não acreditou em nada. E problemas? Já tenho vários. O filho da p**a não valia nada mesmo. Fiz um favor para o mundo mandando aquele desgraçado pro inferno. Um cara velho, se envolveu com uma menina de 15 anos na época, apesar de que a Maria Luiza tinha 17... O que é pior ainda. Se envolvia com duas de menor. Gb_ laê, como foi lá? _ me olhou, curioso. Águia _ A mina era amante do cuzão lá, o Gabriel. Veio atrás do filho da p**a, junto com o filho dos dois!_ Falei, negando com a cabeça, ainda não acreditando em tudo que tinha acontecido. Gb_ Espera aí, me explica direito._ pediu, confuso. Águia _ É isso, pô. A mina que veio aí era amante do Gabriel. Ela veio atrás da Maria Luiza pra saber onde o filho da p**a estava._ Respondi, ainda tentando digerir os fatos. Gb _ Que história é essa de filho, pô?_ perguntou, sem conseguir esconder o choque. Águia _ Ela tava com um menino no colo. Disse que era filho dela com o Gabriel._ Falei, minha voz carregada de desprezo. Gb_ O desgraçado traiu a Maria Luiza e ainda botou um filho na menina... c*****o!_ começou a rir, um riso seco, incrédulo. Águia_ tem graça não pô, Maria Luiza ficou malzona Gb_E ficou m*l por que, o cara já tá morto pô, não adianta ficar m*l com nada não, ela foi burra também, não desconfiou que o cara tava metendo um par de chifre na cabeça dela. Águia _Pode parar com essa p***a, vai trabalhar vai, tá falando demais já. Gb_ Vou buscar o meu né, que eu ganho mais. Me sentei na cadeira de couro desgastada, sentindo a tensão no ar ainda pulsar depois da discussão com Gb. Ele tinha saído batendo a porta com tanta força que as paredes finas da sala tremularam, como se o próprio ambiente estivesse cansado de tanta pressão. Puxei o maço de cigarro de maconha do bolso da jaqueta, acendendo um com um fósforo que fez um leve crepitar ao tocar a seda. Traguei fundo, deixando a fumaça densa preencher meus pulmões, a sensação quente e familiar se espalhando pelo corpo enquanto eu soltava a fumaça devagar, observando-a se dissipar no ar. Eu pensava em Maria Luiza, no quanto ela tinha se envolvido demais, no quanto tinha ficado m*l depois que tudo desmoronou. Mas a vida também não tinha sido justa com ela, com nenhum de nós, para falar a verdade. Ela tinha se entregado, confiado cegamente, e ele tinha traído essa confiança. Agora, ele estava morto, mas o estrago já estava feito, e nada do que eu fizesse ou dissesse mudaria isso. "Ela foi burra, sim," pensei, a amargura subindo pela garganta junto com a fumaça. Mas, ao mesmo tempo, sabia que todos nós tínhamos nosso ponto cego, aquela fraqueza que nos fazia tomar decisões ruins. O amor era o dela, a lealdade cega. E agora, ela pagava o preço. Soltei mais uma baforada de fumaça, observando-a se dissipar enquanto meus pensamentos corriam, uma mistura de raiva e resignação. O som abafado da cidade lá fora era como um eco distante de uma vida que eu já tinha deixado para trás. Eu sabia que não adiantava ficar remoendo o passado, mas era difícil evitar. Cada ação, cada decisão, nos trouxe até aqui. Sacudi a cabeça, tentando espantar os pensamentos, e apaguei o cigarro no cinzeiro cheio. O cheiro doce e pungente ainda pairava no ar, uma lembrança do que eu tinha acabado de fumar. Mas agora era hora de focar no que realmente importava. Tinha uma reunião para preparar, um roubo que precisava ser planejado com precisão. Levantei da cadeira, sentindo os músculos ainda tensos, e comecei a organizar os papéis na mesa. Esboços, mapas, tudo estava ali, esperando para ser finalizado. O que estava por vir era perigoso, mas eu já estava nisso há tempo demais para me deixar intimidar. Peguei uma caneta e comecei a escrever, mergulhando na tarefa com a mesma intensidade com que havia fumado minutos atrás. Havia muita coisa em jogo, e eu não podia me dar ao luxo de falhar.
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